O governo não precisa inventar a roda para dar inclusão econômica e social às comunidades que vivem na Amazônia e, ao mesmo tempo, proteger a floresta. “Se tiver regularização fundiária, crédito e assistência técnica, já resolve boa parte do problema”, diz Paulo Amaral, pesquisador sênior do Imazon, um dos institutos-referência no estudo da Amazônia. Mas não é aí, na regularização fundiária, que está o nó? “Não, o modelo já existe.”
Amaral defende que as comunidades da Amazônia recebam tratamento similar ao que funciona com os assentados e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O assentado só recebe o título de terra depois de 20 anos. “Bastaria dar direito de uso a quem mora e está na floresta há décadas. E estabelecer que só vai receber o título da terra daqui a 30 anos, se a floresta estiver cuidada. Exatamente como é feito na reforma agrária”, prossegue o especialista no estudo do manejo florestal comunitário e familiar.
“Mas o governo tem que entender que não existe floresta de curto prazo”, prossegue o pesquisador. Qualquer ciclo da floresta dura décadas. Planos de manejo percorrem horizontes de 30 anos. “Tem que dar segurança jurídica para que investimentos de longo prazo possam ocorrer”, sugere.
Representantes do governo da área ambiental concordam e têm diagnóstico similar. A ministra Izabella Teixeira disse aos participantes do evento em Parintins que “o Estado tem que ter celeridade, as políticas públicas têm que acontecer”.
O país sabe como lidar com sua vocação agrícola, mas não sabe ainda como desenvolver sua economia florestal. “Não temos estrutura forte para cuidar da floresta”, reconhece Antônio Carlos Hummel, diretor geral do Serviço Florestal Brasileiro, ligado ao MMA. “Historicamente, toda a capacidade técnica do governo é para áreas que já foram alteradas.” A tradição é para a área com agricultura e pecuária, o novo exige que se desenvolva a área com a cobertura vegetal. Ou seja, em uma propriedade da Amazônia, sabe-se o que fazer apenas com os 20% onde se pode desmatar – e não com a área de reserva legal.
Preservar e viver da floresta é prioridade para uma economia de base florestal, de inclusão social e para cumprir a meta de redução de gases-estufa, argumenta Amaral, do Imazon. “Porque o manejo conserva”.
É o que defende outra pesquisadora, Patrícia Cota Gomes, coordenadora do instituto Imaflora e que também trabalha com manejo florestal comunitário. “Existe uma forma de coletar produtos da floresta com baixo impacto e baixa escala. E isto garante que estas florestas se mantenham em pé e é o que queremos promover”, diz ela.
Segundo dados do Serviço Florestal Brasileiro (SBF) 62% das florestas públicas são destinadas a reservas extrativistas ou de desenvolvimento sustentável. São florestas do Estado e às comunidades é concedido o uso. “Isso significa que em 128 milhões de hectares existem comunidades vivendo e em muitas dessas áreas não há desmatamento porque eles manejam a floresta como seus antepassados faziam”, diz Patrícia
“Existem produtores doidos para serem legalizados, que vivem no mesmo lugar há quatro décadas. Regulariza”, sugere Amaral ao governo, lembrando que em boa parte das terras da Amazônia não há conflito. “Estamos falando dos casos simples. É por aí que se pode começar.” Segundo ele, 45% da Amazônia está em unidades de conservação e a regularização poderia atingir quilombolas, seringueiros e ribeirinhos.
As políticas públicas já existem, mas não atingem as populações da floresta. Faltam metas claras, orçamento e equipe. Na visão de Amaral, o CAR, Cadastro Ambiental Rural, que faz com que as pessoas na floresta digam onde estão e quanto tem de mata, é uma ferramenta fantástica “porque liga aquela área a um CPF”. Na Amazônia estima-se que já existam 800 mil CAR. “Se este documento é válido para o controle, também pode ser válido para os benefícios”, defende Amaral. “A floresta só vai ficar de pé se gerar benefícios para quem vive nela.”
Fonte – Valor Econômico