Entre 1990 e 2003, o rebanho bovino da Amazônia Legal cresceu 140% e passou de 26,6 milhões para 64 milhões de cabeças. Neste período, a taxa média de crescimento anual do rebanho na região (6,9%) foi dez vezes maior que no restante do País (0,67%). Estimamos que a renda bruta do abate de bovinos em 2003 na região foi de cerca de R$ 3,5 bilhões – o que revela sua importância para a economia regional. Entretanto, o crescimento da pecuária preocupa pelos seus impactos ambientais e ecológicos, principalmente os associados ao desmatamento. De fato, em uma pesquisa de opinião no Brasil, 88% dos entrevistados responderam que a proteção das florestas deveria aumentar e 93% acreditavam que a proteção ambiental não prejudicava o desenvolvimento do País. Os impactos ambientais do crescimento da pecuária também atraem a atenção internacional e podem ser usados para criar barreiras contra a exportação de carne da região – especialmente para os países mais desenvolvidos. Portanto, o crescimento da pecuária na região deverá considerar seus impactos ambientais e ecológicos.
Este livro – baseado em revisão da literatura e em análises inéditas de dados secundários e coletados pelos seus autores – analisa os fatores que levaram ao rápido crescimento da pecuária na Amazônia, avalia os cenários do futuro dessa atividade na região e propõe políticas que têm o potencial de conciliar o desenvolvimento da pecuária com a conservação ambiental.
A Distribuição e Crescimento da Pecuária na Amazônia
Segundo o IBGE, o rebanho amazônico em 2003 era concentrado em quatro Estados (Mato Grosso, Pará, Tocantins e Rondônia) que possuíam 86% do rebanho regional. Mato Grosso e Pará eram os principais produtores somando 59% do rebanho. Entre 1990 e 2003, Rondônia passou de quinto para terceiro produtor da região. Os três principais Estados produtores em 2003 (MT, PA e RO) contribuíram com 81% do crescimento do rebanho entre 1990 e 2003. As maiores taxas de crescimento neste período ocorreram em Rondônia (14% ao ano), Acre (12,6%/ano), Mato Grosso (8%/ano) e Pará (6%/ano). As taxas de crescimento nos menores produtores pecuários da região – Amapá (1,2%/ano), Roraima (1,6%/ano) e Amazonas (4,4%/ano) – foram baixas em relação aos principais produtores da região; ainda assim, suas taxas de crescimento foram maiores do que no restante do Brasil (0,7%/ano).
Causas do Crescimento da Pecuária na Amazônia
O crescimento da pecuária foi determinado por vários fatores e ocorre em diferentes tipos de sistema de produção. Os dados de campo e a literatura indicam a coexistência de pelo menos duas situações quanto à produtividade do setor. Uma pecuária mais produtiva que, segundo o IBGE, utilizava uma lotação média de 1,38 animal por hectare em 1995 e outra, cuja lotação média era de apenas 0,50 cabeça/ha. A seguir descrevemos os principais fatores associados ao crescimento de ambos os padrões de pecuária.
Lucratividade, baixo preço da terra e produtividade. A pecuária cresceu na região porque tende a ser mais lucrativa que em outras regiões. Isso é possível devido aos baixos preços da terra na região e a maior produtividade das pastagens nos principais centros pecuaristas.
Estimamos que o retorno sobre o investimento na pecuária nas principais regiões produtoras da Amazônia em criações em larga escala (5 mil animais) é significativamente maior do que na região Centro-Sul do Brasil. Por exemplo, a taxa média de retorno do investimento no sistema de cria-recria-engorda em larga escala nas principais regiões produtoras da Amazônia (lucro líquido sobre o patrimônio de 4,6%) foi 35% maior do que no Centro-Sul do Brasil (lucro líquido sobre patrimônio de 3,4%). Outros sistemas de criação em larga escala também são significativamente mais lucrativos. Os sistemas de média escala, com apenas 500 animais, também apresentaram o mesmo padrão de lucratividade e retorno do investimento das criações de larga escala, mas não mostraram diferenças significativas entre Centro-Sul e Amazônia em nossa análise.
De fato, o retorno sobre o investimento na região pode ser ainda mais atrativo na Amazônia considerando o potencial de valorização da terra. Por exemplo, foi estimado que a taxa interna de retorno do investimento em pecuária, considerando a valorização da terra na Amazônia, chega a ser 34% maior que a taxa de retorno sem incluir a valorização da terra (respectivamente 15,5% versus 11,5%). Portanto, a maior lucratividade da pecuária na região estimula investimentos no setor.
Essa alta lucratividade na Amazônia resulta de duas vantagens principais em relação a outras importantes regiões pecuaristas no Brasil. A principal delas é o baixo preço da terra que permite a produção com um investimento relativamente pequeno. O preço das terras em pastagem na Amazônia foi, entre 1970 e 2000, de cerca de cinco a dez vezes mais baixo que em São Paulo e, em 2002, equivalia de 35% a 65% do preço praticado no Centro-Sul. No caso da Amazônia, o preço da terra é o principal custo da pecuária extensiva praticada pela maioria dos fazendeiros na região. Os preços de pastagens na região Centro-Sul aumentaram porque em parte destas terras é possível praticar agricultura mecanizada (por exemplo, grãos ou cana-de-açúcar). Nos últimos anos, a agricultura nessas áreas se tornou mais lucrativa do que as pastagens devido ao aumento dos preços dos grãos e aos ganhos de produtividade da agricultura. Parte dessas pastagens mais caras está sendo transformada em plantios agrícolas. Por outro lado, o preço da terra em boa parte da Amazônia é relativamente baixo porque ainda não existem usos alternativos à pecuária. Portanto, o preço da terra nessas áreas é determinado apenas pela expectativa de lucratividade da pecuária de corte que, em geral, é menor que a lucratividade da agricultura mecanizada.
A outra vantagem é a produtividade mais alta das pastagens nas principais regiões produtoras da Amazônia (sul do Pará, Mato Grosso, Rondônia) em relação às outras regiões do Brasil. Estimamos que a produtividade média de vários sistemas de criação em larga escala na Amazônia foi cerca de 10% maior do que no restante do Brasil. A pecuária mais produtiva dessa região tende a se localizar onde há boa distribuição de chuvas – ou seja, acima de 1.600 mm/ano e abaixo de 2.200 mm/ano em uma região que corresponde a cerca de 40% da Amazônia. Outra justificativa para essa alta produtividade, segundo pecuaristas, é a ausência de geadas.
A maior produtividade aliada ao menor preço das pastagens é suficiente para compensar os menores preços recebidos pelo gado na Amazônia; isto é, os produtores conseguem obter maior retorno pelo investimento do que no Centro-Sul mesmo recebendo um preço pelo gado de 10% a 19% mais baixo que o preço pago aos produtores no Centro-Sul.
Subsídios Naturais e Financeiros. Além do melhor retorno do investimento nas regiões mais produtivas, a pecuária da Amazônia contou com vantagens adicionais para sua expansão expressiva. Por exemplo, o acesso relativamente fácil a terras públicas e a baixa aplicação da lei florestal permitem o acúmulo de capital por meio da exploração ilegal de madeira; parte desse capital é investida na pecuária. Além disso, os fundos constitucionais destinados à Amazônia Legal emprestam dinheiro a taxas de juros de 6% a 10,75% ao ano (bem abaixo da praticada no mercado), permitem descontos de 15% a 25% para produtores adimplentes e possibilitam que associações contratem crédito em nome de pequenos produtores que não possuem título definitivo das terras. Entre 1989 e 2002, o Banco da Amazônia emprestou U$ 5,8 bilhões do FNO rural na Amazônia (excluindo Mato Grosso e Maranhão). Cerca de 40% desses recursos – ou US$ 2,36 bilhões – foram destinados diretamente para a pecuária bovina.
O Papel do Mercado. Frigoríficos localizados nas regiões pecuaristas mais produtivas da Amazônia abastecem mercados nacionais, principalmente o Nordeste e o Sudeste. Em 2000, 87% da carne produzida pelos frigoríficos era destinada ao mercado nacional, enquanto apenas 13% ficavam dentro da própria Amazônia. Portanto, a Amazônia é uma exportadora líquida de carne bovina para outros Estados brasileiros. Além disso, frigoríficos de Mato Grosso, Rondônia e Tocantins já exportam para outros países.
A Pecuária de Baixa Produtividade. A pecuária de baixa produtividade na Amazônia provavelmente está associada aos seguintes fatores: (i) ocupação especulativa de terras em novas fronteiras agropecuárias por meio de plantio de pasto sem limpeza apropriada do solo (apenas com desmatamento e queimada) e baixa adoção de tecnologia de criação animal; (ii) ocupação inadequada de terras de baixo potencial agropecuário, especialmente em regiões com alta pluviosidade e solos pobres; e (iii) degradação das pastagens resultante da compactação do solo, do esgotamento de nutrientes e do uso de gramínea pouco adaptada à região. A ocupação de terras de baixo potencial agrícola é especialmente preocupante, pois gera impactos ambientais e não produz retornos econômicos e sociais expressivos. Em 1995, 6,8 milhões de hectares – ou o equivalente a 14% das áreas alteradas dos estabelecimentos agrícolas eram “terras produtivas não utilizadas” na Amazônia Legal, segundo o IBGE. Essa classificação do IBGE é um indicador aproximado da extensão das terras degradadas na região.
Tendência de Aumento da Produção
Diversos fatores deverão contribuir para um crescimento ainda maior da pecuária de corte na Amazônia em longo prazo. Um deles é o controle da febre aftosa, que está possibilitando a exportação de carne de alguns Estados da região. Mato Grosso, Tocantins, Rondônia e Acre, que possuem 68% do rebanho, já estão credenciados a exportar. O sul do Pará também está avançando no seu controle.
Os focos de aftosa descobertos em Mato Grosso do Sul em outubro de 2005 provavelmente não afetarão no longo prazo as exportações de carne para os atuais compradores. Entretanto, poderá adiar a possibilidade de abrir novos mercados importantes. Portanto, o crescimento adicional das exportações dependerá grandemente da eficácia do controle desta doença nos próximos anos.
Se o controle da aftosa for mantido e ampliado, a região poderá atender uma demanda crescente de carne bovina. A demanda cresceria devido: (i) o aumento de renda em países em desenvolvimento que tende a elevar o consumo de carne per capita – em particular nas camadas mais pobres da população; (ii) o aumento da população nos países em desenvolvimento; (iii) à ocorrência de casos da doença da vaca louca (encefalopatia espongiforme bovina – BSE) na Europa e América do Norte que poderão aumentar a demanda por carne de criações extensivas em pastagens, que é o caso da Amazônia e (iv) devido acordos para a diminuição ou completa remoção dos subsídios aos agricultores da União Européia e dos Estados Unidos. Os custos de produção na Amazônia são menores do que nestes países e, portanto, os produtores amazônicos poderão ganhar parte desses mercados.
A pecuária na Amazônia também seria estimulada por causa da redução de pastos no Centro-Sul do Brasil. A substituição de pastos pela agricultura intensiva continuaria porque a rentabilidade desta tende a ser maior do que a rentabilidade das pastagens e há projeções de aumento expressivo da produção de grãos no Brasil na próxima década.
Finalmente, investimentos em infra-estrutura planejados para a Amazônia – como o asfaltamento da Rodovia BR-163 (Cuiabá-Santarém), de um trecho da BR-364 no Acre e da BR-319 (Manaus – Porto Velho) – tornariam a pecuária da região ainda mais competitiva.
Projetamos de que forma a abertura do mercado para exportação de carne da Amazônia – resultante da expansão do controle da febre aftosa – e o asfaltamento de estradas poderiam afetar a localização da pecuária na região. Para isso, utilizamos o preço do gado pago ao produtor (preço na porteira da fazenda) como um indicador substituto da viabilidade e lucratividade da pecuária. O asfaltamento do trecho paraense da Cuiabá-Santarém e de parte da Transamazônica (entre Marabá e Altamira) aumentaria em 30,4 mil km2 a zona em que o preço seria atrativo para produção de carne (acima de R$ 400,00 por tonelada viva – condições do ano 2000) em relação à situação atual (sem asfaltamento).
Na situação de asfaltamento e de controle da febre aftosa – que permitiria aos produtores obter um preço 10% maior pela carne – a área com preços atraentes para a pecuária aumentaria em 290 mil km2. Além disso, o principal impacto desse cenário seria em uma área de 657 mil km2, que atualmente é apenas marginalmente atrativa (preço por tonelada viva entre R$ 400,00 e R$ 600,00) e que passaria a ser bastante atrativa economicamente (com preço acima de R$ 600,00 por tonelada viva), totalizando 3,4 milhões de km2, dos quais apenas 526 mil km2 (15%) já eram desmatados em 2001. A pecuária provavelmente não se estabeleceria em toda essa área adicional por causa de limitações agro-climáticas para a criação de gado – especialmente o excesso de chuvas em algumas zonas do Pará e Amazonas e a existência de Unidades de Conservação.
Entretanto, as projeções econômicas revelam que uma ampla região pode ser beneficiada pelo asfaltamento e controle da febre aftosa. Essas mudanças poderão resultar em aumento do desmatamento nas terras já ocupadas e em terras públicas devolutas e até mesmo em Unidades de Conservação pouco protegidas.
Como conciliar o crescimento da pecuária com conservação ambiental?
Diante deste panorama, recomendamos estratégias que possam conciliar os anseios locais e regionais para aumentar a produção agropecuária na Amazônia com a conservação biológica e ambiental. Esse modelo é baseado em três princípios.
Criar unidades de conservação. É preciso proteger as terras públicas ricas em biodiversidade e ambientalmente sensíveis. A criação de novas Unidades de Conservação em regiões de baixo potencial agrícola seria a estratégia economicamente eficiente e politicamente menos custosa para atingir esse objetivo. No entanto, será importante também proteger áreas de alto interesse biológico localizadas em zonas com potencial pecuário. Nesse caso, os custos políticos e financeiros seriam maiores devido à pressão local para a utilização dessas áreas.
Combater a ocupação ilegal e promover o manejo de florestas públicas. É necessário combater a ocupação ilegal e o desmatamento de terras públicas florestadas. Assim, a escassez de terras baratas para expandir a pecuária estimularia os produtores a aumentarem a produtividade nas áreas já desmatadas. As florestas públicas deveriam ser destinadas para produção (madeira e outros produtos) por meio de manejo florestal, o que permitiria conciliar crescimento econômico e conservação.
Aperfeiçoar a gestão ambiental em terras privadas. Para isso, será necessário: (i) fortalecer a fiscalização ambiental; (ii) diminuir a impunidade contra crimes ambientais; (iii) garantir que os créditos públicos só sejam destinados a proprietários rurais que respeitem a legislação ambiental; e (iv) regulamentar a recomposição de Reserva Legal de acordo com o novo código florestal. Como prevê o código, a regulamentação envolverá o uso do zoneamento ecológico-econômico para definir as regiões em que proprietários rurais devem recompor a vegetação nativa em até 80% ou 50% da área total do estabelecimento.
Essa estratégia conjunta poderia direcionar os investimentos da pecuária para as áreas com melhor potencial agropecuário, estimular investimentos no aumento de produtividade dos pastos já existentes e melhorar a gestão ambiental nas terras privadas, bem como garantir a conservação de extensas áreas ricas em biodiversidade. A efetiva aplicação dessa estratégia será importante também para proteger a pecuária regional de eventuais barreiras ambientais contra a exportação de carne para países desenvolvidos. A idéia de impor barreiras ambientais nesses países poderá prosperar após a redução de subsídios para produção agrícola.
O agro-negócio é um dos setores que mais têm contribuído para o crescimento econômico do Brasil nos últimos anos. A pecuária bovina em particular, tem tido um papel de destaque nesse cenário. O Brasil tornou-se em 2003 o maior exportador de carne bovina do mundo. Porém, grande parte do crescimento da pecuária tem ocorrido na Amazônia, o que contribuiu para o aumento nas taxas de desmatamento, usado para limpar novas áreas para o plantio de pastos. A reação da opinião pública contra o desmatamento é considerável. Em uma pesquisa de opinião no Brasil, 88% dos entrevistados responderam que a proteção das florestas deveria aumentar e 93% declararam acreditar que a proteção ambiental não prejudicava o desenvolvimento do País (Isa, 2000). Além da reação nacional, a reação da opinião publica internacional contra o desmatamento pode ser usada para criar barreiras ambientais contra a exportação de carne da região. Portanto, a continuação do crescimento da pecuária na região deverá considerar seus impactos ambientais e ecológicos.
