Mesmo comemorando o menor índice de desmatamento na Amazônia Legal desde 1991, o governo brasileiro se esquivou do compromisso de assumir metas obrigatórias e internacionais para emissão de gases do efeito estufa, conforme pediram ontem as principais autoridades dos Estados Unidos e do Reino Unido nas negociações sobre o aquecimento global.

Em visita oficial a Brasília, o enviado especial americano para mudanças climáticas, Todd Stern, e o secretário britânico de Energia e Mudanças Climáticas, Ed Miliband, fizeram o mesmo apelo: os países emergentes, incluindo o Brasil, devem ter metas a partir de 2013, no acordo pós-Kyoto, que será definido — se tudo der certo — em Copenhague, em dezembro.

Miliband e Stern pressionaram o Itamaraty e o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, a adotar um papel mais agressivo nas negociações do clima. Para eles, os emergentes deveriam assumir metas obrigatórias para diminuir a curva atual de crescimento dos gases de efeito estufa, enquanto os ricos se comprome tem a cortar suas emissões.

Os EUA, na proposta de nova legislação que ainda tramita no Senado, propõem reduzir em 17% as emissões até 2020, com base nos dados de 2005. O Reino Unido foi bem mais ousado: definiu em 34% sua redução até 2020, com base nas emissões de 1990, quando eram menores.

Minc deixou claro que o Brasil não aceita responsabilidade semelhante à dos países ricos e admitiu “discordâncias. Para ele,os países quemais emitiram“nos últimos 50 anos devem ter responsabilidade diferenciada. “A bola está com eles, disse.

O ministro lembrou que o governo brasileiro, no Plano Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), estabeleceu metas voluntárias e nacionais para combater o aquecimento global.Com base em números divulgados pelo Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe), que indicam o menor índice de desmatamento da série histórica na Amazônia, o ministro observou que o Brasil deverá cumprir com folga essas metas internas. “Isso é melhor do que fixar metas obrigatórias e não cumpri-las, acrescentou.

A previsão do Ministério do Meio Ambiente é que, entre agosto de 2008 e julho de 2009 (período-base), tenham sido desmatados de 8 mil a 9 mil quilômetros quadrados. O recorde anterior era de 11.037 km2, alcançado em 1991. Em junho deste ano, a derrubada de florestas diminuiu 33% em relação a 2008, segundo números do Deter, o sistema de monitoramento por satélites em tempo real do Inpe.

Para ambientalistas, o Brasil pode estar perdendo uma oportunidade para assumir papel de protagonista nas discussões mundiais sobre o clima ao abdicar de metas mais ousadas. “A impressão do governo brasileiro é que a adoção de metas limitaria o crescimento do país, mas essa visão não tem consistência, diz Mario Menezes, diretor-adjunto da ONG Amigos da Terra. “O Brasil não quer metas e acha que os esforços para manutenção de suas florestas têm de ser partilhados com o mundo, diz.

Para João Talocchi, coordenador das campanhas sobre clima do Greenpeace no Brasil, há certa “esquizofrenia nas posições do governo brasileiro. “Ao mesmo tempo em que o Ministério do Meio Ambiente quer reduzir o desmatamento, a bancada ruralista consegue mudar o Código Florestal, ganhando mais espaço para desmatar. Se resolvesse esses problemas o Brasil poderia assumir posição de liderança nos debates sobre clima, por ser já um grande emissor e por ter em seu território parte importante para a solução dos problemas, diz. “O governo precisa de mais ações internas para ter discurso embasado lá fora.

Uma importante ação interna que o governo poderia adotar seria uma lei mais enfática sobre o tema, diz Brenda Brito, coordenadora do programa de mudanças climáticas do Imazon. “O PNMC, por exemplo, foi lançado com pompa, mas é vulnerável a mudanças políticas. Uma meta de buscar desmatamento “zero seria uma importante sinalização de liderança do Brasil em Copenhague, diz ela.

Os números sugerem que, se não houver nova escalada do desmatamento na Amazônia Legal, será alcançada com facilidade a principal meta do plano de mudanças climáticas. Ele estabelece queda da área derrubada por ano para cerca de 11 mil km2 em 2009 e prevê redução de 70% do desflorestamento até 2017, na comparação com a média do período entre 1996 e 2005. Incluindo o desmatamento das florestas e mudanças no uso do solo, que equivalem a três quartos das emissões nacionais, o Brasil está entre os quatro maiores produtores de gases-estufa do planeta.

De agosto de 2008 a junho deste ano, foram desmatados 3.536 km2 de florestas — redução de 55% em relação ao período anterior. O número previsto para o período completo, de 8 mil a 9 mil km2, engloba não só os dados de julho, mas também o monitoramento feito pelo Prodes, que detecta desmatamento em áreas menores.


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