Objetivo, área de estudo e produtos florestais-alvo. O levantamento de iniciativas de Manejo Florestal Comunitário e Familiar (MFCF) realizado em 2009 e 2010 pelo Imazon e IEB, com apoio da GIZ e do SFB, teve o objetivo de identificar e localizar iniciativas de MFCF que trabalham com madeira e com produtos florestais não madeireiros (PFNM) – açaí, andiroba, babaçu, buriti, castanha-do-brasil, copaíba e látex de seringueira – em seis estados da Amazônia brasileira – Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia. Este estudo ocorreu no contexto do Programa Federal de Manejo Florestal Comunitário e Familiar[1] (PMCF), instituído em 2009, no âmbito do MMA e MDA, e visa subsidiar as ações desse programa.
Levantamento de Dados. Os dados foram coletados junto a órgãos governamentais e não governamentais que lidam com MFCF e complementados por levantamentos pontuais de campo voltados a iniciativas com histórico de manejo florestal. Não foi feito um censo absoluto das iniciativas, de modo que os números obtidos não necessariamente contemplam a totalidade de iniciativas de MFCF existentes nos estados-alvo.
Iniciativas de MFCF madeireiro. Foram identificadas 902 iniciativas de MFCF que lidam com madeira, sendo 775 (86%) delas do tipo manejo florestal familiar ou de pequena escala (MFF) e apenas 127 (14%) de manejo florestal comunitário (MFC). Todas as iniciativas de MFF contabilizadas neste levantamento se situam no estado do Amazonas. Nos demais estados pesquisados não se obteve dados sobre essa ca-tegoria ou os dados disponíveis não permitiam filtrar as iniciativas de MFF dentre as iniciativas de manejo florestal de grande escala. Dessa forma, o Amazonas foi o estado com maior número de iniciativas de MFCF madeireiro identificadas (89,9% do total), seguido pelo Pará (5,3%), Acre (2,5%), Rondônia (1,8%) e Amapá (0,4%). Nenhum caso de MFCF madeireiro foi detectado no estado do Maranhão.
Iniciativas de MFCF de PFNM. Foram identificadas 325 iniciativas de MFCF que lidam com pelo menos uma das sete espécies florestais selecionadas de uso não madeireiro. Em geral, cada iniciativa identificada utiliza (ou utilizou nos últimos cinco anos) comercialmente várias espécies florestais nativas durante seus períodos de safra. Ou seja, quanto aos PFNM a regra geral na Amazônia brasileira é o uso/manejo de múltiplas espécies por cada comunidade ou unidade familiar (agro)extrativista.
Todas as iniciativas de manejo de PFNM identificadas neste levantamento foram genericamente tratadas como iniciativas de MFCF para evitar enquadrá-las artificialmente em uma ou outra modalidade de manejo florestal (MFC e MFF).
O estado com maior número de iniciativas identificadas foi o Pará, com 39% delas, seguido pelo Amazonas, com 27% dos casos, pelo Acre e Maranhão, empatados com 12% cada, e o restante distribuído entre Rondônia e Amapá, com 6% e 3%, respectivamente.
Dentre os sete PFNM-alvo, o açaí foi utilizado comercialmente por mais da metade (55%) das 325 iniciativas identificadas (179 casos). Em seguida, destacaram-se a castanha-do-brasil e o látex (da seringueira), utilizados por 44% (144 casos) e 43% (140 casos) das iniciativas, e o buriti e a copaíba, com 92 e 91 iniciativas usuárias (28% cada), respectivamente. Por fim, a andiroba e o babaçu foram os PFNM de uso mais restrito, utilizados por 25% e 17% das iniciativas de MFCF de PFNM levantadas, respectivamente.
Recomendações. Durante a realização deste estudo dois principais aspectos ficaram evidentes:
(i) não há uma fonte unificadora de dados sobre MFCF que possa gerar em tempo hábil estatísticas consistentes e atualizadas para subsídio de políticas públicas. Em geral, isso se deve ao fato de a economia florestal ainda ser predominantemente informal ou, quando há alguma formalização exigida por um marco regulatório, não há uma rotina ou estratégia institucional de sistematização e disponibilização dos dados oficiais ao público interessado; e
(ii) há considerável número de iniciativas de MFCF comercialmente inativas, mesmo já tendo recebido alguma forma de incentivo de instituições governamentais e/ou não governamentais. Esses casos sinalizam que políticas de fomento centradas em apenas algumas etapas da cadeia de produção florestal podem não produzir o efeito desejado de consolidar iniciativas sustentáveis de MFCF.
Diante dessas constatações, propôs-se a criação de um Cadastro Nacional de Iniciativas de MFCF, a ser alimentado em fluxo contínuo ou periodicamente por uma Rede Colaborativa de Instituições-chave. Esse Cadastro ficaria sob a gestão do Serviço Florestal Brasileiro (SFB) e os dados poderiam ser inseridos por instituições ou entidades com grande capilaridade geográfica, como secretarias municipais e/ou estaduais afins com o manejo florestal, empresas de assessoria técnica e extensão rural, sindicatos de trabalhadores rurais, instituições governamentais ou não governamentais de pesquisa etc., que seriam registradas como integrante da Rede Colaborativa. Para isso, sugere-se a criação de um ambiente on line que possa ser acessado remotamente pelos parceiros da Rede, para inserção e/ou atualização de dados seguindo critérios de entrada preestabelecidos pelo SFB. Assim, com maior celeridade e menor custo, um banco de dados sobre as iniciativas de MFCF seria continuamente atualizado.
Quanto à segunda observação, recomenda-se que na elaboração de políticas públicas incidentes sobre a cadeia de produção florestal e de caráter complementar entre si, haja um esforço para sincronização e/ou coordenação das diferentes modalidades de fomento ofertadas. O distanciamento ou o não recebimento integrado de incentivos – por exemplo, assessoria técnica e financiamento, ou capacitação para produção e acesso ao mercado, tempo de produção e licenciamento ambiental – tendem a desestruturar a iniciativa de MFCF, esvaziando o sentido de ações de fomento muito pontuais e temporalmente isoladas.
1 Decreto nº 6.874/2009, fruto de demanda da sociedade civil cujo processo de articulação e discussão iniciou em 1998 no Acre.
Nos últimos anos, o manejo florestal tem-se apresentado como uma alternativa promissora de renda para as comunidades rurais, ao mesmo tempo em que alia o uso eficiente das florestas e sua conservação e propicia o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida das populações.
Tal fato fez com que o MFCF fosse incorporado nas políticas públicas governamentais através do Decreto nº 6.874/2009, o Programa Federal de Manejo Florestal Comunitário e Familiar (PMCF), que preconiza a elaboração e publicação do Plano Anual de Manejo Florestal Comunitário e Familiar. Por outro lado, as informações hoje existentes no âmbito do setor florestal ainda não se encontram sistematizadas e acessíveis ao público em geral.
É neste contexto que se realizou o estudo “Iniciativas de Manejo Florestal Comunitário e Familiar na Amazônia Brasileira 2009/2010”, apresentado aqui. Tal estudo objetivou sistematizar as iniciativas voltadas à produção de madeira e à produção de produtos florestais não madeireiros (PFNM) de sete espécies: açaí, andiroba, babaçu, buriti, castanha-do-brasil, copaíba e seringueira (látex). O levantamento se deu em seis estados da Amazônia Legal: Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia.
A partir das informações obtidas e análise dos dados, foi possível definir ações prioritárias para inserção do Plano Anual de Manejo Florestal Comunitário e Familiar – 2011, em fase de construção. Adicionalmente, o estudo propõe a criação de um cadastro nacional de iniciativas de MFCF que permite atualização constante de dados sobre esse setor e que servirá de ferramenta visando ao planejamento de ações futuras.
Desse modo, certamente este estudo contribuirá com o Serviço Florestal Brasileiro na gestão, instrumentalização e na ampliação do fomento do manejo florestal sustentável de florestas utilizadas por agricultores familiares, assentados da reforma agrária, comunidades e povos tradicionais.
Antônio Carlos Hummel
Diretor Geral SFB – MMA
O Manejo Florestal Comunitário e Familiar (MFCF), ou seja, o uso planejado e/ou a gestão do uso de produtos florestais por comunidades ou famílias locais, tem sido apontado como uma atividade com potencial para integrar desenvolvimento local e conservação ambiental, partindo da premissa de que gere renda a partir da floresta em pé e fortaleça a gestão territorial e a governança florestal.
Nesse sentido, o governo tem direcionado esforços visando incentivar o MFCF na Amazônia brasileira. Entre as ações mais recentes destaca-se a criação do Programa Federal de Manejo Florestal Comunitário e Familiar (PMCF), em 2009, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). O objetivo do programa é organizar ações de gestão e de fomento ao manejo sustentável de florestas utilizadas por agricultores familiares, assentados da reforma agrária, comunidades e povos tradicionais (Decreto nº 6.874/2009).
Este e outros programas e políticas governamentais demandam dados atualizados sobre as iniciativas de MFCF existentes na Amazônia brasileira (número e localização). O histórico das últimas décadas mostra um grande crescimento no número de planos de manejo florestal comunitário/familiar madeireiro protocolados nos órgãos de controle e fiscalização ambiental, que de 218 na década de 1990 passaram para 1.108 no período de 2000 a 2006, beneficiando diretamente 5,5 mil famílias (Amaral Neto et al., 2008). Desse último período até os dias atuais nenhum novo dado dessa natureza foi consolidado. Em adição, as iniciativas de MFCF que lidam com produtos florestais não madeireiros (PFNM), em geral permanecem invisíveis às estatísticas oficiais, exceto pelo cadastro de 212 experiências agroecológicas em todo o Brasil – 37 destas oriundas da Amazônia –, realizado no âmbito da Articulação Nacional para Agroecologia (ANA, 2007).
Desse modo, visando suprir tais lacunas de dados atualizados, o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), em parceria com o Serviço Florestal Brasileiro (SFB), a Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) e o Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), realizou entre 2009 e 2010 um levantamento das iniciativas de MFCF que lidam com madeira e/ou com PFNM. A pesquisa foi conduzida nos estados do Amapá, Amazonas, Acre, Maranhão, Pará e Rondônia, por meio de visitas de campo, consultas a bancos de dados dos órgãos estaduais e federais de meio ambiente e entrevistas com atores-chave.
Um histórico do MFCF na Amazônia brasileira, assim como os procedimentos metodológicos utilizados neste levantamento, seus resultados e discussões (conclusões e recomendações) compõem as principais seções desta publicação.
Histórico do Manejo Florestal Comunitário e Familiar (MFCF) na Amazônia brasileira
As discussões formais sobre MFCF na Amazônia brasileira iniciaram em abril de 1998. Naquele ano, com apoio de Organizações Não Governamentais (ONG) ambientalistas, foi realizada em Plácido de Castro, Acre, a primeira oficina de manejo florestal comunitário da Amazônia. Este evento significou um marco no processo de manejo florestal praticado por comunidades reunindo, pela primeira vez, representantes dos projetos (técnicos e membros das comunidades) para discutirem problemas comuns que afetavam a implementação dos projetos. Além disso, estavam presentes representantes do governo, entre eles diretores do Departamento de Recursos Florestais do Ibama, o responsável pela elaboração e revisão de normas para o manejo florestal.
O principal desdobramento desse processo de articulação interinstitucional foi a edição, pelo Ibama, das Instruções Normativas (IN) 4, 5 e 6, em dezembro de 1998. Essas medidas promoveram inovação na legislação florestal permitindo que comunidades pudessem se reunir e realizar exploração florestal a partir de mecanismos específicos de manejo. Na prática, essas medidas flexibilizaram a legislação florestal, limitando área das unidades de manejo para exploração anual e permitindo que associações ou legítimos possuidores de glebas rurais passassem a submeter planos de manejo.
De um modo geral, essas discussões foram importantes para alavancar um processo de articulação interinstitucional[2] que influenciou na expansão das iniciativas de manejo florestal comunitário na Amazônia brasileira (Amaral Neto et al., 2008). Esse processo esteve centrado em planos de manejo madeireiro e influenciou fortemente nas formulações de políticas públicas.