Segundo dados do IBGE (2005), o rebanho bovino da Amazônia Legal cresceu de 26,6 milhões de cabeças para cerca de 64 milhões entre 1990 e 2003 – resultado de uma taxa média de crescimento anual de 7%. No restante do Brasil, o rebanho passou de 120 milhões para 131 milhões no mesmo período – representando uma taxa média de crescimento anual de 0,67%; uma taxa 10 vezes menor que na Amazônia. Isso refletiu na participação da pecuária da Amazônia no rebanho nacional, que passou de 18% em 1990 para 33% em 2003.
O crescimento do rebanho bovino na Amazônia intriga, sobretudo, porque os dados agregados sugerem que a produtividade da pecuária bovina varia muito regionalmente. Os dados do último censo agropecuário de 1995 revelam que os pastos mais produtivos, cuja lotação média era de 1,38 animal por hectare, correspondiam a 20% da área total em pastos. Ao mesmo tempo, esses dados mostram que quase sete milhões de hectares estavam abandonados e que os pastos com lotações abaixo de 0,4 animal/ha correspondiam a 40% da área total em pastagem. A coexistência desses dois tipos de pecuária tem gerado confusão sobre a viabilidade econômica da pecuária na Amazônia. Diversos estudos sobre pecuária de baixa produtividade levantam a hipótese de que parte do crescimento do rebanho seria estimulado por motivos especulativos (como o ganho pelo aumento do valor da terra ou como forma de conseguir a posse desta) e devido a subsídios governamentais (Hecht et al., 1988). A baixa produtividade também seria resultado da rápida perda de fertilidade natural dos pastos (Hecht, 1985).
Outros estudos indicam que a produtividade da pecuária em algumas regiões pode ser relativamente alta e resultar em taxas de retorno atrativas, seja logo após o desmatamento ou em pastagens reformadas (Falesi, 1976; Mattos e Uhl, 1994; Arima e Uhl, 1997; Barros et al., 2002; Margulis, 2003). E finalmente, Faminow (1997) argumenta que o crescimento da pecuária na Amazônia estava mais relacionado à demanda regional por carne e ao isolamento geográfico da região do que a fatores relacionados à produtividade. O crescimento populacional urbano na Amazônia e os altos custos de transporte de produtos pecuários do Sul e Sudeste do Brasil até a Amazônia teriam favorecido o desenvolvimento da pecuária regional, apesar dos custos de produção mais elevados na região. Portanto, ainda restam dúvidas sobre em quais áreas o crescimento da pecuária é justificável pelo vigor econômico ou por distorções de políticas públicas, de mercado e do uso abusivo do solo.
Os riscos e problemas ambientais associados à pecuária são principalmente devidos aos desmatamentos. Os pastos plantados – que substituem florestas – ocupavam em 1995 77% da área em uso agrícola na Amazônia (IBGE, 1996). O aumento do desmatamento em 2002 e 2003 – que foi 39% maior que nos cinco anos anteriores[1] – tem aumentado ainda mais as preocupações ambientais. Os desmatamentos ameaçam a biodiversidade e podem causar mudanças climáticas negativas em escalas regionais e globais (Laurance, 1997; Laurance et al., 1998; Goudie, 2001; Bierregaard Jr. et al., 2002). Entre elas, a alteração da circulação de vapor de água reciclado na Amazônia que, por sua vez, pode reduzir as chuvas na região Centro-Sul brasileira, onde se concentra a maior parte da produção agrícola nacional.
As discussões sobre os efeitos globais do desmatamento devem aumentar ainda mais a partir da efetivação do protocolo de Quioto, em fevereiro de 2005. O protocolo obriga os países signatários mais desenvolvidos[2] a reduzir as emissões de gases que contribuem para as mudanças climáticas. Há debates nos quais se discute a possibilidade de também obrigar países em desenvolvimento – inclusive o Brasil – a limitar suas emissões no futuro (ver exemplo em Reuters, 2004). Se o Brasil for obrigado a limitá-las, haverá forte pressão para reduzir os desmatamentos, pois estes foram responsáveis por cerca de 70% das emissões de gases do País em 1994 (Brasil, 2004a).
A expansão da pecuária também está associada a problemas ambientais e sociais localmente – queimadas prejudicam a saúde humana. E a ocupação de novas fronteiras tem sido associada a conflitos agrários, à ocupação ilegal de florestas públicas e ao trabalho escravo (CPT, 2003; Radiobrás, 2005).
Apesar dessas controvérsias e preocupações, governos estaduais e o governo federal estão investindo em políticas que podem permitir um crescimento ainda maior da pecuária na região. Primeiro, o Governo Federal pretende asfaltar rodovias como a Cuiabá-Santarém (BR-163), um trecho da Transamazônica entre Marabá e Altamira e a BR-319 (entre Porto Velho – RO e Manaus – AM). Segundo, governos e setor privado vêm realizando uma campanha contra a febre aftosa[3]. O controle dessa doença e a melhoria de infraestrutura poderiam aumentar as exportações de animais vivos e carne para os mercados interno e externo. A provável erradicação da febre aftosa e o crescimento da demanda levantam três questões importantes: (i) os produtores regionais aumentariam a produção via desmatamento de novas áreas ou investiriam no aumento da produtividade das áreas já desmatadas? (ii) eventuais novos desmatamentos tenderiam a ocorrer nas regiões já ocupadas ou em novas fronteiras? e (iii) quais as opções para conciliar o eventual crescimento da pecuária com a conservação ambiental e ecológica?
Este livro apresenta um panorama da pecuária na Amazônia Legal e suas tendências de desenvolvimento. Ele está dividido em três grandes blocos que representam os objetivos específicos do presente estudo: (i) oferecer uma explicação para o crescimento da pecuária na Amazônia que considera tanto aspectos da oferta como da demanda; (ii) projetar tendências da produção bovina na região, considerando o mercado e as principais políticas públicas ligadas ao setor; e (iii) discutir políticas com potencial de conciliar os objetivos sociais de desenvolvimento econômico com a conservação ambiental. O livro é dirigido aos diversos atores interessados no desenvolvimento sustentável na Amazônia. As análises foram baseadas em diversos estudos da literatura e dados inéditos coletados em campo (ver anexos para maiores detalhes sobre os métodos utilizados).
_____________
[1] O Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) registrou um desmatamento médio de 2,35 milhões de hectares por ano em 2002 e 2003, contra uma média de 1,68 milhão de hectares entre 1997 e 2001. Dados disponíveis em: <http://www.inpe.gov.br>
[2] Entre os países desenvolvidos, os Estados Unidos e a Austrália não ratificaram o documento e, portanto, não se comprometeram a reduzir a emissão de gases causadores de mudanças climáticas.
[3] A febre aftosa é uma doença viral altamente contagiosa que infecta todos os animais de casco fendido como bovinos e caprinos. Apesar de não afetar a saúde humana, o controle dos importadores de produtos pecuários é rigoroso porque a doença reduz o crescimento e a eficiência reprodutiva dos animais. A febre aftosa pode também levar à morte, principalmente os animais jovens (De Cicco, 2004; OIE, 2004). O vírus é transmitido por vários meios incluindo saliva do animal infectado, equipamentos usados na fazenda e vento em um raio de até 60 km no meio terrestre. Além disso, ele resiste por vários meses em carcaças congeladas, principalmente na medula óssea.
A Amazônia Legal foi a principal responsável pelo crescimento do rebanho bovino nacional entre 1990 e 2003 (Figura 1). O rebanho amazônico em 2003 era concentrado em quatro Estados (Mato Grosso, Pará, Tocantins e Rondônia) que possuíam 86% do rebanho regional. Mato Grosso e Pará eram os principais produtores somando 59% do rebanho (Figura 2). O crescimento entre 1990 e 2003 foi mais expressivo nos quatro principais Estados produtores e no Acre – com taxas médias anuais variando entre 4,5%, no Tocantins e 14%, em Rondônia (Figura 3). O crescimento mais acelerado em Rondônia permitiu que esse Estado passasse de quinto para terceiro maior rebanho da região, superando o Maranhão e o Tocantins. Os menores produtores pecuários da região (Amazonas, Roraima e Amapá) tiveram taxas de crescimento relativamente pequenas (Figuras 2 e 3). Os frigoríficos e laticínios registrados no Serviço de Inspeção Federal (SIF) do Ministério da Agricultura em 2003 também estavam concentrados nos principais Estados produtores (Figura 4), indicando as principais zonas produtoras e consumidoras na região. Como seria de se esperar, essa infra-estrutura está associada à distribuição espacial do desmatamento na região.
Figura 1 – Evolução do rebanho bovino na Amazônia Legal e no restante do Brasil entre 1990 e 2003.
Fonte: IBGE, 2005.
Figura 2 – Evolução do rebanho bovino nos Estados da Amazônia Legal entre 1990 e 2003.
Fonte: IBGE, 2005.
Figura 3 – Taxa média de crescimento anual do rebanho bovino nos Estados da Amazônia Legal e no restante do Brasil entre 1990 e 2003. Cálculo dos autores sobre dados do IBGE, 2005.
Figura 4 – Localização de frigoríficos e laticínios registrados no SIF[4] e o desmatamento na Amazônia (2003).
Fonte do desmatamento: Inpe, 2003[5].
_____________
[4]Disponível em:<http://www.ruralbusiness.com.br/industria.asp?secao=3)> Acesso em: dez. 2004.
[5] Disponível em: www.inpe.gov.br. Acesso em: dez. 2004.
Nesta seção mostramos que a pecuária bovina na Amazônia cresceu motivada principalmente por taxas de retorno do investimento maiores que em outras regiões produtoras do Brasil. Os principais fatores para a maior rentabilidade nas principais regiões produtoras da Amazônia são: a melhor produtividade resultante de boas condições agro-climáticas e o relativo baixo preço da terra na Amazônia. Essas condições foram suficientes para compensar o menor preço do gado na região em relação ao Centro-Sul. Além disso, a região contou com capital vantajoso disponível para investimentos, na forma de crédito público subsidiado e oriundo da venda de madeira.
A produtividade da pecuária na Amazônia
A produtividade das pastagens na Amazônia é bastante variável dependendo das condições de manejo do pasto, qualidade genética do gado e diferenças climáticas regionais. Há evidências de regiões agro-climáticas da Amazônia e modelos de criação que atingem produtividades maiores que a de outras regiões do Brasil. O último censo agropecuário do IBGE, realizado em 1995, revela que os pastos mais produtivos da Amazônia, que correspondiam a 20% do total de pastagens, tinham uma lotação média de 1,38 cabeça por hectare. A lotação média da área restante (80%) da Amazônia era de apenas 0,50 cabeça/ha (Arima e Veríssimo, 2002).
♦ A pecuária mais produtiva
A pecuária mais produtiva da Amazônia tende a localizar-se nas zonas onde chove mais do que no Centro-Sul – isto é, acima de 1.600 mm/ano e abaixo de 2.200 mm/ano em uma região que corresponde a cerca de 40% da Amazônia (Schneider et al., 2002). Nessa região, que inclui sul do Pará, Tocantins, Mato Grosso e Rondônia, a produtividade de todos os sistemas de produção extensivos e em larga escala (criação acima de 5 mil cabeças de gado) é, em média, cerca de 10% maior que em outras regiões no Brasil (Tabela 1)[6]. Segundo pecuaristas do sul do Pará, a produtividade nessa região é maior do que no Centro-Sul do Brasil por causa da ausência de geadas e pela relativa abundância e distribuição de chuvas – o que aumenta a disponibilidade de capim (Arima e Uhl, 1997). Além disso, Margulis (2003) observa que a umidade relativa do ar e a temperatura mais alta também favorecem o crescimento mais vigoroso dos capins nessa parte da Amazônia de clima adequado para pecuária – por exemplo, nos municípios de Paragominas (Pará), Alta Floresta e Ji-Paraná (Mato Grosso). De fato, as taxas internas de retorno sobre investimentos em cria-recriaengorda na Amazônia mais produtiva (de 9% a 15%) são de 40% a 134% maiores do que em Tupã (6,4% – Margulis, 2003), que é uma importante região de pecuária em São Paulo.
Em várias regiões da Amazônia, a maior produtividade resulta da reforma de pastagens degradadas. Os pastos degradados geralmente são infestados por plantas invasoras e o solo é compactado. A reforma de pasto consiste em remover as plantas invasoras, gradear o solo e plantar capins mais adaptados à região, principalmente o Brachiaria brizantha[7] e, em alguns casos, adubar o solo. Mattos e Uhl (1994) mostraram que a lotação em pastagens reformadas em Paragominas era de uma cabeça por hectare. Os animais criados nos pastos reformados eram abatidos seis meses antes do que no sistema convencional extensivo em pastagens com plantas invasoras (popularmente denominadas de juquira).
Tabela 1 – Produtividade de criação de gado de corte em pastos plantados em larga escala (5 mil animais) nas regiões mais produtivas da Amazônia e em outras regiões do Brasil.
_____________
[6] Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre as outras regiões, talvez devido ao pequeno número de observações.
[7] O capim Brachiaria brizantha foi usado principalmente para substituir o capim colonião (Panicum maximun), que foi a espécie mais comum nas primeiras pastagens. Porém, o colonião é pouco resistente à seca e, portanto, teve baixo desempenho devido a veranicos na Amazônia. Outras espécies do gênero Brachiaria e leguminosas também são utilizadas em reformas de pastos, mas com menor freqüência.
♦ A pecuária de baixa produtividade
A pecuária de baixa produtividade na Amazônia pode ser explicada por, pelo menos, três motivos principais. Primeiro, os ocupantes iniciais – que desmatam e queimam a floresta – geralmente não investem na limpeza apropriada do solo. Dessa forma, os pastos iniciais competem com tocos e rebrotos da vegetação primária. Os pastos relativamente sujos resultam do baixo investimento, seja por falta de capital ou porque esses ocupantes apenas querem estabelecer a posse da área para vendê-la posteriormente. A produtividade nessas áreas também é reduzida, devido à baixa adoção de tecnologias de criação animal (Margulis, 2003; Tourrand e Veiga, 2003[8]). Entretanto, se as terras estiverem localizadas em região com bom potencial pecuário e a infra-estrutura melhorar, esses ocupantes obterão lucro vendendo-as para outros produtores mais eficientes, que estabelecem fazendas maiores e consolidam regiões produtoras. Esses produtores finais – mais capitalizados e com maior acesso à informação – capturam as vantagens da produção em maior escala e mais intensiva em tecnologia e podem obter lucros maiores. Os ocupantes iniciais beneficiam-se principalmente pela ocupação e eventual valorização da terra (Schneider, 1995; ver também discussão em Margulis, 2003).
No caso dos pequenos produtores, a duração da colonização inicial de uma propriedade varia regionalmente e pode estar relacionada ao tempo necessário para converter a reserva de floresta em pastagem. Seriam necessários, por exemplo, de 12 a 15 anos para uma família converter entre 100 hectares e 150 hectares de floresta em pastagens na Transamazônica (Tourrand e Veiga, 2003). Depois desse período, muitos colonos vendem as terras e migram para novas fronteiras de ocupação em busca de novas áreas[9].
A segunda causa da baixa produtividade da pecuária é a ocupação de terras de baixo potencial agropecuário – especialmente regiões com alta pluviosidade e ocorrência de solos de baixa fertilidade ou mal drenados. Por exemplo, Chomitz e Thomas (2001) estimaram que a lotação dos pastos diminui, em média, de 0,38 para 0,27 cabeça por hectare quando ocorre um aumento de 1.600 mm para 2.300 mm de chuva, excluindo o efeito de outros fatores como a distância até rodovias e mercados, o tipo de solo, o tamanho médio das propriedades e a quantidade de mão-de-obra utilizada[10]. A alta pluviosidade pode afetar a produtividade da pecuária de várias maneiras, incluindo: a alta incidência de plantas invasoras, os altos custos de manutenção de estradas, a perda mais rápida dos nutrientes do solo por lixiviação, percolação e erosão e a alta incidência de pragas e doenças.
