O Manejo florestal Comunitário tem se expandido rapidamente na Amazônia brasileira. O IEB (Instituto Internacional de educação do Brasil) e IMAZON (Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia) têm acompanhado esse tema, analisando os processos, sistematizando informações e articulando as iniciativas em curso, a fim de influenciar na proposição de políticas públicas.
Uma primeira reflexão sobre assunto aconteceu no âmbito da publicação “Manejo Florestal Comunitário na Amazônia brasileira: situação atual, desafios e perspectivas”, lançada em 2000 pelo IEB e IMAZON. Naquela altura, pouco mais de uma dúzia de projetos pilotos estavam sendo testados em campo e já era sinalizada uma tendência de crescimento do MFC.
Atualmente, existem mais de 300 iniciativas em andamento na região e o MFC já se encontra inserido em políticas publicas em níveis federal e em alguns Estados da Amazônia. Desta forma, torna-se necessária uma leitura do MFC a partir dos processos em curso na Amazônia brasileira e em outros paises da América Latina.
É nesta perspectiva que a publicação “Manejo Florestal Comunitário: processos e aprendizagens na Amazônia brasileira e América Latina” pretende contribuir para uma leitura atual do processo de MFC na região. Ao identificar aspectos limitantes ligados às experiências na Amazônia brasileira, e buscar aprendizados em processos mais antigos e consolidados em outras iniciativas, este livro se propõe a oferecer uma reflexão que possa influenciar para a consolidação do processo de MFC no Brasil.
IEB
IMAZON
O manejo florestal tem conquistado cada vez mais espaço como alternativa para comunidades rurais na América Latina. Isto pode ser explicado pela importância relativa da floresta para mais de 250 milhões de pessoas, bem como pela extensa área (aproximadamente 25 % da cobertura florestal) sob domínio de populações tradicionais e camponeses. Neste sentido, tem-se presenciado um movimento de expansão do manejo florestal comunitário na Região. Este fenômeno tem sido impulsionado por governos, doadores, ong’s e organizações comunitárias e vem sendo implementado sob diferentes arranjos técnicos, político, institucional e social.
Na Amazônia brasileira, o Manejo Florestal Comunitário tem experimentado forte processo de expansão e concentrado suas atividades em um único produto: a madeira[3]. No final da década de 90, existia um pouco mais de uma dúzia destas iniciativas, atualmente existem mais de 300 planos de manejo florestal (aprovados ou em processos de elaboração e tramitação) envolvendo comunidades rurais. O crescimento destas iniciativas tem surgido como uma alternativa para reduzir o processo acelerado de degradação ambiental devido à expansão da fronteira agrícola e a exploração predatória de madeira. Além disso, os baixos preços dos produtos extrativistas, como castanha e látex, têm levado as comunidades a buscarem formas alternativas de gerar renda adicional aos seus sistemas de produção.
Entretanto, vários autores (Barreto et al., 1998; Barreto, 2000; Campos, 2000; Holmes et al., 1999 e Viana 2000) coincidem em afirmar que as condições atuais são desfavoráveis para o manejoflorestal[4], especialmente o manejo florestal comunitário mais sensível a fatores externos. Além disso, o acompanhamento destes projetos comunitários e as discussões em diferentes fóruns sobre o tema têm revelado alguns fatores determinantes para a consolidação do MFC na Região, tais como: (i) estabelecimento de mecanismos de regularização fundiária; (ii) fortalecimento da organização social local; (iii) acesso ao crédito; (iv) assistência técnica florestal que contemple o MFC e (v) necessidade de mecanismos de acesso a mercado.
Este documento tem como objetivo apresentar e discutir as condições e processos que têm influenciado nos resultados alcançados pelas iniciativas de manejo florestal comunitário na Amazônia brasileira a partir de experiências semelhantes vivenciadas em outros países latino-americanos. Longe de analisar a diversidade de arranjos sociais, institucionais, políticos e econômicos em diferentes contextos, pretende-se descrever os principais avanços e desafios nos diferentes processos de MFC.
O texto está dividido em quatro seções. Inicialmente, discutimos alguns elementos de definição e de caracterização do MFC, a partir do contexto político-institucional dos diversos processos de MFC em curso na Região. Em seguida, na segunda seção, apresentamos uma breve descrição dos processos de MFC na América Central e na América do Sul. Na terceira seção, identificamos alguns fatores que julgamos determinantes para consolidação do processo de MFC na Amazônia brasileira, tendo como referência o aprendizado com situações semelhantes vivenciadas na América Latina. Na última seção apresentamos algumas considerações às análises feitas dos avanços e desafios vivenciados entre os processos de manejo florestal comunitário nos diferentes contextos aqui refletidos.
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[3] Neste documento o termo MFC refere-se ao manejo para produção de madeira.
[4] De fato, a maioria da madeira que chega aos pátios das serrarias tem origem ilegal ou predatória, inclusive madeira oriunda de comunidades que exploram suas florestas informalmente. As estimativas do número relacionado à madeira manejada tem sido objeto de controvérsia entre governo e pesquisadores.
Tem sido uma tarefa muito difícil encontrar uma definição que possa englobar a diversidade de experiências e casos de manejo florestal comunitário. Existe uma diversidade tão grande de contextos, atores, objetivos e tipos de estratégias que cada uma poderia corresponder a uma definição diferente. Os casos de MFC podem ser – grosseiramente – agrupados naqueles que envolvem comunidades individuais ou grupos de famílias de uma comunidade (casos na Amazônia Brasileira), associações de comunidades (casos em Petén, Guatemala), comunidades indígenas ou associações de comunidades indígenas (casos no México), parcerias de comunidades com empresas (casos comuns na América Latina) e concessões comunitárias (casos em Petén e México).
Esta diversidade pode ser ainda exemplificada nos diferentes tipos de organização para o MFC (envolvimento de sindicatos de trabalhadores rurais, associações locais, cooperativas) e nas diferentes situações de acesso a terra e aos recursos florestais (pequenas propriedades coletivas e individuais e unidades de conservação). Dessa forma, seria uma atitude simplista tentar uma única definição para o manejo florestal comunitário. Entretanto, alguns atores têm se aventurado a definir manejo florestal comunitário com base nos resultados das ações desenvolvidas sobre determinados contextos e populações envolvidas.
Para Kenny-Jordan (1999) o manejo florestal comunitário em sentido amplo engloba todas as atividades de manejo dos recursos florestais que tem como propósito fundamental melhorar as condições sociais, econômicas, emocionais e ambientais das comunidades rurais, a partir de sua própria realidade e de suas próprias perspectivas.
De Camino (2002) define MFC como o manejo que está sob a responsabilidade de uma comunidade local ou um grupo social mais amplo, que estabelecem direitos e compromissos de longo prazo com a floresta. Os objetivos sociais, econômicos e ambientais integram uma paisagem ecológica e cultural e produzem diversidade de produtos tanto para consumo como para o mercado.
Para Smith (2005) o manejo florestal comunitário é um processo social desenvolvido dentro de um contexto social que envolve um grupo de pessoas. O autor considera contexto social todos os aspectos da vida que relacionam o ser humano e seu meio ambiente natural.
Para os processos de MFC em curso na Amazônia brasileira, consideraremos neste documento a diversidade de experiências que estão sendo testadas no campo e as considerações atribuídas ao termo MFC.
♦ Características do manejo florestal comunitário
O manejo florestal comunitário se diferencia significativamente da visão puramente econômica e de mercado que orienta o manejo florestal empresarial. As comunidades que dependem diretamente das florestas, relacionam-se com esse recurso a partir de diferentes perspectivas. Por exemplo, elas podem considerar as florestas com valor espiritual (local onde viviam seus antecedentes, especialmente pelos indígenas), ou como um recurso capaz de satisfazer as necessidades físicas, sociais e econômicas, de forma individual e da coletividade (Ritchie et al., 2000).
Estudos recentes na América Latina (Amaral et al., 2005; De Camino, 2002) têm fornecido uma compreensão maior sobre como operam os sistemas de manejo florestal comunitário. Essas informações têm levado a um reconhecimento crescente da sua viabilidade e importância para o funcionamento de muitos sistemas de produção rurais. Ademais, milhões de pessoas em todo mundo,dependem e vão continuar dependendo das florestas para sua sobrevivência no futuro próximo (Kenny-Jordan 1999). Desse modo, cresce o interesse e multiplicam-se as iniciativas regionais, nacionais e internacionais para proteger e conservar os recursos florestais. Neste cenário, as comunidades que habitam as florestas estão se convertendo em reconhecidas aliadas e gestoras importantes dos recursos florestais.
A prática de manejo em pequena escala ou manejo comunitário, implica um contexto social e econômico com diferentes tipos de relações interpessoais. Diegues (1997) caracterizou alguns sistemas de manejo comunitário que se estabeleceram e se reproduzem através de relações de parentescos, compadrio, ou pela aceitação compartida de regras e valores sociais, econômicos e ambientais. Alguns autores (Amaral, 2002; De Camino, 2001; Pokorny, 2000; Markopoulosn, 1998) caracterizam o manejo florestal comunitário com os atributos apresentados no quadro abaixo.
Quadro 1. Características gerais dos processos de Manejo Florestal Comunitário na Amazônia (Amaral e Amaral Neto, 2005).
Vários autores (Amaral e Amaral Neto, 2000; Veríssimo, 1996; Amaral, 1999; Buschbaccher, 1990) identificam uma gama ampla de atores envolvidos direta ou indiretamente com a atividade florestal na Amazônia, tais como madeireiros (donos de indústrias ou extratores de toras), fazendeiros, proprietários ou ocupantes de áreas florestadas, habitantes tradicionais das florestas (extrativistas, ribeirinhos e indígenas), ONG’s ambientalistas, universidades e agências financiadoras. Para um grupo tão distinto de atores o manejo florestal é concebido sob diferentes óticas e estratégias.