Em relação a produtos não madeireiros, as discussões ocorreram no âmbito da Articulação Nacional para Agroecologia (ANA). Esse processo articulou organizações comunitárias da Amazônia em eventos regionais e nacionais. Os encontros regionais mobilizavam as organizações nos estados, enquanto que os encontros nacionais reuniam demandas para políticas públicas. Em 2006, por ocasião do II Encontro Nacional de Agroecologia, foram cadastradas 212 experiências agroecológicas em todo o país, sendo 37 destas oriundas da Amazônia, relacionadas a produção e melhoramento de sementes, plantas medicinais e sistemas agroflorestais e uso múltiplo da floresta (ANA, 2007).
De um modo geral, a articulação das organizações da sociedade civil que têm discutido o manejo comunitário madeireiro é composta, principalmente, por ONGs ambientalistas e associações comunitárias detentoras de planos de manejo. Já as discussões que envolvem o ma-nejo de produtos não madeireiros é constituída por organizações de base dos movimentos de luta pela reforma agrária e ONGs de promoção da agroecologia.
Embora tenham atuado simultaneamente, mas em campos de atuação diferenciados, essas ações de articulação das organizações da sociedade civil influenciaram no estabelecimento de um marco político institucional mais favorável para o MFCF, a partir de programas de fomento estruturados na esfera federal (principalmente no MMA e MDA) e nos governos estaduais (principalmente Acre, Amazonas e Pará).
2 O Grupo de Tratablho MFC (GT-MFC), composto por 22 organizações da Amazônia, constituiu-se no principal espaço de discussão e formulação de demandas para o MFC. Para saber mais sobre esse processo de articulação, consultar Amaral Neto (2006).
Políticas públicas para o MFCF na Amazônia brasileira
O início dos anos 2000 foi marcado por um forte processo de revisão de procedimentos para regulamentação da atividade de manejo florestal comunitário e familiar junto aos órgãos de controle e fiscalização ambiental. Não obstante esteja superado, este processo influenciou significativamente no número de planos de manejo protocolados nos órgãos ambientais. Além disso, a implementação de iniciativas pi-lotos no âmbito do ProManejo[3] possibilitou a experimentação de planos de manejo florestal em comunidades.
Paralelamente, com advento da regulamentação da Lei de Gestão de Florestas Públicas e com a consequente transferência da gestão florestal para os estados, iniciou-se um processo de reconfiguração do marco regulatório para manejo florestal empresarial e manejo florestal comunitário.
Na esfera federal, o governo criou, em 2009, o Programa Federal de Manejo Florestal Comunitário e Familiar[4] (PMCF). Liderado pelo MMA e MDA, o governo se propõe a organizar ações de gestão e fomento ao manejo em florestas que sejam utilizadas pelos agricultores familiares. O Programa contempla uma perspectiva ampla do desenvolvimento sustentável prevendo o uso múltiplo dos recursos naturais, incluindo bens e serviços da floresta.
As ações do PMCF são definidas no Plano Anual de Manejo Florestal Comunitário e Familiar. O Plano indica as atividades e prazos para implementação da Política Nacional de Manejo Florestal Comunitário e Familiar no ano em que vigorar. Para o ano de 2010, o foco do Programa foi a Amazônia, bioma de destaque na composição das florestas comunitárias brasileiras – além da influência da articulação da sociedade civil que influenciou a formulação do decreto – e teve, ainda, como critérios: (i) sobreposição dentre as áreas de atuação prioritárias de órgãos governamentais; (ii) concentração de famílias e agricultores com interesse em manejar florestas; e (iii) área de influência do Arco do Desmatamento.
Embora o PMCF englobe também ações de fortalecimento de cadeias de produção e comercialização de produtos florestais, o governo criou, em 2008, o Programa Nacional da Sociobiodiversidade. Este Programa é resultado da articulação de três ministérios: do Desenvolvimento Agrário, do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
O Plano foi criado com intuito de promover a conservação e o uso sustentável da biodiversidade e garantir alternativas de geração de renda para as comunidades rurais, por meio do acesso às políticas de crédito, assistência técnica e extensão rural, a mercados e aos instrumentos de comercialização e à política de garantia de preços mínimos.
Nesta primeira fase do Plano Nacional, todo o esforço tem sido traduzido no Plano Nacional de Promoção das Cadeias de Produtos da Sociobiodiversidade. As cadeias da castanha-dobrasil e do babaçu[5] foram priorizadas em virtude de sua relevância socioeconômica e ambiental, pois, juntas, beneficiam cerca de 500 mil famílias de extrativistas e quebradeiras de coco.
Além disso, o governo federal tem outras ações relevantes de promoção e fortalecimento das cadeias da sociobiodiversidade, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM). O PGPM permite o pagamento da Subvenção Direta ao Extrativista. Este Programa busca garantir a sustentação de preços de alguns produtos extrativistas como a castanha-do-brasil, amêndoa de babaçu, borracha natural, o fruto do açaí, do pequi, a cera da carnaúba e a fibra da piaçava. O PAA, por sua vez, possibilita a inclusão dos produtos da sociobiodiversidade na alimentação escolar. Sua modalidade Formação de Estoques Estratégicos da Agricultura Familiar (MDA) possibilita o acesso a mercados mais justos, tornando-se, assim, uma ferramenta importante para a agregação de renda para essas famílias extrativistas que vivem em áreas distantes dos grandes centros e deficientes em infraestrutura como é o caso da maioria dos produtores da região amazônica.
Na esfera estadual, os estados do Acre, Amazonas e Pará se destacam por suas investidas na adequação de uma regulamentação mais favorável para o MFCF, bem como no estabelecimento de programas estaduais de fomento à produção, processamento e comercialização de produtos florestais oriundos de comunidades rurais.
3 Programa de Apoio ao Manejo Florestal Sustentável na Amazônia Brasileira. Projeto implementado no âmbito do PPG-7, que foi determinante para levar a campo as experiências pilotos de manejo florestal comunitário.
4 Decreto nº 6.874/2009, fruto de demanda da sociedade civil cujo processo de articulação e discussão iniciou em 1998, no Acre.
5 Não obstante a prioridade dada pelo governo às cadeias produtivas desses dois produtos, o diagnóstico levantou informações para todos os demais produtos de relevância para o bioma Amazônia.
Objetivo e objeto de estudo
Este estudo tem como objetivo identificar e localizar iniciativas de MFCF na Amazônia brasileira. Nesse contexto, definiu-se iniciativa de MFCF como sendo aquela que cumulativamente atende às seguintes características:
• sua atividade de manejo florestal é executada ou gerida por pequenos produtores (agro)extrativistas ou povos tradicionais, por meio de boas práticas de manejo e em regime comunitário ou individual (familiar) de execução ou gestão[6]; e
• encontra-se atualmente em alguma das seguintes fases:
(i) preparação (capacitação, aquisição de materiais etc.) ou formalização (elabo-ração de plano de manejo, aguardando licenciamento etc.) para o manejo florestal;
(ii) em atividade de manejo e comercialização de produtos florestais (madeira e não madeireiros); ou
(iii) comercialmente inativo e sem atividade de manejo florestal, porém esteve em operação dentro dos últimos cinco anos (entre 2005 e 2009), apresentando um potencial latente para reativação uma vez que possui experiências (técnicas, organizativas etc.) e/ou infraestruturas (maquinários, benfeitorias etc.) acumuladas.
6 Esse critério tem como base o Decreto Federal nº 6.874/2009, que conceitua Manejo Florestal Comunitário e Familiar como “a execução de planos de manejo realizada pelos agricultores familiares, assentados da reforma agrária e pelos povos e comunidades tradicionais para obtenção de benefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando-se os mecanismos de sustentação do ecossistema”, podendo inclusive as atividades de manejo serem executadas por terceiros desde que o plano continue sob a responsabilidade dos produtores comunitários ou familiares (art. 2º).
Área de estudo
O levantamento das iniciativas de MFCF de espécies florestais de uso madeireiro e não madeireiro foi realizado em seis estados da Amazônia brasileira, sendo eles: Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia (Figura 1), onde se estima haver maior concentração dessas iniciativas. Em 2007, um levantamento realizado pelo IEB e Imazon identificou que 86% das iniciativas de manejo madeireiro comunitário e de pequena escala estavam localizadas nesses estados (IEB & Imazon, 2007).
Figura 1. Estados-alvo do levantamento das iniciativas de MFCF na Amazônia Legal em 2009/2010.
Em conjunto, esses seis estados amazônicos compreendem aproximadamente 70% da área da Amazônia Legal, 85% de sua população e em 2007 geraram 72% do Produto Inter-no Bruto (PIB) dessa região. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) desses estados varia entre 0,683 (Maranhão) e 0,780 (Amapá e Amazonas), não diferindo muito dos valores encontrados para a Região Norte (0,786) e para o Brasil (0,811).
Quanto à contribuição dos três principais segmentos econômicos ao valor do PIB estadual, esses estados têm em comum a maior participação do setor de serviços, variando entre 52,7% no Amazonas e 85,8% no Amapá, à semelhança do que ocorre em nível nacional (66,8%). O setor industrial é destacadamente o segundo maior componente do PIB nos estados do Amazonas (42,5%) e Pará (31%), enquanto que o setor agropecuário se destaca mais nos estados do Acre (17,2%), Maranhão (18,6) e Rondônia (20,3%) (Tabela 1).
Tabela 1. Dados geográficos e socioeconômicos dos estados-alvo do levantamento das iniciativas de MFCF na Amazônia Legal em 2009/2010.
Produtos florestais-alvo
O presente levantamento foi direcionado a iniciativas de MFCF que lidam com madeira nativa e com espécies florestais de uso não madeireiro. Neste último caso, a pesquisa focou especificamente as seguintes espécies: açaí, andiroba, babaçu, buriti, castanha-do-brasil, copaíba e seringueira (látex) (Figura 2).
Figura 2. Produtos e/ou espécies florestais de uso não madeireiro que foram alvo do levantamento das iniciativas de MFCF na Amazônia Legal em 2009/2010. 1-Açaí (cacho); 2-Copaibeira (tronco perfurado para extração do óleo-resina); 3-Andiroba (fruto aberto exibindo as sementes); 4-Babaçu (cacho imaturo); 5-Buriti (frutos); 6-Castanha-do-brasil (amêndoas com casca); e 7-Seringueira (durante extração do látex). Fotos: Imazon.
Segundo o IBGE/PEVS (2009), a produção extrativa vegetal do Brasil atingiu R$ 4,6 bilhões em 2009, dos quais 85% foram gerados pelo setor madeireiro e apenas 15% por produtos florestais não madeireiros (equiva-lente a R$ 685,4 milhões). Em conjunto, as sete espécies-alvo de uso não madeireiro responderam por 50,6% do total gerado por esse segmento produtivo florestal, com destacada participação do açaí (23,4%) e do babaçu (17,7%) (Tabela 2).
Tabela 2. Produção extrativa florestal de madeira e de PFNM do Brasil em 2009, destacando os PFNM-alvo deste estudo.
