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Avaliação e modelagem econômica da restauração florestal no estado do Pará

Sumário Executivo

Como contribuição ao esforço global de mitigação das mudanças climáticas, o governo brasileiro anunciou uma meta de restauração e reflorestamento de 12 milhões de hectares até 2030. O estado do Pará pode contribuir com até 25% dessa meta caso recupere seu passivo florestal, estimado em 3 Mha. Destes 3 Mha, estimamos um passivo entre 760 mil ha e 1 Mha em Áreas de Presevação Permanente (APP) e de aproximadamente 2,3 Mha em Reserva Legal (RL). O custo estimado da restauração de APP ripária e RL no Pará é de R$ 7,7 bilhões a R$ 9,4 bilhões (R$ 2,5 bilhões a 4,4 bilhões em APPs e R$ 5,2 bilhões a 6,9 bilhões em RL), ao longo de 22 anos, em valor presente para o ano de 2015. Já os custos de oportunidade da terra estão estimados entre R$ 4,8 bilhões e R$ 5,3 bilhões, além de uma redução de mais de 20% da área de produção agropecuária (entre 5,3% e 7,5% em APP e 15,7% em RL). Não consideramos nos cálculos a compensação florestal do passivo, pois não possuímos uma estimativa da área de RL que será efetivamente compensada no estado inteiro.
O custo da restauração florestal no Pará variou de R$ 2.280 a R$ 11.243/ha (valores correntes para 2015) dependendo do método adotado (ex. cercamento, plantio total da área (1.666 árvores/ha), enriquecimento). Os intervalos apresentados neste relatório para o custo da restauração estão relacionados à: i) indefinição das dimensões das APPs a serem restauradas, que por sua vez depende do avanço do Cadastro Ambiental Rural (CAR), pois a área de preservação a ser restaurada em torno dos rios varia em função do tamanho do imóvel; e ii) definição do método de restauração.
Estimamos os ganhos potenciais com crédito de carbono entre R$ 6,6 e R$ 7,4 bilhões (R$ 1,8 a 2,6 bilhões em APPs e 4,8 bilhões em RL), o que pagaria os custos de implantação da restauração em até 92% para RL e até 74% em APPs. Calculamos que até 120 milhões de toneladas de CO2 equivalentes podem ser sequestrados por ano (entre 40,9 e 57,6 MtCO2 em APP e 62,8 MtCO2 em RL) com a restauração anual de até 232 mil ha de floresta (entre 84 mil e 119 mil ha em APP e 113 mil ha em RL). O passivo do Pará não pode ser diluído totalmente ao longo de 20 anos conforme a lei federal, pois na regulamentação estadual foi definido que a restauração de APPs deve ocorrer em nove anos. Contudo, ainda faltam mecanismos de captação desses recursos e regulamentação para garantir segurança jurídica aos investidores e beneficiários do crédito de carbono.
A exploração madeireira em 50% da RL foi avaliada como segunda fonte de benefícios financeiros diretos da restauração, e os arranjos produtivos com espécies nativas mostrou retornos competitivos com as atividades agropecuárias. O Valor Presente Líquido anualizado das espécies avaliadas foi: R$ -319/ha (negativo) com cumaru (Dipteryx alata); R$ 2.110/ha com marupá (Simarouba amara); R$ 453/ha com sucupira (Bowdichia virgilioides); R$ -962/ha (negativo) com cedro (Cedrela fissilis); R$ -58/ha (negativo) com copaíba (Copaifera langsdorffii); e R$ 1.316 com paricá (Schizolobium amazonicum). Duas espécies demonstraram competitividade com atividades agropecuárias e risco financeiro abaixo de 1%: marupá e paricá – madeiras com menor ciclo de exploração. Apesar do retorno, não é viável esperar a prática de manejo florestal em toda a área de RL a ser restaurada devido à baixa liquidez e competição injusta com a madeira ilegal. As barreiras para a restauração em larga escala e a exploração madeireira em RL são parecidas: pouco conhecimento sobre as técnicas adequadas de plantio para restauração e exploração dessas áreas; alto custo de mudas nativas e insumos; pouca demanda efetiva por restauração; e escassez de mão de obra qualificada.
Reforçamos que o passivo em RL não deverá ser resolvido totalmente via restauração, pois parte do passivo poderá ser compensado em área fora dos imóveis com déficit, reduzindo o custo total da restauração em larga escala. Porém, falta regulamentação e incentivos para estabelecer a comercialização desses excedentes (ex. via o mercado de Cotas de Reserva Ambiental – CRA).
O uso de Sistemas Agroflorestais (SAF) pode ajudar a viabilizar economicamente a restauração para pequenos produtores, conforme analisamos nos dados da literatura. Os retornos médios encontrados estão próximos a R$ 2.000/ha. Contudo, o uso intensivo de mão de obra é uma barreira à adoção em larga escala desses sistemas. Também não sabemos em que extenção os SAFs serão implantados, pois são uma opção legal que pode ser adotada em qualquer imóvel rural, mesmo que sejam mais comumente utilizados em pequenas propriedades. Dessa forma, para estimarmos a receita dos SAFs neste relatório, extrapolamos a receita líquida (em valor presente) apenas para as áreas de passivo em pequenos imóveis, resultando em um potencial de R$ 446 milhões de retorno.
Como indicador de eficácia da restauração, avaliamos a disponibilidade de habitat para a fauna em três cenários, com e sem restauração. A região oeste apresentou a maior disponibilidade de habitat para a fauna. No oeste também ocorre a maior combinação de ameaças para a perda de habitat, como: o desmatamento incentivado pelo crescimento das áreas de produção de soja; e obras de infraestrutura, como a BR-163, o complexo hidrelétrico do Tapajós e o porto para escoamento de produtos agrícolas (ex. soja). Como a maioria dos municípios teve um incremento parecido (< 5%), sugerimos priorizar a restauração naqueles com quantidade intermediária de disponibilidade de habitat (entre 20% e 50%), porém com maior ganho adicional para habitat. Nesse caso, o destaque foram os municípios localizados na região central-sul, como Altamira, Novo Progresso e São Félix do Xingu. A restauração de APPs aumenta a disponibilidade de habitat a um alto custo financeiro, estimado em aproximadamente 1% de ganho na disponibilidade de habitat para cada R$ 1 milhão gasto com restauração.
Para viabilizar a restauração em larga escala no estado do Pará, recomendamos as seguintes medidas para a cadeia da restauração florestal: i) investir em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) para produção de espécies nativas; ii) estruturar a cadeia de valor para comercialização e valorização dos produtos de áreas restauradas; e iii) estabelecer uma estratégia estadual para restauração a partir do mapeamento de áreas prioritárias para a conservação e coordenar as ações com o setor agropecuário. Além dessas ações diretas na cadeia da restauração, também é preciso avançar em algumas políticas públicas de suporte à restauração, como: i) validação do CAR e monitoramento do cumprimento do Código Florestal, assim a demanda por restauração poderá se concretizar; ii) estabelecimento de uma estratégia para o crédito florestal dentro do plano estadual do ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono) e outros mecanismos financeiros de apoio; e iii) implementação de mecanismos de incentivo à restauração para detentores e posseiros rurais, pois apesar do passivo, os ocupantes de terras não têm buscado por restauração.

1. Introdução

Recentemente, na conferência do clima da Organização das Nações Unidas (ONU) em Paris (COP-21), o governo brasileiro anunciou uma meta de restauração e reflorestamento de 12 milhões de hectares até 2030 na Amazônia e Mata Atlântica como contribuição aos acordos globais para reduzir os efeitos das mudanças climáticas (Brasil, 2015). Todavia, a restauração florestal envolve investimentos, custos e benefícios ainda pouco conhecidos, principalmente na Amazônia, onde a preocupação em recuperar a floresta é mais recente e o acesso à informação sobre o assunto é ainda incipiente.
A proteção de florestas em áreas privadas no Brasil é prevista pela Lei de Proteção da Vegetação Nativa (Lei nº 12.651/2012, conhecida como Código Florestal) e a não conformidade implica em sanções como multas pecuniárias ou embargos de áreas produtivas. Conforme a lei, os imóveis rurais devem conservar a vegetação nativa em Reserva Legal (RL) e em Áreas de Preservação Permanente (APP), localizadas em torno de rios (vegetação ripária), encostas e topos de morros. A proteção de florestas ripárias estabelecida na legislação ambiental brasileira pode variar de 30 m a 500 m a partir da borda dos rios, lagos, represas ou nascentes, dependendo da largura do corpo hídrico; e a APP a ser recuperada varia de 5 m a 100 m ao redor dos corpos hídricos, dependendo do tamanho do imóvel e largura dos mananciais. No caso da RL no bioma Amazônia, a proteção das florestas pode chegar a 80% do imóvel, dependendo de sua localização (ex. área com Zoneamento Ecológico-Econômico que reduza a RL), tamanho do imóvel e período do desmatamento. A recuperação do passivo de florestas em áreas de RL também depende dos mesmos fatores. Em outros biomas do País a RL é de até 35% do tamanho do imóvel.
O passivo em RL pode ser sanado via restauração ou mecanismos de compensação (ex. Cota de Reserva Ambiental – CRA) e arrendamento sob regime de servidão) em imóveis onde não ocorreu o déficit. Porém, o passivo em APPs somente deve ser reparado por meio de restauração. Neste estudo, estimamos o custo da restauração do passivo total do estado, sem considerar os mecanismos de compensação, pois não sabemos o tamanho da área que será efetivamente compensada pelos detentores dos imóveis.
De acordo com o Código Florestal, no artigo 3º, uma das funções das APPs é preservar a biodiversidade, facilitando o fluxo gênico da fauna; por isso a importância de considerar na restauração indicadores relacionados à conservação da biodiversidade. Para estimar a eficácia da restauração em termos ecológicos, avaliamos neste relatório o aumento da disponibilidade de habitat para fauna nos cenários com e sem restauração. O número de indivíduos de qualquer espécie suportado em uma paisagem está intimamente ligado à quantidade de habitat disponível na paisagem (Hubbell, 2001; Fahrig, 2003).
Também analisamos o custo-benefício das áreas de RL e APP ripária a serem restauradas no estado do Pará em diferentes cenários previstos pelo Plano Nacional de Recuperação da Mata Nativa (Planaveg – Brasil, 2014). Para estimar o custo total da restauração nas áreas a serem restauradas, consideramos: i) os gastos com a implantação da restauração em diferentes métodos, como plantio e isolamento das áreas; e ii) as perdas da produção agropecuária nas áreas destinadas à restauração, ou o custo de oportunidade. Para estimar os benefícios da restauração, consideramos: o potencial de receita com carbono sequestrado em APP e RL e ganhos da exploração econômica da madeira em RL. Esses benefícios financeiros são uma subestimativa dos ganhos totais da restauração, que incluem serviços ecossistêmicos como proteção dos solos, mananciais hídricos, biodiversidade, entre outros, mas que são difíceis de mensurar pela falta de dados específicos.
As análises foram feitas a partir de dados de uso e cobertura do solo do projeto TerraClass 2012 (Inpe, 2014), Prodes (Inpe, s.d.) e Cadastro Ambiental Rural (CAR) no Pará (Sema, s.d.); de estimativas de RL e APP do Imazon (Nunes et al, no prelo; Nunes et al, 2016); e de informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre a produção agropecuária. A APP foi mapeada para todo o estado, porém a área a ser restaurada apresentou um intervalo em sua estimativa (entre 760 mil ha e 1 Mha) devido à incerteza do tamanho dos imóveis rurais em áreas que não são cobertas pelo CAR. As estimativas de RL consideraram somente imóveis registrados no CAR do Pará, cobrindo cerca de 60% da área cadastrável do estado.