Para a maioria dos madeireiros os recursos florestais constituem uma chance de conseguir retornos financeiros rápidos sem ter responsabilidades futuras com a recuperação das áreas exploradas, operando através de um ciclo migratório constante. Esse modelo de exploração leva a um rápido esgotamento da floresta e tem sido caracterizado por estudiosos como ciclo do boom-colapso (Schneider et al., 2000).
Por outro lado, para os pequenos agricultores e habitantes tradicionais as florestas representam não apenas uma fonte contínua de diversos produtos madeireiros e não-madeireiros (madeira, frutas, caça, plantas medicinais, óleos e resinas), mas também um depósito de nutrientes[5]. Estudos conduzidos na região de Marabá, no Sudeste do Pará, junto a grupos de colonos, têm identificado uma relação muito forte entre a permanência das famílias nos lotes e a existência de recursos florestais: famílias que desmatam suas áreas nos primeiros anos de ocupação e não conseguem se capitalizar com a venda da madeira tendem a migrar para novas áreas em menos de cinco anos (Oliveira et al., 2000).
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[5] Estudos conduzidos sobre a dinâmica dos sistemas de produção praticados por famílias de agricultores familiares em região de fronteira constatou essa relação como componente estratégico para as famílias (De Reynal, et al., 1995).
O Quadro 2 apresenta uma sistematização das perspectivas por estes diferentes atores quanto ao uso dos recursos florestais mediante manejo.
Quadro 2: Visão e perspectivas das empresas e comunidades sobre manejo florestal.
Existe ainda as posições das Ong’s ambientalistas, dos órgãos de governo e das agências financiadoras, que, via de regra, adotam uma visão conservacionista em relação aos recursos florestais. As ONG’s podem atuar tanto incentivando e implementando projetos pilotos de manejo florestal, como fazendo lobby para criação de Unidades de Conservação. O governo e agências financiadoras têm atuado no fomento de pesquisas, projetos pilotos, medidas de controle e fiscalização da atividade florestal.
A convergência de interesses favoráveis ao manejo dos recursos florestais pode ser um exercício difícil de ser operacionalizado e ainda ter efeito oposto ao sugerido por uma proposta baseada na filosofia dodesenvolvimento sustentável para a Região (Fathauer, 1998). No caso da Amazônia brasileira, isso tem acontecido por razões que vão desde a ausência dos usuários dos recursos florestais e seus representantes na definição e implementação de políticas públicas ambientais, de integração entre políticas agrárias e ambientais (Figura 1).
Figura 1: Resumo esquemático da participação de usuários dos recursos florestais e seus representantes na definição e implementação de políticas públicas agrárias e ambientais (Adaptado de Muchagata et al., 2000).
O esquema acima mostra mecanismos bastante diferenciados de envolvimento de grupos de usuários da floresta e seus representantes na definição e implementação de políticas públicas. No setor agrário, os grupos locais participam e exercem influência sobre a condução de políticas nas diferentes esferas (local, regional e nacional), mediante as disputas por posições conflitantes. Neste caso, os usuários da floresta participam da definição e execução da política ao nível local e as instituições que os representam atuam nas escalas regional e nacional.
No caso das políticas ambientais, isso não ocorre. Não existem mecanismos de discussão nas esferas local/regional. Além disso, a representação dos usuários da floresta exerce pressão por aspectos maisespecíficos (i,e, criação de Reservas Extrativistas) sem manifestar muita clareza sobre as questões relativas ao manejo florestal, especialmente o madeireiro. Alguns autores têm identificado as razões dessa ausência de participação de grupos locais na definição e execução de políticas públicas ambientais. Uma possível explicação pode ser em função de raízes históricas diferenciadas que influenciaram o surgimento do movimento ambientalista e o movimento sindical de trabalhadores rurais (Esterci, 2003). No caso de colonos assentados em regiões onde a dinâmica da reforma agrária é forte, uma possível explicação para isso é o maior envolvimento destes atores com a questão agrária, em detrimento de temas relacionados ao meio ambiente (Amaral Neto & Carneiro, 2004).
Algumas medidas poderiam facilitar uma maior interação entre as ações do governo, de maneira a abordar o manejo florestal comunitário como uma atividade importante numa estratégia consistente para o desenvolvimento rural (i,e, infra-estrutura, acesso ao poder público – mediante a necessidade de interação com órgãos governamentais – promovendo a cidadania, recursos financeiros, etc.). Para que isso aconteça, torna-se necessário fortalecer fóruns locais e promover o diálogo entre os diferentes atores envolvidos na atividade florestal. Estes fóruns poderiam apoiar a execução de políticas ambientais de modo que estas venham a obter proeminência sobre as ações de fiscalização, que, infelizmente, tem sido ação governamental até o presente momento.
Além disso, é preciso fazer com que a política agrária, especialmente no que concerne aos assentamentos rurais, incentive a implantação e o desenvolvimento de novas formas de produção. Existem alguns sinais neste sentido, tais como: (i) elaboração de Planos de Desenvolvimento Sustentável nos assentamentos, considerando – entre outros – aspectos ambientais; (ii) proibição de assentar famílias em áreas com cobertura vegetal[6] e (iii) relacionar liberação de créditos com a existência e manutenção da Reserva Legal.
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[6] Essa medida foi reconsiderada, recentemente, pelo Governo com a criação dos Assentamentos Florestais, uma nova modalidade de Assentamento Rural, com ênfase no aproveitamento dos recursos oriundos da floresta pelas famílias assentadas.
Na Guatemala as iniciativas de MFC estão fortemente relacionadas com o processo de concessões florestais. Existem, aproximadamente, 15 concessões outorgadas para 13 comunidades e duas indústrias, com um total de 560 mil hectares de floresta sob manejo (NPV 2001). Outro dado relevante é que a grande maioria das unidades de manejo está em processo ou já recebeu a certificação florestal. Estimam-se benefícios para 1300 famílias e cerca de 7 mil pessoas. Além disso, existe uma área com aproximadamente 23 mil hectares manejados por cooperativas, que envolvem oito comunidades e 432 famílias. Outros doze ejidos (áreas comunitárias sob manejo) municipais manejam cerca de 138 mil hectares envolvendo centenas de famílias (De Camino, 2001).
Iniciativa de MFC na Guatemala (Fonte: ACOFOP)
As experiências de concessões na Guatemala têm demonstrado um modo original de enfrentar o problema de degradação dos recursos florestais. A partir da criação da Reserva da Biosfera Maya em 1990, como forma de frear a degradação florestal daquela região, o uso florestal na Reserva foi planejado criando zonas de proteção, de entorno e de uso múltiplo. Em cada uma dessas zonas as comunidades e ocupantes locais participaram do processo de definição e consulta sobre o estabelecimento das unidades e uso dos recursos. A participação das comunidades de forma organizada facilitou o processo e credenciou os níveis de decisões.
A grande novidade no processo da Guatemala é a gestão de concessões e o estabelecimento de empresas comunitárias florestais. Naquela região, a organização em associações e cooperativas tem agregado vários grupos de manejadores que estão encontrando formas criativas de superarem as barreiras impostas ao manejo florestal comunitário. Além do forte aspecto de organização social e a forte presença da concessão florestal de base comunitária, o processo na Guatemala envolve diferenças quanto aos tipos de florestas, o papel exercido pelo Estado e espaços públicos para tomadas de decisão sobre uso dos recursos florestais. Estes ingredientes, bem como elementos comuns comparados ao processo no Brasil encontram-se no Quadro 3.
Quadro 3: Características marcantes entre os processos no Brasil e Guatemala.
Em Honduras, a Associação Nacional de Produtores Florestais (ANPFOR) e a cooperativa Agroflorestal Colón Atlântica Honduras Limitada (COATLAHL), congregam cerca de 100 e 1500 produtores afiliados, respectivamente. Estas organizações têm aproximadamente 300 mil hectares de floresta sendo manejadas. O desenvolvimento florestal em Honduras prevê programas de capacitação, produção de informações cientifica, programas de transferência de tecnologia e criação de espaço para conduzir diálogos políticos.
Em Costa Rica, o processo de MFC foi impulsionado por mecanismo de regularização fundiária, onde 60 mil hectares de florestas são manejados, bem como pela organização social agregando, aproximadamente, 1300 famílias (Méndez, 1999). Estas ações têm sido catalisadas por duas organizações não-governamentais (FUNDECOR e CODEFORSA), responsáveis pela assistência técnica (elaboração, acompanhamento e implementação de planos de manejo), além de obtenção de mecanismos de incentivos ao manejo florestal (i,e, pagamento por serviços ambientais). Além disso, conta com o CATIE, um centro de excelência com atuação regional que implementa programas de pesquisa e extensão florestal comunitária. Estas ações influenciam na mobilização de recursos e políticas públicas para o MFC no país.
As experiências vivenciadas no Brasil e América Central representam uma importante base de conhecimentos para o desenvolvimento futuro do MFC nos demais países da região. Muitas lições vividas e refletidas, positivas e negativas, devem servir como base para novos empreendimentos a serem iniciados. O quadro abaixo apresenta as principais características dos processos de MFC nesses diferentes contextos.
Quadro 4: Diferenças e semelhanças entre os processos no Brasil América Central.
O México talvez seja o país que tem experimentado resultados mais bem sucedidos com manejo comunitário. A primeira certificação florestal foi concedida ao plano piloto florestal de Quintana Roo. Neste país só a União Nacional de Organização de Manejo Comunitário – UNOFOC, agrupa centenas de associações, entre elas, comunidades indígenas, cooperativas de chicleros (produtores de látex), organizações campesinas e grupos técnicos florestais, controlando aproximadamente 4,3 milhões de hectares de floresta, dos quais 1,7 milhão é gerido através de manejo florestal comunitário (De Camino, 2000). Estima-se que mais de 18 milhões de mexicanos de zonas rurais tiram seu sustento das florestas e que 80% das florestas pertencem a ejidos e comunidades locais. A economia florestal do México está fortemente embasada na produção das empresas comunitárias (Bray & Merino, 2004).