Coleta e sistematização de dados
O levantamento das iniciativas de MFCF nos seis estados amazônicos selecionados foi realizado por meio dos seguintes procedimentos:
• solicitação formal (via ofício) de dados aos órgãos oficiais do governo com atuação na área ambiental (Ibama, Oemas, Semmas etc.), visando acessar as iniciativas de MFCF que possuem plano de manejo florestal aprovado ou protocolado;
• consulta direta e/ou via ofício a instituições/organizações da sociedade civil com atuação na área da produção extrativista (cooperativas, associações etc.), da pesquisa socioambiental e/ou da assistência técnica. Foram contatadas as grandes redes e fontes que direta ou indiretamente lidam com pequenos produtores florestais, tais como:
(i) o Balcão de Serviços para Negócios Sustentáveis da ONG “Amigos da Terra”;
(ii) o Conselho Nacional das Populações Extrativistas (o antigo Conselho Na-cional dos Seringueiros – CNS);
(iii) Sindicatos dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR);
(iv) a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag);
(v) a Federação dos Trabalhadores da Agricultura (Fetagri);
(vi) a Pesquisa da Silvicultura e Extração Vegetal (PEVS) realizada anualmente pelo IBGE; e(vii) o levantamento das iniciativas de MFC e de Pequena Escala realizada pelo Imazon e IEB (2005) na Amazônia Legal;
• coleta direta de dados primários em campo, utilizada com função complementar, retificadora e/ou atualizadora de informações secundárias e estrategicamente direcionada às entidades/atores-chave identificados durante as consultas anteriores. No levantamento em campo utilizaram-se três instrumentos de coleta:
(i) Entrevista: realizada por meio da aplicação de um questionário padrão a todos os informantes-chave entrevistados, visando à obtenção de dados de identificação, localização, tamanho de área manejada, volume produzido, número de famílias executoras/gestoras do manejo, além de dados adicionais para melhor caracterização da iniciativa de MFCF;
(ii) Mapeamento participativo: para facilitar a identificação, localização e/ou caracterização das iniciativas de MFCF, durante a entrevista foi apresentado ao entrevistado um mapa previamente preparado, contendo as principais feições locais, como rios, estradas, cobertura florestal, uso do solo etc. Este mapa serviu de base para o informante indicar a localização de áreas de manejo e rememorar dados a elas associados (nome de comunidades, produtos florestais manejados etc.);
(iii) Visita técnica à área de manejo: este procedimento teve como principal objetivo o registro de coordenadas geográficas da área sob MFCF, realizado com um GPS de navegação.
O fluxograma abaixo resume os procedimentos adotados no levantamento das iniciativas de MFCF com plano de manejo protocolado (em geral, madeireiro) e sem plano protocolado (em geral, não madeireiros) (Figura 3).
Figura 3. Fluxograma dos procedimentos de levantamento de dados sobre as iniciativas de MFCF na Amazônia Legal em 2009/2010.
Os dados obtidos por diferentes meios e fontes de coleta foram confrontados e analisados caso a caso visando: (i) identificar as possibilidades de complementaridade; (ii) eliminar duplicidade de dados; (iii) detectar/corrigir inconsistências; e (iv) padronizar unidades de medida. As iniciativas de MFCF que lidam com PFNM foram classificadas segundo seu status atual de uso em:
• latentes ou com potencial: iniciativas comercialmente inativas no período da pesquisa, mas que estiveram em operação dentro dos últimos cinco anos (entre 2005 e 2009), apresentando um potencial latente para reativação face a experiências (técnicas, organizativas etc.) e/ou a infraestrutura (maquinários, benfeitorias etc.) remanescentes;
• comercialmente ativas: iniciativas que no período da pesquisa informaram ainda comercializar o(s) produto(s) florestal(is)-alvo, independentemente do volume comercializado;
• com plano de manejo protocolado: iniciativas que tinham plano de manejo florestal protocolado no órgão ambiental, independentemente de sua fase de tramitação; em geral, esses dados foram fornecidos pelo órgão ambiental e eram referentes ao setor madeireiro.
Considerando que os produtos florestais madeireiros e não madeireiros possuem diferentes marcos regulatórios para manejo, havendo os primeiros a exigência de licenciamento ambiental da atividade, o que não ocorre para os PFNMs na maioria dos estados e/ou para a maioria das espécies, adotou-se para esses dois grupos os seguintes critérios para entrada no mapa:
• madeira: os pontos representados nos mapas correspondem a todas as iniciativas de MFCF que pelo menos protocolaram um plano de manejo no órgão ambiental competente, uma vez que a legislação em vigor exige o licenciamento dessa atividade;
• PFNM: como, em geral, não há exigência legal de licenciamento para o manejo dos produtos florestais não madeireiros, considerou-se aqui todas as iniciativas enquadradas no conceito do “objeto de estudo”, independentemente de seu status de uso.
Quando foram detectadas inconsistências na coordenada geográfica obtida de fontes secundárias ou quando não foi possível obter coordenadas diretamente da área de manejo, para que a iniciativa de MFCF fosse representada no mapa, atribuiu-se a ela um ponto central (centroide) do município ou de alguma unidade especial onde ela se situa (p. ex.: TI, UC, PA etc.). Para minimizar sobreposições decorrentes da existência de mais de uma iniciativa de MFCF sem coordenada própria e situada em um mesmo município ou unidade especial de área, durante a elaboração dos mapas os pontos sobrepostos foram minimamente deslocados para poderem ser visualizados.
Notas de precaução
Ressalta-se que este levantamento de iniciativas de MFCF que lidam com madeira e com PFNM não consiste em um censo absoluto, mas sim numa busca direcionada aos órgãos governamentais e não governamentais que lidam com o tema e pesquisas pontuais de campo voltadas para iniciativas com histórico de MFCF. Dessa forma, os dados devem ser analisados com as seguintes precauções:
• os estados com mais regular e acessível sistema de registro de dados (oficial ou não oficial) referentes ao manejo florestal tendem a ser melhor representados em levantamentos dessa natureza;
• o número de iniciativas que lidam com PFNM tende a ser subestimado, pois, em geral, não há uma fonte de dados oficial que registre essas iniciativas e as fontes não oficiais têm registros geograficamente limitados, de modo que grande parte dessas iniciativas são “invisíveis” a esses levantamentos; e
• as fontes de informações (primárias ou secundárias) sobre os PFNM possuem formas distintas de sistematizar os dados, gerando diferentes “delimitações” de uma “iniciativa de MFCF”. Por exemplo, em algumas fontes, os dados são agregados em nível de cooperativa ou associação, ou seja, essas organizações consistem em uma “iniciativa de MFC”; em outras fontes, os dados são agregados em nível de comunidades (que compõem cooperativas ou associações), de modo que cada uma delas é considerada uma iniciativa distinta. Assim, a escala de cada iniciativa em termos de número de famílias, tamanho de área e volume manejados pode variar bastante entre as iniciativas mapeadas.
Foram identificadas 902 iniciativas de MFCF que lidam com madeira, sendo 775 (86%) delas do tipo manejo florestal familiar ou de pequena escala (MFF) e apenas 127 (14%) de manejo florestal comunitário (MFC). Todas as iniciativas de MFF contabilizadas neste levantamento se situam no estado do Amazonas. Nos demais estados pesquisados não se obteve dados sobre essa categoria ou os dados obtidos não foram suficientes para filtrar as iniciativas de MFF dentre as iniciativas de manejo florestal de grande escala (Tabela 3).
Dessa forma, o Amazonas foi o estado com maior número de iniciativas de MFCF madeireiro identificadas (89,9% do total), seguido pelo Pará (5,3%), Acre (2,5%), Rondônia (1,8%) e Amapá (0,4%). Nenhum caso de MFCF madeireiro foi detectado no estado do Maranhão (Tabela 3).
Tabela 3. Iniciativas de MFCF madeireiro com planos de manejo florestal protocolados no órgão ambiental identificadas no levantamento 2009/2010.
Em geral, as iniciativas de MFC madeireiro se concentram em alguns poucos municípios de cada estado, onde há/houve mais incentivos governamentais e/ou de entidades de apoio para essa modalidade de manejo. As iniciativas de MFF do Amazonas se encontram dispersas, em geral, seguindo os principais rios da bacia amazônica (Figura 4).
Figura 4. Iniciativas de MFCF madeireiro identificadas nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia em 2009/2010.
Levantamento 2007 e o atual (2009/2010)
Em 2007, o levantamento de iniciativas de MFCF madeireiro realizado pelo IEB e Imazon junto a fontes oficiais de dados (Sisprof/Ibama e SDS/AM) identificou 176 casos de MFC e 1.389 casos de MFF nos nove estados da Amazônia Legal, beneficiando 5.459 famí-lias e abrangendo uma área de 851.103 hectares (IEB & Imazon, 2007).
Entre o levantamento 2007 (dados 2006 e anos anteriores) e o atual houve uma aceleração no processo de descentralização da gestão ambiental[7], incluindo o licenciamento do manejo florestal, por meio de Convênios de Cooperação Técnica para a Gestão Ambiental Compartilhada entre Ibama e órgãos estaduais de meio ambiente (Tabela 4). Uma consequência imediata dessa fase de transição União-Estados foi a descentralização também da informação florestal oficial, antes reunida e sistematizada no Sistema Integrado de Monitoramento e Controle dos Recursos e Produtos Florestais (Sisprof).
Tabela 4. Órgãos estaduais licenciadores do manejo florestal e ano de início da gestão compartilhada entre Ibama e Oemas, por estado da Amazônia Legal.
Cada estado ao assumir a responsabilidade sobre o licenciamento dos planos de manejo florestal sob sua jurisdição se tornou o detentor imediato dos dados sobre os planos protocolados, adotando maneiras próprias de sistematizar e de disponibilizar os dados. Nesse contexto, o atual levantamento não conseguiu obter para todos os seus estados-alvo, em tempo hábil, dados oficiais dos planos de MFCF protocolados nos órgãos estaduais de meio ambiente, tampouco atingiu o mesmo nível de detalhamento (p.ex., número de iniciativas por modalidade de manejo) e de completude de dados (p. ex., número de famílias beneficiadas, tamanho da área atualmente sob MFCF) do levantamento 2007.
Apesar das diferenças entre os dois levantamentos limitarem comparações diretas sobre a evolução do número de iniciativas de MFCF em todos os estados cobertos pela recente pesquisa, há pelo menos quatro estados amazônicos com condições de coleta de dados referente à modalidade manejo florestal comunitário (MFC) mais semelhantes entre os dois períodos levantados, sendo eles: Acre, Amazonas, Pará e Rondônia. Em ambos os períodos, os dados desses estados sobre o número de planos de MFC protocolados foram obtidos de fontes oficiais do governo.
Comparando-se esses quatro estados, observa-se que do levantamento 2007 ao levantamento atual (2009/2010) houve uma redução de 13% no número de iniciativas de MFC com plano de manejo protocolado no órgão ambiental, passando de 142 para 123 casos no acumulado desses estados. Individualmente, o Acre foi o estado que apresentou maior redução; seu número de iniciativas de MFC diminuiu de 47 para 23 casos (–51%). Os três outros estados demonstraram menor oscilação: o Amazonas aumentou de 33 para 36 casos (+9%), o Pará aumentou de 44 para 48 (+9%) e Rondônia reduziu de 18 para 16 (–11%).
A redução do número de iniciativas de MFC no Acre pode ter sido influenciada pelo encerramento do ProManejo em 2007. Como as iniciativas apoiadas por esse projeto demandam um certo nível de investimento e de habilidades técnicas, as comunidades locais podem não ter conseguido dar continuidade ao MFC madeireiro nos moldes do ProManejo (Stone-Jovicich et al., 2007). Ademais, a identidade sociocultural natural das comunidades locais e a composição e/ou estrutura de suas florestas (com predominância de palmeiras e bambus), em geral mais propensas ao uso múltiplo da floresta, em especial de produtos florestais não madeireiros, também podem ter contribuído para o declínio do número de iniciativas de MFC focadas no recurso madeireiro (Veríssimo, 2005; IBGE, 2005).
Os estados do Pará e Rondônia (assim como o estado do Mato Grosso), por sua vez, apresentam um perfil de uso florestal com ênfase na madeira, historicamente ocupando as primeiras posições no ranking de maiores produtores de madeira nativa na Amazônia Legal (Lentini et al., 2003; Lentini et al., 2005; Pereira et al., 2010). Ao passo que o estado do Amazonas, embora não lidere em termos de volume de madeira nativa manejada, destaca-se notoriamente quanto ao número de planos de manejo de pequena escala ou familiar (MFF) protocolados no órgão ambiental do estado. Isso certamente se deve à política estadual de incentivo ao manejo florestal de pequena escala no âmbito do Programa Zona Franca Verde, com ações que vão desde a simplificação de normas para o MFCF até o direcionamento de uma agência de assessoria técnica do estado ao apoio direto à elaboração de planos de manejo florestal de pequena escala (Toni, 2006). Com esse enfoque, o estado do Amazonas elevou em 84% o número de iniciativas de MFF nos últimos três anos, passando de 422 planos de MFF protocolados em 2007 (IEB & Imazon, 2007) a 775 planos de MFF protocolados em 2009/2010 (presente levantamento). A grande maioria (80%) desses planos de MFF foi elaborada via órgão estadual de assessoria técnica – o Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas (Idam).
