O Brasil às vezes faz mais sentido em inglês. Por exemplo, quando se fala da Amazônia na Science e a barreira da língua impede que saiam lá as bobagens sobre a região que se dizem aqui. A Science é publicada pela Sociedade Americana para o Progresso da Ciência. E este mês ela explica como e por que o apego do governo brasileiro a modelos atrasados de progresso está acabando com a Amazônia, sem tirar sequer proveito de seus recursos naturais.
Em outras palavras, o que se faz ali não é bem agricultura ou mesmo exploração florestal. É pura e simplesmente pilhagem do patrimônio natural, para enriquecer um punhado de espertos e empobrecer para sempre quem vai atrás da conversa desenvolvimentista.
Os ciclos de riqueza na Amazônia duram o tempo que levam os predadores para consumir em proveito próprio o patrimônio nacional. Depois, os pioneiros vão em frente e os retardatários ficam para trás, roendo o osso da terra arrasada. Não é de hoje que o Imazon, o instituto de pesquisa paraense que gerou o mais incontroverso e mais acabrunhante banco de dados sobre a Amazônia, diz que o ciclo da ascensão e queda dos povoamentos madeireiros na floresta duram em média 16 anos – ou três mandatos de prefeito.
É o tempo médio do desmatamento para fundar mais uma cidade fantasma. O que os políticos chamam de desenvolvimento da Amazônia raramente vai além da rapina e da grilagem. E é disso que, do presidente Lula para baixo, Brasília mais trata, quando discute a Amazônia. Quase sempre com pressa para abrir alas ao avanço da agricultura e da pecuária, que não passam de coadjuvantes do grande negócio, que é a pirataria da madeira nativa e o roubo de terras públicas.
A crítica que está na Science sobre o desmatamento da Amazônia é arrasadora. Poderia ser a aula que faltava para o Brasil cumprir o prognóstico do historiador Warren Dean, que há mais de dez anos viu na aniquilação perdulária da mata atlântico o único benefício de ensinar os brasileiros a não repetir o mesmo erro na Amazônia.
Que nada. Desde que Dean publicou essa advertência, a floresta amazônica já perdeu uma Áustria, talvez uma França, vários Sergipes – não importa, essas medidas soam tão desmesuradas que a rigor só servem para reiterar a crença histórica de que aquilo lá em cima é grande demais para o engenho humano; logo, deve ser inexaurível.
Quase todos os laudos científicos acabam caindo, mais cedo ou mais tarde, no buraco sem fundo das superstições nacionais sobre a Amazônia. E, no entanto, se o artigo pudesse ao menos envergonhar o Brasil, teria de tudo para enchê-lo de orgulho. Ele é assinado por nada menos que seis cientistas.
Sua autoria mistura os resultados de pesquisas de campo feitas por um inglês, um neozelandês e uma portuguesa, todos pós-graduados em florestas tropicais, sem falar que obviamente levam mais a sério o destino da floresta do que as autoridades municipais, estaduais e federais de que ela depende.
Mas dois autores são do Imazon, de Belém do Pará. E outro veio ao Brasil pela Universidade de East Anglia,onde ensina o paraense Carlos Peres, o filho de um grande exportador de castanha que se tornou uma referência mundial em estudos das florestas tropicais. O Brasil oficial só toma posse desses feitos porque perdeu há muito tempo, para todos os efeitos concretos, a propriedade da Amazônia. Depois ainda vem dizer que ela é nossa.
This post was published on 1 de agosto de 2013
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