As análises das experiências em várias partes do mundo permitem identificar alguns fatores que de uma ou outra forma influem o desempenho do manejo florestal comunitário. Para definir os fatores chaves foram revisados alguns trabalhos considerados pela literatura sobre o tema (Diegues, 1997; Ostrom,1999; Amaral, 2001), bem como relatórios de diferentes fóruns de acompanhamento do processo de MFC na Amazônia brasileira.
Nessa listagem de fatores encontramos alguns que podem ser classificados como internos e externos às comunidades e aos projetos. Os aspectos internos estão relacionados com a capacidade de organização social e gestão dos recursos, que demandam decisões e atitudes das comunidades e suas lideranças. Por outro lado, os aspectos externos incluem, entre outros, temas como a definição do direito à posse/propriedade da terra (questão fundiária), os mecanismos de acesso a crédito e a questão das relações com mercado para produtos florestais. Fatores estes que muitas das vezes escapam ao controle das comunidades e demandam decisões institucionais de maior envergadura e ação governamental.
Para este documento serão analisados cinco desses fatores considerados como os mais influentes nos resultados dos processos e projetos de MFC, são eles: (i) definição fundiária, (ii) organização social, (iii) crédito, (iv) assistência técnica e (v) mercado.
♦ Mecanismos de regularização fundiária para o MFC
A grande extensão da floresta Amazônia (5 milhões de km2) abriga cerca de 12 milhões de pessoas. Entretanto, essa baixa densidadedemográfica contrasta com o elevado número de conflitos pela posse e uso da terra. Um bom indicador da importância dessa questão encontra-se no fato de que o Governo Federal tem como eixo central de suas políticas para a região, a definição da situação fundiária (PNF 2005).
Por outro lado, um dos problemas fundamentais que as comunidades têm enfrentado para manejarem suas florestas é o acesso aos recursos florestais. As comunidades estão em competição com o Governo que é detentor de extensas áreas de florestas e que não possui mecanismos de controle e gestão. As comunidades também competem com o setor privado que demanda grandes áreas de floresta para o abastecimento da indústria e para atividades agropecuárias. E, mais recentemente, em função da escassez de áreas com coberturas florestais, as comunidades competem entre si.
De um modo geral, a competição pelo uso dos recursos florestais tem sido cada vez mais expressada em conflitos pela posse da terra, levando à morte várias lideranças comunitárias. Por exemplo, em 2004 foram registrados, na Amazônia brasileira, 484[7] episódios de violência contra produtores rurais por motivação de conflitos agrários.
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[7] Fonte: Comissão Pastoral da Terra. Conflitos no Campo. Goiânia. 2004. – Considera-se violência assassinatos, torturas, ameaças de morte, agressões, etc. Considera-se área da Amazônia Legal os estados do Acre, Amazonas, Pará, Amapá, Rondônia, Tocantins, Roraima Maranhão e Matogrosso.
Essa situação tem estimulado os Governos a aplicarem instrumentos que possam amenizar os conflitos agrários tais como:
A. Instituir os direitos Consuetudinários
Consiste no reconhecimento dos direitos consuetudinário das populações que tradicionalmente habitam as terras para garantir os diretos de uso e manejo das florestas em longo prazo. O caso mais complexo e emblemático tem sido o reconhecimento da propriedade das terras indígenas. Nesse tema, competem entre si Estado, colonos,indígenas e proprietários privados. Em geral, por se tratar de extensas áreas de terras e envolver interesses de elites econômicas influentes, o Governo adota a postura de postergar a decisão o que só colabora para o aumento dos conflitos.
B. Criação do Mosaico de Unidades de Conservação (UC)
Instrumento que visa garantir a criação de Unidades de Conservação para assegurar o direito de uso e a conservação das florestas. Essa política tem sido adotada pelo governo como uma forma de reduzir o acesso às áreas florestadas. Somente no último ano, o governo brasileiro decretou cerca de 161 mil Km2 como áreas de proteção, entre Reservas Extrativistas (RESEX), Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS), Projetos de Assentamentos Extrativistas (PAE), etc. (Figura 2). Embora essa política tenha se mostrado eficiente para reduzir os conflitos fundiários (retira do foco do conflito a disputa pelo direito à terra), tem tido pouca eficiência para promover o manejo florestal comunitário, pois os custos para implementar as UCs são altos e os processos são longos.
Figura 2: Distribuição das Unidades de Conservação de Uso Direto por Categoria na Amazônia. (Fonte: Instituto Socio Ambiental 2005).
A criação das UC’s tem gerado, em alguns casos, conflitos que levaram muito tempo para serem resolvidos, como no exemplo paradigmático da criação da RESEX Verde para Sempre[8], instituída em 2004, na região de Porto de Moz no Oeste da Amazônia, uma das regiões com maior incidência de conflitos fundiários no estado do Pará. As principais dúvidas das comunidades do entorno e de dentro RESEX são: quais são as possibilidades e restrições para o uso das áreas? quais os custos para elaboração e execução do plano de manejo? qual a origem dos recursos? E, finalmente, como lidar com as demandas externas das ONG´S que chegam cada vez com mais freqüência com suas agendas de pesquisas e de ações de desenvolvimento sustentável.
Apesar de todas essas ressalvas, vale ressaltar que muito embora não se possa relacionar de forma direta a ação de criação dessas UCs com a ampliação das áreas manejadas, o potencial de expansão do manejo florestal encontra-se efetivamente correlacionado com a criação de áreas protegidas. Das iniciativas atuais, a grande maioria encontra-se dentro das UC´s ou em áreas onde a situação fundiária esta definida (Mapa 2). Simulando-se que em 50% das UC´s criadas em 2004 fossem implementados planos de manejo (50% de 161 mil km2 = 80,5 mil km2 – 805 mil ha X 7 m2/ha), teria-se uma produção estimada de 5,6 milhões de m3 de madeira, o que representaria 20% da produção atual da Amazônia, que é de 28 milhões de metros cúbicos.
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[8] A RESEX reúne uma área de 1,3 milhão de hectare (74 % do município de Porto de Moz). Uma área maior que o Estado de Sergipe. Beneficia aproximadamente 80 comunidades e duas mil pessoas e – ao mesmo tempo – reúne atores locais poderosos que se opõem contra sua criação, incluindo prefeito, madeireiros e fazendeiros.
C. Política de concessões florestais
A política de ordenação do setor florestal na Amazônia tem seu eixo central nas concessões de áreas de florestas públicas (FlorestasNacionais, Estaduais e Municipais) para a exploração de recursos florestais, sendo grande parte voltada ao setor privado. Deve-se ressaltar que – em geral – o domínio das áreas florestadas da região é de propriedade do governo federal. Os argumentos contrários à adoção dessa política baseiam-se nas experiências mal sucedidas da Malásia e Indonésia. Por outro lado, a adoção da política de concessões florestais, através da administração de florestas públicas de produção, pode se tornar uma alternativa viável para uma boa parte dos problemas de acesso a recursos florestais. Vários autores (Pandolfo, 1974; Silva, 1997; Veríssimo et al., 1998) centram seus argumentos favoráveis, na possibilidade de aumentar o controle por parte do governo e na desoneração do setor privado, que não teria que imobilizar capital na aquisição de vastas extensões de terra. Entre as vantagens para a adoção da política de concessão destacam-se:
Embora a política de concessão florestal esteja centrada no setor privado, a sua implementação teria reflexo direto para o manejo comunitário. Uma possibilidade seria as comunidades organizadas participarem dos processos de licitação. Outra forma poderia as comunidades do entorno das unidades de produção desenvolver parcerias com as empresas para gerarem serviços e contratos (exploração de produtos não madeireiros, por exemplo).
O conjunto de políticas de ordenação e regularização fundiária deve ter um impacto positivo na expansão de praticas de manejo florestal, pois a indefinição fundiária tem sido apontada com um dos aspectos mais importante relacionados ao MFC (Amaral Neto, 2002; Amaral, 2001; Amaral & Amaral Neto, 2000; De Camino, 2002). Entretanto, sente-se a necessidade de que o processo de implantação das alternativas anteriormente apontadas (UCs, Concessões, etc.) sejam objeto de debate mais amplo junto às populações envolvidas, de forma a tornar a regularização fundiária um processo mais simples, ágil e ao mesmo tempo contemplando a participação dos moradores e suas organizações.
Experiências de ordenamento florestal na Região da Guatemala
Contexto regional da região de Guatemala
A região de Petén na Guatemala pode ser considerada como uma das mais interessantes experiências de regularização fundiária e promoção do manejo florestal comunitário na América Latina.
No final da década de 80, a região sofria forte pressão do processo de colonização. A principal medida adotada para enfrentar esse problema foi a criação do Conselho Nacional de Áreas Protegidas (CONAP), com a função de implementar um sistema de áreas protegidas, capaz de assegurar a conservação dos ecossistemas florestais. Então, em 1990, é decretada a criação da a Reserva da Biosfera Maya (RBM) em Petén, com uma superfície aproximada de 2,1 milhões de hectares[9].
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[9] Sendo que em torno de 33% da superfície foi designada como área de uso restrito e 43% áreas de uso múltiplo, ambas as áreas de propriedade do governo. O restante, cerca de 24%, faz parte das áreas de entorno onde se exige o uso controlado por parte de proprietários privados.
As Concessões Florestais no Petén
A criação da RMB como alternativa ao controle ao desmatamento não teve apoio integral das comunidades camponesas que habitavam a região. Essa população tinha na agricultura itinerante, no corte ilegal de madeira, tráfico de fauna e saques arqueológicos suas principais fontes de sobrevivência (Caal, 2002).