7 A gestão compartilhada dos recursos naturais pela União, Estados, Territórios, Municípios e Distrito Federal foi introduzida no marco regulatório ambiental do Brasil pela Lei nº 6.938/1981, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente. Esta Lei criou o Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama), formado por órgãos representativos de todos os referidos níveis de governo. Em 1988, a Constituição Federal do Brasil reforçou a competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios quanto à gestão dos recursos naturais (Art. 23, incisos VI e VII; Art. 24, incisos VI e VIII; Art. 225). Porém, apenas em 1997, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) estabeleceu as jurisdições de cada ente federativo para o licenciamento ambiental com base na área de abrangência da atividade e/ou de seu impacto (Resolução nº 237/1997; Art. 4º, 5º e 6º). Mas, foi principalmente após a edição da Lei de Gestão de Florestas Públicas em 2006 (Lei nº 11.284/2006), que explicitou as responsabilidades dos órgãos do Sisnama segundo suas jurisdições e a necessidade de estruturar formas de ação conjunta entre Ibama, Oemas e órgãos municipais (Art. 50), que o processo de descentralização ganhou maior celeridade entre os estados da Amazônia Legal.
Geografia e status das iniciativas de MFCF nos estados
Esta seção apresenta a distribuição geográfica das iniciativas de MFCF madeireiro por município de cada estado integrante da pesquisa. Dados adicionais, tais como tamanho de área com plano de manejo, número de famílias beneficiadas e/ou status do plano de manejo, também são apresentados conforme sua disponibilidade em cada estado.
ACRE
Características gerais
Situado no extremo oeste da Amazônia ocidental brasileira, na fronteira com Bolívia e Peru, o estado do Acre possui um território de aproximadamente 153 mil quilômetros quadrados e uma população de 691 mil habitantes, com densidade demográfica de 4,3 habitantes por quilômetro quadrado (IBGE, 2009). Dentre os seis estados-alvo deste estudo, o Acre apresenta o segundo menor IDH (0,751), superando apenas o Maranhão, e o terceiro maior PIB per capita (R$ 8.789,00), ficando a frente dos estados do Maranhão e do Pará (Pnud, 2008 IBGE, 2007, respectivamente).
Em 2009, o setor madeireiro do Acre gerou uma receita bruta de R$ 181,9 milhões, equivalente a 3,7% do total gerado pelos oito estados da Amazônia Legal com polos madei-reiros[8] (exceto Tocantins, pela falta de polo em 2009). As 24 indústrias madeireiras (incluindo microsserrarias) do Acre consumiram 422 mil metros cúbicos de madeira em tora nesse mesmo ano, o que corresponde a 3% do consumo anual da região (SFB & Imazon, 2010; Pereira et al., 2010). Esses valores de receita e de consumo de madeira nativa do Acre em 2009 foram superados apenas pelos estados do Pará, Mato Grosso e Rondônia, ou seja, o Acre assumiu a quarta posição regional de produção de madeira nativa, que antes era ocupada pelo estado do Amazonas (Lentini et al., 2003; Lentini et al., 2005).
Mais da metade da área do estado do Acre está destinada ao uso e ocupação por pequenos produtores rurais (individuais ou comunitários), povos tradicionais e indígenas, sob diferentes modalidades de gestão, tais como: projetos de assentamento (11,3%), terras indígenas (16%) e unidades de conservação de uso sustentável (23,5%). Há também unidades de conservação destinadas à proteção integral, que compreendem cerca de 10% do estado (Tabela 5).
Tabela 5. Unidades de conservação, terras indígenas e assentamentos situados no estado do Acre.
8 Polo madeireiro é um município ou microrregião que consome anualmente pelo menos 100 mil metros cúbicos de madeira em tora em processos industriais (Veríssimo et al., 2002).
Iniciativas de MFCF madeireiro
No Acre, foram identificadas 23 iniciativas de MFC com plano de manejo madeireiro protocolado na Secretaria Estadual de Florestas do Estado do Acre, equivalente a 3% do total levantado nos seis estados amazônicos amostrados (902 casos). Nenhum caso de MFF foi reportado pelo órgão ambiental e nem identificado em levantamento amostral de campo.
As 23 iniciativas de MFC estão distribuídas em 12 municípios acreanos – dentre os 22 existentes no estado –, abrangem uma área de manejo de cerca de 1.500 quilômetros quadrados (somatório da área total de cada plano de manejo) e envolvem pelo menos 765 famílias. O município com maior número de iniciativas de MFC madeireiro foi Xapuri, onde foram identificados cinco casos com plano de manejo protocolado (22%). Porém, Brasiléia foi o município que mais se destacou quanto ao tamanho de área com plano de manejo (31%) e ao número de famílias beneficiadas (39% do total). Quanto ao status dos planos protocolados, 65% deles estavam ativos, ou seja, já haviam sido licenciados pelo menos uma vez e estavam em fase de exploração, comercialização e/ou de elaboração ou análise de novo POA (Plano Operacional Anual) (Tabela 6; Figura 5).
Esses valores de tamanho de área coberta por plano de MFC e de número de famílias beneficiadas no estado do Acre, quando comparados com os dados do levantamento 2007, representam um aumento de 17% na área sob manejo, passando de 1.289 km² (MFC e Familiar) para 1.511 km² (somente MFC), e uma redução de 59% no número de famílias, passando de 1.846 para 765 (ambos MFC). Ou seja, como já se havia constatado anteriormente, houve uma redução no número de iniciativas de MFC no estado, porém as iniciativas existentes estão manejando áreas maiores do que as registradas no levantamento 2007 (IEB & Imazon, 2007).
Tabela 6. Área, número de famílias e status dos planos de MFC protocolados no órgão ambiental, por município do estado do Acre.
Figura 5. Iniciativas de MFC madeireiro identificadas no estado do Acre em 2009/2010.
AMAPÁ
Características gerais
Situado no extremo norte da Amazônia oriental brasileira, na fronteira com a Guiana Francesa, o estado do Amapá possui um território de aproximadamente 143 mil quilômetros quadrados e uma população de 627 mil habitantes, com densidade demográfica de 4,1 habitantes por quilômetro quadrado (IBGE, 2009). Dentre os seis estados-alvo deste estudo, o Amapá detém, junto com o Amazonas, o maior IDH (0,780) e possui o quarto maior PIB per capita (R$ 10.254,00), sendo superado apenas pelos estados de Rondônia e do Amazonas (Pnud, 2008 IBGE, 2007, respectivamente).
O setor madeireiro do Amapá é o menos expressivo em termos de receita gerada e de volume consumido de madeira nativa, historicamente apresentando os menores percentuais dentre os estados amazônicos (Lentini et al., 2003; Lentini et al., 2005; Pereira et al., 2010). Em 2009, o setor madeireiro do Amapá gerou uma receita bruta de R$ 32 milhões, equivalente a 0,6% do total gerado pelos oito estados da Amazônia Legal com polos madeireiros (exceto Tocantins, pela falta de polo em 2009). As 48 indústrias madeireiras (incluindo microsserrarias) do Amapá consumiram 94 mil metros cúbicos de madeira em tora nesse mesmo ano, o que corresponde a 0,7% do consumo anual da região (SFB & Imazon, 2010; Pereira et al., 2010).
Quase metade da área do estado do Amapá está destinada ao uso e ocupação por pequenos produtores rurais (individuais ou comunitários), povos tradicionais e indígenas, sob diferentes modalidades de gestão, tais como: projetos de assentamento (7,9%), terras indígenas (8,3%) e unidades de conservação de uso sustentável (28,7%). Há também unidades de conservação destinadas à proteção integral, que cobrem um terço da área do estado (Tabela 7).
Tabela 7. Unidades de conservação, terras indígenas e assentamentos situados no estado do Amapá.
Iniciativas de MFCF madeireiro
No Amapá, foram identificadas apenas quatro iniciativas de MFC por meio de levantamento amostral em campo e nenhuma iniciativa de MFF foi localizada. Não se obteve acesso aos dados oficiais sobre planos de manejo florestal potencialmente protocolados no órgão ambiental competente. Essas quatro iniciativas estão distribuídas em dois municípios amapaenses, dentre os 16 existentes no estado, sendo eles: Porto Grande, com três iniciativas identificadas, e Mazagão, com apenas uma. Em conjunto, essas iniciativas ocupam uma área de 20 quilômetros quadrados e beneficiam pelo menos 46 famílias (não há dados de número de famílias para uma das iniciativas) (Tabela 8; Figura 6).
No levantamento realizado em 2007 (IEB & Imazon, 2007), os dados oficiais informavam que havia no Amapá 34 planos de MFC madeireiro e oito planos de MFF protocolados no Ibama, abrangendo uma área de 170 quilômetros quadrados e beneficiando diretamente 74 famílias. Como o presente levantamento (2009-2010) não obteve os dados absolutos de fontes oficiais, seus valores não são adequadamente comparáveis com os obtidos no levantamento anterior.
Tabela 8. Iniciativas de MFC madeireiro identificadas no estado do Amapá no levantamento 2009/2010.
Figura 6. Iniciativas de MFC madeireiro identificadas no estado do Amapá em 2009/2010.
AMAZONAS
Características gerais
Situado na Amazônia ocidental brasileira, o Amazonas é o maior estado do Brasil em tamanho de área, aproximadamente 1,6 milhões de quilômetros quadrados, e o segundo menor em densidade populacional, com 2,1 habitantes por quilômetro quadrado, superando apenas o estado de Roraima com 1,8 habitantes por quilômetro quadrado. A população total do Amazonas é de aproximadamente 3,4 milhões de habitantes (IBGE, 2009). Dentre os seis estados-alvo deste estudo, o Amazonas compartilha com o Amapá o posto de maior IDH (0,780) e possui o maior PIB per capita (R$ 13.043,00) (Pnud, 2008 IBGE, 2007, respectivamente).
Em 2009, o setor madeireiro do Amazonas gerou uma receita bruta de R$ 115,2 milhões, equivalente a 2,3% do total gerado pelos oito estados da Amazônia Legal com polos madeireiros (exceto Tocantins, pela falta de polo em 2009). As 59 indústrias madeireiras (incluindo microsserrarias) do Amazonas consumiram 367 mil metros cúbicos de madeira em tora nesse mesmo ano, o que corresponde a 2,6% do consumo anual da região (SFB & Imazon, 2010; Pereira et al., 2010). Esses valores de receita e de consumo de madeira nativa do Amazonas em 2009 foram inferiores aos registrados em dois amplos levantamentos realizados em 1998 e 2004, de modo que o Amazonas foi superado pelo Acre, que assumiu a quarta posição regional de produção de madeira nativa, após os estados do Pará, Mato Grosso e Rondônia (Lentini et al., 2003; Lentini et al., 2005).
Quase metade (45%) do estado do Amazonas está destinado ao uso e ocupação por pequenos produtores rurais (individuais ou comunitários), povos tradicionais e indígenas, sob diferentes modalidades de gestão, tais como: projetos de assentamento (2,3%), terras indígenas (27%) e unidades de conservação de uso sustentável (15,7%). Há também unidades de conservação destinadas à proteção integral, que compreendem cerca de 7% do estado (Tabela 9).
Tabela 9. Unidades de conservação, terras indígenas e assentamentos situados no estado do Amazonas.
Iniciativas de MFCF
No Amazonas, foram identificadas 811 iniciativas de MFCF madeireiro com plano de manejo florestal protocolado no Instituto de Proteção Ambiental do Estado do Amazonas (Ipaam), equivalente a 90% do total levantado nos seis estados amazônicos amostrados (902 casos). A maioria desses planos protocolados (96%) é da modalidade MFF (ou pequena escala, como trata o Ipaam), os quais, em geral, são elaborados com apoio técnico do Idam (80%). Do total de 811 planos de manejo protocolados apenas 17,5% (142) estavam licenciados em 2010; os demais apresentavam pendências de várias naturezas. A quase totalidade dos planos licenciados eram da modalidade MFF/Idam (90,9%), o restante se dividia entre planos de MFF apresentados diretamente pelo produtor ao Ipaam (5,6%) e planos de MFC (3,5%) (Tabela 10).