1.2 O que é a ROAM?

A Metodologia de Avaliação de Oportunidades de Restauração (ROAM) é uma abordagem desenvolvida pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), em parceria com o World Resources Institute (WRI), visando identificar oportunidades, analisar dados e promover a restauração de paisagens florestais (RPF). A metodologia foca na identificação de serviços ecossistêmicos provenientes da restauração, considerando fatores políticos e o custo-benefício econômico da restauração de paisagens.
Um guia sobre a ROAM (IUCN & WRI, 2014) foi elaborado para orientar tomadores de decisão, especialistas, práticos e implementadores de projetos com a pretensão de apoiar o desenvolvimento de estratégias e programas de restauração em nível subnacional e nacional. Assim, a ROAM tem apoiado países e estados que assumem compromissos com a restauração florestal de paisagens, como o Desafio de Bonn, que consiste na restauração de 150 milhões de hectares de áreas degradadas e desmatadas em todo o mundo até 2020.
Para propor um conjunto de políticas e ações para restauração de paisagens florestais em uma área/região, a ROAM requer um passo-a-passo baseado no diálogo com atores locais. O processo todo foi desenvolvido para responder as seguintes perguntas:

  • Onde a restauração é ecológica, econômica e socialmente viável?
  • Quais as oportunidades de restauração no país/na região?
  • Que tipos de restauração são viáveis nas diversas regiões do país?
  • Quais são os custos e benefícios, incluindo sequestro de carbono, associados às diferentes estratégias de restauração?
  • Quais incentivos existem ou são necessários para apoiar a restauração?
  • Quais grupos de interesse precisamos engajar?

A ROAM propõe uma combinação de engajamento de grupos de interesse (“melhor conhecimento”) com a análise de dados disponíveis (“melhor ciência”) para identificar e investigar oportunidades de RPF. A intenção é aumentar a resiliência de paisagens e estabelecer opções futuras que permitam o ajuste e a otimização de bens e serviços, conforme as necessidades da sociedade.
Este relatório visa contribuir com as análises econômicas requeridas pela metodologia ROAM. No entanto, não há uma definição exata de quais análises ou dados econômicos a ROAM exige, mas há uma proposta de arcabouço geral que inclui as análises de custo-benefício e custo-eficácia da restauração, nos diferentes métodos de restauração identificados em cada região que a ROAM é aplicada. Há algumas variáveis recorrentes, por exemplo, em experiências na Uganda, Ruanda e México a equipe implementadora da ROAM considerou o sequestro de carbono um benefício. Neste relatório propomos o uso de ferramentas robustas e já estabelecidas na literatura econômica, de maneira alinhada com a proposta da ROAM, conforme descrevemos na seção “Considerações metodológicas”. Ademais, a abordargem econômica da restauração no Pará apresentada neste documento é a mesma utilizada em outras iniciativas subnacionais da ROAM no Brasil, como no Espírito Santo, Distrito Federal, Pernambuco e Santa Catarina.

Considerações Metodológicas

2.1 Área de estudo

O estudo foi realizado no Pará, o segundo maior estado do Brasil, com 1,25 milhão de km², e maior que países como África do Sul e Colômbia. Nos concentramos no Pará porque é o estado mais avançado na Amazônia em registro de áreas privadas no CAR; >60% de sua área passível de registo constava na base de dados do governo estadual até 2015; possui atualmente uma das maiores taxas de desmatamento na Amazônia: uma média de 2.000 km² ao ano entre 2011 e 2015 em comparação com 5.500 km² ao ano para toda a Amazônia brasileira; e os governos estaduais e municipais, em conjunto com a sociedade civil, têm sido atuantes nos seus esforços para reduzir o desmatamento, tornando o estado um exemplo para outras partes da Amazônia, por exemplo, através do Programa Municípios Verdes.
O Pará está localizado no leste da Amazônia brasileira e sua economia é composta principalmente pela indústria extrativa (ex. minérios de ferro e bauxita, madeira, carvão), agricultura (ex. óleo de palma e mandioca) e pecuária (o Pará tem o quinto maior rebanho bovino no Brasil – com 20 milhões de cabeças em 2015, de acordo com o IBGE (2015)). Conforme a Figura 1 ilustra, aproximadamente 55% do território do Pará, ou 685.575 km², é composto por alguma forma de área protegida pública ou reserva indígena (MMA/Funai, 2013). Vinte e um por cento do estado foi desmatado até 2014 (Inpe, s.d.) e continua a ter uma das maiores taxas de desmatamento na Amazônia.

Figura 1. Estado do Pará (área do estudo), com estradas, rios e Áreas Protegidas (Terra Indígena, Unidade de Conservação e Área Militar)

2.2 Estimativa de área para a restauração

A partir do levantamento de uso e cobertura do solo do Inpe (2014, s.d) e dados do CAR (Sema, s.d) no Pará, Nunes et al (2016) estimaram um passivo florestal de ~2,3 milhões de hectares em RL. Já a estimativa de APPs ripárias a serem restauradas variou em função da incerteza do tamanho dos imóveis não cadastrados no CAR: mínimo de 760 mil ha e máximo de 1 milhão de ha (Nunes et al, no prelo). Para identificar as APPs utilizamos os dados de hidrografia disponíveis para o estado (Nunes et al, no prelo). Os cálculos de passivo foram feitos a partir da base de dados do CAR do Pará de dezembro de 2014, abrangendo 60% da área cadastrável no estado. Para os assentamentos, nos baseamos no Termo de Ajuste de Conduta (TAC) do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) (MPF, 2012) para considerar a área total como um único imóvel, tratado como pequena propriedade, que deverá manter uma RL coletiva, mesmo que os lotes de assentados sejam isentos individualmente.
Para as estimativas de RL e de APP consideramos diferentes escalas geográficas. As RLs foram estimadas para a área cadastrada no CAR do Pará até 2014 (Nunes et al, 2016), excluindo-se a área não cadastrável, e para as APPs utilizamos a hidrografia de todo o estado (Nunes et al, no prelo). Além disso, não é possível considerar como total de passivo a soma simples das duas áreas, pois: i) não sabemos a alocação exata da RL na propriedade, podendo ou não estar sobreposta a APP já contabilizada no outro estudo; ii) nossas estimativas de RL não removem as APPs a serem recompostas. Por este motivo, apresentaremos os resultados de custo-benefício separadamente para APP e RL.
Por fim, ressaltamos que como não sabemos quanto do passivo será compensado em outras propriedades com excedente de RL, consideramos nos cálculos a restauração florestal da área total de passivo dos imóveis rurais.

2.3 Estimativa do custo de transporte

Definimos a distância de transporte a partir de três polos viveiristas, nas regiões de Paragominas, Medicilândia e entorno metropolitano, evidenciados pelo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre produção de mudas e sementes florestais nativas no Brasil (Ipea, 2015). O valor do custo de transporte (em R$/tonelada e R$/km) foi definido a partir da média dos dados da Aprosoja (2016) de frete interestadual em 26 rotas e do levantamento da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) (Coppead/UFRJ, 2006). Os valores da UFRJ foram atualizados para 2015 pelo Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M). Então, com a definição dos custos por intervalos de distância (mesmo intervalo da Coppead/UFRJ (2006); ver Tabela 1), utilizamos o mapa de estradas não oficiais de Brandão & Souza (2006) para espacializar o custo de transporte através da ferramenta networking analyst tools do software ArcGIS.
Para a modelagem econômica do custo total da restauração no Pará, optamos por um valor considerado alto de R$ 200/ha para frete de mudas (Apêndice I), que é comum ser cobrado pelos produtores no sudeste paraense.

Tabela 1. Custos de frete por intervalo de distância

2.4 Análise custo-benefício

A análise custo-benefício consiste em avaliar a vantagem ou desvantagem de uma decisão de investimento, comparando o custo total esperado com os benefícios financeiros esperados ao longo do tempo de duração de um projeto. Na maioria dos casos o resultado deve permitir uma comparação com outros investimentos e, por isso, a análise utiliza indicadores financeiros comuns como a Taxa Interna de Retorno (TIR) e o Valor Presente Líquido (VPL).
Para avaliar o custo-benefício da restauração florestal consideramos: o custo de implantação da restauração em diferentes métodos e cenários; os custos de oportunidade nas áreas restauradas; e as receitas potenciais de exploração madeireira em área de RL e pagamento por sequestro de carbono. Além dos indicadores de retorno (TIR e VPL), calculamos o risco financeiro da exploração madeireira em RL. Não consideramos outros benefícios financeiros potenciais, como Pagamento por Serviço Ambiental (PSA) para água e REDD+, por haver pouca informação de mercado (como preço e demanda dos pagadores), além de incertezas institucionais na aplicação desses mecanismos em larga escala, e de falta de regulamentação e programas efetivos nesses temas no Pará. O Quadro 1 resume a estrutura de custo-benefício deste trabalho e a seção seguinte descreve os indicadores financeiros utilizados.

Quadro 1. Estrutura resumida dos custos e benefícios considerados na análise econômica da restauração florestal no Pará

2.4.1 Indicadores técnico-financeiros e cálculo do risco

Cálculo do VPL da madeira em restauração com fins econômicos. Em análises financeiras o VPL é um indicador comumente utilizado para avaliar o retorno líquido do capital no período de tempo determinado para o projeto. Contudo, aqui também utilizamos uma variação do VPL simples, o VPL anualizado (VPLa), o qual representa o ganho equivalente anual. O uso dessa variação nos permitiu comparar o retorno da madeira com outros usos do solo que apresentam diferentes ciclos de produção e avaliação do retorno, por exemplo, a agricultura que tem ciclos anuais. Tal comparação é importante para entender qual a competitividade da exploração madeireira na restauração.
O VPL consiste no fluxo de caixa de uma atividade, descontada uma taxa relativa ao custo de oportunidade do capital, conforme a fórmula abaixo:

Onde:
B são os ganhos financeiros e C, os custos em um período de tempo (t) pré-determinado; i é a taxa de desconto anual; e I, o investimento inicial na atividade analisada.
Usamos a seguinte fórmula matemática para deduzir o VPLa a partir do VPL:

A taxa de desconto considerada foi 8,5% ao ano, que é a mediana das taxas de juros das principais linhas de crédito destinadas à restauração no Pará. As duas principais linhas de crédito para restauração são o Plano ABC e o FNO biodiversidade, com taxas que variam de 7,5% a 10% a.a. dependendo da classificação do tomador. A taxa de desconto utilizada ficou entre o Custo de Capital Médio Ponderado (WACC, em inglês) calculado por estudos recentes do Projeto Verena (WRI, 2016) e Instituto Escolhas (2015), ou 13,5% e 7,87% a.a. respectivamente.

