Informações já disponíveis poderiam ser usadas para fazer uma malha fina contra a sonegação.
Mais de R$270 milhões em sonegação por ano. Essa é a estimativa levantada por estudo recente que avalia o potencial de arrecadação do Imposto Territorial Rural (ITR) no Estado do Pará, criado para coibir a ocupação de terras públicas e a especulação fundiária, práticas que historicamente contribuem para o aumento das taxas de desmatamento na Amazônia e estimulam a baixa produtividade em terras ocupadas ilegalmente. A sonegação é ainda maior já que o estudo considerou apenas os dados disponíveis para 56% da área desmatada tributável no Pará.
Apesar dos avanços no combate ao desmatamento na região, cerca de 600 mil hectares de florestas foram derrubados por ano, em média, entre 2010 e 2013. Grande parte dessa perda foi para fins de especulação, dada a existência de 12 milhões de hectares de pastos mal utilizados em 2010 – o equivalente a 2,7 vezes o território do Estado do Rio de Janeiro.
O ITR deve ser pago anualmente pelos proprietários ou posseiros de terras rurais com base no valor de mercado da terra, no grau de utilização do imóvel e o tamanho da propriedade, além de fatores de isenção. Em tese, o imposto devido seria maior para grandes propriedades com baixa produtividade, induzindo o melhor aproveitamento do solo. Mas não é o que acontece, segundo o estudo “O potencial do Imposto Territorial Rural contra o desmatamento especulativo na Amazônia”, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).
O estudo foi baseado em informações públicas, incluindo os mapas dos imóveis rurais inseridos no Cadastro Ambiental Rural (CAR); a cobertura vegetal dos imóveis disponibilizadas pelo Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Inpe) e Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa); e o valor total do ITR arrecadado no Estados e nos municípios fornecido pelo Tesouro Nacional. Para estimar o real valor devido à Receita, os pesquisadores usaram dados de mais de 53 mil imóveis disponíveis no CAR considerando que todas essas propriedades teriam alto grau de uso do solo, ou seja, mais de 80% da área desmatada em uso. Depois, foram comparados os valores projetados com o valor total arrecadado no Pará em 2011.
Com base nas análises, ficou claro que os proprietários e posseiros de terras usam pelo menos dois artifícios para sonegar o imposto: declaram um valor de terra abaixo do valor de mercado e declaram a posse de uma área de vegetação nativa maior do que a existente para aumentar a área que é isenta do imposto.
O estudo demonstra que os órgãos fiscalizadores podem melhorar a arrecadação submetendo as declarações do ITR a uma análise do tipo malha fina com base em informações geográficas e dos preços de terra. “A receita precisa perceber o ITR como um imposto que inibe a especulação fundiária, além de aumentar a arrecadação. O cruzamento dos mapas das propriedades disponíveis no Cadastro Ambiental Rural com os mapas da vegetação do imóvel coletados em imagens de satélite tornariam a fiscalização mais eficaz”, explica Daniel Silva, co-autor do estudo e pesquisador do Imazon. Além disso, a Receita Federal e as prefeituras já conveniadas para arrecadar o imposto deveriam criar um banco de dados com os preços de mercado da terra em cada região para fiscalizar o valor declarado pelos proprietários e posseiros de terra. A fiscalização por parte das prefeituras é vantajosa pois os municípios podem ficar com 100% do valor arrecadado, enquanto que os municípios não conveniados ficam apenas com 50% do valor. Se as prefeituras fiscalizassem efetivamente o ITR, a arrecadação municipal poderia atingir milhões de Reais e estimularia o aumento da produção agropecuária nas áreas atualmente usadas apenas para especulação.
Outra medida para incrementar a eficiência do ITR seria atualizar os índices mínimos de rendimento para considerar o uso do solo produtivo na Amazônia. Atualmente, os índices se baseiam no Censo Agropecuário de 1975 e são extremamente baixos, considerando como produtivas terras que têm 0,15 a 0,5 cabeça de gado por hectare, enquanto que poderia ser mais de duas cabeças por hectare. Em 2009, o ex-presidente Lula prometeu atualizar os índices, mas desistiu após pressões de políticos ligados ao agronegócio. O trabalho argumenta que os produtores eficientes não deveriam temer o aumento dos índices mínimos, pois eles já produzem bem acima dos índices que seriam atualizados, além da alíquota do imposto já ser baixa para quem é eficiente. Além disso, os produtores eficientes ganhariam, pois as terras usadas para a especulação seriam mais acessíveis para a produção (seja por meio de arrendamento ou venda).
Além de coibir o desmatamento especulativo, a taxação de terras improdutivas melhoraria condições socioeconômicas de acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o Banco Mundial e a Comissão Europeia. O fim do desmatamento especulativo liberaria recursos para atividades produtivas e aumentaria o emprego no meio rural, o que ajudaria a reduzir a pobreza.
“Considerando que a presidente reeleita assumiu compromisso de reduzir o desmatamento e a pobreza, ela deveria atualizar o índice mínimo de produtividade usado para apurar o ITR“, declarou Paulo Barreto, pesquisador sênior do Imazon e co-autor do trabalho.
Para mais informações
Paulo Barreto
pbarreto@imazon.org.br
Assessoria de Comunicação do Imazon
Bruno Oliveira
bruno@imazon.org.br
This post was published on 3 de novembro de 2014
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