Projetos no Congresso ameaçam 20 unidades de conservação federais

01/08/13
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CLAUDIO ANGELO

DE BRASÍLIA

Outro quer cortar pela metade um parque em Rondônia onde biólogos acabam de identificar ao menos dez espécies novas para a ciência.Outro, ainda, visa transformar um parque nacional no Maranhão em reserva extrativista, para o benefício da população tradicional _só que não existe população tradicional no lugar.

As iniciativas vão na contramão da meta acordada pelo Brasil na conferência da biodiversidade de Nagoya de expandir para 17% do território as unidades de conservação terrestres e para 10% as marinhas até 2020.Elas se somam a 20 processos já concluídos que nos últimos três anos “comeram” o equivalente a um Rio Grande do Norte em áreas de conservação e terras indígenas só na Amazônia, segundo estudo recente do Imazon.

O ICMBio (Instituto Chico Mendes), órgão responsável pela gestão das áreas protegidas do país, diz que a maioria dos projetos não tem mérito e trabalha no Congresso para derrubá-los.”Não questionamos a legitimidade do Congresso para propor esse tipo de alteração”, disse à Folha o presidente do instituto, Rômulo Mello. Pela Constituição, unidades de conservação federais só podem ter seus limites alterados por lei. “Mas as decisões precisam ser técnicas e não baseadas na vontade de algumas pessoas e tomadas de forma açodada.”

Algumas propostas, porém, resultam de situações criadas por erros do próprio governo federal, que tenta agora fazer acordos para reduzir o prejuízo.O caso mais recente e “sensível”, na definição de Mello é o de um projeto do deputado Carlos Melles (DEM-MG) para reduzir o parque nacional da Serra da Canastra, que abriga a nascente do rio São Francisco.

O parque foi criado há 40 anos com uma área total de 200 mil hectares. Porém, o decreto que classificava a área como de interesse público ou seja, passível de desapropriação para a criação do parque atingia apenas 71 mil hectares.

“Em 20 ou 30 anos, autorizamos agricultura e mineração nos 129 mil hectares restantes”, disse Mello à Folha. “O que está lá não é ilegal. Reconhecemos nosso erro.”Por conta do tal erro, hoje há extensa atividade agrícola e mais de 50 mineradoras dentro do parque, inclusive minas de kimberlito (rocha que abriga diamantes).As montanhas de rejeitos da atividade mineira afetam os cursos d’água que o parque foi criado para proteger.

O projeto de Melles, que será apreciado pela Comissão de Meio Ambiente do Senado, visa excluir 50 mil hectares do miolo do parque e criar em uma área total de 17 mil hectares uma APA (Área de Proteção Ambiental), tipo de unidade de conservação mais permissivo a atividades econômicas.

O ICMBio e o Ministério das Minas e Energia fizeram uma contraproposta: ela exclui 9.000 hectares das minas de diamante e duas vilas instaladas dentro do parque.O restante da mineração e as propriedades rurais, porém, terão de se mudar. “Não é possível ter agricultura em zona de nascentes”, afirmou Mello. Os títulos de mineração de dentro da área já foram suspensos.

Ele diz, porém, que a regularização fundiária do parque será “lenta, gradual e segura”. O ICMBio planeja comprar a única fazenda grande da região e esperar que os pequenos proprietários da Serra da Canastra morram ou se mudem para incorporar o restante.

Procurado pela Folha, o deputado Carlos Melles não havia atendido ao pedido de entrevista até o fechamento desta edição.

“USURPAÇÃO”

Menos sutil é um projeto do deputado Asdrúbal Bentes (PMDB-PA), em análise na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Ele quer sustar os efeitos de um decreto presidencial de 2006 que criou 9 milhões de hectares de unidades de conservação na região da BR-163, área de conflito fundiário e grilagem no Pará.

Os seis parques foram criados para evitar que a pavimentação da estrada viesse acompanhada de uma explosão no desmatamento e na grilagem.

Um deles é a Flona (Floresta Nacional) do Jamanxim, que foi palco das operações de apreensão de “bois piratas” pilotadas pelo ex-ministro do Meio Ambiente Carlos Minc. A extinção da Flona é objeto de um outro projeto de lei, do deputado Zequinha Marinho (PSC-PA).”Essas unidades foram criadas ao arrepio da lei”, diz Bentes. “Não houve levantamento fundiário prévio e as audiências públicas foram de fachada.”

O deputado chama o decreto de criação das áreas de “usurpação” do patrimônio do Estado do Pará pela União.”Está cheio de gente lá e não é de hoje. O pobre coitado que vem de outras regiões do Brasil e chega aqui e vê omissão do Estado não tem culpa.”

“Ali na BR-163 estava o maior grilo da Terra”, diz Mello, em alusão ao latifúndio pirata maior que a Bélgica do empresário Cecílio do Rego Almeida, desapropriado para os parques. “A criação das unidades foi um salto histórico para o país.”

Ele diz que está disposto a negociar a cessão de uma 100 mil hectares da Flona do Jamanxim, em troca da incorporação de uma área vizinha.”As pessoas que estão motivando esse projeto são de maior poder aquisitivo, e os deputados colocam que é um anseio da população”, afirma Mello. “Eles querem que 100% dos ocupantes fiquem lá, e isso não é possível.”

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