Brito, B. e Gomes, P. 2021. Nota Técnica sobre a redução de preços de terra na regularização fundiária em áreas estaduais no Pará. Belém: Imazon.
Resumo
A incerteza sobre direito de propriedade abrange 27% do território do estado do Pará. Desse total, a maior parte (57%) corresponde a áreas da União e outros 43% são áreas do estado. Tais áreas sem definição fundiária têm sido alvo de ocupações e desmatamento ilegais para fins especulativos, visando apropriação privada, um processo conhecido como grilagem de terras. Parte do incentivo à ocupação ilegal dessas áreas são os baixos valores de venda cobrados para sua regularização fundiária, o que gera ao invasor a expectativa de obter alto lucro com a venda posterior da terra.
Em junho de 2021, o governo do Pará publicou o Decreto Estadual n.o 1.684/2021 reduzindo o valor cobrado pela venda de terras públicas estaduais na regularização de imóveis acima de 100 hectares. Estimamos que a nova regra implicará em um subsídio estadual de R$ 6,7 bilhões a serem alocados na venda de terra pública em 5.450 imóveis selecionados no Cadastro Ambiental Rural (CAR) para este estudo, ou média de R$ 1,2 milhão por imóvel. Tal subsídio corresponde à diferença entre o preço médio de mercado e aquele cobrado pelo governo estadual para venda desses imóveis. Além disso, os novos valores representam apenas 1,2% do valor médio cobrado no mercado de terras no Pará.
Comparado à regra estadual anterior, o decreto implicará em uma diminuição média de R$ 247 milhões no preço de 1,8 milhão de hectares, área total dos imóveis analisados. Os valores também ficaram abaixo do cobrado pelo Incra na regularização em terras federais, correspondendo a 31% do preço praticado pelo governo federal.
Menos de 0,05% desse subsídio é condicionado ao desempenho ambiental nos imóveis no momento da titulação. Esse cálculo considera um desconto adicional de 20% no valor da terra a imóveis com 80% de reserva legal conservada. Caso os imóveis titulados sejam desmatados ilegalmente no período de 5 a 10 anos da titulação, o governo poderá retomar o imóvel. Porém, ainda deve pagar indenização por benfeitorias feitas no imóvel. Se o desmatamento ocorrer após o período estipulado (5 ou 10 anos), não há possibilidade de perda do imóvel. Além disso, nem todos os imóveis com desmatamento ilegal no ato da titulação precisam assinar compromissos de regularização ambiental, o que pode dificultar o monitoramento e cobrança do cumprimento da lei ambiental.
Considerando que os baixos preços neste decreto reforçam incentivos perversos à ocupação ilegal e especulação de terras públicas, sugerimos que esse tipo de subsídio seja eliminado. Por isso, recomendamos que o governo estadual cobre o valor de mercado para venda de terras públicas e use o recurso arrecadado para programas que estimulem a produção sustentável nos imóveis rurais no estado. Esta seria uma forma de alinhar a política de regularização fundiária com os objetivos de redução de desmatamento e de emissões de gases do efeito estufa previstos no Plano Estadual Amazônia Agora.
Recomendamos também mudar a legislação de terras para eliminar a obrigação de pagar indenização por benfeitorias nos casos em que o governo retome o imóvel titulado por descumprimento de cláusula ambiental. Finalmente, sugerimos a exigência de que todos os imóveis com desmatamentos ilegais efetuem adesão à regularização ambiental antes de receber o título de terra. Tal medida facilitará o monitoramento pelo órgão ambiental.