Análises adicionais revelam a importância da alta pluviosidade no detrimento da produtividade. Quase um quarto das áreas desmatadas da Amazônia até 2003 estava em zonas com pluviosidade acima de 2.200 mm. Em 1995, de acordo com dados do IBGE, 21% dos estabelecimentos rurais nessa zona eram “terras produtivas não utilizadas” (Schneider et al., 2002). Vale notar que essa zona inclui áreas com boa infra-estrutura e proximidade do mercado consumidor (como a região metropolitana de Belém), enquanto nas regiões de pecuária mais produtiva do Pará, como Redenção, Marabá e Paragominas, as “terras produtivas não utilizadas” equivaliam a apenas 2% a 3% da área dos estabelecimentos rurais (IBGE, 1996). A área total de estabelecimentos rurais na classe “terras produtivas não utilizadas” na Amazônia Legal chegava a 6,8 milhões de hectares em 1995 (IBGE, 1996) – o equivalente a 14% da área alterada nestas propriedades. Esse índice era 85% maior do que no restante do Brasil.
Finalmente, a baixa produtividade resulta da degradação das pastagens devido à compactação do solo, à baixa resistência da espécie de capim plantada inicialmente e ao esgotamento dos solos em regiões de ocupação antiga. Parte desses pastos pode se tornar mais produtiva por meio da renovação de pastagens. O fato de que o crédito público subsidiado na Amazônia vem sendo largamente usado para a pecuária pode indicar uma tendência de aumento de reforma de pastagem em algumas das principais regiões produtoras (ver seção sobre disponibilidade de crédito). Entretanto, é importante notar que parte dos pastos degradados dificilmente será transformada em pastos de alta produtividade. Isso porque o terreno em parte das fazendas é impróprio para o uso de máquinas agrícolas necessárias para recuperar as pastagens. Um dos autores deste livro observou, em janeiro de 2005, no leste do Maranhão (ao longo da Rodovia BR-222) e no leste do Pará (ao longo da Rodovia Belém-Brasília), que os fazendeiros não recuperam os pastos nos trechos de alto declive, pois é inviável gradear o solo usando tratores. Uma parcela desses trechos estava intensamente degradada, incluindo erosão; outros trechos estão se tornando florestas secundárias[11].
Em suma, é plausível a coexistência de uma pecuária com produtividade relativamente baixa e uma pecuária de produtividade média e alta bem-sucedidas. As principais regiões produtoras da Amazônia são mais produtivas que no Centro-Sul do Brasil, o que contribui para os menores custos médios de produção observados, como veremos a seguir.
_____________
[8] Segundo Tourrand e Veiga (2003), as deficiências de investimento e tecnológicas incluem: baixa qualidade de sementes, falta de mineralização do gado ou uso de sais minerais inapropriados e baixa higiene de instalações.
[9] Entretanto, vale notar que em algumas regiões com bons solos, os pequenos produtores conseguem se manter nos lotes pequenos e médios com a pecuária e outras culturas mais rentáveis – como o cacau, em trechos da Transamazônica (ver discussão em Tourrand e Veiga, 2003).
[10] No Acre, foi observada a partir de 1995 a morte de pastagens de Brachiaria brizantha devido ao encharcamento temporário em algumas áreas. A B. brizantha foi substituída por outras variedades com bastante sucesso (J. Valentin, Pesquisador da Embrapa, comunicação pessoal). Segundo J. Valentin, existem gramíneas bem adaptadas ao clima mais chuvoso, como Brachiaria mutica, B.humidicola, B. arrecta, entre outras e, por isso, não há dificuldades técnicas para criar gado em regiões mais chuvosas. Entretanto, os dados agregados do IBGE sugerem que os custos médios de produção são maiores em regiões mais chuvosas (acima de 2.200 mm). Portanto, sugerimos pesquisas empíricas de campo para verificar a viabilidade da expansão da pecuária nas áreas mais úmidas da região.
[11] A recuperação florestal pode ser lenta em algumas áreas, em decorrência da alta freqüência de incêndios.
A vantagem do baixo preço da terra na Amazônia
Os custos de produção da pecuária de corte na Amazônia são mais baixos que no resto do País, principalmente devido ao menor preço da terra naquela região. Os preços de pastagens plantadas no Pará corresponderam, em média (e mediana), a apenas 11% do preço dos pastos em São Paulo, entre 1977 e 2000 (Fundação Getúlio Vargas, vários anos). No mesmo período, os preços das pastagens em Rondônia e Mato Grosso equivaleram, respectivamente, a 15% e 21% dos preços em São Paulo. Dados de 2002 revelam que os preços de pastagens nas principais regiões pecuaristas da Amazônia (variando de R$ 1.200,00 a R$ 2.000,00 por hectare) correspondiam a 36% e 61% do valor de pastagens em Tupã, uma importante região de pecuária em São Paulo (Tabela 2).
Essa diferença é muito importante, pois o custo de capital investido na terra é o principal componente nos custos de produção em uma fazenda de criação extensiva de gado. Outros insumos para produção pecuária como arames para cerca, maquinário e medicamentos, são mais caros na Amazônia. Porém, esses insumos correspondem a apenas 15% a 20% dos custos totais decorrentes do uso de um modelo extensivo de criação (Arima e Uhl, 1997).
Os preços de pastagens no Centro-Sul do Brasil são mais altos que na Amazônia devido a dois fatores principais. Primeiro, as melhores condições para agricultura intensiva em algumas regiões no Centro-Sul favoreceram a sua valorização. Assim, o preço das pastagens em terras que têm aptidão agrícola nessa região reflete em parte ou totalmente o uso alternativo agrícola[12]. O caso das pastagens em Tupã (São Paulo) é ilustrativo. O preço teórico[13] da pastagem nessa região seria de cerca de R$ 1.300,00/ha, considerando a lucratividade de R$ 65,00/ha e uma taxa de desconto mínima de 5% em aplicações financeiras sem risco (Tabela 2). Entretanto, o preço médio das pastagens na região de Tupã é de cerca de R$3.300,00/ha, ou 2,5 vezes maior que o preço teórico. Outro indicativo dessa discrepância: para que o preço do pasto em Tupã refletisse a lucratividade de R$ 65,00/ha da pecuária, a taxa de desconto deveria ser de apenas 2%, uma taxa muito baixa até mesmo para regiões consolidadas, onde os riscos são pequenos.
Em médio prazo, o uso do solo em regiões com pastos valorizados além do normal tenderá a ser substituído por culturas mais rentáveis[14]. De fato, isso já vem ocorrendo. Por exemplo, pecuaristas que ocupavam terras com potencial agrícola no Centro-Sul do Brasil estão se tornando agricultores ou vendendo as terras para investir em pecuária em outras regiões. Arima e Uhl (1997) encontraram que 44% dos pequenos e 28% dos médios fazendeiros entrevistados no sul do Pará venderam suas fazendas em outros Estados para investir em áreas bem maiores no Pará.
_____________
[12] O potencial de uso agrícola pode influenciar o preço da pastagem tanto quando uma pastagem está prestes a ser substituída por cultivos agrícolas mais rentáveis, como quando a terra pode ser usada com culturas intercalares – ou seja, um período como pasto e outro como cultivos agrícolas quando os preços de grãos estão altos.
[13] O preço teórico da terra reflete a expectativa de renda a ser obtida com seu uso atual e futuro, considerando uma taxa de desconto aceitável pelos proprietários rurais.
[14] Em teoria – isto é, em um mercado de terras perfeitamente competitivo – as terras em pastagens com aptidão para cultivos agrícolas mais rentáveis que a pecuária seriam imediatamente transformadas em cultivos agrícolas. Entretanto, na realidade, a alocação eficiente de uso da terra não é instantânea. Os pecuaristas podem, por exemplo, resistir à mudança de uso do solo esperando mudanças no mercado, como o aumento do preço do gado ou a redução dos preços dos grãos. E mesmo aqueles que estão decididos a mudar o uso do solo podem precisar de certo tempo de aprendizado sobre novas culturas agrícolas antes de substituir as pastagens.
Outro fator que eleva o preço das pastagens no Centro-Sul é a proximidade do mercado consumidor, mesmo para aquelas sem um uso alternativo à pecuária. O menor custo de transporte da carne até os principais mercados consumidores gera uma renda econômica maior, que é transferida para o preço da terra, considerando os outros fatores, como a produtividade, constantes. Essa transferência se dá através de preços do boi gordo relativamente mais altos no Centro-Sul. Por exemplo, o preço do boi em São Paulo foi cerca de 10% a 20% maior que nos principais produtores da Amazônia entre janeiro de 1998 e dezembro de 2002 (Figura 5). O menor preço pago ao produtor na Amazônia reflete o desconto do custo de transporte do gado (ou da carne) da fazenda (ou do frigorífico) até o mercado consumidor do Centro-Sul. Barros et al., (2002) creditam o menor preço do gado na Amazônia às restrições de comércio devido à febre aftosa. Entretanto, mesmo quando o transporte de animais vivos não era proibido, o preço do gado na Amazônia (exceto na região de Manaus) já era inferior ao preço pago no Centro-Sul (Arima e Uhl, 1997).
Nas principais regiões produtoras da Amazônia, os preços de pastagens correspondem, em geral, aos preços teóricos, de acordo com as lucratividades estimadas e taxas de desconto em torno de 10% (Tabela 2). Isso revela que, em geral, essas terras parecem estar sendo usadas conforme o seu maior potencial de geração de renda e não há outros usos alternativos mais rentáveis. Entretanto, o preço de pastagens em Redenção e Santana do Araguaia, no sul do Pará, estavam relativamente altos (Tabela 2). Isso pode ser reflexo da maior proximidade dessas regiões com os mercados ou o potencial para cultura de grãos no sul do Pará que começa a se desenvolver.
Enfim, os baixos preços da terra na Amazônia em relação ao Centro-Sul brasileiro explicam, em parte, o crescimento do rebanho na Amazônia, apesar de ela estar longe dos principais mercados consumidores. Os preços das pastagens na Amazônia são menores que no Sudeste por causa de sua maior distância até o mercado consumidor e da ausência de uso alternativo agrícola mais rentável na maior parte da região.
Figura 5 – Valores nominais do preço do boi gordo em São Paulo e nos principais Estados produtores amazônicos entre janeiro de 1998 e setembro de 2002 (Fonte: Anualpec, 2003).
Tabela 2 – Lucratividade e preços real e teórico de pastagens em regiões produtoras da Amazônia e de São Paulo (Fonte: Barros et al., 2002).
_____________
[15] Preço da terra com infra-estrutura já instalada (Barros et al., 2002).
[16] Para testar a hipótese de “supervalorização das pastagens no Centro-Sul”, utilizamos os valores de lucratividade e preços da terra encontrados por Barros et al. (2002) e calculamos o preço da terra teórico sob diferentes taxas de desconto. Calculamos também a taxa de desconto necessária para igualar a lucratividade ao preço da terra. O preço da terra (P), em teoria, é a soma do valor presente do fluxo perpétuo da lucratividade e pode ser calculado dividindo-se a lucratividade por ano pela taxa de desconto:
[17] Taxa de desconto necessária para igualar a soma do fluxo de receitas com o preço da terra.
O retorno do investimento em pecuária na Amazônia
No início desta seção mostramos que a pecuária mais produtiva na Amazônia tem duas vantagens principais: menor preço da terra e maior produtividade. Entretanto, os preços do boi gordo na região são menores. Por isso, o lucro por hectare da criação de gado em larga escala (5 mil animais) na região amazônica é cerca de 10% menor que na região Centro-Sul[18] (Tabela 3).
Portanto, para explicar a expansão da pecuária na região, o baixo preço da terra e a maior produtividade teriam de ser suficientes para compensar os menores preços do boi – ou seja, a taxa de retorno do investimento deveria ser maior que em outras regiões. De fato, o retorno sobre o investimento, definido como a porcentagem do lucro líquido sobre patrimônio, é significativamente superior na Amazônia nas criações em larga escala (5 mil animais) por causa dos baixos preços da terra (Tabela 3). A taxa de retorno da pecuária nas principais regiões produtoras da Amazônia (4,58%) é 35% superior ao restante do Brasil (3,38%) no sistema de cria-recria-engorda. Os mesmos resultados são observados em outros sistemas com escala. Porém, os sistemas de média escala, com apenas 500 animais, não mostram diferenças significativas entre Centro-Sul e Amazônia, embora o padrão de lucratividade e retorno do investimento sejam os mesmos das criações em larga escala.
Outro fator que contribui para explicar a expansão da pecuária na Amazônia é a valorização da terra, que amplia a taxa de retorno do investimento. Margulis (2003) estimou que a taxa interna de retorno do investimento em pecuária, considerando a valorização da terra na Amazônia, era 34% maior que a taxa de retorno sem incluir a valorização da terra (respectivamente 15,5% versus 11,5%); enquanto que na criação de gado em Tupã (SP) não haveria perspectiva de elevação do preço da terra. De fato, o potencial de valorização das terras na Amazônia é apontado por consultores como uma grande vantagem do investimento em pecuária na região – especialmente nas regiões com aptidão para agricultura ou com potencial para redução de custos de produção na pecuária, considerando terras baratas, áreas com grandes glebas disponíveis (ganho de escala) e perspectiva de melhoria de infra-estrutura (Ferraz et al., 2002).
♦ Retorno sobre investimento na pecuária de baixa produtividade
O que explicaria o investimento na pecuária menos produtiva? Aparentemente, a expectativa de ganhos robustos com a pecuária e o acesso relativamente fácil às terras devolutas explicam a ocupação de novas áreas, mesmo com uma pecuária inicialmente de baixa produtividade. A corrida para ocupar novas terras públicas sugere que o preço de venda das terras após essa ocupação é, em geral, atrativo o suficiente para compensar os riscos e custos envolvidos na ocupação (ver discussão em Margulis, 2003). Entretanto, a alta proporção de “terras produtivas não utilizadas” em algumas regiões da Amazônia indica que a ocupação agropecuária foi equivocada em algumas regiões. É pouco provável que o retorno do investimento para a ocupação dessas áreas tenha sido atrativo.
Tabela 3 – Lucratividade, produtividade e retorno sobre investimento na pecuária no Centro-Sul e nas principais regiões produtoras da Amazônia[19].
_____________
[18] As lucratividades médias por hectare para a Amazônia descritas por Margulis (2003) – de R$ 105/ha com valores máximos de até R$ 139/ha em Alta Floresta/MT – são bem mais altas que o valor médio calculado na Tabela 5 para a Amazônia (cerca de R$ 75/ha) a partir dos dados do Anualpec 2003. Esses valores mais altos provavelmente representam os limites máximos de lucratividade de fazendas grandes na Amazônia. A área média das fazendas analisadas por Margulis (2003) era de 6 mil hectares. Assim, economias de escala poderiam explicar a lucratividade mais alta de suas estimativas.
[19] Estimativas dos autores com dados do Anualpec, 2003.
[20] Inclui 19 regiões pecuaristas do Sudeste, Sul e Centro-Oeste do Brasil, exceto Mato Grosso.
[21] Inclui regiões pecuaristas nos Estados de Mato Grosso, Tocantins, Rondônia e Pará.
Disponibilidade de capital para investimento
Além do melhor retorno do investimento, a pecuária da Amazônia contou com vantagens adicionais para sua expansão expressiva, incluindo o fácil acesso ao capital natural da floresta e o crédito público subsidiado.
♦ Exploração de madeira
Juntamente com a terra, a madeira tem sido o capital natural mais acessível na região. Por causa da perspectiva de bom retorno financeiro da pecuária, proprietários rurais e ocupantes de terras públicas vendem madeira e investem tanto na formação quanto na reforma de pastagens. Por exemplo, o dinheiro obtido com a venda do direito de exploração de cerca de três hectares de floresta era usado para reformar, em média, um hectare de pastagem no leste do Pará no final da década de 1980 (Veríssimo et al., 1992). Máquinas utilizadas na extração, como os tratores de esteira, são empregadas na reforma de pastagens pelos próprios madeireiros.
Não há estimativas do volume de recursos do setor madeireiro que é investido na pecuária, mas pode ser significativo. Em um levantamento feito em 2004 na Amazônia, 20% dos madeireiros entrevistados declararam investir em pecuária (Lentini et al, 2005). A receita líquida do setor em 1998 pode ter ficado em torno de US$ 375 milhões, considerando uma taxa de lucro de 15% sobre as vendas brutas de cerca de US$ 2,5 bilhões, estimada por Lentini et al. (2003). Além disso, a exploração de madeira instala uma infra-estrutura de transporte (pontes e estradas) que é usada para ocupar terras públicas e para o desenvolvimento da pecuária. Vale frisar que o investimento dos madeireiros em pecuária reforça o argumento de que a pecuária é percebida como um investimento lucrativo ou, pelo menos, de baixo risco (Margulis, 2003).
