A Amazônia brasileira é um microcosmo global dos maiores desafios que a humanidade enfrenta no século 21: encontrar o equilíbrio entre a necessidade de acelerar o progresso social, acabar com a pobreza e permitir que todos tenham uma vida plena, aliado com a necessidade de proteger nosso frágil meio ambiente. O Índice de Progresso Social na Amazônia brasileira lida com este desafio de duas maneiras. Ele é um poderoso apelo para que governos, empresas e sociedade civil ajam no sentido de atender às necessidades das pessoas que vivem na Amazônia brasileira. É, também, o primeiro esforço para avaliar o progresso social de forma rigorosa, consistente e holística em nível subnacional, representando um modelo para as comunidades ao redor do mundo. A Amazônia brasileira abriga cerca de um terço das florestas tropicais e pelo menos um quinto da biodiversidade do planeta. O bem-estar de toda a humanidade depende da conservação e do uso sustentável de ecossistemas como a Amazônia. No entanto, não poderemos proteger esse bem público global se negligenciarmos o bem-estar dos mais de 24 milhões de cidadãos que povoam esta região de 5 milhões de quilômetros quadrados, uma área maior que a dos 28 países da União Europeia juntos. O relatório “Índice de Progresso Social na Amazônia brasileira – IPS Amazônia” mostra que o cidadão comum desta região enfrenta enormes deficiências em quase todos os componentes do progresso social: há dificuldades dramáticas de acesso à água limpa e saneamento básico; problemas na qualidade da educação básica; informação e meios de comunicação deficientes; e a maioria ainda tem pouca oportunidade de chegar ao ensino superior. Além disso, o cidadão da Amazônia enfrenta restrições importantes de direitos individuais e de liberdade de escolha, principalmente por causa das dificuldades de mobilidade nas cidades, gravidez precoce na infância e adolescência e violência generalizada, que afeta especialmente os jovens. A realidade social de 772 municípios e dos nove estados que compõem a Amazônia brasileira é dramática. Quase 98,5% dos municípios amazônicos têm uma pontuação de progresso social inferior à média nacional. E, o Brasil ocupa somente a 46ª posição de progresso social entre os 132 países no mundo. O Índice de Progresso Social da Amazônia brasileira foi concebido como uma ferramenta para a ação, que permite identificar questões sociais urgentes em todos os municípios. Também identifica histórias de sucesso: municípios que foram bem-sucedidos em transformar os recursos econômicos em progresso social. Este relatório foi concebido e apoiado pela #Progresso Social Brasil, uma rede emergente de parceiros que reúne diferentes setores da sociedade no País em torno do objetivo comum de melhorar o progresso social. Nós da Social Progress Imperative agradecemos especialmente ao Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) por liderar este projeto e à Fundação Avina e Deloitte Brasil por liderarem esta rede. Temos certeza que o mundo inteiro poderá aprender com esta iniciativa no Brasil, visto que este ocupa a melhor posição entre os países emergentes para mostrar que é possível promover o progresso social e, ao mesmo tempo, ter um crescimento econômico forte, sustentabilidade ambiental e instituições democráticas sólidas. O mundo também poderá aprender com a metodologia utilizada neste relatório, na qual o modelo de Índice de Progresso Social Global criado para medir o desempenho das nações foi adaptado para medir o que realmente é importante para as pessoas da região amazônica. Portanto, o Índice de Progresso Social construído para a Amazônia brasileira combina tanto indicadores globalmente relevantes – tais como taxa de mortalidade materna, de acesso à água e matrícula no ensino médio – como indicadores customizados adaptados ao contexto local – tais como taxa de desmatamento, gravidez precoce na infância e adolescência e violência contra indígenas. É possível adaptar a estrutura de progresso social sobre a qual os índices Global e da Amazônia estão construídos para mostrar com clareza a realidade local, a fim de que sejam implementadas ações em comunidades em qualquer lugar do planeta. Nossa expectativa é que este relatório seja a primeira de muitas iniciativas semelhantes ao redor do mundo para medir e promover o progresso social usando esta nova ferramenta. Agradecemos contribuições com comentários e a qualquer interessado em integrar a rede #Progresso Social Brasil. Michael Green, SPI (Diretor Executivo da Social Progress Imperative)
A Amazônia é conhecida internacionalmente pela sua imensa floresta, biodiversidade e recursos naturais. Essa riqueza vem sendo utilizada de forma predatória e ao mesmo tempo persistem na região problemas sociais graves e faltam oportunidades para a população. De fato, a Amazônia brasileira tem apresentado indicadores sociais inferiores às outras regiões do Brasil. Até recentemente, o desempenho social da Amazônia era avaliado somente por índices que sofrem forte influência da economia. Com a criação do Índice de Progresso Social (IPS) em 2013, tornou-se possível avaliar o progresso social da região considerando exclusivamente indicadores sociais e ambientais. O IPS foi originalmente proposto para a escala global. No entanto, diversas iniciativas nacionais e subnacionais estão surgindo. Uma delas (IPS Amazônia), promovida pela rede #Progresso Social Brasil, é liderada pelo Imazon em parceria com a SPI na Amazônia Legal. O IPS Amazônia busca responder as mesmas perguntas do IPS Global e tem o mesmo método estatístico. No entanto, alguns dos indicadores utilizados são diferentes a fim de refletir a realidade social e ambiental da região. Para calcular o IPS Amazônia foram utilizados 43 indicadores recentes e de fontes confiáveis. Esses indicadores estão