Taxa Interna de Retorno (TIR). A TIR expressa a taxa de juros suportada pelo investimento, ou a taxa de retorno que iguala o VPL a zero. Este indicador é comumente usado para avaliação e seleção de investimentos, pois possibilita fácil comparação entre negócios com diferentes características. Sempre que a TIR for menor que a taxa de deconto, o VPL é negativo (investimento inviável).

Cálculo do risco financeiro pelo método de Monte Carlo. A análise de risco avaliou a probabilidade de lucro da exploração madeireira nos diferentes modelos propostos. Para mensurar o quanto os indicadores econômicos utilizados pelo modelo são sensíveis às incertezas, utilizamos uma abordagem estocástica do tipo Monte Carlo. Nessa abordagem selecionamos as variáveis de maior impacto no modelo: produtividade, custo e preço de venda da madeira. Para cada uma dessas variáveis selecionamos um valor aleatório no intervalo de 20% maior ou menor que a média para ser utilizado no cálculo do VPL. A seleção aleatória dos valores e cálculo do VPL foi repetida mil vezes em cada modelo de restauração, e, em seguida, foi verificado quantas vezes os modelos apresentaram prejuízo (VPL negativo), isto é, a probabilidade percentual de inviabilidade. Ressaltamos, porém, que esse indicador representa o risco financeiro, não incluindo riscos de comercialização, institucionais, climáticos e outros externos ao negócio.

2.5 Avaliação dos custos de oportunidade da terra

Definimos como custo de oportunidade a receita/ganho não obtido com o uso do solo devido à escolha de restaurar, ou seja, as perdas para a economia agropecuária. Dessa forma, quanto maior o custo de oportunidade, maior o impacto econômico ao substituir uma determinada atividade agropecuária pela restauração. A avaliação do custo de oportunidade em áreas destinadas à restauração considera a receita líquida agropecuária que será perdida nessas áreas no longo prazo. Esse valor é expresso pelo preço da terra ou pelo VPL de cada atividade rural. Devido à imprecisão e às inconsistências dos dados disponíveis, neste trabalho utilizamos uma média entre o valor da terra e a receita líquida média das culturas agrícolas. O uso do valor médio entre a receita líquida e o preço da terra permite diminuir incertezas e viés das informações, normalizando os dados.
Também estimamos a produção agropecuária (em toneladas) que ficará comprometida com a restauração e a área produtiva (ha) perdida para a restauração. Para calcular a produção pecuária comprometida, consideramos a área a ser reduzida/cedida para a restauração multiplicada pela lotação média da pecuária (~1,3 cab./ha); depois replicamos a relação cabeça/hectare para as áreas a serem restauradas. A lotação foi estimada a partir do rebanho total em 2014 (IBGE, s.d. b) dividido pela área de pastagem estimada pelo TerraClass (Inpe, 2014). Para calcular a produção agrícola comprometida, consideramos a área a ser reduzida por causa da restauração multiplicada pelo rendimento médio das culturas temporárias e permanentes conforme o IBGE (s.d. c), exceto coco-da-baia, por contar como unidade e não quilogramas. O abacaxi foi convertido para quilos, considerando 1,2 kg por unidade.
A avaliação de custo de oportunidade considera APPs para o estado inteiro (Nunes et al, no prelo), mas as estimativas de RL utilizam apenas os imóveis cadastrados no CAR, localizados em áreas cadastráveis, até final de 2014, totalizando 60% da área cadastrável do estado (Nunes et al, 2016).

2.5.1 Estimativa da receita líquida ponderada das atividades agropecuárias

Para as estimativas de receita líquida ponderada das culturas agropecuárias (em R$/ha), utilizamos os dados municipais de valor da produção do IBGE (s.d. b; s.d. c) e os de custos da Conab (2015) e Embrapa (s.d.). Como os dados de custo são estaduais e não municipais, utilizamos o custo médio nos estados da Amazônia (em R$/Kg/ha) e multiplicamos pelo rendimento médio das culturas, em Kg/ha (IBGE, s.d b; s.d c). Todas as informações de preço e custo foram atualizadas para 2015 pelo IGP-M.
Abaixo, a representação matemática de como calculamos a receita líquida ponderada das áreas agrícolas no Pará em cada município.

Onde:
Rc,m = receita líquida ponderada de uma cultura c em um município m (R$/ha);
vc,m = valor total da produção (R$) de uma cultura c em um município m, segundo o IBGE (s.d b; s.d c);
ac,m = área de plantio (ha) de uma cultura c em um município m, segundo o IBGE (s.d b; s.d c);
Cc = custos de produção (R$/kg) de uma cultura c, segundo a Conab (2015) e Embrapa (s.d.);
rc,m = rendimento da produção (Kg/ha) de uma cultura c em um município m, segundo o IBGE (s.d b; s.d c);
at,m = área total de plantio (ha) das culturas agrícolas em um município m, segundo o IBGE (s.d b; s.d c).

Não encontramos informações para dez culturas permanentes e temporárias, as quais somaram 0,6% da área plantada em 2015: abacate, guaraná, limão, mamão, tangerina e urucum como culturas permanentes; e fumo, juta e malva como culturas temporárias sem informações de custo de produção. Em virtude da baixa representatividade na área de plantio, consideramos que não houve prejuízo ao desconsiderarmos tais culturas no cálculo de receita líquida do uso agrícola da terra.
Para o cálculo da receita líquida nas áreas de pastagem, somamos as receitas estimadas de produção de leite e abate de gado nos municípios. Para estimar a receita do abate ponderamos o abate estadual (Kg convertido para arroba) pela participação percentual desses municípios no rebanho estadual, depois multiplicamos pelo preço da arroba no ano de 2014 (Cepea, s.d.) e dividimos pela área de pastagem dos municípios (Inpe, 2014). Para estimar a receita da pecuária leiteira consideramos o seguinte cálculo em cada município:

Onde:
Rm = receita líquida da pecuária leiteira em um município m (R$/ha);
vm = Valor total da produção (R$) da pecuária leiteira em um município m, segundo o IBGE (s.d b; s.d c);
am = área total de pastagem (ha) em um município m, segundo o Terra Class (Inpe, 2014);
C = custos de produção (R$/litro) do leite, que na média entre os valores da Conab (2015) e levantamento de campo do Imazon nos municípios de Paragominas e São Félix do Xingu estimamos em R$ 1,27;
qm = produção total (litros) de leite em um município m, segundo o IBGE (s.d b; s.d c).

2.5.2 Definição do preço da terra

Os preços de terra (R$/hectare) utilizados são do levantamento periódico do Agrianual (Agrianual, 2015) e das informações de produção (R$ total/município) fornecidas pelo IBGE para cada cultura. Os preços de terra variam em função do município e uso/cobertura do solo (Apêndice II). Para estimar a produção agrícola comprometida consideramos a produtividade por hectare das culturas agrícolas por município, conforme o IBGE (s.d a; s.d b; e s.d c). O Apêndice II apresenta os preços da terra para os municípios do Pará.

2.5.3 Classificação do uso e cobertura do solo nas áreas de passivo florestal

Para classificar o uso do solo na área a ser restaurada, replicamos a distribuição percentual do uso/cobertura das culturas agropecuárias em cada município. As classes de uso/cobertura utilizadas foram as mesmas do Projeto TerraClass. A partir da área estimada dos diferentes usos nas APPs e RLs a serem restauradas, calculamos o custo de oportunidade total e produção comprometida com a restauração. A seguir, a memória de cálculo para estimar o uso e cobertura dos passivos em APP e RL, por município:
Cálculo das áreas agrícolas reduzidas com restauração, por município:

Onde:
Al,m = área de lavoura reduzida com restauração, por município;
At = área total de passivo florestal em: RL (segundo Nunes et al, 2016); APP mínima e APP máxima (segundo Nunes et al, no prelo).
Pl = percentual da área de lavoura avaliada no TerraClass (Inpe, 2014) em relação à área dos usos considerados passíveis de restauração (agricultura anual, desflorestamento, mineração, reflorestamento e pasto). Como pasto consideramos as classes: pasto com solo exposto, pasto limpo, pasto sujo, regeneração com pasto, definidas no projeto Terra Class;
pl,m = percentual da área de lavoura do estado do Pará em cada município avaliado individualmente.

 

Cálculo de áreas não agrícolas (agricultura anual, desflorestamento, mineração, reflorestamento e pasto) afetadas com restauração, por município:

Onde:
Au,m = área afetada com restauração, por município e por classe de uso do solo (agricultura anual, desflorestamento, mineração, reflorestamento e pasto). Como pasto consideramos as classes do TerraClass (Inpe, 2014): pasto com solo exposto, pasto limpo, pasto sujo, regeneração com pasto;
At = área total de passivo florestal em: RL (segundo Nunes et al, 2016); APP mínima e APP máxima (segundo Nunes et al, no prelo);
Pu = percentual da área total de cada classe de uso do solo que será afetada em relação à área total dos usos considerados passíveis de restauração (agricultura anual, desflorestamento, mineração, reflorestamento e pasto). Como pasto consideramos as classes: pasto com solo exposto, pasto limpo, pasto sujo, regeneração com pasto;
pu,m = percentual da área total do uso a ser estimado no município.

2.6 Estimativa da receita dos Sistemas Agroflorestais (SAFs)

Para avaliar o ganho econômico-financeiro dos SAFs, lenvantamos dados econômicos na literatura e identificamos uma ampla variedade de arranjos de SAF com exploração de diferentes espécies frutíferas, madeira e produtos não madeireiros. Selecionamos três trabalhos para ilustrar a estimativa de ganho financeiro com SAFs: Varela & Santana (2009), Francez & Rosa (2011) e Paraense et al (2013). Selecionamos estes trabalhos por disporem de dados econômicos e serem estudos de caso no estado do Pará. No total, os trabalhos selecionados abrangem 24 arranjos produtivos com 25 espécies diferentes.
Varela & Santana (2009) apresentam dados para Tomé-açu (próximo à região Bragantina – nordeste paraense), com 16 espécies. Francez & Rosa (2011) apresentam dados para a região Bragantina, com 13 espécies. Por fim, Paraense et al (2013) apresentam dados do consórcio das espécies Swietenia macrophylla (produz a madeira conhecida como mogno) e Theobroma cacao (produz o fruto conhecido como cacau), em Medicilância, na Transamazônica.

2.7 Análise de disponibilidade de habitat

Para comparar o custo da restauração com a sua efetividade em termos ecológicos, utilizamos a abordagem de análise custo-eficácia, relacionando o custo total da restauração com os indicadores de disponibilidade de habitat para fauna. A análise de custo-eficácia é utilizada quando os benefícios do investimento/gastos não podem ser medidos em termos monetários, ou, ainda, em casos em que a tentativa de medida monetária exata seria complicada ou alvo de grande discórdia.