♦ Crédito subsidiado
Os pecuaristas da Amazônia contam com financiamento público subsidiado que torna os investimentos na região ainda mais vantajosos. Os principais fundos públicos usados na Amazônia Legal são o Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO), usado nos Estados da região Norte, e o Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste (FCO), disponível em Mato Grosso. Além disso, a porção amazônica do Maranhão conta com recursos do FNO e também do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE)[22]. Esses fundos são financiados por 0,6% da arrecadação do Imposto de Renda e Imposto sobre Produtos Industrializados de todo o Brasil.
As taxas de juros do crédito rural desses fundos variam entre 6% e 10,75% ao ano, respectivamente, para miniprodutores (aqueles com renda bruta anual abaixo de R$ 80 mil) e grandes produtores (renda acima de R$ 1 milhão/ano). Essas taxas são muito mais baixas que as taxas de mercado[23] e os produtores que pagam as prestações em dia obtêm um desconto de 15% da taxa de juros. No caso do FNO, para agricultores familiares (Pronaf/Grupo C) a taxa de juros é de apenas 4% ao ano e está sujeita a um desconto de 25% para produtores adimplentes (Brasil, 2004b; Brasil, 2004c). Esses fundos também incluem facilidades para o investimento por parte de pequenos proprietários que não teriam acesso a outros tipos de crédito. Esse é o caso dos pequenos produtores sem garantias e sem títulos definitivos de posse da terra, que podem solicitar empréstimos por meio de associações.
Entre 1989 e 2002, o Banco da Amazônia emprestou U$ 5,8 bilhões do FNO rural na Amazônia (excluindo Mato Grosso e Maranhão). Cerca de 40% desses recursos – ou US$ 2,36 bilhões – foram destinados diretamente para a pecuária bovina. Outros investimentos que podem ter sido parcial ou totalmente associados à pecuária corresponderam a uma porção significativa do total. Um exemplo disso são os investimentos e custeio geral e melhoramentos não específicos, que corresponderam a 31% no período (Tabela 4).
Os principais Estados pecuaristas atendidos pelo FNO receberam a maioria dos empréstimos gerais e para a pecuária. Pará, Rondônia e Tocantins receberam juntos 85% do total e 87,4% dos recursos destinados à pecuária. Quase 72% dos recursos destinados à pecuária foram emprestados aos produtores maiores, que são atendidos pelo FNO Normal. Os produtores menores, atendidos pelo FNO Especial, receberam apenas 28% do total destinado à pecuária (Tabela 4). O Anexo III apresenta os valores, por Estado, destinados para o FNO Especial e Normal.
Tabela 4 – Distribuição dos investimentos do FNO rural entre 1989 e 2002. Valores (em milhares de US$) de dezembro de 2002. Dados em ordem decrescente do valor total emprestado por Estado (Fonte: Banco da Amazônia).[24]
É difícil estimar o efeito geral do FNO na ampliação recente do rebanho, mas ele pode ser significativo. O rebanho a ser adquirido nos financiamentos equivaleu a cerca de 9% do incremento direto do rebanho entre 1990 e 2001 (Pacheco, 2002). Contudo, 86% do rebanho a ser adquirido com financiamento do FNO entre 1989 e 2001 eram de reprodutores e, portanto, deve ter tido um efeito multiplicador importante nesse período. Os maiores produtores (financiados pelo FNO Normal) compraram 87% do total de reprodutores, indicando um grande potencial de multiplicação do gado, uma vez que estes detêm a maioria das pastagens. Além disso, metade do investimento na pecuária bovina foi destinada a outros fatores que têm efeito multiplicador, como a reforma de pastagem e compra de máquinas.
_____________
[22] Para saber mais sobre os fundos, ver página eletrônica do Ministério da Integração Nacional, disponível em: <http://www.integracao.gov.br/fundos/fundos_constitucionais/index.asp>
[23] A taxa de juros do crédito agrícola em agosto de 2003 era de 8,75% para o Crédito Rural; 28% para a Cédula de Produto Rural (com aval) e 16% a 19% para a Poupança Verde (Raíces, 2003).
[24] Base de dados obtida na sede do Basa em Belém.
O papel do mercado na pecuária bovina da Amazônia
A demanda por carne bovina também teve um papel importante na expansão da pecuária bovina na Amazônia. Até recentemente, a Amazônia abastecia apenas o mercado regional e nacional, e entre 2001 e 2003, alguns Estados passaram também a exportar carne. Os principais produtores da região – Pará, Mato Grosso, Rondônia, Tocantins e Acre – abastecem principalmente outros Estados da região (Amapá, Amazonas e Roraima) e parte do mercado nacional. Entre 2001 e 2003, Mato Grosso, Tocantins e Rondônia passaram a poder exportar carne para outros países. O efeito do comércio internacional na região ainda é recente e pouco documentado[25], mas poderá se tornar muito importante no futuro (ver seção sobre controle da febre aftosa). Nesta seção, apresentamos as características da comercialização de gado e carne nos principais “eixos” pecuários e discutimos a influência do recente controle da febre aftosa nesse comércio (Figura 6). As informações descritas a seguir foram obtidas por meio de entrevistas com 28 compradores de gado e 21 gerentes de frigoríficos em 27 municípios da Amazônia Legal conduzidas no ano de 2001 (ver detalhes sobre os métodos no Anexo I).
Figura 6 – Eixos rodoviários, Estados e municípios selecionados para o levantamento.
_____________
[25] A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne apresentava, em janeiro de 2005, na sua página eletrônica (disponível em: <http://www.abiec.com.br>), apenas o destino das suas exportações, mas não os Estados de origem. A página eletrônica do Ministério da Agricultura não apresentava, até janeiro de 2005, estatísticas de origem das exportações.
♦ Comercialização de animais vivos
O comércio de animais é realizado em quase todos os municípios produtores. Entretanto, alguns concentram a comercialização, como os municípios paraenses de Xinguara e Redenção, Barra do Garças, em Mato Grosso e Ariquemes, em Rondônia, que hospedam vários escritórios de compra e venda de gado pertencentes aos “intermediários de animais”. Frigoríficos locais também compram animais em municípios vizinhos. A comercialização inicia-se com a venda de animais dos produtores para os escritórios de intermediários, frigoríficos ou ainda para matadouros clandestinos (Figura 7). Os intermediários comercializam animais adultos e jovens, que vendem para o mercado interno da Amazônia e para outros Estados. Entretanto, geralmente são especializados na compra e venda de somente um tipo de animal (na maioria das vezes, apenas animais adultos). A maioria dos compradores de gado entrevistados comercializava os animais na própria região amazônica (Figura 8). Porém, no leste do Pará (ao longo da rodovia PA–150) e ao longo da rodovia Transamazônica (BR–230), os intermediários comercializavam intensamente para o Nordeste do País. Considerando as regiões visitadas como um todo, 69% dos animais eram vendidos nos mercados amazônicos, enquanto 21% eram comercializados para fora da região.
Figura 7 – Cadeia de comercialização de bovinos vivos na Amazônia.
Figura 8 – Destino da venda de animais vivos de acordo com região produtora (ver regiões produtoras na Figura 6).
Os Estados do Amazonas e Amapá são grandes importadores de animais, pois não possuem um rebanho que atenda a suas demandas internas. Essa demanda é suprida principalmente por animais de Rondônia, Acre, Roraima e Pará. O transporte de animais entre esses Estados inclui o uso de balsas nos rios Madeira, Xingu, Amazonas, Negro e Branco.
♦ O impacto da febre aftosa no comércio de animais vivos
O comércio de animais vivos na Amazônia sofreu mudanças após o início de uma campanha nacional contra a febre aftosa. Animais de zonas infectadas foram proibidos de transitar em zonas tampão e zonas livres (ver detalhes na seção A campanha para controlar a febre aftosa). Mato Grosso e Tocantins, que foram considerados zonas livres da doença em 2001, proibiram a compra de animais de Estados como Rondônia e Pará, que ainda eram zonas infectadas ou tampão. A produção de Rondônia foi destinada principalmente ao mercado interno. Isso significou um prejuízo enorme, pois nos três anos antes da proibição, cerca de metade dos animais vendidos em Rondônia eram destinados ao Centro-Oeste e Sudeste (Basa, 1999). O Pará foi menos prejudicado, pois parte da sua produção abastecia zonas também infectadas do Nordeste, Macapá, Manaus e seu próprio mercado interno.
Atualmente, as principais zonas pecuaristas da Amazônia (Rondônia, Mato Grosso, Tocantins, Acre e sul do Pará) são classificadas pelo Ministério de Agricultura como zonas livres de febre aftosa com vacinação. Por isso, o trânsito e comércio de animais vivos e de carne com osso entre essas regiões é permitido.
♦ A comercialização de carne
A campanha de controle da febre aftosa é menos restritiva ao comércio de carne (principalmente carne desossada) do que ao comércio de animais vivos produzidos na Amazônia. Há vários canais de comercialização da carne. Os matadouros vendem a carne ainda não resfriada para açougues e feiras livres do próprio município ou de localidades vizinhas. Os frigoríficos vendem a carne resfriada para médios e grandes distribuidores, cadeias de supermercados e para exportação. Os frigoríficos e os matadouros também vendem a carne para intermediários (conhecidos como “marchantes”), que a distribuem para açougues ou supermercados (Figura 9).
Os 21 frigoríficos visitados em 2001 tinham uma capacidade total de abate de 13.070 cabeças por dia; o que equivalia a uma média de 620 animais/dia por frigorífico. No entanto, na época da entrevista, os frigoríficos pesquisados estavam abatendo 8.800 animais/dia, ou 67% da capacidade instalada.
Em média, 87% da carne produzida pelos frigoríficos visitados eram destinados a Estados fora da Amazônia, enquanto 13% eram comercializados no mercado regional. O grande mercado para a carne dos frigoríficos visitados é o Sudeste do País (Figura 10). A maior parte da carne produzida no Pará era, segundo os entrevistados, vendida para as regiões Nordeste e Sudeste. Entretanto, os frigoríficos paraenses também vendiam carne para o mercado interno do Estado – principalmente para os supermercados de Belém (capital do Pará). Os frigoríficos de Tocantins vendiam para a região Nordeste, e os de Mato Grosso vendiam principalmente para o Sul e Sudeste brasileiro, enquanto os principais mercados para a carne de Rondônia eram o Amazonas e a região Sudeste. Tocantins e parte de Mato Grosso passaram a poder exportar carne a partir de 2001, Rondônia, a partir de 2003, e Acre em 2005; mas não dispomos das estatísticas da eventual exportação desses Estados.
Foi impossível estimar o balanço do comércio de animais vivos ou de carne entre os Estados da Amazônia. Entretanto, todos com quem conversamos foram unânimes em dizer que o Pará, Rondônia, o Acre, o Tocantins e Mato Grosso eram exportadores líquidos de carne, enquanto o Amazonas e o Amapá eram importadores líquidos de carne bovina. O déficit dos Estados importadores era suprido pelos Estados da própria região Amazônica. Uma forma indireta de aferir a auto-suficiência regional na produção de carne foi estimar a razão entre o rebanho bovino e a população humana local (Tabela 5). Esse índice para as regiões Nordeste e Sudeste, principais compradoras da carne da Amazônia, é de aproximadamente 0,50. O índice para o Norte é de 1,63, 72% acima da média para o Brasil (0,95). Os principais Estados produtores da Amazônia Legal (Mato Grosso, Tocantins, Pará e Rondônia) têm índices acima de um bovino por residente. Amazonas e Amapá possuem índices relativamente baixos, 0,36 e 0,14, respectivamente – um indicador de que são importadores líquidos de carne bovina[26]. Roraima, apesar de não vender carne para outros Estados, é auto-suficiente e comercializa animais vivos para o mercado de Manaus.
Em resumo, os dados de comercialização mostram que a Amazônia produz carne para o seu mercado interno e para abastecer parte da demanda de outros Estados. Os produtores vendem para outras regiões porque o preço é competitivo – ou seja, os custos médios de produção são baixos o suficiente para compensar o custo de transporte da carne dos frigoríficos até outras regiões. Essa conclusão contraria o argumento de Faminow (1997) de que a pecuária desenvolveu-se na Amazônia devido ao seu isolamento geográfico e aos altos custos de transporte entre o Sul produtor e o Norte consumidor.
Figura 9 – Cadeia de comercialização da carne dos frigoríficos estudados na Amazônia.
Figura 10 – Destino da venda da carne dos frigoríficos visitados na Amazônia[27].
Tabela 5 – População residente e rebanho bovino no Brasil, nas regiões e nos Estados amazônicos.
_____________
[26] A criação de búfalos, comum no Amapá, não chega a alterar substancialmente esses números.
[27] Representantes dos frigoríficos ao longo da rodovia Belém-Brasília (BR-010), um em Paragominas e outro em Castanhal, negaram o pedido de entrevista. Por isso, os dados dessa região não foram incluídos no gráfico. Entretanto, informantes extenos indicaram que ambos abastecem a região metropolitana de Belém e parte do Nordeste.
Diversos fatores relacionados à produção (oferta) e à demanda por produtos pecuários estão mudando e afetarão esse setor na Amazônia nos próximos anos. Nesta seção, descrevemos os potenciais efeitos desses fatores na expansão ou retração da pecuária na Amazônia. Destacamos que as tendências discutidas nesta seção são de longo prazo pois, em curto prazo, existem ciclos nos preços do gado que podem, temporariamente, aumentar ou diminuir a competitividade da atividade pecuária.
Fatores da demanda
♦ A pressão para controlar a febre aftosa
Os principais compradores internacionais só importam carne de regiões livres da ocorrência de febre aftosa que sejam reconhecidas pela Organização Internacional de Saúde Animal. O controle dessa doença no Sul e Sudeste do Brasil possibilitou o aumento das exportações de carne, principalmente in natura. As exportações brasileiras aumentaram de 196 mil toneladas em 1999 para 806 mil toneladas em 2003, um aumento de quatro vezes em apenas quatro anos (Figura 11). É possível que o controle da febre aftosa nas principais regiões produtoras da Amazônia tenha o mesmo efeito nas exportações dessa região. Após esse controle, os pecuaristas que produzem gado com qualidade para exportação poderão obter um sobre preço em relação ao mercado interno de 8% a 10% (Nehmi Filho, 2003). Os animais fora do padrão para exportação poderão ser vendidos mais facilmente no mercado interno, pois o trânsito da carne com osso, desossada e de animais vivos será facilitado. O crescimento da demanda poderia ser tão expressivo que o aumento da produção nos primeiros anos não diminuiria os preços do gado. Dessa forma, haveria espaço para um aumento contínuo da produção por vários anos. Ver seção sobre a campanha brasileira para controle da febre aftosa, com detalhes da estratégia e a situação atual.
Figura 11 – Exportações brasileiras de carne bovina (em milhares de toneladas equivalente carcaça) (Fonte: Anualpec, 2003).
♦ Potencial para aumento do consumo interno e externo
A demanda interna e externa por carne bovina provavelmente crescerá por vários motivos. O aumento de renda em países em desenvolvimento tende a elevar o consumo de carne per capita – em particular nas camadas mais pobres da população. Entre 1987 e 1996, por exemplo, o produto interno bruto per capita brasileiro, medido pela paridade de poder de compra, aumentou 29%[28]. Nesse mesmo período, o consumo per capita de carne bovina aumentou 10%, em média. Entretanto, o aumento no consumo foi de 15% a 27% na classe com renda entre dois e oito salários mínimos (Tabela 6). Mesmo com esse aumento, o consumo per capita no Brasil em 1996 era a metade do argentino (57 kg) e um terço menor que o americano (44 kg) (USDA, 1997). Do mesmo modo, países em desenvolvimento no sudeste asiático e a China poderão aumentar o consumo de carne bovina. Na Malásia, por exemplo, o aumento de 1% na renda aumentou o consumo de carne em quase 1% nos anos de 1980 e 1994 (Ishida et al., 2003). Em 1996, o consumo per capita de carne na China era de apenas 4 kg, sete vezes menos que no Brasil.
_____________
[28] O PIB per capita aumentou de US$ 5.250 para US$ 6.781. Para obter os dados per capita, dividimos os valores do produto doméstico bruto (WRI, 2004) pela população recenseada de 1996 (IBGE, 2004a). A população de 1987 foi estimada interpolando-se os valores entre 1980 e 1991, utilizando a taxa de crescimento anual durante o período.
A demanda por carne brasileira também pode aumentar nos países desenvolvidos, por dois motivos principais. O aparecimento de novos casos da doença da vaca louca (encefalopatia espongiforme bovina – BSE) na Europa e América do Norte poderá aumentar a demanda por carne vinda de criações extensivas em pastagens, que é o caso da Amazônia. Inclusive, percebendo a oportunidade de negócios, pecuaristas brasileiros já argumentam que produzem “boi verde” ou “boi ecologicamente correto”, por alimentá-lo exclusivamente com capim.