Em contrapartida, os empresários locais se apresentavam como os únicos atores capazes de garantir a implementação das concessões florestais. Para justificar usavam argumentos como: sua maior capacidade de investimento, domínio de tecnologia, capacidade técnica e gestão empresarial (Pasos comunicação pessoal).
Neste contexto a definição das concessões teve que mediar as visões excessivamente conservacionista do CONAP e os interesses dos diferentes atores (empresários, camponeses) existentes na região. Por conseguinte, em 1999, o CONAP apresenta a Lei de concessões florestais que estabelece os procedimentos para a qualificação dos candidatos à gestão das concessões na RMB.
Entre as responsabilidades exigidas dos concessionários consta que estes devem se mostrar capazes de manejar as unidades para a produção sustentável de bens e serviços florestais e zelar pela integridade das unidades de manejo sob concessão. O que implica, entre outras obrigações, tais como: controlar desmatamento, coibir a exploração ilegal, prevenir e controlar incêndios e evitar a depredação de sítios arqueológicos.
Nestas condições, estão operando quinze concessões florestais em Petén, das quais 13 são comunitárias e 2 indústrias, manejando 560 mil hectares, compostos na sua maioria de florestas latifoliadas com grande potencial para produção de madeira, a partir de espécies de alto valor como o Cedro (Cedrela odorata L.) e o Mogno (Swietenia macrophylla king.).
As unidades sob manejo das comunidades estão sendo exploradas sob o paradigma do uso múltiplo da floresta, o que inclui o manejomadeireiro e não madeireiro. Deve-se ressaltar ainda, que no caso das comunidades assentadas dentro da unidade de manejo é permitido o trabalho com a agricultura e o eco-turismo, desde que essas atividades estejam dentro de um plano de ordenamento territorial e que sejam compatíveis com os objetivos da RBM. Outra estratégia adotada é que as comunidades concessionárias devem receber assessoria técnica e o acompanhamento de uma Organização Não Governamental (ONG), por elas escolhida.
As unidades concedidas às indústrias diferenciam-se das comunitárias, pois possuem permissão para explorar somente recursos madeireiros. Entretanto, o CONAP pode estender a concessão a terceiros, de maneira a garantir o aproveitamento de recursos não madeireiros. Além disso, para garantir a execução do plano de manejo, ao invés da ONG, a indústria deve instituir um regente[10].
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[10] Pessoa contratada pela comunidade, responsável pela implementação do plano de manejo.
Em ambos os casos os concessionários devem ter suas unidades de manejo certificadas – segundo os padrões internacionais de certificação – a partir do terceiro ano após outorgada a concessão e mantê-la durante o período de tempo que dura os contratos de concessão, isto é, vinte e cinco anos.
O processo de implementação das concessões no Petén pode ser resumido como uma conjugação de interesses que foram, de alguma maneira, parcialmente atendidos. Os atores envolvidos tiveram maior ou menor participação no processo, cujos papéis podem ser descritos nos seguintes termos:
Embora as concessões ainda estejam na metade de seus contratos, e que precisem de mais tempo para consolidar-se, é possível enumerar alguns resultados importantes alcançados, que devem servir como lições:
♦ Organização social para o MFC
A organização comunitária constitui-se em fator-chave para consolidação de iniciativas de MFC. A participação efetiva das comunidades em todas as fases e a apropriação dos processos pelos beneficiados são apontadas como condições básicas para que o MFC possa ter bons resultados de longo prazo. Contudo, observamos, de forma, aparentemente paradoxal, que a organização social não tem recebido a devida importância por parte dos promotores do MFC.
As experiências vivenciadas na Amazônia brasileira revelam ausência das organizações de representação e apoio dos movimentos sociais nos processos de articulação e promoção do MFC, diferenciando-se dos processos mais autônomos e influentes vivenciados em outros países da América Latina.
O processo de manejo florestal comunitário surge na Amazônia brasileira mediante execução de projetos pilotos apoiados por agências de cooperação internacional e, principalmente, pelo Programa Piloto para Proteção das Florestas Tropicais no Brasil – PP G7. A literatura sobre esses projetos (Amaral & Amaral Neto, 2000; Souza & Gomes, 2005) revela complexos sistemas de manejo, adaptados de modelos industriais a serem gerenciados pelas famílias envolvidas, demandando habilidades técnicas, gerenciais e – também – conhecimentos sobre legislação florestal. Esse conjunto de requerimento estaria sendo demandado – pela primeira vez – pelas comunidades amazônicas para desenvolverem atividades de uso do solo. O resultado do investimento[11], todavia, tem tido pouco impacto em termos de escala de produção, mas – principalmente – em relação à apropriação do processo pelas famílias envolvidas e por suas organizações.
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[11] Estima-se que somente do PP G7 foram investidos cerca de US$ 13 milhões em projetos pilotos de manejo florestal comunitário na Amazônia.
A. A articulação do processo de MFC na Amazônia brasileira
Os primeiros planos de manejo florestal comunitário na Amazônia brasileira começaram a ser aprovados a partir da segunda metade da década de 90. Neste período, inicia-se um processo de articulação interinstitucional que pretendia discutir e realizar o intercâmbio de experiências, mas também influenciar na formatação de políticas públicas.
Em 1998, foi realizada a primeira Oficina de Manejo Florestal Comunitário da Amazônia Brasileira[12], da qual participaram organizações de apoio ao MFC, lideres comunitários, técnicos, doadores e representantes do Governo. Este evento teve o objetivo de identificar e formalizar os principais obstáculos ao MFC, tornando-os visíveis aos formuladores de política florestal. Desde então, foram realizados outros seis eventos semelhantes, constituindo-se em um fórum privilegiado de discussão e encaminhamentos de demandas para superação de entraves técnicos, sociais, políticos e legais ao processo de manejo florestal comunitário na Amazônia Brasileira.
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[12] Essas oficinas iniciaram através da parceria IEB e WWF Brasil, que catalisaram várias outras instituições envolvidas na implementação de projetos pilotos de manejo florestal comunitário.
A partir desse processo surgiram outras formas de articulação para o MFC. Em março de 2001, foi constituído o Grupo de Trabalho para o Manejo Florestal Comunitário na Amazônia Brasileira (GT-MFC). Este GT aglutina as instituições que apóiam ou estão à frente da execução dos projetos no Brasil e tem como objetivo encaminhar demandas apresentadas pelos projetos, bem como das resoluções oriundas das oficinas. O GT-MFC também realiza estudos estratégicos que visam à superação dos principais obstáculos vivenciados pelos projetos (aspectos tributários, revisão do marco legal, diagnósticos dos sistemas de manejo, mecanismos de extensão florestal comunitária, etc.), bem como articula processos políticos relacionados ao MFC. A composição do grupo é diversa, aberta e reúne, atualmente, as principais instituições com atuação direta e indireta no processo de MFC (Quadro 5).
Quadro 5: Instituições que compõem o GT-MFC.
Outros processos de articulação regionalizados têm ocorrido, conduzidos e liderados por organizações que estão à frente dos projetos, bem como por órgãos governamentais. Estes processos estão acontecendo nos estados do Pará (por meio de fóruns no Estuário do Amazonas, em Marabá e na Transamazônica), no Acre (através do Grupo de Produtores para o Manejo Florestal Comunitário) e no Amazonas (catalisado pelo Governo).
Até o momento os principais resultados obtidos com estes processos de articulação foram: a) internalização do tema MFC na agenda do Programa Nacional de Florestas; b) animação de discussão para estruturação de uma linha de crédito específica para o MFC junto ao Banco da Amazônia – financiamento à primeira iniciativa de MFC (Aguapé, Projeto do Rio Cautário); c) estruturação de uma proposta para simplificação da Instrução Normativa 4 do IBAMA, que regulamenta o MFC; d) diálogo com as entidades de representação e apoio dos movimentos sociais sobre tema MFC, visando a maior inserção destes na temática ambiental; e) realização de estudos estratégicos sobre MFC.
B. A ausência de envolvimento dos grupos locais e organizações dos movimentos sociais no processo de MFC na Amazônia brasileira
Embora possamos identificar avanços importantes na construção de políticas públicas voltadas para o apoio e implementação dos projetos pilotos de manejo florestal comunitário, percebe-se que o processo de MFC na Amazônia brasileira ainda está sob forte domínio de agentes externos, especialmente no que concerne a mecanismos de tomadas de decisão e definição de sistemas técnicos de manejo (Amaral Neto, 2002). Esse é o caso, por exemplo, do processo de articulação interinstitucional acima descrito, que se caracteriza pela ausência de organizações ligadas aos movimentos sociais, sendo dominado por ONGs ambientalistas. As organizações de base social quando envolvidas nos processo são de representação de populações extrativistas (i,e, Organização dos Seringueiros de Rondônia).
Uma das explicações para o interesse dos extrativistas pode estar relacionada ao fato de que a implementação de projetos pilotos está concentrada em áreas de Unidades de Conservação, no caso, principalmente Reservas Extrativistas[13]. Além disso, a crise naeconomia extrativista deve ter despertado o interesse das organizações extrativistas (Conselho Nacional de Seringueiros) para debates que envolvam alternativas econômicas para o uso da floresta. Nessa perspectiva o manejo florestal comunitário ganha importância para lideranças que até então apresentavam resistência ao envolvimento com esse tipo de atividade.
Como possível causa para o distanciamento das outras categorias dos movimentos sociais nos debates das discussões sobre o manejo florestal, podemos apontar o fato de que (via de regra) a atividade madeireira é praticada na região: sob signo da ilegalidade, sob marco da super-exploração dos trabalhadores e de relações de poder fortemente assimétricas entre madeireiros e grupos camponeses que participam da cadeira produtiva da madeira ou que habitam e trabalham em área com forte incidência de exploração madeireira (Amaral Neto & Carneiro, 2004).
