Não importa em qual dos nove países esteja, a região amazônica compartilha os mesmos problemas. No geral, os indicadores sociais da Amazônia estão sempre abaixo das médias nacionais e revelam defasagens crônicas. O analfabetismo está acima do limite que a Unesco define como crítico, a desnutrição atinge um quarto das crianças e a incidência de tuberculose no Peru e na Bolívia é a mais alta do mundo. Na Amazônia, as dificuldades são comuns e invadem fronteiras.
Esses dados fazem parte do primeiro grande diagnóstico da região já produzido. Trata-se do estudo “A Amazônia e os Objetivos do Milênio”, elaborado por oito ONGs da América Latina e lançado ontem à noite, em Belém, durante o seminário “Cenários e Perspectivas da Pan-Amazônia”, realizado pelo Fórum Amazônia Sustentável, articulação brasileira de populações ribeirinhas, indígenas e urbanas, além de empresas e sindicatos. O seminário também é realizado pela Articulação Regional da Amazônia (ARA), associação de 40 ONGs da América Latina. Pesquisadores de oito entidades fizeram o diagnóstico amazônico com patrocínio das fundações Avina e Skoll.
Na Amazônia, distribuídas pelos nove países, moram mais de 34 milhões de pessoas, diz o estudo. Há 375 povos indígenas. Essas pessoas vivem em uma área de quase 7,8 milhões de km2 ou 44% da América do Sul. O Brasil tem 64,3 % da região, seguido pelo Peru (10,1%) e Colômbia (6,2%).
O PIB per capita é de US$ 5.507 ao ano. O da Amazônia brasileira bate em US$ 6.128. A Bolívia tem a renda mais baixa. A mais alta é a da Guiana francesa, com mais de US$ 18 mil, mas esse dado é distorcido pelos gastos com a base europeia de lançamento de foguetes. É na Amazônia venezuelana que está o PIB per capita mais alto da região toda – US$ 9.259.
“Trabalho na Amazônia há 26 anos”, diz Adalberto Veríssimo, pesquisador-sênior do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), um dos mais respeitados centros de pesquisa da floresta. “Nunca vi um relatório publicado sobre a região com esse tipo de abrangência.”
A afirmação pode soar cabotina – o Imazon é um dos autores do estudo e assina os dados do Brasil -, mas a carência de informações sobre a Amazônia, principalmente quando se sai do Brasil, é desoladora. “Quando se cruza a fronteira”, continua ele, “a Amazônia é uma grande desconhecida.”
O trabalho rastreou os parâmetros criados pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2000 para orientar investimentos e melhoras nas condições socioeconômicas dos países em saúde, educação, renda e condições de vida, com foco em 2015. São os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, conhecidos por ODM. Entre as nove metas avaliadas, apenas uma foi alcançada entre todos os países – a que diz que é preciso eliminar as diferenças entre os sexos na educação. A maioria dos indicadores melhorou, da década de 90 a hoje. Mas são melhoras tímidas.
Em alguns países, a desnutrição atinge um quarto da população infantil e a vulnerabilidade é maior para os povos indígenas. As maiores taxas encontram-se no Peru (24%) e na Bolívia (21%).
O analfabetismo na Amazônia está acima do limite internacionalmente considerado crítico, que é de 5%. Na Amazônia brasileira, é mais do que o dobro (11%) e na boliviana, 17%. É naquela região da Bolívia, também, que a mortalidade infantil é mais alta do que a das regiões mais pobres do mundo (73 casos por mil nascidos vivos). A menor taxa nesse quesito, entre os nove países da região, é a da Guiana Francesa, com 10 casos por mil. Só a Venezuela conseguiu diminuir o índice em dois terços em relação a 1990, como está na meta da ONU. Mas ali há contradições – entre os índios venezuelanos, a mortalidade infantil é dez vezes maior que a média do país.
O desmatamento aumentou em todos os países, à exceção do Brasil. A região sofre com pobreza, desigualdade de renda e problemas graves de saúde, como malária e tuberculose. As mulheres têm pouca participação na política. A taxa de mortalidade materna aumentou. Na região que tem mais recursos hídricos do mundo, o acesso à água potável e o saneamento básico é precário. “Conhecer melhor a Amazônia é estratégico”, diz Veríssimo. “Temos que entender as pressões que estão em curso na região, as oportunidades e trocar experiências.”
Fonte- Valor Econômico (17.11.2011)