O segundo fator seria a diminuição ou completa remoção dos subsídios aos agricultores da União Européia e dos Estados Unidos. Com o ingresso de novos países na União Européia, em especial os do Leste Europeu em desenvolvimento, será difícil manter os mesmos níveis de subsídio para todos os produtores do bloco. Além disso, o Mercosul e a União Européia estão negociando acordos bilaterais de comércio internacional. Qualquer acordo irá, necessariamente, envolver a redução dos subsídios agrícolas. Acontecimentos recentes confirmam essa tendência. A Organização Mundial do Comércio (OMC) deu ganho de causa ao Brasil, que pleiteava a redução dos subsídios agrícolas ao açúcar (Europa) e algodão (Estados Unidos) (FinanceOne, 2004). Além disso, em setembro de 2004 foi acordada a remoção dos subsídios na Europa. Embora o prazo não tenha sido definido, especialistas acreditam que ocorrerá nos próximos dez anos. Com a redução dos subsídios, o custo de produção da carne européia crescerá e o preço da carne no mercado internacional poderá aumentar, pois boa parte dos animais é confinada e alimentada com ração à base de soja e milho. Conseqüentemente, a carne bovina da Amazônia, produzida em pastos plantados, se tornará ainda mais competitiva no mercado externo.
Segundo relatório do Departamento de Agricultura Norte-Americano (USDA, 2005), o aumento de demanda e as vantagens da pecuária brasileira possibilitariam um aumento das exportações de carne de cerca de 60% entre 2003 e 2014. Essa tendência é também projetada em relatórios dos países mais desenvolvidos (OECD-FAO, 2005). A confirmação dessa tendência dependeria da continuidade do controle da febre aftosa (ver seção sobre campanha para controlar essa doença).
Entretanto, a queda dos subsídios agrícolas poderá levar os pecuaristas de países desenvolvidos a pressionar por barreiras não tarifárias – incluindo barreiras ambientais. O fato de parte da produção na Amazônia estar associada a novos desmatamentos e ao não cumprimento das leis florestais, poderá levar a pressões por barreiras ambientais contra a carne produzida na região.
Tabela 6 – Mudança no consumo per capita de carne no Brasil em diferentes classes de renda entre 1987 e 1996.
Fonte: IBGE/Sidra. Orçamento Familiar.
Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>
♦ Efeitos da melhoria de infra-estrutura na Amazônia
O governo federal e os estaduais estão investindo ou planejando investir em infra-estrutura na Amazônia, incluindo o asfaltamento das rodovias Cuiabá-Santarém entre Guarantã do Norte e Santarém (BR-163), da Transamazônica (BR-230, no trecho entre Marabá e Altamira) e a construção de hidrovias nos rios Araguaia-Tocantins e Madeira. A redução dos custos de transporte poderá reduzir custos de produção (por exemplo, custo de insumos, como medicamentos e sais minerais, que vêm de outras regiões) e aumentar o preço pago ao produtor. Dessa forma, a pecuária da região poderia se tornar ainda mais lucrativa e competitiva. Todas as principais regiões pecuaristas, como o sul do Pará, o Tocantins, Mato Grosso e Rondônia, seriam diretamente beneficiadas, pois os corredores de transporte incorporam essas regiões. Neste trabalho será apresentada uma projeção espacial das áreas potenciais para expansão da pecuária, considerando o asfaltamento de duas rodovias.
Fatores da oferta
O aumento da oferta de gado na Amazônia poderá ocorrer por meio do desmatamento ou do aumento da produtividade nas áreas já desmatadas. A decisão de expandir a produção via desmatamento dependerá principalmente da evolução do preço da terra florestal em relação ao preço de insumos, como fertilizantes e maquinários. Quanto maior a disponibilidade de terras florestais baratas para expansão agropecuária, menor será o incentivo à intensificação da produção que use insumos mais caros. Diversos fatores, discutidos a seguir, poderão influenciar os preços relativos da terra. Esses fatores atuarão em duas escalas distintas, mas relacionadas: escala macro (regional e nacional) e escala da propriedade.
♦ Fatores atuantes na escala macro
Substituição de pastos por culturas agrícolas intensivas. A produção de grãos no Brasil tem se expandido devido à taxa de câmbio damoeda brasileira e aos preços internacionais favoráveis[29] às exportações e a programas de crédito facilitado para aquisição de máquinas agrícolas (ver análise em Brandão et al., 2005). Segundo dados do IBGE[30], entre 1990 e 2003 a área de colheita de grãos aumentou em 7,8 milhões de hectares ou o equivalente a 22,5%.
Parte da expansão agrícola está ocorrendo em áreas de pastagens com potencial para uso agrícola – ou seja, pastagens em áreas planas, em solos bem estruturados (mesmo que com baixa fertilidade), com regime de chuvas adequado e infra-estrutura satisfatória. Nos últimos anos, a região Centro-Oeste tornou-se a principal produtora de grãos do Brasil. O Estado de Mato Grosso já é o terceiro maior produtor de grãos do País, com 14% do total da produção nacional (IBGE, 2004b).
A substituição de pastos por plantio de grãos ocorre porque a rentabilidade da agricultura intensiva tende a ser maior que a rentabilidade das pastagens. Por isso, vem ocorrendo um aumento expressivo dos preços de pastagens com potencial para uso agrícola[31]. Ou seja, o fenômeno observado no Sul e Sudeste décadas atrás está ocorrendo novamente no Centro-Oeste e na Amazônia. Especialistas prevêem que essa tendência continuará. A agricultura intensiva cresceria no Brasil por causa do aumento da demanda internacional e da vantagem competitiva do país. Por exemplo, o Departamento de Agricultura dos EUA projetou que as exportações brasileiras de farinha e de óleo de soja cresceriam, respectivamente, 51% e 85% entre 2003 e 2014 (USDA, 2005). O mesmo estudo indica que a demanda por grãos também aumentaria devido ao aumento expressivo das exportações brasileiras de carnes de porco e frango (respectivamente 46% e 75% entre 2003 e 2014).
Nehmi Filho e Pusch (2003) projetaram que 17 milhões de hectares de pastagens no Brasil seriam transformados em plantações de milho e soja até 2012. O total de pastagem a ser ocupado por grãos seria equivalente a todo o aumento da área a ser plantada com soja, ou 15% da área de pastagem plantada do Brasil em 2002 (cerca de 17 milhões dos 115 milhões de hectares de pastos – Nehmi Filho e Pusch, 2003). Além disso, a entrada em vigor do protocolo de Quioto em 2005 poderá estimular a expansão de plantios de cana-de-açúcar para produção de álcool combustível. Especialistas projetam que o Brasil poderia ampliar a área plantada de cana-de-açúcar em cerca de 2,5 milhões de hectares nos próximos dez anos e que parte da expansão deverá ocorrer principalmente em pastagens e outras culturas no sul de Goiás, no norte de Brasília e em Mato Grosso (Valor Econômico, 2004).
A conseqüência dessa tendência é previsível: os pecuaristas nessas regiões irão continuar vendendo ou convertendo pastos em lavouras. Os pecuaristas que venderem as terras seriam candidatos a migrar para partes da Amazônia e outras regiões do Brasil propícias à expansão da pecuária e impróprias para a agricultura intensiva.
_____________
[29] Os preços internacionais favoráveis ocorreram principalmente a partir de 2001, segundo Brandão et al., 2005.
[30] Dados da Produção Agrícola Municipal entre 1990 e 2003 obtidos através do Sistema IBGE de Recuperação Automática. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br> Acesso em: dezembro de 2004.
[31] Por exemplo, no norte de Mato Grosso (Colíder, Gurantã e Alta Floresta), os preços das terras em pasto aumentaram entre 45% e 195% em um período de quatorze meses (nov/2001 a jan/2003 – Anualpec, 2003). Em Paragominas, no leste do Pará, terras com pastos que foram transformados em plantios de arroz tiveram um aumento de 350% entre dez/2001 e fev/2004 (Anualpec, 2004).
Acesso quase aberto a terras públicas devolutas. Extensas áreas da Amazônia com potencial para expansão da pecuária são terras públicas devolutas. Madeireiros, fazendeiros e pequenos produtores estão ocupando parte dessas terras, incluindo a abertura de estradas (Souza Jr. et al., 2005). A falta de controle sobre terras públicas devolutas permite que extensas áreas sejam ocupadas e transformadas em posses de fato e em direito de uso. Em muitos casos, o acesso a essas áreas é quase livre. Posseiros e especuladores ocupam terras públicas e tentam obter títulos definitivos. Uma parcela das ocupações tem sido regularizada pelo governo por meio do programa de reforma agrária e regularização fundiária. Entre 1995 e 2002, os assentamentos regularizados na Amazônia passaram de pouco menos de dois milhões de hectares para cerca de 16 milhões de hectares[32]. Parte dessas terras pode ser convertida em pastagem pelos próprios posseiros, ou por pecuaristas capitalizados que compram as áreas para formar fazendas maiores. Francisco Graziano estima que entre 50% e 60% das terras distribuídas em projetos de reforma agrária no sul do Pará tenham sido vendidas ilegalmente (Agência Estado, 2004).
Os investimentos em infra-estrutura aceleram ainda mais as iniciativas de ocupação de terras públicas. A promessa de asfaltamento da rodovia Cuiabá-Santarém desencadeou a ocupação das terras no oeste do Pará. Freqüentemente, a ocupação de áreas maiores inclui fraudes de documentos envolvendo funcionários públicos, cartórios, especuladores e produtores rurais[33].
Essas ocupações constituem um subsídio público para os ocupantes, pois eles não remuneram o Estado pela área nem pelos recursos extraídos, como a madeira[34]. Portanto, a fragilidade das instituições governamentais que gerenciam a distribuição e proteção das áreas públicas pode ser um incentivo indireto à expansão da pecuária. A continuação desse processo pode tornar as terras na região ainda mais baratas; ou pelo menos, inibir o aumento significativo do preço e, dessa forma, reduzir o interesse em investir para aumentar a produtividade dos usos do solo.
_____________
[32] De acordo com dados da Superintendência Nacional de Desenvolvimento Agrário do Incra, obtidos em apresentação do Balanço da Reforma de setembro de 2002. Disponível em: <http://www.incra.gov.br> Acesso em 2004. Apresentação disponível com os autores.
[33] Os esforços recentes do governo federal para combater essas fraudes incluíram a prisão de 21 suspeitos de falsificação ou emissão indevida de documentos fundiários na região oeste do Pará (Mendes, 2004).
[34] Embora os ocupantes ilegais não remunerem o governo, há custos envolvidos com fraudes e com a proteção das áreas contra outros invasores.
Criação ou não de Unidades de Conservação. Os governos federal e estaduais pretendem criar Unidades de Conservação (UCs) para proteger a biodiversidade e apoiar o desenvolvimento sustentável. O estabelecimento dessas áreas poderia restringir o acesso a terras públicas para a criação de gado. O governo federal, por meio do projeto Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa), prevê a criação, até 2009, de 27 milhões de hectares de Unidades de Conservação de uso restrito[35] – ou seja, parques e reservas biológicas onde não pode ocorrer extração de recursos e desmatamento – e de 9 milhões de hectares de unidades de uso sustentável como Reservas Extrativistas. Além disso, o governo federal propôs um Projeto de Lei para gestão de florestas públicas que envolveria destinar florestas devolutas para fins de produção florestal. Esse projeto foi aprovado pelo Congresso em junho de 2005, foi destinado ao Senado em regime de urgência constitucional e deverá ser votado ainda neste ano. Essas iniciativas poderão ser reforçadas com planos estaduais paralelos ou complementares[36].
Embora os governos estejam criando ou planejando criar novas Unidades de Conservação, a lentidão ou insuficiência de aplicação dessas políticas poderia deixar enormes áreas públicas sujeitas à invasão e eventual conversão destas em pastagens. Por exemplo, protestos contra a demarcação da Terra Indígena Baú, no oeste do Pará, em 2004, levaram a um acordo que reduziu a Terra Indígena em 310 mil hectares (Carta Maior, 2004). Portanto, a disponibilidade de terras dependerá do eficiente planejamento e da rápida criação de Unidades de Conservação, seguida de investimentos para proteção duradoura dessas áreas.
Zoneamento Ecológico-Econômico. Um esforço complementar à criação de Unidades de Conservação é o zoneamento ecológico-econômico. O zoneamento pode influenciar as estratégias de produção dos pecuaristas na macro-escala ao definir os melhores usos do solo para cada região – incluindo zonas dedicadas à conservação e zonas para expansão agropecuária. Além disso, o zoneamento poderá afetar a produção na escala da propriedade, pois a regulamentação do uso das Reservas Legais depende dos resultados do zoneamento (ver detalhes na seção sobre a aplicação da legislação florestal). Estados como Pará, Amazonas e Acre estão concluindo seus zoneamentos e poderão influenciar a disponibilidade de terras no futuro próximo[37]. Mato Grosso já realizou seu zoneamento.
_____________
[35] Seriam criados 9 milhões até 2006 e mais 18 milhões entre 2006 e 2009. Informação disponível em: <http://www.funbio.org.br/website/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=1736&sid=36> Acesso em: 7 de out. de 2004.
[36] Por exemplo, a Assembléia Legislativa do Pará aprovou a proposta do Executivo Estadual de ampliar a área de Unidades de Conservação de 29% para 61,5% do Estado no seu plano de macrozoneamento ecológico-econômico. O governo do Acre está criando um sistema de Unidades de Conservação, incluindo 1,5 milhão de hectares de Florestas Estaduais. O governo do Amazonas criou nos últimos dois anos 4,2 milhões de hectares de UCs e está planejando a criação de novas áreas (Amazonas, 2004).
[37] O governo do Pará propôs e a Assembléia Legislativa aprovou um Macrozoneamento do Estado. O documento especifica áreas que serão destinadas para criação de Unidades de Conservação e outras que serão destinadas para usos agropecuários, mas ainda sujeitos a levantamentos detalhados.
♦ Fatores atuantes na escala da propriedade
Os fatores atuantes na escala da propriedade incluem aspectos ligados às característias do local de produção e às respostas dos produtores aos fatores da escala macro.
Regulamentação e aplicação do novo código florestal. Mudanças no código florestal por meio de Medidas Provisórias a partir da década de 1990 tornaram sua aplicação incerta e polêmica. O aumento do interesse em proteção, de um lado, e as pressões para ampliar o uso das propriedades, de outro, estão forçando uma definição das regras. O resultado desse debate pode influenciar o destino da pecuária.
Desde 1965, o código florestal estabelece dois tipos principais de restrições ao uso do solo nas propriedades privadas. Primeiro, a vegetação nativa não pode ser removida das Áreas de Preservação Permanente, que são as margens de rios e lagos e outros corpos d’água, topo de morros e terrenos íngremes. Segundo, os proprietários devem manter vegetação nativa na forma de Reserva Legal em parte da propriedade, como forma de assegurar o uso sustentável dos recursos naturais e a proteção de fauna e flora nativas. A Reserva Legal pode ser manejada para produção de bens e serviços, como a extração de madeira, mas não pode ser desmatada.
Entretanto, o código florestal vem sendo freqüentemente desrespeitado. Em 1996, após o anúncio do desmatamento recorde de 29 mil km2 entre 1994 e 1995, o governo federal editou uma Medida Provisória (MP) que aumentava a exigência de Reserva Legal na Amazônia. Após várias reedições da MP, a Câmara dos Deputados transformou-a em lei em 2001. A Reserva Legal foi ampliada de 50% para 80% da área dos estabelecimentos rurais em zonas de floresta tropical densa; de 20% para 35% no cerrado na Amazônia Legal, sendo no mínimo 20% na propriedade e 15% na forma de compensação em outra área, desde que esteja localizada na mesma microbacia. Em Mato Grosso, uma lei estadual estabeleceu que a Reserva Legal deve ser de 50% nas florestas de transição entre o cerrado e a floresta densa no Estado. Porém, ela tem sido questionada, pois é menos restritiva que o Código Florestal Federal.
