Novos dados do MapBiomas mostram que a perda histórica de áreas naturais no Brasil até 1985 totalizava 20% do território. Nos 39 anos seguintes (1985-2023), essa perda avançou para outros 13% do território (110 milhões de hectares), totalizando em 2023 a marca de 33%. As perdas neste período mais recente impressionam, pois representam 33% de tudo que foi antropizado desde a chegada da colonização europeia até 2023. Áreas naturais incluem vegetação nativa, superfície de água e áreas naturais não vegetadas, como praias e dunas. Metade desse total (55 milhões de hectares) ocorreu na Amazônia.
A extensão e rapidez da mudança da cobertura e uso da terra são alguns dos fatores que elevam o risco climático do Brasil – tema do Seminário Anual de lançamento da Coleção 9 de mapas anuais de cobertura e uso da terra do MapBiomas nesta quarta-feira, 21 de agosto de 2024, em Brasília, com a presença da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Além de atualizar as informações até 2023 para as 29 classes mapeadas, a Coleção 9 inclui um mapeamento inédito, em versão beta, de recifes de coral que ficam em águas rasas ao longo da costa marítima brasileira. Outra novidade é o balanço de ganho e perda de vegetação nativa nos municípios a partir de 2008, ano em que foi instituído o Fundo Amazônia e também quando foi editado o Decreto nº 6.514, que conferiu efetividade ao Código Florestal então vigente ao estabelecer multas para os casos de descumprimento de suas regras.
Em nível nacional, 18% dos municípios tiveram estabilidade entre 2008 e 2023: são locais onde o ganho e perda da vegetação foram menores que 2%, com relativa estabilidade. Em outros 37%, houve ganho de vegetação nativa. O bioma com maior percentual de municípios onde a área de vegetação nativa cresceu nesses 16 anos foi a Mata Atlântica: 56%. Porém quase metade dos municípios brasileiros (45%) perderam vegetação nativa no período. O bioma com a maior proporção de municípios com perdas acentuadas de vegetação nativa (>15%) é o Pampa: 35%. Quando são consideradas todas as perdas nesse período (a partir de 2%), o bioma com mais municípios com perdas de áreas naturais é o Pantanal, com 82%. No caso do Matopiba, no Cerrado (região que reúne os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), todos os estados têm pelo menos um município com mais de 30% de perda de vegetação nativa entre 2008 e 2023. Os estados com maior proporção de municípios com ganho de vegetação nativa são o Paraná (76%), Rio de Janeiro (76%) e São Paulo (72%). Já os estados com maior proporção de municípios com perda de vegetação são Rondônia (96%), Tocantins (96%) e Maranhão (93%).
“A perda da vegetação nativa nos biomas brasileiros tende a impactar negativamente a dinâmica do clima regional e diminui o efeito protetor durante eventos climáticos extremos. Em síntese, representa aumento dos riscos climáticos. Uma parte significativa dos municípios brasileiros ainda perde vegetação nativa; mas, por outro lado, os últimos quase ⅓ dos municípios brasileiros estão recuperando áreas de vegetação nativa”, comenta o coordenador geral do MapBiomas, Tasso Azevedo.
A Formação Florestal cobre atualmente 41% do país, mas foi o tipo de cobertura nativa que mais perdeu área de 1985 até o ano passado: menos 61 milhões de hectares, uma queda de 15% no período. Proporcionalmente, a Formação Savânica teve a maior perda, com redução de 26% e cerca de 38 milhões de hectares convertidos.
Na Coleção 9, pela primeira vez a vegetação nativa mapeada foi relacionada com os diferentes tipos de fitofisionomias reconhecidas no Mapa de Vegetação do Brasil, elaborado pelo IBGE. Nos últimos 39 anos, as fitofisionomias de Estepe no Pampa, Savana no Cerrado e Floresta Estacional Sempre-verde no sul da Amazônia foram as que, proporcionalmente, mais perderam vegetação nativa. Por outro lado, a Floresta Estacional Semidecidual – que depende das variações sazonais de temperatura e umidade, e se notabiliza por ter várias espécies que perdem parcialmente suas folhas, e a Floresta Ombrófila Mista, também conhecida como Mata com Araucária – que depende de chuvas constantes ao longo do ano, foram as tipologias mais exploradas historicamente, sendo que até 1985 ambas já tinham sido reduzidas a menos de 50% da sua área de distribuição original.