Dessa forma, no geral, a intervenção das organizações de representação e apoio aos movimentos sociais no processo de MFC na região ainda se dá a partir de suas relações com projetos pilotos (i,e, Organização de Seringueiros de Rondônia, no projeto na RESEX do Rio Cautário; Grupo de Trabalho da Amazônia, no projeto de Boa Vista dos Ramos), a partir de ações isoladas. Porém, acreditamos que à medida que o processo de manejo florestal comunitário comece a entrar nas agendas de políticas públicas, o tema começará a obter ressonância dentro de fóruns internos de estruturas de representação regional e nacional. Como exemplo, tem-se as discussões sobre concessão comunitária defendida pela Confederação dos Trabalhadores da Agricultura no âmbito do CONAFLOR[14] e atuação de outras organizações (i,e, Conselho Nacional dos Seringueiros, Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, etc.) e nas discussões sobre a política de Assentamentos Florestais.
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[13] Uma das exigências para financiamento dos projetos pilotos para o PP-G7.
[14] Comissão Coordenadora do Programa Nacional de Florestas. Estrutura constituída por representantes de diversos setores (governo, movimentos sociais, ong, academia, setor privado, etc.) que tem por finalidade: (i) propor e avaliar medidas para o cumprimento dos princípios e diretrizes das políticas públicas voltadas ao Setor Florestal e (ii) sugerir projetos, pesquisas e estudos sobre manejo e plantio florestal, bem como ações de capacitação de recursos humanos, fortalecimento institucional e sensibilização pública (Azevedo cp).
C. Algumas lições comparativas relacionadas à organização social entre os processos na Amazônia brasileira e América Latina
De um modo geral a organização social para o manejo florestal comunitário ainda apresenta debilidades nos processos em curso tanto no Brasil como América Latina. Para identificar lições aprendidas de processos de organização social para o manejo florestal comunitário é preciso – antes de tudo – resguardar que o manejo florestal é um processo social, que se desenrola em contextos sociais específicos, incluindo uma ampla gama de fatores internos e externos, cuja articulação será determinante na orientação do comportamento das pessoas que participam da atividade (Smith, 2005).
Nesta perspectiva, a análise comparada desses processos deve vir sempre acompanhada do conhecimento aprofundado dos aspectos históricos e das condições culturais, políticas e econômicas peculiares a cada país. No entanto, é possível identificar algumas características marcantes nos processos de organização social para o manejo florestal comunitário no Brasil e alguns processos na América Latina.
Na Amazônia brasileira, a ênfase em projetos pilotos, impulsionou a associação de ONGs com organizações sociais locais. Em muitos casos, os projetos pilotos não possuem organizações formais e – na maioria das vezes – não existem mecanismos adotados para superação das disparidades de poder entre os agentes externos à comunidade (i,e, ONG e doador) e a própria comunidade.
Este formato revela um sistema de ação bem peculiar e com condições desfavoráveis às comunidades. Albaladejo e Veiga (2002) analisaram as relações e os diferentes arranjos institucionais em um projeto piloto na Amazônia brasileira e consideram que este sistemaconfigura-se como um “duplo funil”, onde as instituições promotoras do MFC atuam como “porteiras” e controlam o acesso a recursos às famílias que querem manejar a floresta. Por outro lado, ao olhar o funil de maneira inversa, observa-se um conjunto de indivíduos e organizações que exercem um papel de “corretores” do projeto, apenas servindo de intermediários para captação de recursos (Figura 3).
Figura 3: os atores envolvidos na implementação de projetos pilotos de MFC na Amazônia brasileira (Adaptado de Albaladejo e Veiga, 2002).
De um modo geral, este modelo de apoio e promoção do manejo florestal comunitário na Amazônia brasileira tem privilegiado alguns dos atores envolvidos no processo (no caso, principalmente, as ONGs) e tem catalisado reduzido impacto em termos de escala de produção, envolvimento das famílias e suas organizações e desenvolvimento rural local.
D. As lições de organização social na Guatemala para o manejo florestal comunitário
A Guatemala reúne uma das mais importantes experiências de manejo florestal comunitário, através das concessões comunitáriasna Reserva da Biosfera Maya, em Petén. A Reserva foi criada em 1990, fruto de conflitos sociais ocasionados por uma forte tendência de desmatamento e conflitos por disputas de recursos (Cortave, 2003). Este processo desencadeou a organização coletiva das comunidades que se opuseram a um modelo inicial de política de concessões (que privilegiava as indústrias), dando origem a uma estrutura organizativa que agregou um conjunto de comunidades para defender seus interesses no uso dos recursos florestais.
Nessa perspectiva surge a ACOFOP (Associação de Comunidades Florestais de Petén), composta por 23 organizações de 30 comunidades em cinco municípios (Cortave, 2003). Os grupos locais que compõem a associação apresentam diversidade cultural (envolvendo grupos indígenas de origem Maya e camponeses mestiços), formas diferenciadas de acesso aos recursos (concessão florestal comunitária, unidade de manejo privada, etc) e um número expressivo de hectares manejados (aproximadamente 500 mil) e de sócios envolvidos (2280) (Tabela 1).
Tabela 1: número de sócios e quantidade de florestas manejadas pelas organizações da ACOFOP (adaptado de Cortave, 2003).
Os resultados deste processo de articulação das organizações de base comunitária na Guatemala podem ser medidas sob vários aspectos. Do ponto de vista de sua base técnica e econômica, o manejo florestal realizado pelas comunidades conseguiu cumprir a perfomancee obter o selo do FSC, que é reconhecidamente o sistema de certificação florestal mais exigente[15] (Cortave, 2003).
Do ponto de vista do fortalecimento da organização social local, a ACOFOP está envolvida em diversas redes de representação de organizações não-governamentais e de movimentos sociais, em diferentes esferas: local (i,e, Comissão de Recursos Naturais e Meio Ambiente de Petén, União dos Trabalhadores de Petén, etc.); nacional (i,e, Conselho Nacional de Áreas Protegidas; Comissão Coordenadora de Meio Ambiente e Recursos Naturais) e internacional (i,e, Associação Coordenadora Indígena-Camponesa de Agrofloresta Comunitária e Conselho Mundial de Manejo Florestal) (Cortave, 2003). Esta complexa forma de representação e atuação em diferentes processos tem permitido trocar informações e aprendizados com outras experiências de manejo florestal comunitário.
Este formato regionalizado de organização social para o manejo florestal poderia ser adaptado para Amazônia brasileira, tanto na execução de projetos pilotos – para ganhar discussão mais processual do manejo, discutindo escala de produção, organização coletiva para comercialização, etc. –, como em processos mais localizados que envolvem a relação com representantes da indústria madeireira[16].
Outro ingrediente que poderia ser mobilizado dos processos mais antigos vivenciados em outros países na América Latina é o aspecto de intercâmbio entre lideranças de grupos locais envolvidas (ou não) em processos de manejo florestal comunitário na Amazônia brasileira. Este processo poderia acontecer de duas maneiras: (i) conhecimento de diferentes mecanismos de participação e gestão de projetos e (ii) conhecimento de diferentes processos de organização das entidades derepresentação e apoio aos movimentos sociais em diferentes contextos na Amazônia brasileira (i,e, Comitê dos Recursos Naturais em Porto de Moz, Fórum de Articulação para o Manejo Comunitário no Estuário do Pará, região de várzea; Comitês de Acompanhamento do Manejo Comunitário em Marabá). Outro nível de troca de experiências poderia acontecer no âmbito de um processo de intercâmbio regional, mobilizando processos importantes de manejo florestal comunitário em outros países (i,e, Bolívia, México, Guatemala, etc.).
Esses mecanismos poderiam promover a participação qualificada dos grupos locais na condução de projetos, como também consolidar uma estratégia das organizações de representação e apoio para o manejo florestal comunitário na Amazônia brasileira. Além disso, tais mecanismos favoreceriam a participação desses grupos em discussões de políticas de promoção do manejo florestal comunitário em curso.
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[15] O manejo comunitário na Reserva da Biosfera Maya possui cerca de 326 mil hectares certificados pelo sistema FSC.
[16] Atualmente, existem algumas tentativas de acordos de cooperação entre comunidades e indústria madeireira. As ações e resultados deste processo ainda têm sido pontuais. No entanto, é crescente a pressão por abastecimento das indústrias com madeira oriunda de pequenos agricultores, cuja fonte seria manejo ou desmatamento.
♦ Financiamento para o Manejo Florestal Comunitário
O financiamento para o MFC em geral tem sido feito através de estratégias de projetos demonstrativos e pilotos financiados por programas de governo e cooperação bilateral. Desta forma, o MFC é realizado em projetos com prazos e recursos limitados. A ausência de crédito e políticas de promoção tem colocado em risco os projetos quando terminam os recursos destinados a financiá-los.
Na Amazônia Brasileira, as linhas de financiamento oriundas do FNO para atividades florestais originaram-se nos anos 90, catalisadas a partir das experiências do BASA em créditos para pequena agricultura e sistemas agroflorestais e pelos projetos pilotos de manejo florestal comunitário apoiados no âmbito do PP-G7[17] (Programa Piloto para Proteção das Florestas Tropicais do Brasil).
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[17] Dois subprogramas do PP-G7 apóiam projetos pilotos envolvendo comunidades: o PD/A (Projetos Demonstrativos Categoria “A”) e o ProManejo (Programa de Apoio ao Manejo Florestal na Amazônia). Este último destina-se apenas à atividade de manejo florestal para produção de madeira a empresas e comunidades. Estes financiamentos do PP-G7 continuam apoiando a consolidação de projetos pilotos de manejo florestal e sistemas agroflorestais, com iniciativas no Pará.