As primeiras versões da MP contra o desmatamento implicavam que todos os proprietários rurais que desmataram além de 20%, inclusive aqueles que respeitavam o código antes de 1996, deveriam recompor as florestas em suas Reservas Legais – ou seja, de 50% para 80% no caso de floresta. Contudo, a versão da Medida Provisória convertida em lei determina que o poder executivo pode reduzir a Reserva Legal na Amazônia Legal nas áreas que devem ser recompostas – de 80% para até 50% da propriedade,[38] desde que seja indicado pelo Zoneamento Ecológico-Econômico e pelo Zoneamento Agrícola, e após consulta ao Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), ao Ministério do Meio Ambiente e ao Ministério da Agricultura e do Abastecimento. Porém, com base no zoneamento, o poder executivo poderá ampliar as áreas de Reserva Legal em até 50% dos índices previstos no código em todo o território nacional, em áreas especiais como corredores biológicos, entre outros. Portanto, o zoneamento é extremamente importante para definir se os proprietários poderão ampliar ou deverão reduzir a área disponível para a agropecuária em suas propriedades.
A falta de zoneamento em alguns Estados, como o Pará, e, conseqüentemente, a falta de regras definitivas sobre a Reserva Legal, gerou incertezas entre os investidores dispostos a cumprir as leis. Ao mesmo tempo, à medida que a pressão para o cumprimento do código florestal aumenta, fazendeiros do Pará ameaçam questionar a constitucionalidade da Reserva Legal de 80%.
Uma das conseqüências da aplicação do código atual – com Reserva Legal de 80% em regiões de floresta densa – seria um aumento nos custos médios de produção, pois os ganhos de escala na criação bovina seriam restritos aos produtores muito grandes. Por exemplo, para ter 2 mil hectares de pastos, uma propriedade em zona de floresta densa na Amazônia deveria ter o total de 10 mil hectares. A redução de pastagem por meio da recomposição da Reserva Legal poderia estimular o uso mais intensivo das áreas de pastos remanescentes. Entretanto, é necessário reconhecer que, seja qual for o porcentual de Reserva Legal, o efeito do código florestal na intensificação da produção dependerá de outros fatores – principalmente da capacidade do governo de restringir o acesso quase livre às terras devolutas.
Fragilidade do controle ambiental. A baixa eficiência do controle ambiental contribuiria para um aumento da área disponível nas propriedades para a pecuária, pois os fazendeiros poderiam ampliar as pastagens nas áreas que deveriam ser Reserva Legal. Além disso, contribuiria para o aumento de capital disponível para investimento rural acumulado com a exploração ilegal de madeira em terras privadas e públicas. Há indícios de que o controle continua frágil, apesar da nova legislação ambiental e de campanhas de fiscalização. Um exemplo disso é o fato de o Ibama ter emitido cerca de 6.700 multas por ano na Amazônia Legal entre 2001 e 2004[39], mas só ter arrecadado 2,12% das multas ambientais acima de R$ 10 mil aplicadas entre 1995 e 2003[40] – o que comprova que a arrecadação tem sido pequena. A baixa responsabilização dos crimes contra a flora parece predominar também na esfera judicial. Brito e Barreto (2004) identificaram baixa eficiência e lentidão na responsabilização de crimes florestais na Justiça Federal em Belém – entre 2000 e 2003, apenas um (2%) de 55 processos avaliados foi concluído, enquanto mais de 60% ainda aguardavam a localização dos infratores.
_____________
[38] Segundo a Medida Provisória 2.166-67, para contabilidade da Reserva Legal devem ser excluídas “em qualquer caso, as Áreas de Preservação Permanente, os ecótonos, os sítios e ecossistemas especialmente protegidos, os locais de expressiva biodiversidade e os corredores ecológicos”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/2166-67.htm#art1§1> Acesso em: 27 de dez. de 2004.
[39] Dados obtidos do Ibama em Brasília, em 2005, referentes a todos os crimes ambientais.
[40] O Ibama explica que a baixa arrecadação está associada ao grande número de recursos contra as multas, a erros na aplicação destas, à insuficiência de pessoal para acompanhar os processos e à possibilidade de suspensão da multa (Folha de São Paulo, 2004; O Globo, 2004).
Avanços tecnológicos na criação bovina. Os produtores poderiam expandir a produção nas áreas já desmatadas aumentando o investimento em tecnologias e melhores práticas de criação bovina. Em nossa pesquisa nas principais regiões de criação bovina da Amazônia, técnicos agrícolas, fazendeiros e comerciantes afirmaram que os fazendeiros que adotavam mais tecnologia aumentaram a produtividade. A lotação média dos pastos, segundo os fazendeiros entrevistados, foi de 1,52 animal/ha (mediana de 1,5, n=79), ou seja, 10% superior à lotação média dos pastos mais produtivos em 1995 (IBGE, 1996). A idade média de abate dos animais era de 32 meses (mediana de 36 meses) e o ganho de peso de 503 gramas/dia, 20% maior que o descrito em Arima e Uhl (1997). Na amostra de 85 casos, o aumento da produtividade foi conseguido por meio do cruzamento industrial (praticado por 21% dos produtores), da inseminação artificial (27% dos produtores) e da rotação de pastos (16%). Embora esses números não possam ser extrapolados para todos os criadores, eles refletem a possibilidade “máxima” de produção com a tecnologia atual. Os produtores que adotam tecnologias mais avançadas são competitivos no mercado e estarão aptos a ganhar novos mercados internos e externos assim que a febre aftosa for controlada.
Contudo, os avanços tecnológicos nem sempre levam à intensificação da produção no nível regional. Se esses avanços diminuírem os custos médios de produção e forem facilmente adotados pelos fazendeiros, o efeito será o oposto, ou seja, a expansão da pecuária para novas áreas[41].
Finalmente, é necessário observar que a reforma de pastagens não pode ser generalizada para todas as áreas degradadas – a mecanização, por exemplo, é impossível em áreas acidentadas e terrenos muito úmidos. Dessa forma, os ganhos de produtividade derivados da reforma de pastagem não são extrapoláveis para todas as áreas desmatadas.
Disponibilidade de crédito subsidiado. A disponibilidade de crédito subsidiado do FNO e FCO continuará exercendo pressão para o aumento dos desmatamentos, apesar de não sabermos a magnitude desse impacto. Todo subsídio a uma atividade econômica implica menores custos de produção e, portanto, maiores lucros. Mesmo que esses créditos ou os de outros programas sejam destinados a aumentar a produtividade da pecuária nas áreas já desmatadas, será difícil evitar que o lucro adicional obtido com subsídio não seja utilizado para ampliar a pecuária em outras áreas. A eventual expansão da pecuária resultante do subsídio aumentaria os desmatamentos. Portanto, para que as políticas de intensificação da pecuária tenham o efeito desejado, é necessário restringir, por meio de criação de Unidades de Conservação, a área disponível para desmatamento.
Uma vez que esses fundos são constitucionais, os recursos provavelmente serão mantidos no longo prazo. Em 2004, os recursos dos Fundos Constitucionais previstos para a agrope-cuária nos Estados da Amazônia (excluindo o Maranhão) somavam R$ 896 milhões; dos quais R$ 534 milhões do FCO-Rural somente para Mato Grosso e R$ 361 milhões do FNO para a agropecuária e do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar)[42].
Os bancos que gerenciam os fundos constitucionais devem tentar evitar, pela imposição de salvaguardas ambientais, que tais recursos sejam utilizados para financiar desmatamentos diretamente na propriedade. As salvaguardas incluem a manutenção da Reserva Legal e das áreas de preservação permanente, além do licenciamento ambiental, de acordo com uma determinação do governo federal por meio do Protocolo Verde[43]. Porém, o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) contra o desmatamento identificou, em 2003, a necessidade de mudanças na aplicação desse protocolo, a fim de tornar o controle mais efetivo (Brasil, 2004d). Em seu relatório, o GTI não especificou as deficiências na aplicação do protocolo e não encontramos na literatura qualquer análise da sua aplicação. Entretanto, a preocupação do GTI parece consistente, pois Wood et al. (2003) mostraram que pequenos produtores que receberam crédito na região de Uruará, na Transamazônica, desmataram mais do que aqueles que não receberam. Embora o estudo não tenha investigado se os desmatamentos adicionais foram legais ou não, ele indica que o crédito está associado ao aumento do desmatamento.
Demanda por qualidade dos produtos para exportação. Para atingir o mercado externo, além de controlar a febre aftosa, os produtores terão de atender ao padrão de qualidade da carne exigido para exportação. Segundo Nehmi Filho (2003), o padrão para exportação é um animal macho com pelo menos 480 kg de peso vivo, com no máximo três anos, castrado e com boa cobertura de gordura. Além disso, a exportação exige rastreabilidade do rebanho – ou seja, um sistema que permite rastrear a origem e a cadeia de comércio da carne exportada. Para atingir esse padrão seria necessário investir no melhoramento genético e manejo de pastagens, típicos da pecuária mais produtiva.
_____________
[41] Esse efeito adverso da tecnologia no desmatamento será ainda mais acentuado se a Amazônia atender à demanda mundial por carne (demanda elástica). Simulações utilizando modelos de equilíbrio geral mostram que melhorias na produtividade aumentam as taxas de desmatamento em longo prazo (Cattaneo, 2002).
[42] Dados obtidos em Brasil, 2004a e Brasil, 2004b.
[43] O Protocolo Verde é um acordo estabelecido entre o Ibama e os bancos públicos para que os investimentos sejam condicionados ao respeito à legislação ambiental e a melhores práticas.
A campanha para controlar a febre aftosa
A campanha para controlar a febre aftosa inclui aspectos de demanda e de oferta. A partir da década de 1990, o governo brasileiro e os produtores têm intensificado investimentos para erradicar a febre aftosa e ampliar as exportações (ver detalhes da estratégia no Quadro 1). Entre 1992 e 2002, foi investido US$ 1,43 bilhão no sistema de defesa sanitária animal brasileiro, sendo 31% de recursos públicos estaduais e federal (Brasil, 2003). A vacinação contra a febre aftosa aumentou de 64% do rebanho nacional em 1994 para 86% do rebanho em 2002 (Brasil, 2003). O número de focos da doença caiu expressivamente – de 2.093 em 1994 para apenas cinco em 2004 (Brasil, 2004e). Alguns Estados da Amazônia já estão livres da doença. A conclusão do controle permitiria um aumento ainda maior da produção na região.
Até o início desta década, o controle vinha sendo mais intensivo e efetivo nos Estados do Sul[44], Sudeste e Centro-Oeste do País (Figura 12). Essas regiões são livres da febre aftosa, com reconhecimento da Organização Internacional de Saúde Animal, e, por isso, podem exportar carne para a União Européia e outros países que exigem tal credenciamento.
_____________
[44] Vale notar que o Rio Grande do Sul começou o programa de vacinação em 1963, e Santa Catarina, em 1966 (Wohlemberg, 2005).
Entretanto, o controle nas principais regiões produtoras na Amazônia está sendo ampliado. Mato Grosso tornou-se zona livre em etapas entre 2000 e 2001. Rondônia, Tocantins e Acre conseguiram o reconhecimento de zona livre com vacinação da Organização Internacional de Saúde Animal (OIE), respectivamente em 2001, 2003 e 2005, e já podem exportar. Esses quatro Estados possuíam 68% do rebanho da Amazônia em 2003, segundo dados do IBGE (2005).
O sul do Pará é reconhecido como zona livre pelo Ministério de Agricultura, mas ainda aguarda o reconhecimento da OIE (Figura 12) e, por isso, não pode exportar para outros países, mas pode comercializar carne para outros Estados do Brasil. O governo brasileiro solicitou o reconhecimento da OIE para essa região em março de 2004, mas a OIE pediu informações complementares. O governo enviou novo relatório em janeiro de 2005 e aguarda a decisão. Se essa nova área for liberada, o Brasil ampliará o rebanho livre de febre aftosa dos atuais 85% para 92% (Gazeta Mercantil, 2004). No sul do Pará, há ainda um corredor sanitário (Figura 12) que permite enviar bois vivos desta região diretamente para o abate em frigoríficos em Matupá e Sinop no norte de Mato Grosso (Ver descrição de corredor sanitário no Quadro 1).
Apesar desses avanços, o controle da febre aftosa no Brasil ainda é desafiador e preocupa produtores e autoridades. Em setembro de 2004, casos de febre aftosa no município de Monte Alegre, no Pará (área de risco desconhecido), levaram à suspensão temporária de exportações de carne brasileira. Outros casos em uma região não exportadora – próximo a Manaus, no Amazonas – também em setembro de 2004, resultaram na suspensão das exportações do Brasil para a Rússia até abril de 2005 (O Estado de São Paulo, 2004 e Newsletter dos Criadores, 2005). Entretanto, a Rússia manteve o embargo da importação de Estados da Amazônia, com exceção de Mato Grosso (Newsletter dos Criadores, 2005). Esses eventos indicam que áreas mais remotas da Amazônia – com baixa infra-estrutura e baixa disponibilidade de serviços – poderão levar mais tempo para se tornarem aptas a exportar, além de, eventualmente, prejudicarem o comércio das áreas vizinhas livres da doença. Os casos de febre aftosa na Amazônia levaram o governo brasileiro a aumentar os esforços de controle em todo o território nacional.
Em outubro de 2005 foram descobertos 21 focos de febre no sudoeste do Mato Grosso do Sul – que possui o maior rebanho brasileiro e que era responsável por 20% das exportações do Brasil. Potenciais focos ainda não confirmados até sete de novembro foram identificados no Paraná. O governo brasileiro começou a adotar medidas de controle, incluindo o isolamento das regiões afetadas, o reforço de vacinação e o abate previsto de mais de 20.000 animais. Por causa desses focos, países importadores embargaram parcial ou totalmente compras do Brasil. Embora seja cedo para fazer prognósticos detalhados sobre os impactos econômicos desses focos, é possível projetar algumas tendências chave. O Brasil provavelmente continuará sendo um importante exportador e poderá até mesmo expandir o seu mercado. Entretanto, a possibilidade de abrir alguns dos principais mercados que são mais restritivos provavelmente será adiada. Portanto, o crescimento mais acelerado das exportações da Amazônia e do resto do Brasil dependerá grandemente do aperfeiçoamento do controle da febre aftosa nos próximos anos. Essas projeções são baseadas nas seguintes observações.
_____________
[45] O Ministério da Agricultura informou a lista de países que embargaram as importações e o nível de embargo no seguinte endereço: http://www.agricultura.gov.br/. Acesso em: 05 nov. 2005. Os dados sobre o volume de importações destes países em 2004 foram obtidos em Lima et al., 2005.
Quadro 1 – A estratégia de controle da febre aftosa no Brasil
Figura 12 – Evolução do controle da febre aftosa no Brasil entre 1998 e 2005 (Fonte: Brasil, 2004 e Indea[46]).
_____________
[46] O Indea – Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso. Relatório de ações em 2003. Disponível em: http://www.indea.mt.gov.br/html/internas.php?tabela=paginas&codigoPagina=8. Acesso em: 6 out. 2005.
Regiões e potenciais estratégias para expansão da pecuária
Nesta seção analisamos as prováveis regiões de expansão da pecuária e as estratégias dos produtores para aumentar a produção nessas áreas. Para isso, apresentamos primeiro uma projeção dos potenciais preços pagos ao produtor (preço na fazenda) como uma variável substituta da renda da pecuária. Os mapas indicam onde os preços seriam mais atrativos para a criação de gado. Ou seja, a pecuária tenderá a se expandir onde o preço do gado pago ao produtor for suficiente para gerar lucro. Esta simulação considerou o asfaltamento de rodovias federais e o controle da febre aftosa, que permitiria a exportação nos principais portos da região. Depois, avaliamos as prováveis estratégias dos produtores para expandir a produção, isto é, onde provavelmente ocorreria a expansão do desmatamento e onde ocorreria investimento para aumento da produtividade.
♦ As regiões potenciais para expansão da pecuária
O cenário base da simulação (A) – que considerou as condições predominantes no ano de 2000, quando o preço da arroba do boi gordo estava entre R$ 29,00 e R$ 35,00 – revela que ocorre desmatamento e, conseqüentemente, pecuária em localidades onde o nosso mapa indica preços do gado na porteira de pelo menos R$ 400,00 por tonelada viva. Se considerarmos este como o valor mínimo atrativo para a pecuária, o mapa indica que 82% da Amazônia Legal ou 4,27 milhões de km2 poderiam potencialmente ser viáveis para a pecuária, dos quais 573 mil km2 já se encontravam desmatados em 2001 (Figura 13A e Tabela 7).