2.7.1 Definição do desenho amostral

 

A área do estado do Pará foi dividida em hexágonos de 10.000 ha, em que cada hexágono representou uma paisagem diferente, isto é, uma unidade de análise. Utilizamos dois critérios para definir o tamanho dos hexágonos: i) a unidade de análise deve ser grande o suficiente para quantificar a disponibilidade de habitat para as espécies com maior capacidade de dispersão; e ii) outros estudos no Brasil que modelaram a disponibilidade de habitat têm utilizado hexágonos com o mesmo tamanho para representar as paisagens (ex. Crouzeilles et al, 2014; Almeida-Gomes et al, 2016). A análise só considerou os hexágonos com mais de 50% de área dentro do Pará. No total, calculamos a disponibilidade de habitat em 12.400 hexágonos referentes a 143 municípios. Consideramos o município de Mojuí dos Campos ainda como parte de Santarém, pois foi criado oficialmente em 2012.

 

2.7.2 Estimativa da disponibilidade de habitat

 

A disponibilidade de habitat está baseada na Teoria de Grafos, que considera um grafo como um conjunto de vértices ou manchas que podem representar qualquer elemento (ex. remanescentes florestais) e pode ser conectado por ligações (ex. fluxo biológico) (Crouzeilles et al, 2013). A disponibilidade de habitat depende de um atributo do fragmento florestal (ex. tamanho ou qualidade do remanescente florestal) e também da conectividade desse fragmento na paisagem, influenciada pela capacidade de dispersão das espécies.
A conectividade da paisagem é o grau em que a paisagem facilita ou impede o movimento dos indivíduos entre os vértices (Taylor et al, 1993). A conectividade da paisagem pode ser dividida em estrutural, determinada pela disposição física dos elementos da paisagem; e funcional, determinada pela resposta das espécies aos elementos da paisagem (Crouzeilles et al, 2010, 2013). Em alguns casos ocorre a conectividade estrutural, mas não a conectividade funcional, e o oposto também é viável (Crouzeilles et al, 2013). Por exemplo, dois remanescentes florestais podem estar ligados por um corredor florestal (há conectividade estrutural), porém a espécie pode não utilizar esse corredor por ele ser muito estreito, então não há conectividade funcional.
A disponibilidade de habitat foi estimada a partir do índice Probability of Connectivity (PC; Saura & Pascual-Hortal, 2007). Os dados de entrada necessários para quantificar esse índice são dois: o tamanho dos fragmentos florestais (ou vértice) e a distância entre os fragmentos. Os tamanhos dos remanescentes florestais foram considerados como o atributo do fragmento, e a distância Euclidiana entre a borda de dois fragmentos, como o atributo de distância. Sendo que a probabilidade de dispersão direta (qij) entre dois fragmentos i e j é a seguinte:

Em que: dij é a distância entre o fragmento i e j e 1/β é a capacidade média de dispersão da espécie. Logo, PC é calculado como:

Em que: n é o número de fragmentos, ai e aj são os respectivos atributos do fragmento (tamanho do remanescente florestal), Pij* é a probabilidade máxima do produto de todos os caminhos possíveis entre os fragmentos florestais ai e aj, e AL2 é o quadrado da área geográfica da paisagem (Saura & Pascual-Hortal, 2007). A probabilidade de a espécie incorrer em um caminho – definida como uma possível trajetória de um fragmento para outro – é o produto das probabilidades de ligação através da dispersão para todos os fragmentos florestais em um caminho. Assim, a probabilidade máxima é também o caminho com maior probabilidade de ligação dentre todas as possibilidades de ligação entre dois fragmentos específicos. Os valores de PC podem variar de 0 (nenhum habitat disponível) até 1 (toda a paisagem é ocupada pelo habitat ou floresta).
A contribuição relativa da disponibilidade de habitat foi comparada variando os cenários (situação atual e cenários futuros de restauração das APPs) e a capacidade de dispersão das espécies. A situação atual considerou a quantidade e configuração atual dos remanescentes florestais, enquanto que os cenários futuros consideraram a situação atual dos remanescentes mais as APPs localizadas em áreas ripárias que serão restauradas para adequação ambiental dos imóveis rurais. Ainda, foram considerados dois cenários futuros: APP mínima e APP máxima. Para avaliar como a disponibilidade de habitat varia de acordo com a capacidade de dispersão, simulamos diferentes capacidades de dispersão de espécies hipotéticas de 100, 1.000 e 3.000 m. Esses valores representaram espécies que têm baixa, média e alta capacidade de dispersão (ex. Crouzeilles et al, 2010, 2014).
Como o objetivo dessa etapa foi avaliar o efeito da capacidade de dispersão, os outros requisitos ecológicos das espécies foram constantes, como o tamanho mínimo do fragmento (remanescente florestal) detectado. Portanto, todas as espécies simuladas e comparadas foram especialistas de floresta e poderiam utilizar remanescentes ≥3 ha. Os valores de dispersão corresponderam à capacidade média de dispersão das espécies de fauna, resultante de uma probabilidade de 50% de trânsito direto entre dois fragmentos de floresta gerada através de função exponencial negativa (Ver equações anteriores). Utilizamos o mapa de APPs a serem restauradas de Nunes et al (no prelo) para representar os remanescentes florestais como fragmentos de habitat potencialmente disponíveis para as espécies simuladas. Realizamos as análises de disponibilidade de habitat utilizando os softwares R 2.12 environment (R Development Core Team 2011) e Conefor Sensinode versão de linha de comando 2.5.8 (www.conefor.org; Saura & Torné, 2009).

3. Resultados

3.1 Custos da restauração

3.1.1 Custo de implantação em diferentes condições e cenários

O custo da restauração florestal no Pará em 2015 variou de R$ 2.280 a R$ 11.243/ha, dependendo do método adotado (Figura 3, Apêndice I). Consideramos o mesmo custo por hectare de restauração em APP e RL, pois apesar de as mudas utilizadas em APP serem diferentes das espécies em RL, o custo médio é o mesmo para espécies nativas. Esses custos incluem o plantio no ano um e a manutenção e monitoramento por dois anos seguintes. Na prática, os custos por hectare devem reduzir na restauração em larga escala, pois os custos fixos associados à mão de obra e compra de insumos são diluídos na maior produção de mudas. Por exemplo, notamos que o custo médio da muda de espécies nativas reduziu de R$ 1,50 para R$ 0,48/unidade quando comparamos os experimentos do Laboratório de Ecologia e Restauração Florestal (LERF) da Esalq/USP em fazendas de Paragominas com áreas maiores da empresa de reflorestamento Amata. A estrutura de custos foi feita baseada em informações de campo da LERF/Esalq em Paragominas (PA) e consultas a empresas privadas que atuam na Amazônia (Apêndice I).
A produção de mudas e sementes em larga escala é importante para reduzir custos e aumentar a oferta de insumos para a restauração do passivo ambiental do estado. Segundo o Ipea (2015), o Pará tem o terceiro maior número de viveiros do Brasil (106), porém se reproduzirmos a produtividade média dos viveiros pesquisados na região Norte para o estado do Pará, 440 mil mudas/viveiro/ano[1], estimamos que a oferta não atenda a demanda anual por áreas a serem restauradas. Se os 3 Mha de passivo fossem restaurados com plantio total, a demanda anual seria de 249 milhões de mudas por ano, contra 46 milhões de mudas anuais produzidas – 106 viveiros multiplicado por 440 mil mudas/ano – ou cinco vezes a capacidade média anual do Pará. Obviamente, neste momento, o maior problema ainda é como tornar essa demanda potencial por restauração em demanda efetiva, pois muitos produtores ainda estão aguardando pelas Cotas de Reserva Ambiental (CRA) ou outros mecanismos de compensação mais baratos.
A definição do método de restauração depende da condição do solo, situação do entorno (ex. se existe fontes de propágulos – plântulas e sementes – ao redor), histórico de intensidade e uso do solo e potencial de regeneração natural da área (Brancalion, 2015; TNC, 2013). Por exemplo, o plantio total da área (método I na Tabela 2) deve ocorrer em áreas sem potencial de regeneração natural da vegetação (baixa resiliência). Isto ocorre normalmente em áreas com longo período de uso agrícola ou pastagem. As opções de enriquecimento (método II e III na Tabela 2) ocorrerão em áreas com alguma resiliência, mas baixa densidade de espécies, baixa diversidade e necessidade de controle de espécies invasoras. Por fim, as opções de condução da regeneração natural (métodos IV e V) são indicadas para áreas com alto poder de regeneração natural e alta resiliência, nas quais o isolamento da área só será necessário se houver fatores de perturbação presentes (ex. cercamento devido à presença de gado). Não consideramos aqui a proximidade da área com fragmentos de florestas que podem afetar a resiliência da área restaurada, baixando o custo com plantio.
Dessa forma, a definição do melhor método de restauração deve seguir orientação técnica especializada. Para estimar os custos totais da restauração, consideramos os cenários propostos pelo Planaveg (Brasil, 2014) para a distribuição de área a ser restaurada em função dos diferentes métodos de restauração (Tabela 2).

 Tabela 2. Descrição dos métodos de restauração considerados nas análises e área percentual correspondente nos diferentes cenários do Planaveg

 3.1.2 Custo de transporte

Estimamos que o custo com transporte de mudas pode aumentar de 1% a 11% do custo por hectare da restauração em função da distância das principais regiões produtoras de mudas do Pará (Figura 2). Definimos a distância de transporte a partir de três polos viveiristas, nas regiões de Paragominas, Medicilândia e região Bragantina (extendida até Tomé-açu), evidenciados pelo levantamento do Ipea sobre produção de mudas e sementes florestais nativas no Brasil (Ipea, 2015). Os resultados são próximos ao valor do frete de insumos agrícolas nas regiões, por exemplo, no sudeste do estado o preço do frete varia de R$ 200 a R$ 300/ton, segundo alguns produtores[2]. Todavia, ressaltamos que as regiões com maior custo de transporte (centro e oeste do estado), provavelmente são aquelas com maior resiliência e potencial para regeneração natural. Isto devido ao histórico de desmatamento recente e à maior proximidade a grandes fragmentos florestais. Ou seja, provavelmente são regiões onde haverá pouca ou nenhuma demanda por muda e semente de locais distantes. Para a modelagem econômica do custo total da restauração no Pará, optamos por ser conservadores e consideramos um valor de R$ 200/ha para frete de mudas (Apêndice I). Esse valor é comum no frete de produtores do sudeste paraense.
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[1] O Ipea (2015) entrevistou representantes de 25 viveiros no Norte, com capacidade total de 11,19 milhões de mudas, uma média de 440 mil mudas por viveiro.
[2] Comunicação pessoal com alguns produtores do Sindicato de Produtores Rurais de São Félix do Xingu.

Figura 2. Mapa de custo de transporte de mudas a partir dos principais pontos de viveiros mapeados pelo Ipea. O custo por tonelada é aproximadamente o mesmo custo por hectare se considerarmos que uma tonelada equivale a mesma quantidade de mudas para plantio de um hectare (aproximadamente 1.666) (Os valores foram atualizados para 2015 pelo IGP-M)
Fonte: elaborado pelos autores com dados do Ipea (2015), Brandão & Souza (2006), Coppead/UFRJ (2006) e Aprosoja (2016).