No levantamento 2007, o perfil do Amazonas quanto à proporção de MFC e MFF era semelhante ao atual. Haviam 455 planos de MFCF, sendo que 422 (93%) eram da modalidade MFF. Em conjunto, esses planos de MFCF cobriam uma área de 2.179 quilômetros quadrados e beneficiavam diretamente 1.572 famílias (IEB & Imazon, 2007).
Do levantamento 2007 ao atual, observa-se também que o número de planos protocolados da modalidade MFC permaneceu quase que constante; passou de 33 para 36 casos (aumento de 9%), ao passo que os planos de MFF passaram de 422 para 775, ou seja, tiveram um aumento de 84% em 3-4 anos.
Tabela 10. Modalidade e status dos planos de MFCF identificados no estado do Amazonas em 2009/2010.
A distribuição geográfica das iniciativas de MFCF com plano de manejo florestal protocolados no Ipaam basicamente seguem o curso dos principais rios da bacia amazônica, principalmente do rio Amazonas. As 36 iniciativas de MFC, bem menos numerosas do que as de MFF, se dispersam por apenas oito municípios dentre os 62 existentes no estado, havendo maior concentração delas em três municípios vizinhos: Maraã (33% delas), Uarini (25%) e Alvarães (19%), situados próximos a porção central do estado. Considerando-se apenas as iniciativas licenciadas e sem pendências, os casos de MFC se restringem aos municípios de Maraã (60%) e Fonte Boa (40%) (Figura 7; Tabela 11).
As 775 iniciativas de MFF, por sua vez, estão distribuídas em 44 municípios do Amazonas. O município com maior concentração de casos é Atalaia do Norte, na fronteira com o Peru, com quase 10% das iniciativas com plano de manejo protocolado, seguido por Borba, próximo à fronteira com o Pará, com 7% dos casos. Considerando-se apenas as iniciativas de MFF licenciadas e sem pendências, a liderança é assumida por Boa Vista do Ramos, próximo à fronteira com o Pará, com 11% dos casos, seguido por dois municípios próximos, Borba e Itacoatiara, com 9% dos casos cada (Figura 7; Tabela 11).
Figura 7. Iniciativas de MFCF madeireiro identificadas no estado do Amazonas em 2009/2010.
Tabela 11. Iniciativas de MFC e MFF madeireiro identificadas no estado do Amazonas, por município e status da iniciativa, em 2009/2010.
MARANHÃO
Características gerais
Situado no extremo leste da Amazônia oriental brasileira, o estado do Maranhão possui um território de aproximadamente 332 mil quilômetros quadrados e uma população de 6,4 milhões de habitantes, sendo destacadamente o estado com maior densidade demográfica da Amazônia Legal; 18,4 habitantes por quilômetro quadrado (IBGE, 2009). Dentre os seis estados-alvo deste estudo, o Maranhão apresenta o menor IDH (0,683) e o menor PIB per capita (R$ 5.165,00) (Pnud, 2008 IBGE, 2007, respectivamente).
Em 2009, o setor madeireiro do Maranhão gerou uma receita bruta de R$ 59,1 milhões, equivalente a 1,2% do total gerado pelos oito estados da Amazônia Legal com polos madeireiros (exceto Tocantins, pela falta de polo em 2009). As 54 indústrias madeireiras (incluindo microsserrarias) do estado consumiram 254 mil metros cúbicos de madeira em tora nesse mesmo ano, o que corresponde a 1,8% do consumo anual da região. Esses valores de receita e de consumo de madeira nativa do Maranhão em 2009 superam apenas os registrados nos estados amazônicos do Amapá e Roraima (SFB & Imazon, 2010; Pereira et al., 2010). Dessa forma, o estado se manteve na mesma posição do ranking regional de produção de madeira de 2004 (6º lugar), exceto por ter consumido mais madeira nativa do que o Acre nesse referido ano (Lentini et al., 2005).
Aproximadamente 20% do estado do Maranhão estão destinados ao uso e ocupação por pequenos produtores rurais (individuais ou comunitários), povos tradicionais e indígenas, sob diferentes modalidades de gestão, tais como: projetos de assentamento (3,6%), terras indígenas (6,8%) e unidades de conservação de uso sustentável (9,3%). Há também unidades de conservação destinadas à proteção integral, que compreendem cerca de 4% do estado (Tabela 12).
Tabela 12. Unidades de conservação, terras indígenas e assentamentos situados no estado do Maranhão.
Iniciativas de MFCF madeireiro
Dados oficiais sobre planos de manejo florestal protocolados no órgão ambiental do Amapá não foram acessados e o levantamento amostral de campo 2009/2010 não detectou nenhum caso de MFCF madeireiro no estado, apenas iniciativas que lidam com PFNM, que serão reportadas em seção própria.
De fato, os dados oficiais acessados em 2007 já indicavam ocorrência inexpressiva de MFCF madeireiro no Maranhão, havendo apenas 22 planos de MFF e nenhum plano de MFC protocolados no Ibama. Esses planos beneficiavam diretamente 22 famílias e abrangiam uma área de 40 quilômetros quadrados, equivalentes a 1,4% e 0,5% dos totais identificados para a região em termos de famílias e área contempladas por MFCF, respectivamente. Com esses valores, o Maranhão superava apenas os estados de Tocantins e de Roraima dentre os estados da Amazônia Legal (IEB & Imazon, 2007).
PARÁ
Características gerais
Situado na Amazônia oriental brasileira, o Pará é o segundo maior estado do Brasil em tamanho de área, com aproximadamente 1,2 milhão de quilômetros quadrados, e é o estado da Amazônia Legal com maior população, cerca de 7,4 milhões de habitantes, resultando em uma densidade populacional de 5,7 habitantes por quilômetro quadrado (IBGE, 2009). Dentre os seis estados-alvo deste estudo, o Pará possui o segundo menor IDH (0,755) assim como o segundo menor PIB per capita (R$ 7.007,00); em ambos os casos supera apenas o estado do Maranhão (Pnud, 2008 IBGE, 2007, respectivamente).
Por outro lado, historicamente, o Pará é o maior produtor de madeira tropical da Amazônia Legal, tanto em termos de madeira nativa consumida por suas indústrias quanto em termos de receita gerada (Lentini et al., 2003; Lentini et al., 2005; Pereira et al., 2010). Em 2009, o setor madeireiro do Pará gerou uma receita bruta de R$ 2.177 milhões, equivalente a 44% do total gerado pelos oito estados da Amazônia Legal com polos madeireiros (exceto Tocantins, pela falta de polo em 2009). As 1.067 indústrias madeireiras (incluindo microsserrarias) do Pará consumiram 6.599 mil metros cúbicos de madeira em tora nesse mesmo ano, o que corresponde a 47% do consumo anual da região (SFB & Imazon, 2010; Pereira et al., 2010).
Mais da metade da área do estado do Pará está destinada ao uso e ocupação por pequenos produtores rurais (individuais ou comunitários), povos tradicionais e indígenas, sob diferentes modalidades de gestão, tais como: projetos de assentamento (8,4%), terras indígenas (22,6%) e unidades de conservação de uso sustentável (21,8%). Há também unidades de conservação destinadas à proteção integral, que compreendem 10% da área do estado (Tabela 13).
Tabela 13. Unidades de conservação, terras indígenas e assentamentos situados no estado do Pará.
Iniciativas de MFCF madeireiro
No Pará, foram identificadas 48 iniciativas de MFCF com plano de manejo madeireiro protocolado no órgão estadual de meio ambiente, equivalente a 5,3% do total levantado nos seis estados amazônicos amostrados (902 casos). Todas essas iniciativas são da modalidade MFC, pois os dados oficiais acessados não foram suficientes para separar consistentemente os casos de MFF (pequena escala) dos casos de manejo florestal de grande escala.
No levantamento 2007 (IEB & Imazon, 2007), o Pará foi o estado com maior número de iniciativas de MFF com plano de manejo florestal madeireiro protocolado no órgão ambiental; havia 422 planos que representavam 38% do total de casos de MFF dentre os estados da Amazônia Legal. Quanto ao número de inicia-tivas de MFC, em 2007 a liderança era do Acre (47 casos, 27% do total), seguido pelo Pará (44 casos, 25% do total). Porém, como de 2007 a 2009/2010 o número de iniciativas de MFC no Pará permaneceu quase que constante (passou de 44 para 48, ao passo que no Acre houve uma redução acentuada (passou de 47 para 23 casos), o Pará assumiu a liderança regional (entre os seis estados-alvo) quanto ao número de iniciativas com essa modalidade de manejo.
As 48 iniciativas de MFC identificadas em 2009/2010 no Pará estão distribuídas em 22 municípios dentre os 143 existentes no estado. O município com maior número de iniciativas foi Santarém, onde foram identificados dez casos com plano de manejo protocolado (20,8%), seguido pelo município de Placas, com seis casos (12,5%), e de Pacajá, com cinco casos (10,4%). Quanto ao status dos planos protocolados, 22 deles (46%) estavam ativos, os demais estavam “suspensos” ou “cancelados”. Considerando-se somente as iniciativas com planos de manejo ativos, o município de Santarém se manteve na liderança com 18,2% dos casos e, em segundo lugar, destacou-se o município de Anapu com 13,6% (Figura 8; Tabela 14).
Figura 8. Iniciativas de MFC madeireiro identificadas no estado do Pará em 2009.
Tabela 14. Iniciativas de MFC madeireiro identificadas no estado do Pará, por município e status da iniciativa, em 2009.
RONDÔNIA
Características gerais
Situado na Amazônia ocidental brasileira, na fronteira com a Bolívia, o estado de Rondônia possui um território de aproximadamente 237,6 mil quilômetros quadrados e uma população de 1,5 milhões de habitantes, com densidade demográfica de 6,1 habitantes por quilômetro quadrado (IBGE, 2009). Dentre os seis estados-alvo deste estudo, Rondônia apresenta o segundo maior IDH (0,751), ficando atrás apenas do Amapá e do Amazonas, que estão empatados na primeira posição (0,780) (Pnud, 2008. Esses dois estados também superam Rondônia quanto ao valor do PIB per capita, deixando-o na terceira posição (R$ 10.320,00) (IBGE, 2007).
Historicamente, Rondônia se mantém como o terceiro maior produtor de madeira tropical da Amazônia Legal, ficando atrás apenas dos estados do Pará e Mato Grosso, tanto em termos de madeira nativa consumida por suas indústrias quanto em termos de receita gerada (Lentini et al., 2003; Lentini et al., 2005; Pereira et al., 2010). Em 2009, o setor madeireiro de Rondônia gerou uma receita bruta de R$ 713,6 milhões, equivalente a 14% do total gerado pelos oito estados da Amazônia Legal com polos madeireiros (exceto Tocantins, pela falta de polo em 2009). As 346 indústrias madeireiras (incluindo microsserrarias) de Rondônia consumiram 2.220 mil metros cúbicos de madeira em tora nesse mesmo ano, o que corresponde a 16% do consumo anual da região (SFB & Imazon, 2010; Pereira et al., 2010).
Mais da metade da área do estado de Rondônia está destinada ao uso e ocupação por pequenos produtores rurais (individuais ou comunitários), povos tradicionais e indígenas, sob diferentes modalidades de gestão, tais como: projetos de assentamento (17,6%), terras indígenas (20,6%) e unidades de conservação de uso sustentável (17,5%). Há também unidades de conservação destinadas à proteção integral, que compreendem cerca de 12% da área do estado (Tabela 15).
Tabela 15. Unidades de conservação, terras indígenas e assentamentos situados no estado de Rondônia.
Iniciativas de MFCF
Em Rondônia, foram identificadas 16 iniciativas de MFCF com plano de manejo madeireiro protocolado no órgão estadual de meio ambiente, equivalente a 1,8% do total levantado nos seis estados amazônicos amostrados (902 casos). Todas essas iniciativas são da modalidade MFC, pois os dados oficiais acessados não foram suficientes para separar consistentemente os casos de MFF (pequena escala) dos casos de manejo florestal de grande escala.
No levantamento 2007 (IEB & Imazon, 2007), Rondônia possuía 171 iniciativas de MFF com plano de manejo florestal madeireiro protocolado no órgão ambiental, o equivalente a 12% do total de casos dessa modalidade na Amazônia Legal. Quanto ao número de iniciativas de MFC, em 2007, Rondônia possuía 18 iniciativas, o que representava 10% do total regional.