O cenário B – considerando o asfaltamento da Cuiabá-Santarém e de um trecho da Transamazônica entre sua interseção com a Cuiabá-Santarém e Marabá – revelou um aumento de 30,4 mil km2 na zona com preços acima de R$ 400,00 (Tabela 7). O acréscimo dessas áreas ocorreria no oeste e centro-norte do Pará, ao longo das rodovias a serem asfaltadas (Figura 13B).
No terceiro cenário (C) – assumindo o aumento de 10% nos preços pagos nos principais mercados exportadores da Amazônia (Belém, Santarém e Manaus) e o asfaltamento da Cuiabá-Santarém e de parte da Transamazônica – a zona de “preço atrativo” para pecuária aumentaria em 289 mil km2. As novas regiões atrativas para a pecuária estariam no oeste e centro norte do Pará, no centro-oeste e em parte do sul do Amazonas. O principal impacto do asfaltamento e da possibilidade de exportação de carne seria nas regiões onde a pecuária é apenas marginalmente atrativa no cenário base (preço abaixo de R$ 600,00). Com asfaltamento e exportação, 657 mil km2 deixariam de ser marginalmente atrativos para se tornarem bastante atrativos (preço maior do que R$ 600,00) – um aumento de 26% em relação ao cenário base. Nas regiões em torno dos portos prováveis para exportação de carne (Manaus/Itacoatiara, Santarém e Belém), o preço do gado na porteira poderia ser maior que R$ 800,00/tonelada (Figura 13C).
Em todos os cenários, cerca de 70% das áreas onde o preço seria potencialmente atrativo para a pecuária estavam fora de Unidades de Conservação em 2005. Cerca de metade desta área ainda era florestada, cerca de 30% eram de vegetação nativa não-florestal e o restante já era desmatado em 2004. Portanto, haveria uma grande área florestada sujeita à expansão da pecuária em qualquer cenário.
Contudo, devemos frisar que a projeção do preço pago ao produtor não é suficiente para indicar aonde a produção irá de fato se expandir. A expansão dependerá, além do preço, de fatores políticos e sociais (veja seção seguinte), de fatores agro-climáticos que afetam a produtividade (esta tende a diminuir nas regiões mais úmidas, acima de 2.300 mm/ano) e, conseqüentemente, do custo de produção e da lucratividade. A pluviosidade é alta em algumas das zonas que poderão ter preços atraentes, como em torno de Belém e em grande parte do Amazonas, inclusive Manaus. Uma evidência da importância da pluviosidade é o fato de estes dois municípios importarem carne de outros municípios, apesar depossuírem a melhor infra-estrutura da região e as terras não serem ocupadas por outros usos altamente rentáveis (como os grãos)[47]. Na próxima seção discutiremos onde as diferentes estratégias de expansão poderão predominar.
Figura 13 – Projeções do preço potencial pago ao produtor (na porteira da fazenda) de acordo com cenários: A – Base: preço de transporte coletado neste trabalho com infra-estrutura atual e preço de comercialização (frigoríficos) em 2000; B: equivalente ao cenário base mais o asfaltamento da Cuiabá-Santarém e do trecho paraense da Transamazônica; e C: aumento de 10% no preço de comercialização nos principais pontos potenciais de exportação da Amazônia (Belém, Santarém e Manaus) e o asfaltamento da Cuiabá-Santarém e da Transamazônica entre sua interseção com a Cuiabá-Santarém e Marabá.
Tabela 7 – Efeitos do asfaltamento de estradas e do aumento de preço de carne para exportação na área potencialmente viável para pecuária.
_____________
[47] Além disso, o preço de pastagem formada em Manaus e Belém – apesar de estarem próximas de dois grandes mercados – era bem menor que o preço das principais regiões produtoras do Pará no início de 2004 (correspondia a apenas 36% a 74% do preço de pastagens em Redenção, no sudeste, e Paragominas, no leste do Pará). Comparação baseada nos preços de pastagem de baixo suporte disponíveis no Anualpec (2004).
♦ Estratégias para expansão da produção pecuária
A conjugação dos fatores discutidos acima envolve incertezas e, por isso, é difícil prever exatamente quais estratégias de produção pecuária predominarão: se a intensificação da produção nas áreas já desmatadas ou se o desmatamento de novas áreas. Entretanto, é possível discutir cenários qualitativos prováveis considerando a força de algumas tendências e de situações já estabelecidas. Os pecuaristas provavelmente intensificarão a pecuária nas zonas já ocupadas que não têm potencial para agricultura intensiva em parte do Centro-Oeste brasileiro e em áreas mais antigas de ocupação na Amazônia (leste do Pará, Maranhão, Rondônia, Mato Grosso e Tocantins). Essas regiões contam com razoável infra-estrutura e áreas já desmatadas (cujo custo de renovação de pastagem é mais baixo que o de desmatamento). Além disso, os produtores tenderão a desmatar áreas adicionais nessas zonas antigas de ocupação. Um dos autores observou, em janeiro de 2005, que pelo menos dois tipos de expansão estão ocorrendo no oeste do Maranhão (incluindo os municípios de Açailândia, Itinga do Maranhão, Buriticupu e Santa Luzia). No primeiro caso, fazendeiros vendem a madeira dos remanescentes de floresta para produção de carvão e os produtores de carvão deixam a área pronta para o plantio de capim. No segundo caso, os pecuaristas investem em poços artesianos profundos (que chegam até 200 metros), que viabilizam a pecuária em áreas sem fontes naturais de água (chamados regionalmente de trechos secos).
Ao mesmo tempo, pecuaristas tenderão a migrar para zonas interiores da Amazônia com baixa infra-estrutura e para zonas onde a produção de grãos é pouco competitiva (regiões mais acidentadas e com períodos de chuva mais longos). A migração tenderá a ocorrer especialmente para zonas com potencial de melhorias de infra-estrutura, como é o caso dos trechos situados ao longo das rodovias Cuiabá-Santarém e da Transamazônica, entre Marabá e Altamira, as quais seriam asfaltadas, segundo os planos governamentais atuais. Consultores em investimento agropecuário (ver Anualpec, 2003) indicam que a migração também deverá ser influenciada pela disponibilidade de grandes glebas nas novas fronteiras. Grandes áreas permitem o aumento da escala de produção, o que, por sua vez, eleva a lucratividade.
De fato, já é possível identificar sinais de ocupação humana em novas fronteiras na Amazônia Legal. Uma evidência dessa ocupação são os focos de calor em florestas identificados por satélite (Figura 14). Fica evidente que a pecuária poderá expandir-se especialmente no norte de Mato Grosso, em Rondônia, no leste do Acre e no Pará.
Entretanto, a intensidade da expansão da pecuária para novas fronteiras e o nível de desmatamento nessas zonas dependerão muito da eficácia das políticas de controle do desmatamento e da criação de Unidades de Conservação. Esses temas serão discutidos a seguir.
Figura 14 – Potenciais zonas de expansão da pecuária indicadas por focos de calor em florestas no bioma Amazônia. Focos de calor são indícios de incêndios e queimadas identificados por satélites.
Fonte dos focos de calor: Inpe em www.inpe.gov.br
Neste trabalho mostramos que o “sucesso” da pecuária na Amazônia deve-se principalmente aos preços mais baixos da terra nas regiões com pluviosidade adequada. Além disso, mostramos que a Amazônia atende à demanda regional e nacional. A análise dos fatores de oferta e demanda indica que a pecuária poderá se expandir ainda mais na Amazônia e que, provavelmente, irá atender a parte da demanda mundial. Para alguns, esse cenário é animador, pois significa maiores oportunidades de desenvolvimento econômico. Para outros, o cenário é preocupante, considerando o risco de aumento do desmatamento da floresta amazônica.
Diante desse conflito de visões, é pertinente perguntar se seria possível conciliar os objetivos de crescimento da pecuária e de conservação na Amazônia. Argumentamos a seguir, que a predominância do livre mercado (sem qualquer restrição legal) levaria à expansão da pecuária, principalmente daquela baseada no desmatamento indiscriminado e que, por isso, seria necessária uma intervenção governamental estratégica para conciliar o crescimento da pecuária com a conservação.
Cenário de predominância do livre mercado
Embora o crescimento econômico e a proteção ambiental sejam objetivos legítimos, ocontexto freqüentemente favorece o crescimento econômico, pois os ganhos privados são maiores em curto prazo (um exemplo disso é o acúmulo de ganhos dos pecuaristas). Por outro lado, as perdas ambientais e ecológicas tendem a ser difusas e costumam se manifestar em longo prazo. Por exemplo, os riscos de perda de biodiversidade crescem devido à soma do desmatamento de diversas propriedades ao longo de vários anos.
Entretanto, as opções de usos sustentáveis das florestas são limitadas, avançam lentamente ou não são competitivas em relação à agropecuária. Por exemplo, a grande maioria dos consumidores de madeira (que é o principal produto extraído das florestas da região) não exige uma origem sustentável do produto. Isso pode ser demonstrado pela demanda potencial por madeira certificada em São Paulo, a qual representaria apenas cerca de 20% do consumo total do Estado (Sobral et al., 2002). Além disso, o manejo sustentável para produção de madeira nas condições recentes de mercado é menos rentável que a pecuária (ver detalhes em Barreto et al., 1998).
Embora a importância das florestas nativas para o clima seja cada vez mais reconhecida, não existe um sistema que remunere a maioria dos proprietários por esse serviço[48]. O maior esquema de compensação ambiental – o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Quioto – que entrou em vigor em fevereiro de 2005, desconsidera o desmatamento evitado como uma possibilidade para compensação de emissões de gases do efeito estufa. De fato, é pouco provável que algum sistema abrangente seja criado em curto prazo[49].
Enfim, o contraste entre ganhos econômicos dos agentes específicos em curto prazo (fazendeiros, madeireiros e parte da população local) e de ganhos ambientais difusos em longo prazo (conservação ambiental para a população em geral) dificulta a execução de programas de proteção ambiental e favorece as pressões pelo crescimento rápido. Portanto, sem uma forte intervenção governamental e sem mudanças no mercado atual, o mercado favorecerá uma expansão da pecuária por meio do desmatamento nas áreas de Reserva Legal das propriedades privadas e em terras públicas devolutas.
_____________
[48] Existe uma iniciativa piloto – chamada Proambiente – para criar uma política pública de compensação por serviços ambientais. A política envolveria pagamentos para pequenos proprietários, comunidades indígenas e pescadores que desenvolvessem atividades de conservação. Essa política vem sendo apoiada por uma coalizão de entidades sociais, incluindo a Federação dos Trabalhadores da Agricultura na Amazônia Legal, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, o Movimento Nacional de Pescadores e a Coordenação das Nações Indígenas da Amazônia Brasileira. Na fase piloto em 2003, seriam apoiadas 500 famílias em 12 pólos regionais. (Informações coletadas em apresentação de Cássio Pereira, disponível em <http://www.worldbank.org/rfpp/docs/pereira.ppt> Acesso em: 8 de fevereiro de 2005). Embora louvável, o programa é restrito aos pequenos proprietários, que são uma pequena parcela dos agentes do desmatamento – segundo o IBGE, as propriedades menores que 500 hectares, por exemplo, correspondiam a 29% do total da área das propriedades em 1995 (IBGE, 1996) – e o financiamento além da fase piloto é incerto.
[49] O MDL permite que países mais desenvolvidos que devem reduzir as emissões possam compensar suas metas de emissões financiando projetos de redução em países em desenvolvimento. Esse mecanismo foi criado considerando que para o clima global não importa onde as emissões ocorram, mas sim que elas sejam reduzidas. A decisão de não incluir o desmatamento evitado como projetos de MDL poderá ser revista no futuro, mas demandará negociação internacional antes do fim do primeiro período do compromisso que vai até 2012.
Cenário de intervenção governamental estratégica
A atuação dos governos federal e estaduais para conciliar o crescimento da produção pecuária com a conservação ambiental deve ser concentrada em aspectos-chave. Primeiro, é necessário ampliar e garantir a proteção ambiental em terras públicas por meio da criação de Unidades de Conservação e do combate à ocupação desordenada de terras devolutas. Essas medidas seriam importantes para proteger áreas ecologicamente sensíveis e para evitar que o custo da terra seja demasiadamente baixo – o que desestimula os investimentos em aumento da produtividade nas áreas já ocupadas. Segundo, é necessário facilitar a consolidação da pecuária nas áreas com bom potencial agropecuário e garantir uma boa gestão ambiental nessas regiões.
♦ Criar Unidades de Conservação e combater a ocupação ilegal de terras devolutas
Inicialmente, é necessário evitar o desma-tamento de terras públicas sem aptidão agrícola (por exemplo, áreas com chuvas excessivas e declive acentuado) e ricas em biodiversidade. Em termos políticos e econômicos, a maneira mais eficaz para alcançar esses objetivos seria a criação de Unidades de Conservação em regiões de baixo potencial agrícola. Como o desmatamento dessas áreas tenderia a produzir baixos retornos econômicos e sociais, as resistências locais à criação de Unidades de Conservação tenderiam a ser menores. Por outro lado, para atender as demandas por desenvolvimento econômico local, parte dessas áreas deveria ser destinada à produção de bens e serviços florestais. Isso poderá ser feito em florestas públicas por meio de concessões de uso para produção sustentável de madeira como prevê um projeto de lei do governo federal em apreciação no Senado.
As Unidades de Conservação teriam outras vantagens adicionais. A manutenção das terras sob domínio público significaria que o custo de oportunidade de não desmatá-las seria compartilhado por toda a sociedade; ao contrário das terras privadas, nas quais o custo de manter as florestas recai sobre os proprietários que, freqüentemente, resistem ao controle. Seria mais fácil monitorar a situação das Unidades de Conservação usando imagens de satélites, fotos aéreas e sistemas de informação geográfica do que as áreas privadas, pois os blocos de terra são contínuos e com limites fundiários bem definidos. De fato, alguns estudos têm mostrado a efetividade de alguns tipos de Unidades de Conservação na contenção do desmatamento, mesmo considerando os pequenos esforços de fiscalização em relação à área total das Unidades de Conservação (ver Mahar e Ducrot,1999 e Thomas, 2003). Finalmente, a criação de Unidades de Conservação tornaria o recurso terra mais escasso (e mais caro), o que poderia estimular investimentos para aumentar a produtividade das áreas já desmatadas e a recuperação de áreas degradadas (White et al., 2001). Contudo, a criação de Unidades de Conservação requer um esforço mínimo de vigilância para evitar a invasão das áreas.
O governo federal e alguns governos estaduais têm criado Unidades de Conservação em áreas identificadas como prioritárias para conservação da biodiversidade e planejam criar outras (ver mapa de áreas prioritárias em Capobianco, 2001). A execução desses planos deve ser acelerada para evitar que a crescente demanda por produtos agropecuários e os investimentos em infra-estrutura planejados resultem na ocupação e nos desmatamentos de áreas de interesse para conservação.
Para acelerar a criação das Unidades de Conservação é essencial que o governo federal aproveite o interesse de governos estaduais no zoneamento ecológico-econômico (ZEE). O ZEE é uma pré-condição para investimentos públicos internacionais (por exemplo, do Banco Mundial) e pode reduzir as incertezas sobre os investimentos privados nos seus Estados – principalmente porque permite regulamentar a recuperação da Reserva Legal nas propriedades privadas de acordo com o atual Código Florestal. A proposta de macro ZEE do Estado do Pará (Sectam, 2004) tem permitido uma convergência de interesses e negociações entre os governos federal e estadual, que poderá resultar na criação de várias Unidades de Conservação nesse Estado em 2005.
Entretanto, é preciso reconhecer que especuladores, políticos locais e produtores rurais poderão se opor à criação de mais Unidades de Conservação. Essa resistência poderá ocorrer inclusive em áreas com baixo potencial agrícola. Isso porque os ocupantes de novas fronteiras podem ter expectativas equivocadas quanto ao potencial agrícola dessas áreas. Ou seja, produtores rurais podem ocupar áreas com baixo potencial agrícola com a expectativa de obter ganhos similares a outras áreas com melhor potencial já ocupadas. Os 6,8 milhões de hectares de terras produtivas não utilizadas nos estabelecimentos rurais da Amazônia Legal em 1995 indicam que o risco de ocupação equivocada não é desprezível. Portanto, o zoneamento de potencial agrícola é chave para que os governos justifiquem a proteção de áreas biologicamente importantes e evitem investimentos com baixo potencial de retorno.
