Especialistas concordam que é possível produzir muito mais na Amazônia usando apenas as área já desmatadas, para estimular o desenvolvimento social e econômico na região, sem a necessidade de mais destruição.

Atualmente, a pecuária praticada na Amazônia é altamente extensiva: em geral, o boi fica solto em grandes pastos (a média é de menos de uma cabeça de gado por hectare) sem grandes preocupações, por exemplo, com a qualidade do capim.

“Já são mais de 700 mil quilômetros quadrados desmatados para a agropecuária, mas tudo é usado de maneira muito pouco eficiente”, diz o pesquisador Paulo Barreto, do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). “Como a terra ainda vale muito pouco na Amazônia, vale mais para os produtores destruir mais floresta do que recuperar o que já está sendo usado.”

Fertilidade

Ao contrário do que sugere a pujança da floresta, o solo amazônico é na verdade bem pobre. A natureza é tão exuberante na região porque a selva se alimenta de si mesma.

Ou seja, as plantas e animais que morrem se transformam em humo, que fertiliza o solo e permite que a mata volte a crescer. Quando este ciclo é interrompido pela agropecuária, todos os nutrientes do solo acabam sugados em pouco anos e a terra se torna estéril e arenosa.

É possível recuperar o terreno com grandes investimentos em fertilização e preparação da terra (fósforo é a principal deficiência do solo amazônico), mas este é um processo que exige grandes investimentos e planejamento de longo prazo.

“A incerteza na questão fundiária é uma das principais causas da atividade predatória na Amazônia”, diz a diretora do programa Amazônia da ONG Conservação Internacional, Patrícia Baião. “É necessário que isso seja regularizado para que possamos cobrar dos potenciais produtores e investidores mais comprometimento com a manutenção da
terra.”

“Existe uma desvalorização da terra porque a ilegalidade é muito barata”, acrescenta. “É mais fácil ocupar um outro pedaço do que se concentrar em um lote já aberto e ali trabalhar para recuperar a terra.”

Floresta

Outro aspecto considerado essencial por especialistas para manter a selva de pé é desenvolver maneiras de valorizar as atividades econômicas mais ligadas à propria floresta.

Patricia Baião observa que a coleta de matéria-prima florestal – para as indústrias de cosméticos e medicamentos, por exemplo – é uma das atividades que se adequa bem às caracteríticas de populações locais e à preservação da natureza.

“O modelo econômico a ser adotado na Amazônia precisa ser pensado especificamente para a Amazônia”, diz a ambientalista. “Existe uma desvalorização da terra porque a ilegalidade é muito barata e, por isso, é mais fácil ocupar um outro pedaço do que se concentrar em uma área.”

Paulo Barreto diz que agregar valor aos produtos florestais é outra medida que pode gerar muitos ganhos com pouca devastação.

“O manejo sustentável de madeira (retirar árvores com um planejamento e um ritmo que permitam a recomposição da floresta) já é um grande avanço, mas agregar valor aos produtos florestais é algo que poderia trazer mudanças ainda mais profundas”, afirma.

“Poderíamos, por exemplo, criar uma indústria de móveis que pudesse exportar a madeira já trabalhada e valendo muito mais. Isso teria uim impacto social muito positivo e aumentaria o valor econômico da floresta de pé.”

Reserva

O fazendeiro Mauro Lúcio Costa ainda mantém as áreas florestais intocadas em 80% de sua propriedade – de 4,5 mil hectares – na região de Paragominas, no sudeste do Pará.

“Fazendo só pecuária, é muito difícil viabilizar o negócio usando apenas 20% da propriedade”, afirma o produtor. “Mas desde que comecei há trabalhar a terra aqui, oito anos atrás, acreditava que a floresta poderia ter muito valor no futuro.”

Ele diz esperar que, com o aumento das preocupações com o meio ambiente, seja possível lucrar com a preservação por meio, por exemplo, da prestação dos chamados “serviços ambientais”.

Um exemplo de serviço ambiental bastante em voga hoje em dia é o mercado internacional de emissões de carbono, em que países e indivíduos que mantenham florestas intactas poderão receber recursos como compensação por estarem mantendo de pé áreas de vegetação que mitiguem os efeitos das mudanças climáticas.

“Acho que o governo poderia também criar um mercado para que aquelas fazendas que preservam mais do que o exigido por lei possam vender esses créditos para quem têm áreas mais desmatadas”, sugere.

Produtividade

Também na pecuária, o fazendeiro diz que se preocupa em manter a fertilidade da terra – por meio de técnicas agropecuários modernas, períodos de descanso para o solo e rotação de culturas – para não ter que abrir novas áreas na mata.

“É mais caro trabalhar assim, mas a produtividade também aumenta muito”, diz o fazendeiro. “Eu produzo uma média superior a 400 quilos de carne por ano por hectare. A média na Amazônia não passa de cem quilos por ano.”

Ele dá como exemplo o capim que seu gado come. “Utilizo na minha propriedade seis tipos de capim, o que traz várias vantagens. O solo não fica desgastado por apenas uma espécie e, se houver algum problema, como uma praga, em um deles, os outros continuam vicejando”, afirma.

Se a produtividade já é um problema entre os fazendeiros maiores, é uma dificuldade ainda maior para as pequenas propriedades, dos colonos da reforma agrária ou dos sem-terra que invadem fazendas na região. São, em geral, agricultores que não têm recursos próprios para investir, e reclamam de enormes dificuldades para conseguir crédito para investimentos por não terem a terra regularizada.

“Precisamos ter nossa terrinha certa para poder trabalhar sem medo”, diz a agricultora Cosma Lima. “Se o governo ajudar, facilitar para a gente conseguir máquinas e fertilizantes, vamos poder produzir muito mais e ajudar a manter a floresta de pé.”

A agricultora ocupou um lote em uma fazenda na cidade de Dom Eliseu e chegou a conseguir fazer seu cadastro para regularizar seu terreno dentro das regras do programa Terra Legal. Mas, depois, recebeu a notícia de que seu cadastro não seria aceito porque a terra que ela quer ocupar já está em nome de outra pessoa – uma situação bastante comum e difícil de ser resolvida em meio à desorganização fundiária da região.


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