As 16 iniciativas de MFC identificadas em 2009/2010 em Rondônia estão distribuídas em apenas quatro municípios dentre os 52 existentes no estado. O município com maior número de iniciativas de MFC madeireiro é Machadinho D’Oeste, onde foram identifica-dos 11 casos com plano de manejo protocolado, equivalente a 69% dos casos. Quanto ao status dos planos protocolados, pelo menos 11 deles estavam ativos (69%), os demais estavam “suspensos” ou “cancelados”. Considerando-se somente as iniciativas com planos de manejo ativos, o município de Machadinho D’Oeste se destaca ainda mais na liderança, passando a responder por 73% dos casos (Figura 9; Tabela 16).
Figura 9. Iniciativas de MFC madeireiro identificadas no estado de Rondônia em 2009.
Tabela 16. Iniciativas de MFC madeireiro identificadas no estado de Rondônia, por município e status da iniciativa, em 2009.
Iniciativas de MFCF identificadas em 2009/2010
Foram identificadas 325 iniciativas de MFCF que lidam com pelo menos uma das sete espécies florestais de uso não madeireiro selecionadas. Em geral, cada iniciativa identificada utiliza (ou utilizou nos últimos cinco anos) comercialmente várias espécies florestais nativas durante seus períodos de safra. Ou seja, quanto aos PFNM a regra geral na Amazônia brasileira é o uso/manejo de múltiplas espécies por cada comunidade ou unidade familiar (agro)extrativista.
Todas as iniciativas de manejo de PFNM identificadas neste levantamento são referentes a comunidades ou aglomerados de produtores agroextrativistas integrantes de alguma organização informal ou formal relacionada à produção (comercialização, acesso à crédito etc.) ou ao acesso/uso da terra. Porém, na prática, as famílias mesmo quando pertencentes a uma associação ou cooperativa, em geral, transitam entre o perfil de MFC e o de MFF, conforme as oportunidades e necessidades imediatas. Isso se torna menos frequente nos estados e para as espécies não madeireiras para as quais há exigência de plano de manejo florestal e/ou a iniciativa já possua vínculos mais sólidos com o mercado. Assim, todas as iniciativas que lidam com PFNM identificadas neste levantamento serão genericamente tratadas como iniciativas de MFCF, para evitar enquadrá-las artificialmente em uma ou outra categoria de organização para o manejo florestal.
A distribuição geográfica das 325 iniciativas de MFCF de PFNM identificadas em 2009/2010, em geral ocorreu de forma concentrada em poucos municípios (como no Amapá Pará e Rondônia) e/ou mesorregião (como no Acre) de um estado. Apenas nos estados do Amazonas e do Maranhão as iniciativas se encontram mais dispersas (Figura 10). A distribuição geográfica desagregada por espécie florestal-alvo é apresentada nos Anexos 1 a 7.
O estado com maior número de iniciativas identificadas foi o Pará, com 39% delas, seguido pelo Amazonas, com 27% dos casos, pelo Acre e Maranhão, com 12% cada, e o restante distribuído entre Rondônia e Amapá, com 6% e 3%, respectivamente. Em decorrência do grande número de casos detectados no Pará e do histórico de uso de múltiplas espécies florestais por uma mesma iniciativa, esse estado concentrou o maior número de iniciativas de MFCF referentes a seis dentre as sete espécies florestais selecionadas, sendo superado apenas pelo Maranhão, que detém o maior número de iniciativas que lidam com o babaçu (Tabela 17).
Dentre as espécies florestais-alvo, o açaí foi o PFNM utilizado comercialmente por mais da metade (55%) das 325 iniciativas identificadas (179 casos). Em seguida, quase empatados, destacam-se a castanha-do-brasil e o látex (da seringueira), utilizados por 44% (144 casos) e 43% (140 casos) das iniciativas; e o buriti e a copaíba, com 92 e 91 iniciativas usuárias (28% cada), respectivamente. Por fim, a andiroba e o babaçu foram os PFNM de uso mais restrito, utilizados por 25% e 17% das iniciativas de MFCF de PFNM levantadas, respectivamente (Tabela 17).
Figura 10. Iniciativas de MFCF de PFNM (7 espécies-alvo agregadas) identificadas nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia em 2009/2010.
Tabela 17. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia em 2009/2010.
Geografia e status das iniciativas de MFCF nos estados
Esta seção apresenta a distribuição geográfica das iniciativas de MFCF de PFNM e seu status nos municípios dos estados-alvo deste levantamento. As iniciativas foram categorizadas quanto ao seu status em: “Ativa” e “Potencial”. O primeiro termo se refere aos casos em que o(s) PFNM-alvo estava(m) sendo manejado(s) e/ou comercializado(s) quando disponível(is). O segundo se aplica às iniciativas que estavam comercialmente inativas (há menos de cinco anos), mas possuíam um histórico de uso dos PFNM-alvo, havendo acúmulo local de experiências técnicas e/ou organizacionais, de benfeitorias e/ou insumos associados a manejo/comercialização de algum(ns) deles.
ACRE
No Acre, foram identificadas 39 iniciativas de MFCF que lidam com pelo menos uma das sete espécies florestais de uso não madeireiro estudadas, correspondendo a 12% do total de casos identificados nos seis estados amazônicos cobertos pela pesquisa. Essas iniciativas estão distribuídas em 14 municípios acreanos, dentre os 22 existentes, com maior concentração de casos nos municípios situados na porção leste do estado (Figura 11).
Figura 11. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Acre em 2009/2010.
A análise desagregada do número de iniciativas de MFCF por espécie florestal e por status (comercialmente ativa ou com potencial) revela que as iniciativas atualmente ativas no Acre estão trabalhando principalmente com o látex, a castanha-do-brasil e a copaíba, embora haja iniciativas com potencial latente para os sete PFNM-alvo, em especial para o açaí (Figura 12). O município com maior número de iniciativas ativas dessas três espécies florestais é Brasiléia, que também lidera em número de casos com potencial para o manejo do açaí. As demais iniciativas de MFCF estão distribuídas de forma relativamente equilibrada entre os demais municípios do estado (Tabela 18).
Figura 12. Status das iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Acre, por PFNM-alvo, em 2009/2010.
Tabela 18. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Acre, por município e status da iniciativa, em 2009/2010.
Segundo a Pesquisa do Extrativismo Vegetal e da Silvicultura (PEVS) realizada pelo IBGE (2009), o látex e a castanha-do-brasil também se destacaram quanto ao volume produzido pelo estado do Acre. Em 2009, o Acre foi o maior produtor de látex líquido do país, respondendo por 57% da produção da Amazônia Legal e do Brasil, e o segundo maior produtor de látex coagulado (sendo superado apenas pelo Amazonas), com 16% da produção regional e nacional. Quanto à castanha-do-brasil, o Acre contribuiu com mais de um quarto da produção regional e nacional (27,5%), sendo o segundo maior estado produtor após o Amazonas (IBGE/PEVS, 2009) (Tabela 19). Por outro lado, os dados da PEVS/IBGE referentes ao volume produzido em 2009 de buriti (fibra) e de copaíba (óleo) apontaram o estado do Acre como o grande produtor de fibra de buriti da Amazônia Legal e do Brasil, respondendo por 48% e 44%, respectivamente, e um produtor pouco expressivo de óleo de copaíba, participando com apenas 0,2% da produção regional e nacional (Tabela 19). Para essas duas espécies, os dados de número de iniciativas de MFCF da presente pesquisa evidenciaram uma relação oposta, isto é, o buriti figurou entre os PFNM menos utilizados e a copaíba como um dos utilizados por grande parte das iniciativas detectadas (Figura 12). Dois fatores em especial podem contribuir para essas diferentes tendências: primeiro, não há necessariamente uma relação diretamente proporcional entre número de iniciativas de MFCF e volume de produção florestal; e as iniciativas de MFCF não são necessariamente os principais agentes da cadeia de produção de todos os PFNM-alvo, mas apenas elas foram o alvo do presente levantamento.
Tabela 19. Produção extrativa florestal do Acre em 2009 referente aos PFNM-alvo do levantamento das iniciativas de MFCF 2009/2010.
AMAPÁ
No Amapá, foram identificadas 11 iniciativas de MFCF que lidam com pelo menos uma das sete espécies florestais de uso não madeireiro estudadas, correspondendo a 3% do total de casos identificados nos seis estados amazônicos cobertos pela pesquisa. Essas iniciativas estão distribuídas em três municípios amapaenses, dentre os 16 existentes, com maior concentração de casos no centro-sul do estado (Figura 13).
A análise desagregada do número de iniciativas de MFCF por espécie florestal e por status (comercialmente ativa ou com potencial) revela que as iniciativas atualmente ativas no Amapá lidam com quatro dos sete PFNM-alvo, sendo eles: o açaí, a andiroba, a castanha-do-brasil e/ou o látex. Quanto ao número de iniciativas com potencial para manejo, em geral ele supera o número das comercialmente ativas, exceto para os seguintes PFNM: babaçu – sem nenhuma iniciativa identificada no estado (nem ativa, nem potencial); castanha-do-brasil – todas as iniciativas identificadas estavam ativas; e açaí – com maior número de iniciativas ativas (Ver Figura 12).
O município com iniciativas ativas para a maioria dos PFNM-Alvo é Laranjal do Jari (açaí, andiroba castanha e látex), seguido por Mazagão (açaí e andiroba) e Porto Grande (apenas açaí). Quanto às iniciativas com potencial para manejo florestal, em geral os três municípios possuem de um a quatro casos para os mesmos PFNM (Tabela 20).
Segundo o IBGE/PEVS (2009), a produção extrativa florestal do Amapá é pouco expressiva, tanto no que se refere a produtos florestais madeireiros quanto aos não madeireiros alvo deste levantamento. O PFNM que mais se destaca é o látex líquido, respondendo por 42% da produção da Amazônia Legal e do Brasil, sendo o segundo maior produtor regional/nacional após o Acre. O açaí e a castanha-do-brasil representam, cada, apenas 1% do volume total produzido na região e no país. O babaçu, o buriti e a copaíba apresentam produção inferior a 500 quilos, e para a andiroba não há registro individualizado de dados (Tabela 21).
Figura 13. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Amapá em 2009/2010.
Figura 14. Status das iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Amapá, por PFNM-alvo, em 2009/2010.
Tabela 20. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Amapá, por município e status da iniciativa, em 2009/2010.
Tabela 21. Produção extrativa florestal do Amapá em 2009 referente aos PFNM-alvo do levantamento das iniciativas de MFCF 2009/2010.
AMAZONAS
No Amazonas, foram identificadas 88 iniciativas de MFCF que lidam com pelo menos uma das sete espécies florestais de uso não madeireiro estudadas, correspondendo a 27% do total de casos identificados nos seis estados amazônicos cobertos pela pesquisa. Essas iniciativas estão distribuídas em 37 municípios amazonenses, dentre os 62 existentes, estando a maioria dos casos situada em municípios que margeiam o rio Amazonas e/ou alguns de seus principais afluentes (Figura 15).
Todas as iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Amazonas estavam comercialmente ativas e todos os PFNM-alvo deste levantamento são utilizados por um número variável delas. Os PFNM utilizados pela maioria das iniciativas são o látex, a castanha-do-brasil, o açaí, a andiroba e a copaíba, havendo poucos casos que lidam com o babaçu e o buriti (Figura 16). O município com maior número de iniciativas por espécie PFNM-alvo é Tefé, com destaque para o açaí (10 casos) e para a castanha-do-brasil (12 casos). As demais iniciativas de MFCF estão distribuídas de forma relativamente equilibrada entre os demais municípios do estado, variando entre zero e cinco casos por PFNM (Tabela 22).