Além disso, o fortalecimento do componente florestal na agenda de alguns estados da Amazônia (i,e, Acre e Amazonas) levou a atual administração do BASA a dar maior ênfase aos setores florestal para financiamentos. Para tanto, o Banco criou no ano de 2003 um grupo de trabalho (GT-Floresta), composto por diferentes grupos de interesse: representantes de projetos pilotos de manejo florestal comunitário; setor privado (associações de empresários do setor florestal); instituições de pesquisa e fomento ao setor florestal e órgãos de governos estaduais. A criação do GT-Floresta objetivava elaborar linhas de financiamento para a atividade florestal, adaptadas a diferentes modalidades (empresarial e comunitário).
Os principais assuntos debatidos neste Grupo de Trabalho foram: (i) fatores limitantes para acessar créditos florestais; (ii) sugestões de alternativas técnicas, adaptações de formas de garantias e agilidade nos procedimentos de análise e (iii) mecanismos de pressão para real implantação de crédito para o setor florestal, incluindo mecanismos de divulgação das linhas de financiamento gerenciadas pelo Banco, além de promoção de diálogo ente equipe do BASA e clientes potenciais das linhas de crédito (Veríssimo & Gomes, 2004).
Atualmente, existem duas categorias de crédito para o setor florestal, operadas com recursos do Fundo Constitucional do Norte: O FNO-Floresta (financia manejo e reflorestamento), e PRONAF – Florestal (em categorias para sistemas agroflorestais, produção de madeira e produção de não madeireiros). No entanto, essas linhas de financiamento têm sido pouco acessadas. No caso do FNO – Floresta, os poucos recursos foram destinados para atividades de reflorestamento. Em uma análise da destinação destes fundos, Veríssimo & Gomes (2004) encontraram, em 2002, somente três projetos de reflorestamento aprovados, totalizando um valor de R$ 0,33 milhão (equivalente a menos de 0,05 % do valor desembolsado pelo FNO naquele ano). Em 2003, foram alocados para o FNO – Floresta R$ 22 milhões, sendo comprometido um valor inferior a R$ 10 milhões (Veríssimo & Gomes cp). No caso do PRONAF, a situação é similar. Embora exista fluxo relativo na obtenção de financiamento das linhas PRONAF C e A, o mesmo não ocorre com o PRONAF-Floresta, a principal linha de financiamento para agricultores familiares na área de manejo florestal[18].
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[18] Em levantamento realizado junto a técnicos do Banco da Amazônia, constatou-se inexistência na alocação desta modalidade de crédito na Região.
As explicações para as dificuldades em acessar esses créditos possuem as mais variadas origens. No caso do FNO-Floresta, é possível agrupar os entraves para obtenção do financiamento em: (i) falta de divulgação; (ii) problemas quanto a regularização fundiária, para oferecer a terra como garantias de empréstimos; (iii) falhas nos procedimentos operacionais adotados pelo Banco, (iv) cultura do Banco voltada para o financiamento da agricultura e pecuária, e (v) desinformação dos funcionários do banco quanto aos parâmetros técnicos, econômicos e sociais do manejo florestal o que chega a inviabilizar análises (Veríssimo & Gomes, 2004).
No caso das linhas do PRONAF, ainda é preciso redefini-las de modo que reflitam as diferentes realidades das iniciativas de MFC em curso na Região. As condições de pagamento são mais atrativas, comparando-o ao FNO-Floresta. No entanto, essa modalidade de financiamento encontra-se ainda fortemente fundamentada na política agrária. Torna-se necessária uma imediata articulação entre funcionários do Banco, técnicos (do MMA e do SAF/MDA) e o pessoal envolvido (técnicos e lideranças comunitárias) na implementação de projetos pilotos de MFC para discussão de parâmetros técnicos (para análise de projetos envolvendo madeira e PFNM) para agilizar análises, enquadramento e prazos para pagamento.
Uma iniciativa inovadora de crédito tem sido experimentada pelo Projeto Mamirauá. Através de recurso do DFID, o Instituo Mamirauá pôde reservar uma parte dos recursos para servir de capital rotativo aos comunitários da Reserva, através de um sistema de micro-crédito. Embora os recursos sejam limitados, para o MFC o crédito tem sido usado como capital de giro na exploração de madeira. Considerando que em Mamirauá usa-se um sistema de retirada de madeira a partir da influencia da maré (não necessitam de máquinas e abertura de estradas), os custos de exploração são reduzidos. Entretanto, a novidade é que a associação dos produtores é quem controla e gerencia o sistema de crédito, e o índice de inadimplência é quase zero. Assim, os produtores têm conseguido manter o capital inicial e prever um crescimento do mesmo para os próximos anos. Desta forma, um dos principais resultados do micro-crédito tem sido que os produtores não estão atrelados a crédito oficial e tem evitado ações de intermediários (maiores informações www.mamiraua.org.br).
Um resumo analítico destas recomendações para aumentar acessibilidade às linhas de crédito existentes para atividades florestais encontra-se no Quadro 6.
Quadro 6. Recomendações para aumentar a acessibilidade às linhas de financiamento para o manejo florestal.
Mecanismos de financiamento para o MFC na América Central e México
Na Guatemala (no sistema de concessões no Petén), as famílias utilizaram inicialmente seus próprios recursos, de forma a viabilizar as atividades de manejo. Para isso, reduziram seus ganhos nos primeiros anos e investiram, por exemplo, na compra de máquinas e equipamentos. Com isso a comunidade passou a assumir os riscos de seus investimentos e, conseqüentemente, passaram a ter maior controle e interesse para o sucesso das atividades.
No México, a partir da metade do século XX, grande parte dos direitos de propriedade sobre a terra passou para as mãos das comunidades em um processo de reforma agrária com base na disputa de propriedade e uso das florestas. Então, a partir do inicio dos anos de 1970 o governo passou a implementar o Fundo Nacional de Fomento Ejidal que promoveu 135 empresas florestais comunitárias. Com essas experiências as comunidades puderam se capacitar sobre o manejo e construir a infra-estrutura de exploração. Em seguida, toda a gestão passou para as mãos das comunidades e em alguns casos com investimentos dos próprios comunitários como nos casos de Oaxaca e Durango.
Os mecanismos de acesso ao financiamento para o MFC são diferenciados, variando segundo o contexto próprio de cada país. Dessa forma, observamos um conjunto diversificado de situações que vão desde casos autônomos de auto-financiamento da atividade, característicos do MFC na Guatemala, até aqueles em que a fonte de financiamento mais importante é de natureza governamental, como no caso do México.
Estas experiências nos casos do México e Guatemala podem trazer alguns aprendizados para o processo na Amazônia brasileira, tais como:
♦ Assistência técnica
O manejo florestal comunitário demanda dos operadores dos planos de manejo novas formas e alternativas de uso dos recursos florestais. Em muitos casos as formais tradicionais de manejo dos recursos devem ser incrementadas com técnicas de manejo (inventários e censos florestais, técnicas de derrubas de árvores, elaboração de mapas de exploração etc), que possam garantir um melhor uso dos produtos e reduzir os impactos negativos à floresta. Para isso, faz-se necessário um acompanhamento técnico do manejo florestal. Esse acompanhamento técnico tem sido oferecido por diferentes formas na América Latina, tais como: por instituições de apoio (ONG´S, Governos, Cooperativas de serviços, organismos de cooperação), por programas de governos e por empresas privadas.
De um modo geral, o sistema de assistência técnica e extensão rural (ATER) difundido no Brasil e na América Latina é de natureza governamental e direcionado quase que exclusivamente para a atividade agropecuária. Sistema este que encontra-se estruturado a partir de duas características básicas: (i) é baseado em um modelo de desenvolvimento padronizado com ênfase ao uso de insumos modernos e (ii) desconsidera as especificidades locais, o saber das populações tradicionais e outros fatores que influenciam a evolução dos sistemas de produção praticados nas diferentes regiões (Souza, 2005).
Existe uma vasta literatura que critica este modelo e que apresenta um conjunto de novos princípios para a construção de um outro sistema de assistência técnica e extensão rural. A adoção desses princípios possibilitaria a construção de novos enfoques metodológicos de trabalho, baseado no planejamento participativo e construção do conhecimento de forma partilhada (Assis, 2004).
Apesar da importância do setor florestal para vários Estados da Amazônia brasileira, não existe um programa ou agência oficial de extensão ou assessoria técnica florestal na Região[19]. De um modo geral, a demanda por assistência técnica tem sido atendida de forma privada ou por instituições não-governamentais, neste caso, para projetos envolvendo comunidades. Em ambos os casos, contatam-se escassez de pessoal treinado em operações práticas de manejo florestal (no caso das empresas), ou ainda em questões de gerenciamento ou planejamento participativo (no caso de comunidades).
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[19] Não obstante, no Estado do Acre existe um embrião de uma ATER Florestal. O Estado contratou técnicos para prestarem assessoria a projetos comunitários e mais recentemente, desenvolve uma experiência com o princípio metodológico agricultor-agricultor.
Entre outras razões, a escassez de pessoal treinado para atender a demanda do manejo florestal na região está relacionada aos seguintes fatores: (i) debilidade na formação nas universidades e escolas florestais, que oferecem poucas oportunidades de vivência florestal; (ii) poucas iniciativas de bom manejo na região e, (iii) ausência de cursos técnicos profissionalizantes consolidados na Região. Barreto (2002), ao simular a demanda requerida para assessoria técnica florestal em diferentes cenários de produção de madeira em 2000 e 2001 na região, constatou que faltariam cerca de 2.400 técnicos e operários e aproximadamente 15 engenheiros com treinamento prático em manejo para a demanda potencial dos planos de manejo/protocolados no Ibama no ano de 2000.
Desta forma, é necessário efetivar um programa de assistência técnica que possa atender as demandas das indústrias, empresas e das iniciativas de manejo florestal comunitário. Neste último caso, a escassez de oportunidade de treinamento é ainda maior, uma vez que as estruturas de treinamento na Região normalmente não possuem capacitações práticas, adaptadas aos diferentes – e complexos – sistemas locais de manejo.