3.1.3 Custo da restauração em Reserva Legal nos imóveis já cadastrados

Considerando os diferentes cenários do Planaveg (Ver Tabela 2), a restauração dos ~2,3 milhões de hectares de RL no Pará demandará entre R$ 5,2 bilhões e R$ 6,9 bilhões[3] (Tabela 3). Consideramos esses custos diluídos ao longo de 22 anos (Tabela 3, Figura 3), pois o Código Florestal brasileiro define que a restauração poderá ocorrer ao longo de 20 anos (pelo menos 10% da área a cada dois anos). Porém, após o período definido por lei, consideramos ainda dois anos de gastos com manutenção dos últimos 10% de área restaurada no ano 20. Assim, o volume de investimento anual para restauração de RL no Pará varia de R$ 236 milhões a R$ 268 milhões (em valor presente), considerando que o custo por hectare da restauração depende da condição e do método adotado, variando de R$ 2,2 mil a R$ 11 mil/ha (Figura 4, Apêndice I). O Apêndice I apresenta a tabela com o detalhamento desses custos.
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[3] Valor Presente para 2015, com taxa de desconto de 8,5% a.a.

Figura 3. Fluxo de gastos com restauração florestal de Reserva Legal nos imóveis inseridos no Cadastro Ambiental Rural do Pará, ao longo de 22 anos, em diferentes intervenções para restauração baseadas no Planaveg (Preços a valores correntes)

Figura 4. Custos de restauração (R$/ha) em diferentes métodos, sem exploração madeireira

Tabela 3. Custo da restauração de RL nos imóveis inseridos no Cadastro Ambiental Rural do Pará, em diferentes cenários do Planaveg e ponderado pelos diferentes métodos de restauração descritos na Tabela 2. Valores correntes e Valor Presente (Taxa de 8,5% a.a.)

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[4] O Apêndice I detalha os custos em diferentes métodos de restauração.

3.1.4 Custo da restauração de APPs em todo o estado

O estado do Pará possui entre 760 mil e 1 milhão de hectares de APPs alteradas e passíveis de restauração (Nunes et al, no prelo), demandando entre R$ 2,5 bilhões e R$ 4,4 bilhões ao longo de onze anos (valor presente para 2015 a 8,5% a.a.; Tabela 4 e Figura 5) dependendo do método e da área considerada (APP mínima ou máxima). Projetamos os custos de restauração em diferentes cenários, de acordo com a previsão do Planaveg de uso das diferentes técnicas de restauração (Ver Tabela 2). O Decreto nº 1.379 (Pará, 2015) define o tempo de nove anos para a implantação da restauração de APPs, porém, consideramos dois anos adicionais de gastos com manutenção dessas áreas. O avanço do CAR nos próximos anos, assim como o mapeamento preciso das áreas com potencial de regeneração natural e levantamentos regionais do custo da restauração, serão importantes para definir com maior precisão o custo da restauração em APP e planejar a restauração em larga escala.
Os municípios do estado com maior área e demanda por investimento para recuperação de APPs também são aqueles que apresentam altas taxas de desmatamento e aparecem nas listas prioritárias de fiscalização federal (Apêndice III). Entre os dez primeiros estão São Félix do Xingu, Altamira, Marabá, Novo Repartimento. Para esses municípios, as ações conjuntas do governo e setor privado são emergenciais para desenvolver a governança e o planejamento de projetos de restauração florestal.

Tabela 4. Custo da restauração de APP no Pará, em diferentes cenários do Planaveg e ponderado pelos diferentes métodos de restauração. Valores correntes e Valor Presente (taxa de 8,5% a.a.)

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[5] A Tabela 2 detalha os custos em diferentes métodos de restauração.

Figura 5. Fluxo de gastos com restauração florestal de APPs no estado do Pará, ao longo de 11 anos, em diferentes intervenções para restauração baseadas no Planaveg (Preços a valores correntes)

3.2 Custos de oportunidade da terra

Estimamos os custos de oportunidade com a restauração de APP e RL no estado do Pará entre R$ 4,8 bilhões e R$ 5,3 bilhões (R$ 1,18 Bi a R$ 1,65 Bi em APP; mais R$ 3,68 Bi em RL), bem como reduzimos cerca de 2,3 milhões de hectares da área com uso agropecuário em RL e mais 700 mil a 1 milhão de hectares em APP que podem estar com uso agropecuário (Tabelas 5 e 6). Para estimar os custos de oportunidade da terra, utilizamos uma média entre a receita líquida ponderada das culturas agrícolas e o preço da terra (Figura 6). De maneira geral, é mais seguro afirmar que o valor final do custo de oportunidade deverá ficar entre o preço da terra e as receitas líquidas esperadas da atividade econômica agropecuária. A partir dos dados de uso e cobertura do solo (Inpe, 2014), identificamos que o oeste do estado e a região próxima ao Salgado paraense (nordeste do estado) apresentam menor custo de oportunidade, o que leva à conclusão de que essas áreas serão as mais baratas para compensação (Figura 7).
Do ponto de vista estritamente econômico, a restauração deveria iniciar pelas regiões de menores custos de oportunidade, permitindo um maior tempo para implantação de programas de compensação das perdas decorrentes da restauração nas regiões de maior valor da terra. Contudo, deve ser considerada a eficácia ambiental da restauração, ou seja, onde há maiores ganhos para a conservação da biodiversidade, clima, carbono, maior fragmentação etc. O censo comum é que as áreas com maior fragmentação, desmatamento e custo de oportunidade (devido à presença de agricultura e infraestruturas) também são áreas mais degradadas e com maior ganho ambiental da restauração. Assim, a seção 3.4 deste relatório é dedicada à avaliação de custo-eficácia, identificando áreas com maior ganho ambiental para restauração.
A restauração das APPs no Pará reduzirá entre 5,3% e 7,5% da área com produção agropecuária do estado (Tabela 5), com um custo de oportunidade equivalente que varia de 4,5% a 6,3% do valor total da produção. A restauração de APPs também afetará de 1,6% a 2,2% da produção agrícola e de 4,6% a 6,4% do rebanho da pecuária. Em paralelo, calculamos que a restauração da RL analisada reduzirá aproximadamente 15,7% da área de produção agropecuária do estado, afetando 14% do valor da terra (custo de oportunidade, na Tabela 6). As áreas de RL a serem restauradas afetarão 8,1% da produção agrícola e 15,8% do rebanho. A diminuição da área agrícola pela restauração em larga escala pode ter dois efeitos: i) aumentar o valor das áreas agrícolas ao reduzir a oferta de área agricultável, o que atenuará parte das perdas; e/ou ii) estimular novos desmatamentos por causa do aumento do valor da terra, em áreas com menor monitoramento e fiscalização.
Todavia, as perdas relacionadas à produção poderão ser facilmente compensadas com o aumento da produtividade. Por exemplo, a pecuária tem potencial de aumentar sua produtividade de 75 Kg/ha para 300 Kg/ha e atender a demanda por carne da Amazônia sem novos desmatamentos (Barreto & Silva, 2013). Assim, a implementação da restauração deverá ocorrer integrada a programas de incentivo à adoção de tecnologias e boas práticas produtivas, especialmente na pecuária, que detém 95% da área total a recompor de APPs. Além disso, o planejamento da restauração deve priorizar, sempre que possível, as áreas de baixa aptidão agrícola.

Tabela 5. Custos de oportunidade da terra com a restauração de APPs no Pará. Informações de uso e cobertura do solo em 2012 (Valores (R$) atualizados para 2015 pelo IGP-M)

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[6] Desconsideramos classes de uso que não serão restauradas e áreas de floresta, a saber: área não observada, área urbana, floresta, mosaico de ocupações, não floresta, outros e vegetação secundária. No caso da vegetação secundária pode haver a necessidade de enriquecimento florestal, porém essa classe de uso foi desconsiderada na análise de custo de oportunidade por não haver perdas econômicas nessas áreas. As classes deflorestamento, mineração e reflorestamento não têm informação produtiva parcial ou completa. Como pasto consideramos as classes: pasto com solo exposto, pasto limpo, pasto sujo, regeneração com pasto.

 Tabela 6. Custo de oportunidade da terra com a restauração de RL no Pará (Informações de uso e cobertura do solo em 2012. Valores (R$) atualizados para 2015 pelo IGP-M)

Figura 6. Estimativa média do custo de oportunidade da terra no Pará para agricultura e pastagem, em três abordagens: 1) receita líquida ponderada das culturas agrícolas e da pecuária (leite e corte); 2) preço de compra e venda da terra; e 3) média das duas anteriores

Fonte: elaborado pelos autores com dados do Agrianual (2015), IBGE (s.d b; s.d c), Conab (2015) e Embrapa (s.d.).

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[7] Idem nota de rodapé 6.

Figura 7. Mapa de custos de oportunidade da terra com a restauração no Pará. Os valores mudam de acordo com o município e uso do solo (Valores (R$) atualizados para 2015)

Fonte: Elaborado pelo autor com dados do Agrianual (Agrianual, 2015), TerraClass (Inpe, 2014), IBGE (s.d b; s.d c), Embrapa (s.d.) e Conab (2015).