Segundo a Pesquisa do Extrativismo Vegetal e da Silvicultura (PEVS) realizada pelo IBGE (2009), a copaíba, o látex e a castanha-do-brasil também se destacaram quanto ao volume produzido pelo estado do Amazonas. Em 2009, o Amazonas foi o maior produtor de óleo de copaíba, com 89% da produção regional/nacional, assim como de látex coagulado (66% da produção) e de castanha-do-brasil (43% da produção). Não houve dados individualizados para a andiroba. Por outro lado, embora o açaí tenha figurado entre os PFNM utilizados por grande parte das iniciativas detectadas no presente levantamento (Figura 16), os dados da PEVS/IBGE referentes ao volume produzido em 2009 de açaí (fruto) mostram uma produção pouco expressiva do Amazonas, participando com apenas 1,4% da produção regional/nacional (Tabela 23). Dois fatores em especial podem contribuir para essas diferentes tendências: primeiro, não há necessariamente uma relação diretamente proporcional entre número de iniciativas de MFCF e volume de produção florestal; e as iniciativas de MFCF não são necessariamente os principais agentes da cadeia de produção de todos os PFNM-alvo, mas o presente levantamento foi focado apenas nelas.
Figura 15. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Amazonas em 2009/2010.
Figura 16. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Amazonas, por PFNM-alvo, em 2009/2010.
Tabela 22. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Amazonas, por município, em 2009/2010.
Tabela 23. Produção extrativa florestal do Amazonas em 2009 referente aos PFNM-alvo do levantamento das iniciativas de MFCF 2009/2010.
MARANHÃO
No Maranhão, foram identificadas 39 iniciativas de MFCF que lidam com pelo menos uma das sete espécies florestais de uso não madeireiro estudadas, correspondendo a 12% do total de casos identificados nos seis estados amazônicos cobertos pela pesquisa. Essas iniciativas estão distribuídas em 21 municípios maranhenses, dentre os 217 existentes no estado (Figura 17).
Todas as iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no Maranhão estavam comercialmente ativas. O babaçu foi destacadamente a espécie florestal utilizada pela maioria das iniciativas, seguido pelo buriti e açaí. Apenas uma iniciativa relatou o uso comercial do óleo de andiroba e nenhum caso foi identificado quanto à castanha-do-brasil, copaíba e látex (Figura 18).
As iniciativas de MFCF estão distribuídas de forma relativamente equilibrada entre os municípios onde houve detecção de casos, em geral, variando entre 0 e 3 iniciativas por município, exceto no município de Codó, onde foram detectados cinco casos com uso comercial do babaçu (Tabela 24).
O ranking dos PFNM utilizados pela maioria das iniciativas identificadas neste levantamento se assemelha aos dados de produção extrativa do IBGE. Segundo o IBGE/PEVS (2009, o estado do Maranhão é o maior produtor de babaçu do país, respondendo por 99% da produção regional e 94% da produção nacional. Ele também se destaca na produção de buriti, contribuindo com 18% e 16%, respectivamente; e de açaí, cuja produção equivale a cerca de 8% do volume regional e nacional (Tabela 25).
Figura 17. Iniciativas de MFCF de PFNMs identificadas no estado do Maranhão em 2009/2010.
Figura 18. Status das iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Maranhão, por PFNM-alvo, em 2009/2010.
Tabela 24. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Maranhão, por município, em 2009/2010.
Tabela 25. Produção extrativa florestal do Maranhão em 2009 referente aos PFNM-alvo do levantamento das iniciativas de MFCF 2009/2010.
PARÁ
No Pará, foram identificadas 127 iniciativas de MFCF que lidam com pelo menos uma das sete espécies florestais de uso não madeireiro estudadas, correspondendo a 39% do total de casos identificados nos seis estados amazônicos cobertos pela pesquisa. Essas iniciativas estão distribuídas em 17 municípios paraenses, dentre os 143 existentes no estado, a maioria das quais situada no médio Amazonas e no estuário desse rio, às proximidades da Ilha do Marajó (Figura 19).
A análise desagregada do número de iniciativas de MFCF por espécie florestal e por status (comercialmente ativa ou com potencial) revela que há no estado iniciativas ativas de MFCF para todos os PFNM-alvo, com destaque para o açaí, a andiroba e o buriti. Por outro lado, para quase todos os PFNM-alvo, exceto a andiroba, o número de iniciativas latentes (com potencial para manejo) é maior do que o das iniciativas que efetivamente comercializavam os produtos florestais no período deste levantamento (Figura 20). Isso se deve exclusivamente ao contexto identificado no município de Santarém, onde há grande concentração de iniciativas com histórico de MFCF com uso de múltiplos PFNM, porém comercialmente inativos em 2009. Considerando-se apenas as iniciativas ativas, então o município de Igarapé-Miri é o que lidera em número de iniciativas de MFCF, com destaque para o açaí e o buriti (Tabela 26).
Figura 19. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Pará em 2009/2010.
Figura 20. Status das iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Pará, por PFNM-alvo, em 2009/2010.
Tabela 26. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado do Pará, por município e status da iniciativa, em 2009/2010
O ranking dos PFNMs utilizados pela maioria das iniciativas identificadas neste levantamento se assemelha aos dados de produção extrativa do IBGE. Segundo o IBGE/PEVS (2009), o estado do Pará foi o maior produtor de açaí do país, respondendo por 88% e 87% da produção regional e nacional, respectivamente. O Pará também se destacou na produção do buriti (34% da produção regional e 31% da produção nacional) e da castanha-do-brasil (19% da produção regional/nacional). O IBGE/PEVS não apresentou dados isolados para a produção de andiroba (Tabela 27).
Tabela 27. Produção extrativa florestal do Pará em 2009 referente aos PFNM-alvo do levantamento das iniciativas de MFCF 2009/2010.
RONDÔNIA
Em Rondônia, foram identificadas 21 iniciativas de MFCF que lidam com pelo menos uma das sete espécies florestais de uso não madeireiro estudadas, correspondendo a 6% do total de casos identificados nos seis estados amazônicos cobertos pela pesquisa. Essas iniciativas estão distribuídas em cinco municípios rondonienses, dentre os 52 existentes no estado (Figura 21).
A análise desagregada do número de iniciativas de MFCF por espécie florestal e por status (comercialmente ativa ou com potencial) revela que há no estado iniciativas ativas de MFCF para quase todos os PFNM-alvo, exceto para a andiroba, com destaque para a castanha-do-brasil, a copaíba e o látex. Para todos os demais PFNM-alvo o número de iniciativas latentes (com potencial para manejo) foi maior do que o das iniciativas que efetivamente comercializavam os produtos florestais no período deste levantamento (Figura 22).
O município com maior número de iniciativas ativas que lidam com castanha-do-brasil, copaíba e látex foi Guajará-Mirim, o qual também lidera em número de casos com potencial para o manejo do açaí, do babaçu e do buriti. As demais iniciativas de MFCF estão distribuídas de forma relativamente equilibrada entre os demais municípios do estado onde estas foram identificadas (Tabela 28).
Segundo o IBGE/PEVS (2009), o estado de Rondônia possui uma produção extrativa florestal não madeireira pouco expressiva. Os produtos florestais nativos que mais se destacaram foram: o látex coagulado (10% da produção regional/nacional), a castanha-do-brasil (6% da produção regional/nacional) e a copaíba (2% da produção regional/nacional). Apesar da pequena produção e de não haver necessariamente uma proporcionalidade direta entre número de iniciativas de MFCF e quantidade produzida, observa-se que esses PFNM que se destacaram em volume de produção na PEVS/IBGE 2009 coincidem com os três PFNM utilizados pela maioria das iniciativas de MFCF identificadas no estado pelo presente levantamento (Tabela 29).
Figura 21. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado de Rondônia em 2009/2010.
Figura 22. Status das iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado de Rondônia, por PFNM-alvo, em 2009/2010.
Tabela 28. Iniciativas de MFCF de PFNM identificadas no estado de Rondônia, por município e status da iniciativa, em 2009/2010.
Tabela 29. Produção extrativa florestal de Rondônia em 2009 referente aos PFNM-alvo do levantamento das iniciativas de MFCF 2009/2010.
As iniciativas de manejo florestal praticadas por comunidades ou pequenos produtores individuais na Amazônia brasileira, em geral, enfrentam vários obstáculos para implementação de planos de manejo, tendo como consequência um grande número de planos protocolados (em especial, no caso do manejo madeireiro), porém inaptos ao licenciamento, e/ou comercialmente inativos, conforme observado neste estudo.
Os principais desafios à consolidação do MFCF recorrentemente identificados são: (i) a fragilidade de processos de licenciamento da atividade de manejo florestal em comunidades; (ii) a indefinição fundiária; (iii) a falta de assessoria técnica qualificada e adaptada à atividade; (iv) a dificuldade de acesso a crédito compatível; (v) a debilidade da organização social para as atividades florestais; e (vi) a limitação em acessar mercados (Amaral Neto et al., 2008). A superação desses obstáculos remete a um processo de fortalecimento das organizações comunitárias envolvidas na implementação de planos de manejo como estratégia de conservação e governança florestal.
O processo de licenciamento de planos de manejo florestal comunitário tem-se mostrado pouco eficiente na região. Por um lado, agricultores e suas organizações de representação ainda carecem de maior entendimento dos complexos arranjos técnicos, sociais e ambientais inerentes à implementação de planos de manejo em âmbito local. Por outro, os órgãos governamentais direta e indiretamente envolvidos com o manejo comunitário ainda mostram-se pouco capazes de atender a demanda cada vez maior de aprovação de planos de manejo oriundos de comunidades.
De modo geral, a descentralização da gestão dos recursos florestais – atribuindo a Oemas a responsabilidade de aprovação e fiscalização de planos de manejo – aumentou ainda mais a morosidade na aprovação de planos de manejo, especialmente em assentamentos onde a dinâmica é intensa. Entre os motivos identificados no diálogo com as organizações, tem-se: (i) a pouca capacidade institucional dos órgãos públicos (infraestrutura, pessoal, qualificação técnica para questões comunitárias etc.); (ii) o marco regulatório inadequado para o manejo florestal por comunidades; e (iii) a ausência de uma estrutura dentro dos estados, articulada por diferentes órgãos, que catalise as demandas de manejo por comunidades.
Como propostas para superar a morosidade no processo de autorizações para operacionalização de planos de manejo, identificou-se a necessidade de constituir estruturas específicas nos órgãos governamentais para centralizar demandas para o manejo florestal comunitário. Além disso, é necessário criar marcos regulatórios mais adequados às realidades dos planos de manejo, considerando exigências atuais de levantamento do potencial florestal (incorporando não madeireiros).
A indefinição fundiária tem sido apontada como um dos principais desafios para a governança ambiental na Amazônia e obstáculo crucial para aprovação de planos de manejo oriundos de comunidades. Além disso, dificulta a discussão sobre práticas de melhor gestão dos recursos florestais em nível local e, consequentemente, melhor gestão territorial. Ama-ral & Amaral Neto (2005), ao acompanhar a implementação de planos de manejo na região, identificaram como mecanismos interessantes e necessários para superar esses obstáculos: (i) instituição dos direitos consuetudinários; (ii) criação e consolidação de mosaicos de unidades de conservação; e (iii) consolidação da política de concessões florestais.
Alguns avanços têm sido obtidos em relação à questão fundiária. Recentemente, o governo resolveu estabelecer ações de apoio à regularização ambiental (p.ex. Programa Terra Legal) na Amazônia. Essas ações têm catalisado algumas alternativas interessantes para aprovação de planos de manejo florestal comunitário e familiar. O Governo do Estado do Amazonas, por exemplo, está discutindo uma Instrução Normativa que facilita a aprovação de planos de manejo em áreas de até quatro módulos rurais, aproveitando-se da Medida Provisória 458/2009[9]. Esta medida permitirá atender uma demanda considerável de lanos de manejo que se encontram com pendências de documentação fundiária e tem potencial para influenciar em outros estados.
A organização social representa outro desafio importante para viabilizar o manejo florestal comunitário na escala local. Constitui-se como fator-chave para assegurar o controle social sobre a exploração florestal em comunidades, principalmente em planos de manejo onde há formalização de acordos e/ou parcerias com atores externos. De um modo geral, observa-se fragilidade na organização local para acompanhamento e operacionalização de planos de manejo. Este aspecto tem influenciado no estabelecimento de boas práticas de manejo e impactado nos processos de comercialização.