No caso específico dos assentamentos de reforma agrária, existe um programa de assessoria técnica que funciona através de convênio com o INCRA. Todavia, pode-se afirmar que o mesmo não está adaptado para a realização da assistência técnica florestal. Em levantamento realizado por Amaral & Amaral Neto (2005), junto a oito prestadoras de serviços de assistência técnica em áreas de assentamentos da reforma agrária atuando no Pará, verificamos que apenas 4% do quadro técnico possui formação na área de Engenharia Florestal e somente 2 % na área de técnico florestal. Entretanto, não foi encontrado nenhum programa de assistência técnica para as áreas ambiental ou florestal.
A. Assessoria técnica para manejo florestal comunitário: questões importantes para os extensionistas
A implementação do PP-G7 trouxe novos desafios para a extensão rural na Amazônia, pois permitiu a emergência de uma variada gama de experiências cujo enfoque era ambiental, especialmente em sistemas agro-florestais[20] e projetos de manejo florestal comunitário. O Quadro 7, construído a partir de um exercício feito com lideranças comunitárias envolvidas na execução de planos de manejo nos Estados do Pará, Amazonas, Acre e Rondônia revela a complexidade de temas demandados para o processo de capacitação.
Quadro 7: Identificação de demanda de capacitação junto a projetos de manejo florestal comunitário.
O quadro ao lado mostra que as questões técnicas do manejo florestal não são os temas principais para o desenvolvimento do MFC. Observa-se forte demanda para questões de gerenciamento (financeiro e contabilidade) e de mercado (aspectos tributários, padrões de qualidade). Em relação aos aspectos técnicos, existem demandas específicas, relacionadas à diversificação da produção a partir da introdução de produtos florestais não-madeireiros nos planos de manejo.
A cultura de projetos[21] estabelece metas e resultados em tempo limitado para operacionalização das atividades, além do atendimento de – outras – normas rigorosas estabelecidas pelas agências financiadoras. Além disso, os projetos devem, necessariamente, seguir aos preceitos da academia no que diz respeito à fundamentação técnica de seus planos de manejo. Essa dinâmica não permite confrontar os saberes mobilizados pelos técnicos com as diferentes práticas de gestão dos recursos florestais adotadas pelos grupos locais, e concentra as ações dos projetos em aspectos técnicos, financeiros e ecológicos.
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[20] Em um dos Programas do PP-G7 (PD/A), em sua primeira fase, sete em cada dez projetos apoiados eram para sistemas agro-florestais (Fatheuer, 1999).
[21] O entendimento de “cultura de projetos” é qualificada por Calório (2004), no qual a autora chama atenção para os impactos aos pequenos produtores no que diz respeito à complexidade na elaboração e exigência de agentes externos e assessores para concretizar (às vezes) as poucas chances de acessarem recursos financeiros.
A chegada dos projetos nas comunidades estabelece ainda nova relação de poder, entendido aqui como a capacidade de tomar decisões relativas a definição de problemas, suas causas e propostas de soluções. Davis-Case (1991) reforça que essa relação de poder pode acontecer em situações distintas, nas quais comunidade e projeto podem compartilhar decisões e conhecimentos apropriando-se igualmente do projeto. No entanto, podem existir ocasiões em que o projeto pode exercer um poder superior sobre a comunidade, lhe impondo, de forma sutil, idéias sobre os problemas e o que fazer para solucioná-los.
Amaral Neto (2002) estudou três casos de projetos de manejo florestal comunitário na região amazônica e constatou que o controle dos recursos financeiros dos projetos encontra-se nas mãos de ONG’s que, através de sua equipe técnica, pode exercer métodos diferenciados para que os grupos locais “participem” das ações de manejo. Outro estudo realizado por Astorga (1994) verificou que na maioria dos casos da Região, a participação das comunidades tem ocorrido de forma instrumental, que é definida pela autora como uma das manifestações de poder superior, caracterizada por relações de controle e dependência entre os atores.
A compreensão, percepção e experimentação dessas questões e de relações distintas dos grupos locais com a floresta têm-se mostrado ingredientes importantes no processo de interação de técnicos com grupos. Essas relações complexas diferem entre e dentro de comunidades, entre comunidades e técnicos e entre estes (Porro et al., 2000).
Atualmente, existe uma série de ações governamentais que tendem a fomentar o desenvolvimento de ações de assistência técnica e extensão mais adaptadas aos sistemas de produção desenvolvidos pelos produtores familiares, através da gestão dos recursos florestais na Amazônia brasileira (i,e, Assentamentos Florestais, Política de Flonas, Proambiente, CENAFLOR, etc.). A sistematização das experiências em cursos e a análise da adaptação destas políticas frente às dinâmicas que as comunidades vêm adotando, pode ajudar na identificação de novas formas de relações entre técnicos e comunidades, bem como fundamentar as bases para o estabelecimento de uma extensão florestal de base comunitária para a região. Para isso, é preciso influenciar na capacitação de técnicos, considerando aspectos operacionais de planos de manejo e também outros temas relacionados ao gerenciamento e comercialização de produtos florestais comunitários, especialmente considerando que os técnicos exercem grande influência sobre as comunidades, bem como desvincular o manejo florestal de projetos pontuais.
B. Algumas lições do processo de ATER na América Latina
A extensão florestal tem sido tema de debate entre diferentes atores envolvidos com atividades florestais e agrícolas em diferentes países da América Tropical. Em 1993 e 2003 o CATIE organizou Seminários Regionais sobre o tema, tratando da diversidade socioeconômica, biofísica, climatológica entre os diferentes países da América Latina. Entre as orientações para o desenho de uma metodologia de extensão participativa e comunitária, o documento aponta: (i) crítica ao papel desenvolvido pelas instituições e projetos de desenvolvimento rural implementados nestes países; (ii) necessidade de consolidação de distintas formas de organização, dos tecidos sociais, em função do bem estar social; (iii) fortalecimento de processos que contemplem a transição de experimentação feita por grupos locais e consolidação de mecanismos de pesquisa e extensão a partir da perspectiva da comunidade e dirigida por elas; (iv) localização do papel do extensionista como agente externo, mediador de processos locais.
Estas questões refletem bem a dinâmica da ATER e a necessidade de ruptura com processos clássicos de transferência de tecnologia e intervenções externas de projetos de desenvolvimento implementados em comunidades. Certamente, o desafio para um processo mais democrático continua e deve ser, continuamente, buscado por comunidades, extensionistas e demais atores envolvidos em ações de desenvolvimento.
Para o caso do manejo florestal comunitário, buscou-se alguns exemplos interessantes de ATER em outros países da América Latina que poderiam trazer lições para o processo de MFC na Amazônia brasileira. Na Amazônia equatoriana, por exemplo, o Serviço Florestal Amazônico realiza importante serviço de assistência técnica para o manejo de recursos florestais em pequenas propriedades rurais, incluindo programas de: (i) aproveitamento florestal sustentável; (ii) aproveitamento florestal simplificado; (iii) corte em florestas cultivadas e sistemas agroflorestais e (iv) corte em área deconversão(SFA, 2004). Em todos eles são aplicadas ferramentas que levam ao planejamento participativo e à gestão melhorada do lote.
A existência de uma instituição – mesmo que privada – com atuação em ações de manejo de uso múltiplo e aproveitamento da reserva legal em pequenas propriedades rurais, entre outros aspectos, possibilita maior valorização dos recursos florestais e melhor gestão dos recursos naturais ao nível local. Esta experiência poderia ser aplicada na Amazônia brasileira, principalmente pelas cooperativas de serviços que prestam assistência técnica em assentamentos da reforma agrária.
Outro caso interessante em curso é o de sistematização de experiências de manejo e gestão comunitária dos recursos naturais, que tem acontecido na Guatemala. Este processo prevê a formação de sistematizadores locais e comunitários que lhes permitem aprender e refletir sobre o que estão envolvidos, apropriar-se do processo e capitalizar suas experiências como mecanismo de aprimorar seus modelos de gestão (Pasos, 2005). Além de formação local para sistematização de processos de manejo florestal comunitário em que estão envolvidos, existe um componente forte de intercâmbio regional neste processo, o que proporciona auto-reflexão de seus sistemas de gestão, manejo adaptativo e participação comunitária nas discussões sobre manejo ao nível local. O resultado dessa experiência tem influenciado ações em projetos pilotos desenvolvidos no Acre e no Amazonas. Isso tem acontecido através de intercâmbios entre técnicos que atuam naquela região com apoio da Fundação Ford.
Esta experiência poderia ser adaptada para Amazônia brasileira, aproveitando-se de alguns mecanismos em curso. Recentemente, o ProManejo/PP-G7 lançou edital e está apoiando projetos de sensibilização para o MFC e organização comunitária. No entanto, o apoio está concentrado em ações isoladas, sem uma perspectiva mais ampla (e estratégica) de envolvimento dos produtores familiares e suas organizações no processo.
♦ Mercado para o manejo florestal comunitário
Um dos dilemas enfrentados pelos empreendimentos do MFC está nas dificuldades em acessar mercados cada vez mais competitivos, que garantam preços adequados às condições de produção do MFC e cujo o alto volume de madeira demandada não coloque em xeque a viabilidade do MFC de pequena escala.
Para conseguirem sobreviver nesse tipo de mercado os projetos comunitários devem: i) competir com a atividade ilegal; ii) precisam atender as exigências de padronização, qualidade, volume e freqüência na oferta de produtos a serem comercializados e, iii) necessitam conhecer a estrutura da cadeia de comercialização de maneira a conseguirem melhores preços para seus produtos.
Para superarem estes desafios, as comunidades envolvidas na implementação de planos de manejo florestal na Amazônia brasileira têm desenvolvido algumas alternativas, como é o caso da obtenção de um selo ambiental (para acessar nichos privilegiados de mercados), da construção de estratégias coletivas de comercialização (i,e, organização da produção, reunindo um grupo de comunidades) e da atuação para influenciar nas políticas públicas, de forma a facilitar o acesso dos produtos comunitários ao mercado regional e nacional (i,e, redução da carga tributária para o MFC).
