A Amazônia Legal conta com 143,6 milhões de hectares sem informação de destinação. Sem destino claro, essas áreas sofrem ainda mais pressão de invasões, grilagem, desmatamento e degradação ambiental. O novo estudo do projeto Amazônia 2030 mostra que as leis atuais já seriam suficientes para destinar as florestas públicas de forma alinhada com uso sustentável e conservação.

Coordenado por Brenda Brito e Pedro Gomes, pesquisadores do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), o trabalho analisa como a implantação de uma política de ordenamento territorial na Amazônia pode auxiliar no combate ao desmatamento e melhorar a utilização da terra.

Conforme o estudo, aproximadamente 17 milhões de hectares das florestas federais não destinadas, inseridas no Cadastro Nacional de Florestas Públicas (CNFP) até 2020, já estão sob o risco de privatização. Esta área corresponde à soma de três dados sobrepostos: área de imóveis georreferenciados para titulação pelo Incra; áreas destinadas à regularização fundiária pela Câmara Técnica de Destinação de Terras Federais; e imóveis inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR).

A análise também estima que, pelo menos, 4,7 milhões de hectares de florestas estaduais não destinadas no CNFP se encontram em risco iminente. Esta é a área de imóveis inscritos no CAR sobrepostos a florestas estaduais.

Segundo a análise, as leis atuais já possuem o arcabouço legal para mitigar a questão, contudo é necessário ajustar procedimentos previstos em decreto, aumentar a transparência das ações de regularização fundiária e promover maior coordenação das ações dos diferentes entes federativos.

Como evidenciado nos relatórios já publicados no AMZ 2030, que trataram dos desafios da regularização fundiária na região, tentativas atuais de alterar a legislação a fim de facilitar a regularização de áreas recém desmatadas tendem a contribuir com mais desmatamento.

Por isso, o primeiro passo para uma política de ordenamento territorial na Amazônia é alinhar os procedimentos de destinação de terras públicas de acordo com a ordem de prioridades identificada a partir da interpretação da Constituição e legislação nacional. Reconhecendo assim: terras indígenas; territórios quilombolas; comunidades tradicionais; áreas para conservação ambiental; e acesso à terra para a agricultura familiar; titulação de médias e grandes ocupações privadas.

A aplicação dessa ordem de prioridade de destinação de terras públicas requer medidas governamentais imediatas para impedir que florestas públicas sejam privatizadas. As recomendações estão divididas em quatro categorias:

  1. Florestas públicas cadastradas: há 57,9 milhões de hectares de florestas públicas não destinadas inseridas no CNFP. As opções de destinação destas áreas devem abranger apenas aquelas previstas na Lei de Gestão de Florestas Públicas: territórios indígenas, territórios quilombolas, de comunidades tradicionais, UCs e concessão florestal. Os governos responsáveis devem criar Áreas de Limitações Administrativas Provisórias (ALAP) como forma de concentrar um esforço em curto prazo para sua destinação. A ALAP suspende por sete meses atividades e empreendimentos que possam causar danos ambientais em regiões de interesse para estabelecer novas unidades de conservação.
  2. Florestas públicas não cadastradas e Áreas de Proteção Ambiental com florestas ainda não destinadas: 29,2 milhões de hectares seriam possivelmente florestas públicas não destinadas, que não estão identificadas no CNFP. Outros 7,2 milhões de hectares são de florestas em APAs6 que também não tiveram destinação e podem ser alvo de regularização fundiária. Apesar de aparecerem no CNFP como áreas destinadas, as APAs podem ser objeto de emissão de título de terra, se cumpridos os requisitos legais.
  3. Ocupações recentes em terra pública: os governos devem indeferir pedidos de regularização de ocupações recentes e adotar procedimentos de retomada e redirecionamento dessas áreas para outras finalidades. Do contrário, haverá estímulo para que mais áreas públicas sejam ocupadas ilegalmente visando a sua titulação futura.
  4. Ocupações antigas em terra pública: a legislação atual permite a emissão de títulos de terra a ocupações antigas (até 2011 em terras federais), que atendem requisitos legais e que não estejam sobrepostas a demandas prioritárias de reconhecimento territorial. Porém, para avançar com a regularização fundiária nessas áreas de forma compatível com salvaguardas socioambientais, é necessário uma série de medidas como reforçar a capacidade operacional dos órgãos de terra criar mecanismos de monitoramento e transparência, retomar o controle áreas com pedidos indeferidos de regularização fundiária e vedar a possibilidade de titulação de áreas com mais de 80% de cobertura florestal. A definição do que seria uma ocupação antiga e recente depende do marco temporal para regularização fundiária. Atualmente, a lei federal considera dezembro de 2011 como data limite. Mas as leis estaduais possuem marcos temporais ainda mais flexíveis ou sem data limite. Por isso, é crucial que todos os estados adotem uma data limite para o início dessas ocupações que podem ser regularizadas. Também é necessário criar mecanismos jurídicos que impeçam alterações posteriores nessas datas.

Leia o estudo completo aqui


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