Para o fortalecimento da organização social em prol do MFCF, torna-se necessário um conjunto de ações de capacitação, treinamento, formação etc. Algumas iniciativas como estas estão previstas no Programa Anual de Manejo Florestal Comunitário e Familiar. Porém, o alcance do Programa ainda é reduzido e torna-se necessário articular e fortalecer redes interinstitucionais de cooperação e informações para dinamizar o manejo comunitário. Além disso, é imprescindível internalizar o MFCF nas agendas de organizações-chave de representação e apoio dos grupos sociais envolvidos com o manejo florestal comunitário.
O financiamento para viabilizar as atividades de MFCF constitui outro fator determinante para sua consolidação. De modo geral, inexiste na comunidade alternativas para o estabelecimento de fluxo de caixa para operacionalização de planos de manejo.
A finalização do ProManejo em 2007 diminui as possibilidades de autonomia das organizações comunitárias para implementação de planos de manejo. Além disso, a ausência de linhas de créditos compatíveis e adaptadas à atividade tem limitado fortemente a expansão do MFCF. Como consequência, em algumas regiões (p.ex. oeste do Pará, Rondônia e Acre) tem crescido o estabelecimento de acordos formais entre empresas e comunidades para o manejo florestal. Com o quadro de fragilidade institucional, esses acordos precisam cada vez mais serem acompanhados com o intuito de estabelecer salvaguardas às comunidades e aumentar o controle social sobre o manejo.
Algumas iniciativas em curso preveem recursos para apoiar o MFCF[10]. No entanto, o acesso a esses recursos pelas comunidades ainda constitui um grande desafio a ser superado nas discussões a serem estabelecidas com a implementação das políticas públicas.
A disponibilização de uma assessoria técnica capacitada na área florestal, sobretudo no acompanhamento de planos de manejo florestal comunitário, é sem dúvida outro desafio estruturante para a região. A implementação do PPG-7 – que catalisou a emergência de uma gama variada de experiências com enfoque ambiental – sem dúvida alguma constitui-se em um marco na discussão dos desafios para a construção de um novo modelo de extensão florestal.
Algumas oportunidades e assessoria técnica para planos de manejo florestal estão em curso, articuladas por programas governamentais. Entre las, pode-se citar a Política Nacional de Ater, além do fortalecimento de órgãos de extensão em governos estaduais (sobretudo no Pará, Amazonas e Acre). No entanto, torna-se necessário atrelar essas iniciativas a programas de formação para técnicos de modo que possam compreender o manejo florestal comunitário, à luz dos complexos arranjos em que são implementados na região.
Finalmente, as dificuldades de acesso a mercados mais competitivos representam outro obstáculo à consolidação do MFCF. De modo geral, o MFCF tem o desafio de competir com a atividade ilegal, atender exigências de padronização na oferta dos produtos e de conhecer a morfologia da cadeia de comercialização dos produtos florestais oriundos das comunidades (Amaral & Amaral Neto, 2005). A baixa capacidade de interagir qualitativamente com o mercado tem impossibilitado o estabelecimento de estratégias de comercialização adaptadas e experimentadas pelas lideranças e organizações comunitárias envolvidas com o manejo florestal. Nos arranjos que envolvem terceiros (por exemplo, nos acordos formais empresas-comunidades) o fortalecimento das capacidades organizacionais das estruturas comunitárias criadas e/ou adaptadas para este fim é importantíssimo para favorecer o maior controle social sobre o manejo florestal comunitário.
Existem algumas experiências em curso de mercados solidários e institucionalizados, implementados tanto pela sociedade civil quanto por agências governamentais, que podem apontar para caminhos mais promissores e fomentar o mercado de produtos florestais oriundos de comunidades da Amazônia. O fortalecimento e disseminação destas iniciativas são ingredientes importantes a serem incorporados nos demais programas de fomento ao manejo florestal comunitário e familiar em curso na Amazônia brasileira. A tabela abaixo sintetiza os principais desafios e oportunidades à consolidação do MFCF (Tabela 30).
Em resumo, o MFCF é um processo social em curso na Amazônia brasileira. Nos últimos dez anos, as iniciativas de manejo praticadas por comunidades apresentaram crescimento exponencial e foram incorporadas em programas oficiais. O Programa Federal de Manejo Florestal Comunitário e Familiar e o Programa Nacional da Sociobiodiversidade constituem um marco para fomento à produção e comer-cialização de produtos florestais oriundos de comunidades rurais.
Os impactos dessas ações de fomento ainda estão sendo assimilados pelas lideranças e organizações comunitárias pelo fato de: (i) a implementação desses programas ainda encontrarem-se em estágio inicial; (ii) os diferentes estágios apresentados pelo processo de descentralização da gestão florestal na região e sua consequente dificuldade em adaptar um marco político-institucional mais apropriado à complexidade do manejo florestal comunitário; e (iii) falta de maior articulação entre os órgãos na definição e implementação das ações de fomento ao MFCF.
De modo geral, é possível considerar que houve avanços importantes na estruturação de ações de coleta, manejo, beneficiamento e comercialização de produtos florestais por famílias e organizações comunitárias na Amazônia brasileira. Porém, torna-se necessário a superação dos obstáculos estruturantes para consolidação do MFCF na região. A consolidação deste processo tem a dupla finalidade de melhorar as condições de vida das populações rurais que habitam áreas florestadas na Amazônia e contribuir para conservação florestal, ao mesmo tempo em que promove a governança ambiental. Portanto, as lideranças e organizações comunitárias envolvidas com o manejo florestal são aliados estratégicos do governo para conservação ambiental.
Tabela 30. Entraves e oportunidades para consolidação do MFCF na Amazônia brasileira.
9 Esta Medida Provisória dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União, no âmbito da Amazônia Legal, mediante alienação e concessão de direito real de uso de imóveis. Essa medida foi convertida na Lei nº11.952/2009.
10 Tanto o Programa Federal de Manejo Florestal Comunitário e Familiar, quanto à IN do MDA nº 65/2010 que regulamenta o manejo florestal em assentamentos, preveem recursos para o MFCF de diversos programas governamentais, principalmente dos Fundos Amazônia, Nacional do Meio Ambiente e Nacional de Desenvolvimento Florestal.
Neste primeiro levantamento de iniciativas de MFCF em grande escala geográfica (seis estados da Amazônia brasileira) e focado em múltiplos produtos florestais (madeira e sete PFNM) ficaram evidentes dois principais aspectos:
(i) não há uma fonte unificadora de dados sobre o setor de manejo florestal que possa gerar estatísticas consistentes e atualizadas para subsídio de políticas públicas. Em geral isso se deve ao fato de a economia florestal ainda ser predominantemente informal ou, quando há alguma formalização exigida por um marco regulatório, não há uma rotina ou estratégia institucional de sistematização e disponibilização dos dados oficiais ao público interessado; e
(ii) há considerável número de iniciativas de MFCF comercialmente inativas, mesmo já tendo recebido alguma forma de incentivo de instituições governamentais e/ou não governamentais. Estes casos sinalizam que políticas de fomento centradas em apenas algumas etapas da cadeia de produção florestal podem não produzir o efeito desejado de consolidar iniciativas sustentáveis de MFCF.
Essas duas constatações apontam a necessidade de criação de um banco de dados florestais unificado e de alimentação contínua ou periódica (no máximo, anual), que permita um diagnóstico rápido de potencialidades, demandas e tendências do setor florestal madeireiro e não madeireiro; e a necessidade de um maior alinhamento ou coordenação das ações que direta ou indiretamente fomentam as cadeias de produção florestal, para minimizar a probabilidade de falência de ações pontuais e temporalmente isoladas.
Criação de um cadastro nacional de iniciativas de MFCF
Considerando a necessidade de reduzir a invisibilidade do MFCF face à recente criação do Programa Federal de Manejo Florestal Comunitário e Familiar (Decreto nº 6.874/2009), que tem o objetivo de organizar ações de gestão e de fomento ao manejo florestal sustentável realizado por pequenos produtores e que, portanto, precisa de acurados subsídios técnicos, propõe-se a criação de um Cadastro Nacional de Iniciativas de MFCF, que deve ser constante ou periodicamente alimentado por uma Rede Colaborativa de Instituições-chave.
Esse Cadastro Nacional ficaria sob a gestão do Serviço Florestal Brasileiro (SFB) e os dados poderiam ser inseridos por instituições ou entidades com grande capilaridade geográfica, como secretarias municipais e/ou estaduais afins com o manejo florestal, empresas de assessoria técnica e extensão rural, sindicatos de trabalhadores rurais, instituições governamentais ou não governamentais de pesquisa etc., que seriam registradas como integrante da Rede Colaborativa. Para isso, o ideal seria a criação de um ambiente on line que pudesse ser acessado remotamente pelos parceiros da Rede, de modo que os dados poderiam ter um fluxo contínuo de atualização a um baixo custo.
O SFB poderia estabelecer critérios para inserção de uma iniciativa de MFCF no Cadastro Nacional com base, por exemplo, no volume produzido, tamanho de área manejada e número de famílias manejadoras (beneficiárias). O acesso aos dados poderia ser on line e aberto ao público em geral. Além disso, o governo poderia divulgar Boletins Anuais sobre o status do MFCF no país, aumentando a visibilidade e a transparência desse setor produtivo.
A Figura 23 resume a ideia geral desse Cadastro Nacional para viabilizar a contínua atualização e complementação dos dados referentes ao MFCF do Brasil.
Figura 23. Esboço da proposta de criação de um Cadastro Nacional de Iniciativas de MFCF do Brasil.
Alinhamento de ações de fomento às iniciativas de MFCF
Na maioria dos estados estudados observou-se a ocorrência de iniciativas de MFCF inativas, desmobilizadas, muitas das quais já receberam algum tipo de apoio governamental e/ou não governamental, mas não conseguiram se manter ativas comercialmente.
Em geral, essas iniciativas não receberam em tempo hábil o conjunto de incentivos necessários e complementares para superarem os desafios apontados na seção anterior e se consolidarem no mercado de produtos florestais. Por exemplo, algumas delas possuíam maquinários parados por falta de orientação técnica para operação, instalação e/ou manutenção. Outras receberam treinamentos e/ou assessoria técnica relacionados aos processos de manejo e produção, mas não conseguiram acesso regular ao mercado. Desse modo, incentivos unilaterais tendem a impulsionar apenas algumas etapas da cadeia de produção florestal, podendo não ser suficientes para viabilizá-la como um todo.
Além dos desafios mais diretamente relacionados à formalização do manejo florestal, há também nas comunidades amazônicas grande carência de infraestrutura básica que também impacta a cadeia produtiva florestal. Em 2008/2009, um estudo realizado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e o Imazon, abrangendo 20 comunidades agroextrativistas residentes em oito estado da Amazônia Legal, identificou que a falta de meios para escoamento da produção (estradas trafegáveis e/ou veículos de carga) foi o principal gargalo apontado pelas comunidades para o estabelecimento e manutenção de uma cadeia produtiva florestal focada em PFNM (Pinto et al., 2009).
Isso sinaliza que o alinhamento ou coordenação ideal de ações de fomento ao MFCF necessita ocorrer tanto de forma vertical, ou seja, entre as diferentes esferas de governo (Federal, Estadual e Municipal), quanto de forma horizontal, integrando ações de diferentes setores de uma mesma esfera (Secretarias de Meio Ambiente, de Planejamento, de Infraestrutura etc.), de modo a tornar o MFCF de madeira e/ou de PFNM uma alternativa socioeconômica e ambiental efetivamente sustentável na Amazônia brasileira.
Anexo 1. Iniciativas de MFCF do açaí identificadas nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia em 2009/2010.
Anexo 2. Iniciativas de MFCF de andiroba identificadas nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia em 2009/2010.
Anexo 3. Iniciativas de MFCF de babaçu identificadas nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia em 2009/2010.
Anexo 4. Iniciativas de MFCF de buriti identificadas nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia em 2009/2010.
Anexo 5. Iniciativas de MFCF de castanha-do-brasil identificadas nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia em 2009/2010.
Anexo 6. Iniciativas de MFCF de copaíba identificadas nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia em 2009/2010.
Anexo 7. Iniciativas de MFCF de látex (seringueira) identificadas nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Pará e Rondônia em 2009/2010.
This post was published on 5 de março de 2013
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