A. A certificação florestal como estratégia para acessar mercado para produtos florestais oriundos de comunidades rurais.
A certificação florestal é posta como uma alternativa para conseguir aumentar melhores preços e diversificar os produtos. O mercado tem-se mostrado cada vez mais sensível a discriminar produtos provenientes de práticas depredadoras das florestas. Esse comportamento começa a forçar empresas do setor madeireiro a reverem as atuais práticas de uso das florestas, buscando formas demanejo e certificação. Essa tendência tem empurrado as iniciativas comunitárias a buscarem o selo cada vez mais de forma precoce.
Um dos principais certificados na área florestal é o FSC (Forest Stewardship Council). A certificação florestal através do FSC, pode ser traduzida como uma tentativa de controlar a exploração dos recursos florestais, através de mecanismos de mercado, que apelam para o poder dos consumidores dos principais países da OCDE (Japão, USA e Europa ocidental) e da capacidade de pressão e formação de opinião dos movimentos sócio-ambientalistas (Amaral Neto & Carneiro, 2004).
Atualmente, a Amazônia brasileira destaca-se no ranking de área certificada na América Latina, pelo selo FSC, com 1,7 milhão de ha certificados. Em termos de importância, isto representa 60 % das áreas certificadas no Brasil (o que inclui também florestas de plantações no Sul-Sudeste do país). No caso da certificação comunitária, o processo é recente e a primeira unidade certificada aconteceu no Acre, em 2002 (Quadro 8).
Quadro 8: Unidades de manejo florestal certificadas na Amazônia brasileira (Fonte: FSC, 2005).
A tendência de crescimento de unidades comunitárias certificadas deve continuar, especialmente, devido ao fortalecimento do processo de manejo florestal comunitário (Amaral Neto & Carneiro, 2004) e à simplificação dos mecanismos de certificação, através do SLIMF[22]. Outros ingredientes importantes a serem considerados no aumento da certificação comunitária estão relacionados às condições de competição de mercados, oferta de recursos destinados exclusivamente para os projetos de MFC alcançarem a certificação e a demanda crescente por produtos certificados, especialmente da indústria de fito-cosméticos.
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[22] Sigla em inglês para Florestas Manejadas em Pequena Escala e Baixa Intensidade, do FSC, tem o objetivo de facilitar o acesso à certificação para operações florestais comunitárias ou de pequenos proprietários de florestas (FSC, 2004).
No entanto, os impactos da certificação para o manejo comunitário ainda precisam ser analisados, principalmente considerando que esta só cumprirá seus objetivos à medida que seus benefícios superem os custos a ela relacionados. Atualmente, é possível dizer que os benefícios da certificação estão mais relacionados ao acesso a novos mercados (Amaral et al., 2005). Dessa forma, torna-se importante considerar a estratégia do projeto, a dinâmica interna da comunidade e a capacidade para ofertar produtos de acordo com as exigências de mercado para relacionar estes aspectos com a perspectiva de certificação.
Por exemplo, os projetos pilotos de MFC que se concentram somente na etapa da extração de madeira, ainda consomem um baixo número de espécies florestais. Este aspecto quando associado à baixa escala produtiva, ao problema da não padronização de bitolas; às dificuldades no tratamento da madeira (i.e.: teor de umidade) e à irregularidade no fornecimento; tornam-se barreiras quase que intransponíveis par acessar determinados mercados. Isso tem levado os projetos a comercializarem madeira no mercado local e regional, ou seja, no mercado ilegal e/ou predatório. Os mercados do Sul e Sudeste do País são atingidos, principalmente, pelos projetos certificados (Figura 4).
Fonte: levantamento junto aos projetos de MFC na Amazônia brasileira.
Figura 4: Comercialização de madeira – projetos pilotos de MFC.
B. Estratégias de comercialização coletiva de produtos florestais oriundos das comunidades
A organização da produção para ganhar escalas, freqüência no fornecimento, constitui-se um dos grandes desafios relacionados a mercados para produtos comunitários. Uma das experiências de maior visibilidade na Amazônia é a criação do Grupo de Produtores Florestais Comunitários, no Acre[23]. A criação deste Grupo é fruto da expansão do manejo e certificação comunitária no Estado, que influenciou em um processo de articulação interinstitucional para dialogar com o mercado e aumentar a capacidade de intervir na formulação de políticas públicas para o setor (Souza & Gomes, 2005).
Além do trabalho de influenciar na regulação da atividade, o Grupo executa atividades de capacitação para organização comunitária e de busca por nichos específicos de mercados, especialmente o certificado. A estratégia de comercialização para safra de 2005 prevê contrato com empresas de São Paulo de venda de mil metros cúbicos de madeira, gerando em torno de um milhão de reais, somente neste verão. Isto significa uma renda de R$ 10 mil por famílias envolvidas no plano de manejo[24].
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[23] O GPFC é constituído por sete organizações de pequenos produtores e extrativistas do Acre, além de instituições de apoio e assessoria (CTA e WWF-Basil), órgãos do Governo do Estado (SEF e SEATER) e Embrapa-Acre.
[24] Este acordo envolveu, também, o Governo do Estado do Acre e visa ampliar a oferta de madeira manejada e certificada do Estado a nichos específicos de mercado, para madeira oriunda de comunidades rurais (Página 20, edição de 05/06/2005).
C. Estratégias experimentadas na América Latina para facilitar acesso a mercado de produtos florestais comunitários
As estratégias buscadas pelas comunidades na América Latina para acessar mercados não têm sido muito diferentes das observadas no processo do MFC na Amazônia brasileira. No geral, tem-se promovido alianças estratégicas entre associações de produtores com intuito de organizar a produção, aumentando escala e qualidade dos produtos oferecidos no mercado. Além disso, as organizações de apoio têm fomentado a certificação florestal e alianças com empresas para realizar negócios sob a perspectiva de comércio justo (Caballero et al., 2002).
As principais motivações para o estabelecimento destes mecanismos para acesso a mercado têm sido: (i) aumento da demanda e crescente escassez do recurso madeira, ocasionando maior valorização dos recursos florestais; (ii) abertura de mercados, fruto do fenômeno da globalização; (iii) democratização do acesso aos recursos florestais (i,e, concessões comunitárias na Guatemala) (Martini, 2005).
Na Amazônia, o estabelecimento de relações entre empresas e comunidades, além ter o incentivo de algumas instituições de pesquisa e assessoria a projetos de MFC, tem sido impulsionada por estratégias estabelecidas pelo Banco Mundial, que visam fomentar a construção de parcerias e cooperações que tragam novas perspectivas para o PP-G7 (Becker, 2004).
A relação entre empresas e comunidades na Região tem se dado mediante diferentes arranjos. Existem casos que visam o aproveitamento de madeira oriunda de desmatamento como estratégia de suprimento de matéria-prima pela indústria. Neste caso, não são previstas ações de manejo. Os casos que envolvem manejo podem acontecer de três maneiras: (i) acordos de cooperação com empresas em algumas etapas de manejo (i,e, arraste, beneficiamento) em projetos de manejo florestal comunitário; (ii) acordos para manejo e processamento de produtos florestais não-madeireiros em unidades empresariais certificadas e (iii) acordos entre empresas de cosméticos e fitoterápicos com associações de pequenos agricultores para fins de manejo e certificação florestal.
Alguns estudos têm analisado estas cooperações no Brasil (Anderson, 2002) e em outras regiões (Mayers and Vermeulen, 2002; Martini, 2005). No entanto, e especificamente no caso da Amazônia brasileira, ainda é preciso analisar as condições necessárias para que esses mecanismos possam mostrar-se viáveis. As lições dos processos na América Latina têm apontado para a necessidade de investigar, entre outros aspectos: critérios de relações de colaboração, estabelecimento de acordos de compromisso participativos, fortalecimento da capacidade de negociação da comunidade, tipo de formalização e contratos, e prazos estabelecido, entre outros (Martini, 2005).
O manejo florestal comunitário na América Latina tem se expandido rapidamente, tanto em termos do volume de áreas manejadas quanto do número de famílias beneficiadas. Somente na Amazônia brasileira, por exemplo, estima-se que 338 mil hectares de floresta estejam sob manejo comunitário e que 3.000 famílias estão sendo beneficiadas. Enquanto na região da Guatemala as estimativas reportam 445 mil hectares manejados com 2300 famílias se reproduzindo econômica e socialmente, a partir de recursos obtidos da floresta. Esses números, embora sejam modestos em relação ao potencial, são bastante expressivos, considerando que no inicio da década de 90 esses empreendimentos não passavam de experiências pilotos e pontuais.
As iniciativas em curso oferecem uma ampla gama de diversidade e arranjos locais para o manejo, em relação às questões técnicas, sociais e de relação com o mercado. Por outro lado, os desafios postos às comunidades continuam em parte sendo os mesmos apontados, desde que as primeiras experiências foram postas em prática, há três décadas. A garantia de acesso e uso da floresta (através da definição fundiária), o fortalecimento da organização social, o crédito, a assistência e o acesso ao mercado, todos esses fatores continuam sendo as principais barreiras a serem superadas pelas iniciativas na perspectiva de sua consolidação.
Entretanto, como foi mostrado ao longo desse trabalho, já se dispõe de um cardápio variado de experiências que mostram formas alternativas e criativas para que o MFC possa ganhar escala e contribuir fortemente para a geração de renda e conservação das florestas das comunidades.
As principais ações, políticas e alternativas para solucionar os problemas do MFC em relação aos fatores expostos acima são:
Regularização fundiária:
O avanço do MFC foi maior onde o processo de regularização fundiária fez parte de uma estratégia clara e vinculada a políticas de conservação das florestas;
Organização social
Crédito
Assistência Técnica
Mercado
This post was published on 25 de novembro de 2015
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