“As florestas no Brasil são muito diversas com características e espécies típicas de cada região, que estão sujeitas a diferentes graus de ameaça. Esta diversidade deve ser levada em conta em políticas públicas para conservação e bioeconomia destas florestas“, acrescenta Eduardo Vélez, do MapBiomas.
O MapBiomas também analisou pela primeira vez a perda de cobertura vegetal nas florestas públicas não destinadas – áreas sob domínio público, mas que ainda não têm um uso específico definido como Unidades de Conservação, Terras Indígenas e Concessões Florestais, e que aguardam uma destinação formal. Elas ocupam 13% da Amazônia Legal e têm 92% de sua área coberta por vegetação nativa, o equivalente a 60 milhões de hectares.
“Temos uma área florestal maior que o Estado de Minas Gerais ainda sem destinação na Amazônia Legal. Essas áreas estão mais suscetíveis ao desmatamento em relação às florestas que estão sob algum regime de proteção. É importante e urgente destinar essas áreas e transformá-las em territórios protegidos. A conversão dessas áreas para algum tipo de uso antrópico agravaria ainda mais a atual crise climática” explica Luis Oliveira, da equipe da Amazônia do MapBiomas.
Terras Indígenas continuam sendo as mais protegidas
As áreas mais preservadas do Brasil continuam sendo as Terras Indígenas (TIs) que cobrem 13% do território nacional. De 1985 a 2023, elas perderam menos de 1% de sua área de vegetação nativa, enquanto nas áreas privadas foram 28%.
Ao todo, o Brasil tem 281 milhões de ha de áreas antrópicas e uma análise inédita mostrou como a perda de vegetação nativa é afetada pelo relevo. A perda foi avaliada em diferentes declividades do território. Os resultados mostram que na zona rural, as áreas mais planas, com declividades entre 0 a 3% e entre 3 a 8%, têm proporcionalmente as maiores perdas de vegetação nativa (-20% e -19%, respectivamente). Em áreas urbanizadas, ocorre o oposto: elas apresentaram crescimento de 3,3% ao ano em áreas de encostas – cuja declividade é superior a 30%, contra uma média geral de 2,4% ao ano, considerando todas as classes de declividade.
“A expansão urbana em áreas mais declivosas em um contexto de mudanças climáticas, como de extremos chuvosos, aumenta o risco de desastres e coloca em perigo a população”, destaca Mayumi Hirye, da equipe das áreas urbanas do MapBiomas.
Na Coleção 9, o MapBiomas lança a versão beta do mapeamento de recifes de coral em águas rasas, que podem ser detectados por satélites com sensores óticos. Tratam-se de habitats marinhos, formados pelo acúmulo progressivo do esqueleto calcário de corais e algas. O mapeamento revelou 20,4 mil hectares de recifes de coral na costa leste do Brasil. A maior parte deles (72%) se encontram em Unidades de Conservação Marinhas, sendo que uma delas – a APA Ponta da Baleia / Abrolhos – responde por 33% de toda a área mapeada.
“A costa leste brasileira, sem grande descarga sedimentar de seus rios, possui águas claras, com grande penetrabilidade à luz. Este é um dos fatores que explicam a grande concentração de recifes de corais na região. Entretanto, a exuberância dos corais do Brasil, e do mundo, é ameaçada pelo aumento da temperatura média dos oceanos, condição que leva ao branqueamento do coral e, eventualmente, à sua morte” destaca Cesar Diniz, da equipe de mapeamento da Zona Costeira do MapBiomas. “Estima-se que 1/4 de toda vida marinha é dependente de corais, em algum momento de sua vida. Logo, monitorar as condições coralíneas do país é absolutamente relevante a todos nós. Mesmo que não percebamos, todos estamos associados aos serviços ecossistêmicos prestados pelos recifes de corais”, complementa.
O território brasileiro em números
Clique aqui para ver os principais destaques da Coleção 9 (1985-2023)
This post was published on 21 de agosto de 2024
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