A estratégia de reduzir o tamanho de unidades de conservação e de terras indígenas – a fim de resolver problemas fundiários e abrir espaço para obras de infraestrutura – acaba funcionando como um gatilho para o desmatamento dessas áreas. Essa é a conclusão de um estudo conduzido pelo instituto Imazon, com sede em Belém, que mediu o impacto sobre dez dessas áreas protegidas.
Pelos cálculos da organização, já descontadas compensações em outras unidades, de 1995 até o ano passado o governo federal e os governos estaduais de Rondônia, Mato Grosso e Pará retiraram a proteção de 2,5 milhões de hectares em 40 áreas protegidas (conceito genérico que reúne unidades de conservação e terras indígenas) na Amazônia Legal.
Nas dez unidades estudadas, constatou-se um aumento de 50% no desmatamento depois da mudança na comparação com os cinco anos antes da redução da área. No período anterior, havia uma taxa média anual de 2% de desmatamento nessas áreas. Nos anos seguintes, as taxas saltaram para 3%.
Na comparação com as regiões que continuaram protegidas, o cenário é ainda mais complicado. Depois da desafetação, a taxa média de desmatamento nas áreas alteradas foi 1.116% maior do que nas áreas que continuaram protegidas.
O trabalho analisou sete unidades de conservação estaduais: Parque Estadual Xingu, Estação Ecológica (Esec) Rio Ronuro e Parque Estadual Araguaia (MT); Floresta Estadual de Rendimento Sustentado Rio Madeira, Esec Antônio Mugica Nava, Esec Serra dos Três Irmãos e Reserva Extrativista Jaci-Paraná (RO). E três áreas federais: Floresta Nacional Bom Futuro (RO) e Terras Indígenas Baú e Apyte rewa (PA).
De acordo com a pesquisadora Elis Araújo, que liderou o trabalho, era esperado que houvesse um aumento do desmatamento, mas não tanto assim. “Por mais que se retire o status de unidade de conservação ou de terra indígena, essas áreas ainda têm de respeitar o Código Florestal, manter Reserva Legal e Área de Preservação Permanente”, diz.
“O problema é que muitas daquelas terras não têm titulação, então ocorre uma corrida de especuladores para abrir novas áreas e dizer que é deles. Nossa crítica é que, se o governo vai retirar a proteção de uma área, tem de reforçar ali a fiscalização. No volume total, esses desmatamentos são pequenos, mas vão se somando ao total e podem aumentar a taxa geral, que o governo quer reduzir.”
Segundo os autores, além do dano direto, “a redução da área ou do grau de proteção das áreas protegidas enfraquece a credibilidade da política de conservação e de direitos sociais de populações indígenas e tradicionais”. Eles citam como exemplo recentes invasões que ocorrem nas Florestas Nacionais de Roraima e do Bom Futuro. De acordo com os pesquisadores, elas foram estimuladas pelas reduções ocorridas em 2009 e 2010.
Outro lado. Virgílio Ferraz, coordenador-geral de proteção do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, órgão responsável pelas unidades federais, afirmou que algumas reduções, como a da Bom Futuro, foram compensadas com o aumento de outras.
Nessa floresta, diz, o processo de ocupação já estava instalado a ponto de a proteção deixar de fazer sentido naquele local. Melhor resolver o problema ali e aumentar a conservação em outro ponto, pondera.
Segundo ele, porém, as medidas de desafetação (redução) de uma área que tinha uma ocupação têm de ser acompanhadas de assistência técnica para aumentar a produtividade e regularização fundiária. Ele reconhece que em alguns casos não foram feitas essas outras ações após a mudança. “É certo dizer que não houve o incremento de outras políticas para ordenar a área. Mas são problemas do governo federal e dos estaduais.”
Ferraz afirma ainda que o governo vem intensificando as ações de comando e controle nas unidades de conservação para consolidar áreas que já foram embargadas de modo a não permitir que se efetive o uso do solo.
Procuradas, as secretarias de ambiente dos Estados não enviaram respostas.
Fonte: Estadão, 27 de fevereiro de 2014.
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