3.3 Benefícios financeiros da restauração

3.3.1 Receita potencial do sequestro de carbono em RL

Estimamos uma receita potencial de R$ 4,8 bilhões (em valor presente) proveniente do sequestro de carbono nas áreas de RL a serem restauradas durante 22 anos (Figura 8). A receita cobriria de 70% a 92% dos custos da restauração dependendo do cenário previsto pelo Planaveg (Figura 8 e Apêndice IV). O custo médio da restauração reduziria para: R$ 2.010/ha no cenário A; R$ 1.263/ha no cenário B; e R$ 405/ha no cenário C do Planaveg. No Pará, acreditamos que o cenário mais provável de ocorrer na maioria das regiões é o C, devido ao alto potencial para regeneração natural. O Apêndice IV apresenta a tabela com os valores desses custos, receitas e sequestro de CO2 equivalente.
Todavia, a maior importância do sequestro de carbono é a contribuição para as metas brasileiras de mitigação das mudanças climáticas, posicionando o Brasil nos acordos internacionais, pois, de fato, há muitas incertezas sobre o mercado de crédito de carbono e sua regulamentação. Para calcular a receita potencial por sequestro de carbono consideramos o preço de US$ 5,00/tCO2 equivalente, dado pelo BNDES (2014) no Fundo Amazônia. Esse valor convertido para reais correspondeu a R$ 12,95/tCO2 equivalente[8], que é alto quando comparado com as tendência internacionais, mas foi o valor de referência encontrado em uma instituição do governo (BNDES) para beneficiários privados[9]. Um exemplo de como o preço do carbono tem oscilado é a Bolsa de Chicago (Chicago Climate Exchange), na qual o valor caiu de aproximadamente US$ 4,00 em 2009 para US$ 0,10 por tonelada em 2010. Um valor que, se usado em nossa modelagem, pagaria menos de 2% do custo da restauração no Pará (Figura 8). Essa queda nos preços do carbono negociado ocorreu pela descrença no mercado após a COP-15, em Copenhagen, e também pela crise financeira de 2008 e 2009. O volume de transações na Bolsa do Clima de Chicago caiu de 60 milhões de toneladas em 2010 para 66 mil toneladas em 2013 (ICE, 2016). Apesar disso, o valor do BNDES é a referência oficial que temos para pagamento de carbono.
Não consideramos aqui outras potenciais fontes de receitas, como o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) relacionado à água ou mesmo pagamento por desmatamento evitado (REDD+). Além disso, quando o mercado de cota de reserva ambiental for regulamentado no estado, facilitará a compensação do déficit em áreas com ativo florestal (excedente de floresta além do exigido pela lei), diminuindo a área a ser restaurada e baixando o custo total da restauração no estado. Nesse cenário, o sequestro de carbono advindo da restauração também é reduzido junto com a receita potencial correspondente.
Para estimar o carbono sequestrado e CO2 equivalente, utilizamos os valores de crescimento das espécies e tempo médio de maturidade das árvores nos diferentes grupos de espécies – ciclo curto, médio e longo (Tabela 7). De fato, as estimativas são conservadoras, pois calculamos que ao final do ciclo de 11 anos o carbono equivalente sequestrado é de 92 ton/ha, enquanto a média de carbono por hectare estipulada pelo inventário brasileiro de emissões é de 124 ton./ha na Amazônia (Brasil, 2010). Segundo o IPCC (2006), a convenção é que o carbono corresponde a 50% da biomassa e o dióxido de carbono (CO2) equivale a aproximadamente 3,66 vezes o valor desse carbono.
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[8] Devido à variação cambial, utilizamos o preço médio do dólar nos últimos três anos: R$ 2,59 para U$ 1,00. Os dados são do Banco Central, disponíveis em: <http://www4.bcb.gov.br/pec/taxas/port/ptaxnpesq.asp?id=txcotacao>.
[9] Há uma ampla discussão sobre quem deve ser o beneficiário do crédito de carbono, como comunidades tradicionais, governo ou atores privados e posseiros de terra. Para mais, consulte autores como Wunder et al (2008), Altmann (2011), Lima (2009) e Brito & Lima (2011).

 Tabela 7. Biomassa acima do solo acumulada e indicadores utilizados para cálculo do sequestro de carbono

Figura 8. Valor presente acumulado dos custos (em diferentes cenários do Planaveg) e receita potencial por crédito de carbono em RL a ser restaurada nos imóveis cadastrados no CAR. A receita foi estimada em dois cenários de preço: US$ 5/tCO2 pelo BNDES e US$ 0,10/tCO2 pela Bolsa de Chicago (Taxa de câmbio de R$ 2,59; taxa de desconto de 8,5% ao ano)

 3.3.2 Receita potencial do sequestro de carbono em APPs

Nossa estimativa de receita potencial por carbono sequestrado em APPs restauradas variou de R$ 1,8 bilhão a R$ 2,6 bilhões, em 11 anos (Figuras 9 e 10), em valores presentes. De acordo com o Código Florestal, a dimensão da APP a ser preservada depende do tamanho do imóvel rural, por isso calculamos os valores de custo e benefícios para a APP mínima e máxima. A receita de carbono sequestrado compensou até 74% dos gastos com a restauração de APP (Figura 9, Figura 10). O Apêndice IV apresenta a tabela com os valores desses custos, receitas e sequestro de CO2 equivalente.
O preço da tCO2 que pagaria o custo da restauração foi estimado entre R$ 14,81 e R$ 19,64 ao longo de 11 anos nas APPs restauradas, nos diferentes cenários do Planaveg – R$ 14,81/ tCO2 no cenário A, R$ 17,23/tCO2 no cenário B e R$ 19,64/tCO2 no cenário C. Para esse cálculo, cruzamos os custos da Tabela 4 com as estimativas de sequestro de CO2 equivalente do Apêndice IV, e os valores não variaram em função do tamanho da APP restaurada. Apesar de a receita do sequestro de carbono não pagar a restauração, o custo médio da restauração reduziria para: R$ 1.485 a R$1.824 /ha no cenário A; R$ 1.074 a R$ 1.515/ha no cenário B; e entre R$ 664 e R$ 936/ha no cenário C do Planaveg (Apêndice IV).
Utilizamos o mesmo preço de tCO2 e conversões aplicados na estimativa para restauração de RL. Para estimar o carbono sequestrado e CO2 equivalente, utilizamos os valores de crescimento das espécies e tempo médio de maturidade das árvores nos diferentes grupos de espécies – ciclo curto, médio e longo (Ver Tabela 7).

Figura 9. Valor presente acumulado dos custos (em diferentes cenários do Planaveg) e receita potencial por crédito de carbono em APP mínima a ser restaurada no estado do Pará. A receita foi estimada em dois cenários de preço: US$ 5/tCO2 pelo BNDES e US$ 0,10/tCO2 pela Bolsa de Chicago (Taxa de câmbio de R$ 2,59; taxa de desconto de 8,5% ao ano)

Figura 10. Valor presente acumulado dos custos (em diferentes cenários do Planaveg) e receita potencial por crédito de carbono em APP máxima a ser restaurada no estado do Pará. A receita foi estimada em dois cenários de preço: US$ 5//tCO2 pelo BNDES; ou US$ 0,10//tCO2 pela Bolsa de Chicago. Taxa de câmbio de R$ 2,59; taxa de desconto de 8,5% ao ano.

3.3.3 Receita potencial da exploração madeireira em Reserva Legal

Estimamos os ganhos e riscos financeiros da exploração madeireira em área a ser restaurada a partir da premissa legal de exploração madeireira em área destinada à restauração florestal (Lei nº 12.651/2012). Consideramos a exploração em 50% da área de RL a ser restaurada, de acordo com a experiência da empresa Bioflora (especializada em restauração e localizada no estado de São Paulo) em áreas do município de Paragominas (Pará). Porém, o Código Florestal não restringe a área de exploração de espécies nativas. Apenas para o plantio de espécies exóticas o limite é 50% da área. Consideramos seis arranjos produtivos no plantio de nativas para restauração[10], descritos nas Tabelas 8 e 9. Ressaltamos que, apesar desses modelos atenderem à lei, não há informação da eficiência dos modelos de restauração com exploração madeireira na conservação da biodiversidade.
_____________________
[10] Essas espécies foram analisadas de acordo com a disponibilidade das informações sobre preço, produtividade e experiências de campo da Amata e LERF/Esalq, no Pará. As informações de preço da madeira foram extraídas do relatório Fatos Florestais 2010 (Imazon, 2010) e atualizadas pelo IGP-M para 2015; enquanto as informações produtivas (tempo de exploração, Incremento Médio Anual etc.) foram extraídas do relatório Guia de árvores com valor econômico (Campos-Filho & Sartorelli, 2015). Para a modelagem, excluímos espécies sem ocorrência na Amazônia, sem informação do Incremento Médio Anual (IMA) e com prazo de produção acima de 20 anos.

O VPL anualizado da exploração de espécies madeireiras em RL variou entre -R$ 962 (negativo) e R$ 2.110 por hectare nos diferentes modelos de exploração considerados (Figura 11). Os custos de implantação da restauração são maiores nos modelos com exploração econômica madeireira, de R$ 16.655 a R$ 33.826/ha (Tabela 8 e Figura 12), porém há retorno financeiro. O cumaru (Dipteryx alata), o cedro (Cedrela fissilis) e a copaíba (Copaifera langsdorffii) foram os casos com prejuízo devido à baixa TIR, menor que a taxa de desconto considerada (8,5% a.a.). Nos casos de espécies com ciclo de exploração de até 10 anos, como o marupá (Simarouba amara) e paricá (Schizolobium amazonicum), o VPL anualizado ficou competitivo com os ganhos médios da pecuária intensificada e da agricultura. A pecuária na Amazônia apresenta ganhos (em VPL anual) que variam de negativo, em práticas extensivas mais comuns, a R$ 1.700/ha em áreas intensificadas (Silva & Barreto, 2014); enquanto a agricultura tem o rendimento médio de R$ 1.500/ha em valores correntes de 2014 (Agrianual, 2015). Apesar do retorno competitivo do marupá e paricá, o manejo florestal e silvicultura são menos atrativos do que a agricultura devido à baixa liquidez da madeira, ou seja, receita em 10 a 20 anos, enquanto a agricultura provém ganhos anuais. Ao mesmo tempo, o plantio comercial de madeira compete com o manejo de floresta primária, muitas vezes ilegal na Amazônia, o que gera uma competição injusta. Assim, é provável que na maioria dos casos esta atividade seja complementar ou secundária em fazendas de agropecuária que queiram destinar a RL para algum uso econômico. De maneira geral, para que o manejo sustentável se torne uma realidade, os governos precisam coibir a exploração ilegal de madeira, que gera uma competição injusta.
Os custos para restauração com exploração madeireira incluem a implantação no primeiro ano, o monitoramento e manutenção das áreas no segundo ao ano anterior ao corte e o gasto com replantio de mudas no ano do corte (Figura 12, Apêndice I). O aumento dos custos ocorre por causa da necessidade de manutenção e monitoramento anual da área até a data de corte. Além disso, após o corte deve ocorrer o replantio de mudas que substituam as árvores cortadas.

Figura 11. Valor Presente Líquido (VPL) anualizado, Taxa Interna de Retorno (TIR) e risco de inviabilidade financeira (probabilidade percentual) na restauração com exploração de diferentes espécies madeireiras. Taxa de desconto de 8,5% ao ano. Para o risco foi calculado mil vezes o VPL anualizado (R$/ha) com variações aleatórias no preço, custo e produtividade. Espécies avaliadas: cumaru (Dipteryx alata), marupá (Simarouba amara), sucupira (Bowdichia virgilioides), cedro (Cedrela fissilis), copaíba (Copaifera langsdorffii), paricá (Schizolobium amazonicum)

Fonte: Elaborado pelo autor com dados de campo de Paragominas, combinados com informações da LERF (Esalq), Bioflora, Amata, Imazon e Agroicone.