É importante observar que a proteção de áreas biologicamente ricas em regiões com potencial agrícola tenderá a enfrentar maiores resistências, pois poderá resultar em maiores perdas econômicas locais. Um exemplo dessa pressão foi a proposta do governo do Mato Grosso em 2003 de reduzir cerca de 30% do Parque Estadual do Xingu. O governo estadual argumentou sobre a necessidade de excluir áreas produtivas para expansão agrícola e contou com o apoio da população do município para tal medida (Diário de Cuiabá, 2003). De qualquer forma, é importante garantir o mínimo de proteção dessas áreas. Paralelamente, os governos devem proteger as Unidades de Conservação e reservas indígenas já criadas, que somados equivalem a aproximadamente 34%[50] da Amazônia.
♦ Aperfeiçoar a gestão ambiental nas terras privadas
A expansão da pecuária demandará o aperfeiçoamento da gestão ambiental em terras privadas que, segundo o IBGE (1996), ocupavam 24% da Amazônia Legal em 1995. É preciso estabelecer uma base legal sólida e fiscalizar o cumprimento da Reserva Legal (RL). Tem sido polêmico exigir que os proprietários que respeitaram a RL de 50% até 1996 reflorestem 30% das fazendas para atingir 80%, conforme o novo Código Florestal; especialmente sem a existência de um Zoneamento Ecológico-econômico que regulamente sua aplicaçãoem alguns Estados. De fato, seria financeiramente ineficiente exigir a recomposição florestal de pastos produtivos em fazendas que respeitavam o código florestal antigo e ao mesmo tempo permitir novos desmatamentos em novas fronteiras. Portanto, é crucial concluir os ZEEs e regulamentar a Reserva Legal – incluindo a possibilidade de mantê-la em 50%, para efeito do cálculo das áreas que devem ser recompostas nas áreas com bom potencial agrícola e não prioritárias para conservação. Além disso, será necessário fiscalizar a manutenção das Áreas de Preservação Permanente e de medidas para evitar incêndios florestais (como a manutenção de aceiros em torno das florestas).
A recente aprovação do macro zoneamento no Pará provavelmente resultará em pressões para diminuir o porcentual de Reserva Legal abaixo dos 50% originais em regiões já ocupadas (considerando o Código Florestal até 1996). Apesar de ser financeiramente e, em alguns casos, socialmente justificável ampliar o uso agropecuário onde já há infra-estrutura[51], esse tipo de proposta certamente vai gerar polêmica. É necessário alertar que a eventual redução da Reserva Legal nessas áreas deveria ser baseada no zoneamento agro-ecológico detalhado ou em um licenciamento ambiental, propriedade por propriedade, criterioso e não no macro zoneamento. Sem o zoneamento detalhado, haveria o risco de permitir o desmatamento de áreas inapropriadas – ou seja, áreas de baixo potencial agrícola que poderiam ser degradadas após poucos anos de uso e não seriam mais atrativas para recuperação, principalmente onde ocorrem terrenos acidentados ou muito úmidos; ou áreas que seriam prioritárias para conservação na escala local (por exemplo, devido à existência de espécies únicas locais).
Contudo, mesmo que regras estáveis e sensatas sejam estabelecidas sobre a Reserva Legal, a resistência contra qualquer forma de controle provavelmente continuará. Portanto, será essencial investir no sistema de controle do uso das terras privadas. Os processos administrativos e judiciais contra os infratores devem ser aperfeiçoados para reduzir a impunidade. A certeza da punição dos infratores identificados aumentaria a eficácia dos esforços de fiscalização.
Os agentes financeiros e ambientais devem garantir que o uso do crédito público para a agropecuária obedeça estritamente a aplicação das ressalvas ambientais. Em 2004, o governo federal prometeu rever as normas de aplicação do Protocolo Verde para torná-lo mais efetivo. Além disso, comprometeu-se a elaborar uma proposta de cadastro dos inadimplentes ambientais (Cadin Verde) para evitar que estabelecimentos com pendências ambientais recebam crédito público (Brasil, 2004d). Essas promessas indicam a preocupação com o potencial impacto ambiental negativo do crédito público e o seu cumprimento deve ser monitorado.
Finalmente, é importante frisar que a recuperação de áreas degradadas não garante a redução de novos desmatamentos. De fato, políticas de subsídio à produção na Amazônia terão o resultado adverso de aumentar os desmatamentos se não forem acompanhadas de uma restrição ao acesso a novas áreas florestadas.
_____________
[50] Estimativa de Maria Beatriz Ribeiro (pesquisadora do Imazon) em junho de 2005.
[51] O desmatamento adicional em áreas com potencial agrícola e boa infra-estrutura seria economicamente mais eficiente que o desmatamento adicional em zonas com baixa infra-estrutura.
No início de 2005, uma equipe do Imazon – liderada por Ritaumaria Pereira – fez um novo levantamento sobre o comércio de boi vivo e de carne junto aos frigoríficos e comerciantes na Amazônia Legal. A seguir resumimos as principais mudanças observadas em relação a 2001. O mercado para animais rastreados prontos para serem exportados é crescente. O preço desses animais é cerca de 2% a 5% maior do que o boi comum. Além do Mato Grosso, Rondônia e Tocantins, frigoríficos do sul e sudeste do Pará também aparecem como exportadores de carne para os países com menores restrições sanitárias (a chamada lista geral)[52]. Atualmente (de acordo com dados coletados em campo em 2005 e ainda não publicados) existem quatro frigoríficos no Estado do Pará habilitados a exportar. Os preços do boi gordo tiveram uma queda em termos reais em relação a 2001, o que temporariamente tem diminuído a euforia em relação à pecuária. Porém, os pecuaristas de Mato Grosso e do Pará já reagiram para recuperar suas margens de lucro. Eles pressionaram e os governos desses Estados reduziram o Imposto sobre Circulação de Mercadoria sobre a venda do gado: no Pará caiu de 7% para 1,8% em agosto, e no Mato Grosso passou de 12% para 3% em julho. Essa ação demonstra a organização e o poder político do setor pecuarista. Apesar das flutuações de preços, os cenários de longo prazo descritos no texto ainda continuam válidos.
_____________
[52] EUA, Japão e UE estão fora desta lista.
Motivos para o crescimento da pecuária na Amazônia
Partimos da hipótese de que a pecuária na Amazônia cresceu principalmente motivada pelo maior retorno do investimento na região, se comparada a outras regiões. Esse retorno atrativo seria derivado especialmente do baixo preço da terra e da melhor produtividade nessas áreas. Para verificar essa hipótese comparamos: (i) os preços de pastagens na Amazônia e em São Paulo entre 1977 e 2000 (Fundação Getúlio Vargas, vários anos); (ii) a produtividade das principais regiões produtoras da Amazônia com o restante do Brasil, usando dados do Anuário da Pecuária Brasileira (Anualpec, 2003); e (iii) a lucratividade e taxa de retorno do investimento nas principais regiões produtoras da Amazônia e no restante do Brasil, usando dados do Anualpec 2003.
Entretanto, consideramos que a pecuária não é homogênea na região amazônica. Para discriminar as regiões de maior crescimento dessa atividade analisamos os dados do IBGE referentes ao período entre 1990 e 2003 (IBGE, 2005) sobre o rebanho na Amazônia Legal. Finalmente, para compreender a existência da pecuária de baixa produtividade na região revisamos análises de vários autores. Detalhes sobre as fontes de dados e análises desta seção são apresentados juntamente com as tabelas e figuras dos resultados.
Assumimos também que o mercado teve forte papel na evolução da pecuária regional. Por isso, levantamos informações sobre a comercialização de bois vivos e carne da região (ver descrição do levantamento no item seguinte).
Consideramos que, além do bom retorno financeiro, a disponibilidade de capital de fácil acesso ou em condições favoráveis também facilitou o crescimento da pecuária na Amazônia Legal. Por isso, coletamos informações sobre as condições de crédito dos Fundos Constitucionais de Financiamento utilizado pelo setor rural da região. Esses fundos foram criados em 1988 para apoiar com vantagens financeiras o desenvolvimento de regiões menos desenvolvidas do País, incluindo o Centro-Oeste, Nordeste e Norte brasileiros. Avaliamos o destino dos fundos aplicados pelo FNO rural (o fundo constitucional usado na Amazônia Legal) entre 1989 e 2002, de acordo com dados do Banco da Amazônia. Além disso, revisamos o volume de recurso gerado pelo setor madeireiro que tem sido usado, em parte, para financiar a pecuária.
O papel do mercado na pecuária bovina da Amazônia
Para compreender o papel do mercado na pecuária bovina da Amazônia, levantamos dados sobre a comercialização de gado vivo e carne nos principais pólos pecuários da Amazônia no primeiro semestre de 2000. Para isso, entrevistamos gerentes de frigoríficos, fazendeiros e comerciantes de gado, por meio de questionários semi-estruturados.
A carne é comercializada por matadouros e frigoríficos. Os frigoríficos são maiores que os matadouros e têm a capacidade de resfriar e processar a carne, produzindo vários tipos de corte. Em contrapartida, os matadouros são freqüentes em pequenas cidades, mas não foram incluídos no estudo, pois comercializam um volume pequeno de carne, se comparados aos frigoríficos.
Para planejar o levantamento de campo, delimitamos nosso universo amostral consultando a lista de frigoríficos fornecida pelas secretarias de agricultura (estaduais e municipais) e delegacias do Ministério da Agricultura. Solicitamos também, de alguns sindicatosde produtores rurais, informações sobre a localização ou existência de empresas que, por algum motivo, poderiam não constar nas listas obtidas anteriormente.
Entrevistamos 21 gerentes de frigoríficos, ou o equivalente a 35% dos 59 existentes na época do levantamento de campo. Os responsáveis pelos frigoríficos entrevistados foram escolhidos segundo critérios oportunistas: entrevistamos aqueles presentes no momento em que visitávamos o município e que estavam dispostos a fornecer informações. Questionamos os gerentes sobre o ano de instalação das empresas, a capacidade de abate, os custos de transporte e os mercados de compra e venda de animais vivos e processados. Os representantes dos frigoríficos ao longo da Belém-Brasília (BR-010), um em Paragominas e outro em Castanhal, negaram o pedido de entrevista. Entretanto, obtivemos com informantes externos dados sobre os mercados abastecidos por esses frigoríficos, mas não quantificamos sua produção e outras informações.
Entrevistamos também 28 compradores de gado em 27 municípios com rebanho expressivo para obter informações sobre mercados e custos de transporte. Esses municípios foram selecionados por possuírem os maiores rebanhos, segundo o Censo Agropecuário de 1996. Os municípios visitados possuíam, em 2001, cerca de 10% do total de animais bovinos da Amazônia. Embora não sejam regiões pecuaristas importantes, Manaus e Boa Vista foram incluídas nesta pesquisa por importarem gado de outras regiões.
Para facilitar a exposição dos dados, os municípios foram reunidos em oito grupos distintos chamados de eixos, pois se aglomeram ao longo das principais rodovias federais e estaduais (Figura 6) – a região da BR-364, por exemplo, contém os municípios de Rondônia e Acre.
Avaliamos os principais fatores que afetarão a produção bovina na região revisando os principais aspectos da demanda e oferta relacionados ao mercado e às políticas públicas. Para compreender o potencial papel do controle da febre aftosa na produção e no comércio de gado da região, revisamos a literatura sobre a estratégia e os resultados do controle, incluindo dados da exportação de carne bovina do Brasil. Essa revisão foi baseada em literatura acadêmica, relatórios governamentais, artigos da imprensa sobre eventos recentes relevantes e observações de campo dos autores.
Onde a pecuária poderá se expandir na Amazônia?
Fortes mudanças estão ocorrendo nos fatores de oferta e demanda por produtos pecuários, as quais afetarão a localização da atividade na Amazônia. Projetamos de que maneira a exportação de carne da Amazônia e o asfaltamento de algumas estradas poderiam afetar a localização da pecuária. Para isso, estimamos o preço do gado pago ao produtor (valor na porteira da fazenda) como uma variável substituta da renda da pecuária – a pecuária tenderá a se expandir onde o preço do gado pago ao produtor for suficiente para gerar lucro.
O valor pago ao produtor foi a diferença entre o preço pago nos locais de comercialização (frigoríficos ou portos, no caso de exportação) e o custo de transporte até os pontos de produção, considerando as estradas existentes ou que serão asfaltadas. Usamos dados coletados nesta pesquisa e da literatura para estimar o preço pago ao produtor. A interação dos dados foi feita em um sistema de informação geográfica, conforme detalhes na seção seguinte.
Estimamos o preço pago ao produtor em três cenários:
A projeção do preço do gado pago ao produtor na Amazônia
Considerações teóricas. As mudanças na oferta e demanda por carne bovina influenciarão a distribuição espacial da pecuária na Amazônia. O modelo de Von Thünen ajuda a entender o impacto dessas mudanças na fronteira de produção. A fronteira irá se expandir até o ponto em que a renda econômica da atividade for zero, como dado pela fórmula:
R = E(p-a) – Efk
onde R é a renda econômica por hectare, p é o preço do gado (por arroba) no centro de comercialização, E é a produção por hectare (portanto, Ep é a renda bruta), a é o custo médio de produção, f, o custo de transporte por arroba por quilômetro e k, a distância do local de produção até o de comercialização.
Considere a situação atual ilustrada na Figura 15: a fronteira pecuária está em d1, onde a renda econômica é zero. Caso o preço do gado aumente por causa da exportação ou do aumento na demanda interna, a fronteira viável para produção será expandida – assim, toda a reta se deslocará paralelamente para a esquerda e interceptará o eixo horizontal em d2. A renda econômica crescerá em todos os locais, independentemente da distância até o centro de comercialização. Por outro lado, a melhoria da infraestrutura irá diminuir o custo unitário de transporte, fazendo com que a inclinação da reta diminua e o ponto de interseção no eixo horizontal se desloque para a esquerda, até d3. A renda econômica aumentará em todos os locais onde os custos de transporte forem significativos. Portanto, caso os fatores de oferta e demanda se concretizem, espera-se que a fronteira agrícola se expanda da fronteira d1 para d3.
Figura 15 – Modelo teórico de expansão da fronteira de acordo com o aumento no preço do gado e as mudanças de custos de transporte.
O modelo de estimativa dos preços. Estimamos o preço do gado na porteira em toda a Amazônia como uma variável substituta da renda da pecuária. O preço do gado na porteira (PP) em um dado ponto i da Amazônia (uma célula de 5 km x 5 km no modelo) é o preço (P) pago no mercado (frigoríficos, portos, etc.) localizado em j, menos os custos de transporte (CT) de i até j, utilizando a infra-estrutura existente. Para cada célula i, o preço na porteira é, portanto, definido como:
PPi =Max(Pj-CTij: j=1,…,k).
O subscrito j denomina um frigorífico ou centro de comercialização de gado. Os preços nessas localidades e os custos de transporte foram levantados mediante entrevistas de campo. Os custos de transporte de i até j foram calculados utilizando o programa ArcView e são uma função da distância, da qualidade da infra-estrutura e do modal de transporte. Um valor de fricção, ou o custo de se mover através da célula, foi assinalado para cada célula em nossa área de estudo. O transporte de gado em estrada não asfaltada, por exemplo, era de R$ 0,390 ton-1 km-1 em 2000, enquanto o custo em estrada asfaltada era de R$ 0,133 ton-1 km-1. A função costdistance – baseada no algoritmo de Dijkstra (1959) – calcula os custos de transporte de i até j de tal forma que esse valor seja o mínimo possível. Um outro algoritmo, programado em linguagem Avenue, garante que o preço pago pelo gado, subtraído dos custos de transporte na célula i, seja o maior possível entre todas as opções (j’s). Os custos de transporte foram obtidos de Thomas (2003). Para simular o asfaltamento de estradas, baixamos os valores de fricção das células não asfaltadas que seriam asfaltadas e recalculamos o custo de transporte de i até j. No caso da simulação com aumento de preços, aumentamos os preços pagos em Pj e subtraímos os custos de transporte de i até j para obter novos valores de preços na porteira PPi.
Dados (em milhares de US$) de dezembro de 2002 (fonte: Banco da Amazônia[53]).
Continuação
[53] Base de dados obtida na sede do Basa, em Belém.
This post was published on 25 de novembro de 2015
Evento será no Teatro Gasômetro, em Belém, e mostrará experiências de proteção ao meio ambiente…
Pesquisadoras e pesquisadores do Imazon foram para Florianópolis, em Santa Catarina, para mostrar os principais resultados…
O Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) está com edital aberto para…
Resumo Neste relatório avaliamos a situação da exploração madeireira no estado entre agosto de 2015…
Resumo Os frigoríficos que compram gado da Amazônia têm sido pressionados por campanhas ambientais e…