Tabela 8. Receita (R$/ha) e produtividade para diferentes modelos de restauração com exploração madeireira em 50% da área

 Tabela 9. Modelos de recuperação com plantio de espécies nativas e exploração madeireira, todos com exploração de 833 indivíduos por hectare, em 50% da RL a ser restaurada

Figura 12. Custos de implantação e manutenção de restauração com exploração econômica de madeira, em R$/ha (O Apêndice I apresenta a tabela com o detalhamento desses custos)

3.3.3.1 Análise de sensibilidade dos modelos de restauração com exploração madeireira

A maior incerteza nos modelos de restauração com exploração da área está nos preços voláteis do mercado de madeira nativa e na produtividade, visto que há pouco desenvolvimento de tecnologias para exploração comercial dessas espécies. Por exemplo, a produtividade do paricá que apresentamos está próxima ao que o Projeto Verena (WRI, 2016) constatou nas áreas da Amata (~25 m³/ha/ano), mas abaixo da produtividade das áreas de plantio da empresa Simbyosis (10 m³/ha/ano, segundo o WRI (2016)). Entre as explicações para esta variação estão: i) fatores edafoclimáticos, pois a Amata e a Simbyosis atuam em regiões diferentes, na Amazônia e na Bahia, respectivamente; e ii) tempo de pesquisa e desenvolvimento, pois a área da Simbyosis é recente (~5 anos) em comparação ao tempo e investimento da Amata nessa espécie.
Diante dessas incertezas, estimamos o risco financeiro de esses modelos apresentarem inviabilidade econômica entre 0% e 99% dependendo da madeira explorada na RL (Ver Figura 11). A avaliação do risco é feita repetindo-se mil vezes o cálculo do VPL com oscilação nos valores de preço (R$/m³), custo e produtividade (m³/ha). Além dessa análise, testamos a sensibilidade desses investimentos aos principais fatores de incerteza e notamos que a maior variação do VPL foi em função da taxa de juros e do preço de venda da madeira (Figura 13). Isso mostra que o modelo de financiamento é importante, pois a taxa de juros (ou taxa de desconto) representa o retorno esperado do investidor e pode definir a viabilidade e efetividade da restauração. Além disso, é possível pensar mecanismos de incentivo à restauração por meio da redução das taxas de juros de financiamentos para compensar progressivamente o produtor que for restaurando seu passivo florestal. Este tipo de mecanismo é previsto no artigo 41 da Lei nº 12.651/2012, mas ainda tem sido pouco desenvolvido por especialistas. Nesse teste de sensibilidade usamos como taxa de juros mínima 7,5% a.a. referente ao Plano ABC Restauração Florestal, enquanto a taxa máxima foi de 13,5% a.a., definida pelo Custo Médio Ponderado do Capital (WACC, em inglês) estipulado no Projeto Verena (WRI, 2016).
Evidenciamos que faltam estudos de mercado para compreender a sensibilidade do preço ao incremento na oferta de madeiras nativas. Entre outras barreiras, o plantio comercial de madeira e a exploração madeireira em RL demandam mão de obra especializada para ganhar escala e grande volume de capital em investimento inicial. Essas barreiras econômicas somadas a distância de insumos e oferta de mudas podem dificultar e inviabilizar a implementação de modelos de restauração com exploração econômica da área.

Figura 13. Valor mínimo e máximo do Valor Presente Líquido (VPL) anualizado diante da variação de quatro incertezas, em modelos de restauração com exploração madeireira de diferentes espécies. Taxa de desconto de 8,5% ao ano e preço da muda a R$ 1,5 nos casos sem variação desses fatores. Espécies avaliadas: cumaru (Dipteryx alata), marupá (Simarouba amara), sucupira (Bowdichia virgilioides), cedro (Cedrela fissilis), copaíba (Copaifera langsdorffii), paricá (Schizolobium amazonicum)

Fonte: Elaborado pelo autor com dados de campo de Paragominas, combinados com informações da Lerf (Esalq), Bioflora, Amata, Imazon e Agroicone.

3.3.4 Receita potencial dos Sistemas Agroflorestais (SAFs)

Com base na literatura, identificamos o retorno financeiro de SAFs no estado do Pará. O retorno médio foi próximo a R$ 2.000/ha em dois casos. Em um terceiro trabalho o valor alcançou R$ 5.354/ha com exploração de mogno (Figura 14). Varela & Santana (2009) demonstraram um retorno médio de R$ 1.962/ha em 18 arranjos de SAFs estudados em Tomé-açu; enquanto Francez & Rosa (2011) apresentam um retorno parecido, de R$ 2.226/ha, na região Bragantina (Figura 14). Apenas Varela & Santana (2009) apresentaram casos de retorno negativo, em cinco de 18 SAFs. No terceiro arranjo demonstrado na Figura 14, de Paraense et al (2013), a exploração do mogno eleva o VPLa para aproximadamente R$ 5 mil/ha (Figura 14). Entretanto, evidenciamos que o fluxo de caixa deste último estudo apresentou uma média de R$ 1.424/ha anual até o ano anterior à exploração do mogno.
No Pará, três regiões são destaque na adoção de SAFs: nordeste, desde o município de Tomé-açu até a região Bragantina; na região de São Félix do Xingu, sudeste paraense; e na Transamazônica, nas proximidades do município de Medicilândia (a oeste do estado, na rodovia Transamazônica). Em Tomé-açu e na região Bragantina prevalecem SAFs com frutíferas e ligados às cooperativas de pequenos produtores, enquanto no sudeste e na Transamazônica o cacau tem destaque devido ao apoio de instituições como a Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac) e organizações não governamentais como o Imaflora.
Os SAFs são uma alternativa para a restauração e melhoria das condições produtivas e econômicas em pequenas propriedades, as quais dependem de maior liquidez (dinheiro de rápida circulação para gastos do dia a dia) para subsistência. Todavia, há limites de escala para a implantação dos SAFs, uma vez que este tipo de produção é intensiva no uso de mão de obra e os gastos podem inviabilizar a atividade em larga escala. Rosa et al (2009) também relacionam a adoção de SAFs com questões educacionais, de organização e aspectos socioculturais. Não sabemos em que extenção os SAFs serão implantados, pois são uma opção legal que pode ser adotada em qualquer imóvel rural, mesmo que sejam mais comumente utilizados em pequenas propriedades. Dessa forma, para efeito de estimativa de receita dos SAFs neste estudo, consideramos sua implantação somente em 50% da área de passivo de RL (223 mil ha) dos pequenos imóveis rurais (até quatro módulos fiscais) e assentamentos, identificados em Nunes et al (2016). Assim, o retorno potencial médio pode alcançar R$ 446 milhões (baseado na receita média de 2.000/ha), com um variação de até R$ 600 milhões de acordo com o arranjo de espécies consorciadas.

Figura 14. Valor Presente Líquido (R$/ha) anualizado de Sistemas Agroflorestais com diferentes arranjos produtivos e espécies (‘n’ é o número de arranjos ou combinações de espécies analisadas em cada trabalho. Os valores foram corrigidos para 2015 e a taxa de desconto foi ajustada para 8,5% a.a)

Fonte: adaptado de Varela & Santana (2009), Francez & Rosa (2011) e Paraense et al (2013).

3.4 Disponibilidade de habitat

A disponibilidade de habitat variou em função dos cenários (situação atual ou restauração das APPs) e diferentes capacidades de dispersão para espécies da fauna (100, 1.000 e 3.000 m) (Tabela 10). No Pará, o indicador de disponibilidade de habitat aumentou com a recuperação de APPs nas três categorias de dispersão das espécies (Tabela 10), no entanto, não variou entre os cenários de APP mínima e máxima restauradas. A variância foi de 4%, e o desvio padrão, de 20% em todos os cenários.
Em virtude das diferentes condições, a disponibilidade de habitat também variou nos 143 municípios (Figura 15). Em geral, os municípios da porção leste tiveram os menores valores percentuais de disponibilidade de habitat, enquanto que os municípios do noroeste tiveram os maiores valores percentuais. Esse comportamento já era esperado uma vez que o leste paraense tem a maior concentração de APP a ser recuperada, enquanto o oeste apresenta a maior concentração de APP conservada (Nunes et al, no prelo). Em geral, espécies com maior capacidade de dispersão (Figura 15) têm maior disponibilidade de habitat, pois têm maior alcance e mobilidade entre fragmentos. Constatamos que no cenário atual os municípios do oeste do estado (i.e. Oriximiná, Santarém e Jacareacanga) têm maior importância para as espécies de maior dispersão (3.000 m).
Os municípios que mais ganharam habitat foram os localizados ao sul da ilha do Marajó; os municípios de Alenquer e Monte Alegre, na Calha Norte, noroeste do estado; e os municípios do centro-sul, como Altamira, Novo Progresso e São Félix do Xingu (Figura 15). A restauração de APPs aumentou a disponibilidade de habitat em aproximadamente 5% em comparação ao cenário atual (Tabela 10), no entanto, o ganho de habitat não variou em função da largura da APP restaurada (cenários com APPs mínima e máxima – Figura 15). Isso não significa que o tamanho da APP não importa para a conservação, pois estamos avaliando classes gerais de espécies segundo a capacidade de dispersão. De fato, se avaliarmos individualmente, diversas espécies precisam de corredores maiores, como as onças e outros animais de corpos maiores, que dificilmente utilizariam corredores de cinco metros de largura para se locomover (Crouzeilles et al, 2015). Além disso, há outras implicações da largura das APPs sobre a conservação de rios, como assoreamento, retenção de resíduos agrícolas e disponibilidade de água, que não avaliamos neste trabalho.
Em paisagens altamente florestadas (>60% de disponibilidade de habitat), a conectividade dos fragmentos tende a ser alta e o aumento da cobertura florestal terá baixa adicionalidade sobre a disponibilidade de habitat (Pardini et al, 2010; Crouzeilles & Curran, 2016). Por outro lado, em paisagens com baixa quantidade de cobertura florestal (< 20%), a conectividade tende a ser muito baixa e a restauração de pequenas áreas de floresta pode não ser suficiente para aumentar a conectividade na paisagem (Pardini et al, 2010; Crouzeilles & Curran, 2016). Portanto, a restauração tende a apresentar maior ganho para a funcionalidade da paisagem quando feita em áreas com disponibilidade de habitat intermediária, entre 20% e 50% (Pardini et al, 2010; Crouzeilles & Curran, 2016). No Pará, essa região abrange os municípios de Cumaru, Altamira, Ourilândia, Parauapebas, São Félix e Novo Progresso (no centro e em direção ao sul do estado). A explicação é que esses municípios apresentam uma combinação de fragmentos florestais grandes e próximos quando comparamos com a região leste (fragmentos menores e dispersos) ou com a região oeste (fragmentos grandes e com maior grau de conectividade).

Tabela 10. Média da disponibilidade de habitat em função dos cenários (situação atual e cenários futuros de restauração das APPs) e espécies com diferentes capacidades de dispersão (100, 1.000 e 3.000 m). O Apêndice V lista por município a disponibilidade de habitat.

Figura 15. Disponibilidade de habitat nos municípios paraenses na situação atual, em dois cenários futuros de restauração das APPs (mínima e máxima) e para espécies com diferentes capacidades de dispersão (100, 1.000 e 3.000 m). Os municípios não avaliados apresentaram problemas de topologia no mapa de remanescentes florestais utilizados, impossibilitando o cálculo correto da disponibilidade de habitat. O Apêndice V lista por município a disponibilidade de habitat.

Quando comparamos os gastos com restauração florestal (advindos dos cenários do Planaveg descritos anteriormente) com o ganho em conectividade da paisagem nessas áreas restauradas, concluímos que cada R$ 1 milhão gasto com restauração gera um aumento aproximado de 1% na disponibilidade de habitat (Tabela 11). Esse ganho ambiental cai pela metade quando é feita a restauração de área máxima de APP, pois a conectividade entre fragmentos é estabelecida mesmo em áreas mínimas de APP e o aumento da APP pode gerar mais custo do que eficácia ambiental neste caso. Poucos municípios na região do Marajó tiveram ganhos acima de 1% (Apêndice VI), contudo, os custos nessa região devem estar subestimados uma vez que as condições biofísicas do solo (i.e. áreas de várzea) devem dificultar o plantio e manejo de espécies. Para o indicador de custo-eficácia (gasto com restauração dividido pelo ganho em disponibilidade de habitat) foi considerada a média dos custos nos diferentes cenários do Planaveg e tamanho da APP a ser restaurada (Tabela 11); indicadores de disponibilidade de habitat nos municípios.

Tabela 11. Ganho médio na disponibilidade de habitat para cada R$ 1 milhão gasto com restauração (custo-eficácia), além da variância e desvio padrão, nos diferentes cenários de restauração. O Apêndice VI lista por município a relação entre custo e aumento da disponibilidade de habitat da restauração florestal.

4. Resumo dos custos e benefícios

Este estudo estimou o custo total (custo de oportunidade mais custo de implantação) para restauração das áreas de passivo ambiental no Pará entre R$ 12,6 e R$ 16,7 bilhões (R$ 3,7 a R$ 6,1 bilhões em APP mais R$ 8,9 a R$ 10,6 bilhões em RL – Figura 16). Estimamos os ganhos potenciais de crédito de carbono entre R$ 6,4 e R$ 7,2 bilhões (R$ 1,8 a R$ 2,6 bilhões em APP e R$ 4,8 bilhões em RL – Figura 16), o que pagaria os custos de implantação da restauração em até 92% para RL e até 74% em APPs dependendo dos cenários do Planaveg. A exploração madeireira pagaria a restauração em RL com lucro de até R$ 2.110/ha (VPLa) no caso do marupá (Simarouba amara), ou até R$ 47,7 bilhões se extrapolarmos essa atividade em 50% do passivo de RL inserido no CAR (Figura 16). Os SAFs podem viabilizar a restauração de RL de pequenas propriedades, mas há limitações econômicas para implantação em larga escala e incertezas sobre onde serão efetivamente implantados. Assim, estimamos o benefício financeiro de SAFs apenas em áreas de passivo de RL das pequenas propriedades (Nunes et al, 2016), classificadas com até quatro módulos fiscais. Com retorno financeiro médio de R$ 2.000/ha, esses sistemas podem gerar até R$ 446 milhões no passivo de pequenos produtores em RL (com desvio padrão de R$ 600 milhões a R$ -30 milhões dependendo do arranjo produtivo de espécies consorciadas). Como benefício ecológico, avaliamos que a disponibilidade de habitat para a fauna tende a aumentar com a restauração das APPs e a relação custo-eficácia é de aproximadamente 1% de aumento de habitat para cada R$ 1 milhão gasto com restauração.
Ressaltamos que há limites e barreiras para a adoção em larga escala das duas atividades que viabilizaram a restauração de RL no nível de propriedade (SAFs e exploração madeireira). Apesar dos SAFs apresentarem viabilidade econômica, com retorno comprovado na literatura, o uso intensivo de mão de obra é uma barreira à adoção em larga escala desses sistemas. Já a adoção de manejo florestal em área a ser restaurada pode pagar o custo da restauração e adequação ambiental das fazendas com passivo florestal e é viável em larga escala. Todavia, ressaltamos que a exploração madeireira é uma atividade de baixa liquidez e alto risco em comparação com outras atividades agrícolas, especialmente quando ainda há competição com madeira ilegal, por isso não podemos superestimar a adoção dessa prática em todo o território paraense. O custo de transporte e dificuldade de acesso em algumas regiões não deve ser o maior desafio, visto que as regiões com maior custo de frete também são as áreas com maior potencial de regeneração natural pela proximidade com grandes fragmentos florestais e baixa fragmentação.
Reforçamos que a adequação ambiental da RL dos imóveis rurais não será resolvida totalmente via restauração, pois parte do passivo poderá ser compensada em área fora dos imóveis com déficit, reduzindo o custo total da restauração em larga escala. Nunes et al (2016) estimou um potencial 11,3 Mha para compensação no Pará, o que é cinco vezes maior que o déficit aqui estimado para o estado. Porém, falta regulamentação e incentivos para estabelecer a comercialização desses excedentes (ex. via o mercado de CRAs). No caso do Pará, que possui mais da metade de seu território protegido por lei, o potencial para regeneração natural é enorme. Isso colocaria o estado em um cenário de custos ainda menores com a restauração, mais próximo do cenário C do Planaveg. Por isso consideramos esse cenário como referência no resumo da Figura 16.

Figura 16. Resumo comparativo dos custos totais e benefícios avaliados (em valor presente) para RL e APP passíveis de restauração no Pará, em bilhões de reais (R$) (Valores para 2015; taxa de desconto de 8,5% a.a.)

5. Recomendações

5.1 Recomendações para a cadeia da restauração

Investir em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) para produção de nativas. O risco financeiro das espécies nativas ainda é alto devido a incertezas no mercado, taxa de mortalidade e crescimento variado das mudas produzidas. Por exemplo, a produção de espécies nativas deve replicar as lições de produção de espécies exóticas como o eucalipto, que já passaram por um período longo de melhoramento genético e desenvolvimento de tecnologias para incremento de produtividade da planta.
Estruturar a cadeia de valor para comercialização e valorização dos produtos de áreas restauradas. A exploração econômica da floresta pode pagar o custo da restauração parcial ou integralmente, contudo, é preciso fortalecer a cadeia de valor do manejo de madeira nativa e de produtos florestais (ex. não madeireiros como frutas, óleos e advindos de SAFs). Essa tarefa envolve várias etapas: estabelecimento de uma rede de coletores de sementes e produção de mudas; conexão dos principais atores envolvidos com restauração; capacitação e assistência técnica; melhoria do acesso a créditos; mapeamento da demanda e oferta de produtos regionais para identificar oportunidades de incentivo à produção.
Estabelecer uma estratégia estadual para restauração a partir do mapeamento de áreas prioritárias para a conservação e coordenar as ações com o setor agropecuário. O governo deve definir áreas prioritárias para restauração com base em critérios que maximizem os benefícios ambientais e minimizem os conflitos com a produção de alimentos. Por exemplo, definindo áreas para restauração com base no maior ganho para a conservação da biodiversidade (disponibilidade de habitat) e no menor custo de oportunidade. Os órgãos ambientais devem elaborar ações e programas coordenados com as agências de agricultura (secretarias de governo, Emater etc.) a fim de diminuir riscos institucionais e compensar os 20% de área produtiva que será reduzida com a restauração. Esse tipo de planejamento espacial permitirá o máximo benefício ambiental e a mínima competição por uso do solo.

5.2 Recomendações para políticas públicas que afetam a restauração

Validar o CAR e monitorar o cumprimento do Código Florestal. Somente a partir de uma base de dados confiável de CAR poderemos estimar com maior precisão a área do passivo ambiental, definir os imóveis com demanda por restauração ou compensação e ajudar na regulamentação do mercado para compensação para reduzir o custo total com a restauração em larga escala. Além disso, o CAR permitirá monitorar o cumprimento do Código Florestal, direcionando políticas de incentivo ou fiscalização no nível de imóvel rural e de planejamento à conservação florestal no nível de paisagem.
Estabelecer uma estratégia para o crédito florestal dentro do plano estadual do ABC e outros mecanismos financeiros. Atualmente existem diversas linhas de financiamento para restauração e regularização ambiental, contudo, ainda há pouco acesso a esses recursos. No âmbito estadual, o governo tem a responsabilidade de trabalhar em ações para o avanço do plano nacional para a Agricultura de Baixo Carbono (ABC), o qual inclui uma linha de crédito para restauração. A sensibilização de produtores e a capacitação de técnicos são parte das ações previstas pelo Plano ABC, e o governo estadual pode criar estratégias de incentivo à restauração a partir desse plano.
Implementar mecanismos de incentivo à restauração para detentores e posseiros rurais. O crédito de carbono pode pagar parcialmente o custo de restauração em larga escala, porém ainda faltam mecanismos financeiros para captação de recursos e para garantir a segurança jurídica para os contratos desse tipo de financiamento. Por outro lado, o governo estadual pode desenvolver programas de incentivo aos produtores que queiram investir em restauração ou estejam ligados à produção de mudas e sementes. Um bom exemplo é o Programa Reflorestar, do governo do Espírito Santo (Benini et al, 2016), que apoia a restauração em propriedades privadas com o mapeamento das áreas prioritárias, definição dos arranjos florestais mais rentáveis com espécies nativas e pagamento de parte dos insumos para a restauração (ex. calcário, fertilizantes etc.). Além disso, é possível gerar mecanismos de incentivo à restauração por meio da redução das taxas de juros de financiamentos para compensar progressivamente o produtor que estiver restaurando seu passivo florestal.

Apêndice I

Detalhamento dos custos de restauração

Tabela 12. Custos de restauração (R$/ha) em diferentes métodos, sem exploração madeireira

Tabela 13. Custos de implantação e manutenção de restauração com exploração econômica de madeira, em R$/ha

Apêndice II

Preço de terras nos municípios do Pará em 2014




Apêndice III

Estimativa de área mínima e máxima para restauração de APPs e custo da restauração em diferentes cenários, por município

Apêndice IV

Sequestro de carbono e receita líquida (em valor presente) potencial de sequestro de carbono

Tabela 14. Custos e receita (em Valor Presente) potencial por crédito de carbono para RL a ser restaurada nos imóveis cadastrados no CAR

Tabela 15. Custos e receita (em Valor Presente) potencial por crédito de carbono em APP mínima a ser restaurada no estado do Pará

Tabela 16. Custos e receita (em Valor Presente) potencial por crédito de carbono em APP máxima a ser restaurada no estado do Pará

_____________________
[11] Multiplicamos o valor de tCO2 equivalente pela área anual restaurada em cada grupo de espécie (ciclo curto, médio e longo) durante o tempo médio de sequestro de cada uma (Ver Tabela 7). Em nosso modelo as espécies de curto prazo (tempo de crescimento médio de 10 anos) ocupam 50% da área, as de médio prazo, 25% (tempo de crescimento médio de 14 anos) e as de longo prazo, 25% da área (tempo de crescimento médio de 20 anos). A quantidade plantada é 1.666 indivíduos por hectare.
[12] Para calcular o custo total de restauração multiplicamos o preço (R$/ha) de cada método de restauração (Ver Tabela 12) pela área correspondente nos diferentes cenários do Planaveg (Ver Tabela 2).
[13] Idem nota 11.
[14] Idem nota 12.
[15] Idem nota 11.
[16] Idem nota 12.

Apêndice V

Indicador de disponibilidade de habitat em função dos cenários (situação atual e restauração das APPs), espécies com diferentes capacidades de dispersão (100, 1000 e 3000 m), por município do estado do Pará

Apêndice VI

Ganho na disponibilidade de habitat para cada R$ 1 milhão gasto com restauração (custo-eficácia), nos diferentes cenários de restauração do Planaveg, por município

This post was published on 21 de fevereiro de 2017

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