agrupados em três dimensões e doze componentes. O índice varia de zero (pior) a 100 (melhor). O IPS Amazônia representa o diagnóstico mais detalhado do progresso social e ambiental de 772 municípios da região e dos seus nove estados (Acre, Amazonas, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins). Além do relatório com os principais resultados do IPS Amazônia, está sendo lançado o website www.ipsamazonia.org.br, onde estão apresentados os resultados municipais desagregados. No site é possível avaliar a performance social de todos os municípios, suas fortalezas e fraquezas em relação a outros municípios da região com o mesmo desempenho econômico. O IPS médio da Amazônia (57,31) é inferior à média nacional (67,73). Comparada com o restante do Brasil, a região apresenta resultados inferiores para todas as dimensões e quase todos os componentes do IPS. A Dimensão 1 do IPS (Necessidades Humana Básicas) apresentou um índice de apenas 58,75 – abaixo da média nacional de 71,60. Entre os componentes dessa dimensão inclui-se “Água e saneamento”, que teve o pior resultado (35,35). Por sua vez, a segunda Dimensão (Fundamentos para o Bem-estar) obteve o melhor resultado (64,84), mesmo assim, o valor está abaixo da média nacional (70,42). Entre os componentes, o pior resultado foi no Acesso à informação e comunicação (53,36). Por outro lado, o melhor resultado foi alcançado pelo componente Sustentabilidade dos ecossistemas (74,85), devido principalmente à queda recente no desmatamento e também a maior proporção de Áreas Protegidas (Terras Indígenas e Unidades Conservação) existentes na região. Por fim, a Dimensão 3 (Oportunidades) teve o pior desempenho da região, com um índice de apenas 48,33. Os estados da Amazônia apresentam uma disparidade importante entre si em relação ao IPS e suas três dimensões, mesmo assim, todos têm resultados inferiores à média nacional. Mato Grosso apresenta o melhor desempenho, com IPS de 61,37, seguido por Tocantins (59,46) e Rondônia (59,21). Os demais estados apresentam um IPS inferior a 57. Também observou-se variação expressiva do IPS entre os municípios amazônicos, os quais foram agrupados em cinco níveis de IPS conforme sua pontuação. O primeiro grupo inclui os 87 municípios com os melhores resultados, nos quais o IPS médio é 65,79. Neste grupo estão todas as capitais, exceto Porto Velho. O segundo grupo tem 200 municípios e apresenta um IPS médio de 61,13. Por sua vez, o terceiro grupo possui 194 municípios e apresenta um IPS médio de 57,21. Neste grupo estão municípios como Marabá e Paragominas, ambos no Pará. O quarto grupo compreende 204 municípios e possui IPS médio de apenas 53,59. Os municípios de Coari (AM) e Itaituba (PA) são alguns dos municípios neste nível de IPS. Finalmente, 87 municípios compõem o quinto grupo, que apresenta os resultados de IPS mais baixos: média de 49,00. A maioria dos municípios desse nível (38%) está localizada no Maranhão. Os municípios com piores resultados na região são Jordão (AC), Brejo de Areia (MA), Alto Alegre (RR) e Anapu (PA). Embora o IPS tenha uma correlação positiva alta com a renda per capita dos municípios da Amazônia (0,62), a performance econômica sozinha não é suficiente para explicar integralmente o progresso social dado que a relação entre IPS e renda não é linear. De fato, há grande variação entre o IPS nos municípios com a mesma faixa de renda. Por exemplo, Magalhães Barata (PA) e Parintins (AM) têm um IPS na categoria mais alta mesmo apresentando uma renda per capita muito baixa em comparação com as capitais. Por outro lado, há diversos municípios com renda superior à média regional que apresentam um IPS nos níveis mais baixos, entre eles Bom Jesus do Araguaia (MT) e Cujubim (RO). Ou seja, progresso social é diferente de desenvolvimento econômico, embora sejam correlacionados.
O desenvolvimento da Amazônia tem sido fortemente marcado pelo desmatamento, uso predatório dos recursos naturais e por conflitos sociais. Como consequência, além dos sérios danos ambientais, os 24 milhões de habitantes da região convivem com indicadores sociais e econômicos inferiores ao restante do Brasil. Apesar de o Brasil ter priorizado os investimentos sociais, incluindo programas de transferência de renda como o Bolsa Família, e conseguido reduzir a pobreza extrema pela metade na última década (Pnud, 2014), na Amazônia os avanços têm sido menores e problemas sociais graves persistem (Celentano et al., 2010). A extensão continental da região, a precariedade da infraestrutura e as condições do meio ambiente natural (distinto do resto do Brasil) impõem desafios adicionais ao seu desenvolvimento social e econômico. Além disso, índices como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) usados para medir o desempenho social na região têm atualização pouco frequente na escala municipal (a cada 10 anos) e sofrem forte influência de indicadores econômicos. Felizmente, atualmente existe um novo índice com potencial de capturar de forma mais abrangente o status social da Amazônia e influenciar positivamente o debate sobre as políticas públicas: o Índice de Progresso Social (IPS). O IPS, lançado em 2013 pela Social Progress Imperative (SPI) – http://progressosocial.org/ -, avalia o progresso social dos países por meio de um modelo matemático que agrega uma ampla variedade de indicadores sociais e ambientais recentes e de fontes públicas e fidedignas (SPI, 2014a). O índice se diferencia de outras medidas de desenvolvimento como o IDH e o Produto Interno Bruto (PIB) principalmente por excluir variáveis econômicas no seu cálculo e incluir apenas indicadores sociais e ambientais. O relatório global do IPS 2014 avaliou 132 países a partir de 54 indicadores (SPI, 2014a). Os indicadores utilizados para a elaboração do IPS são agrupados em três dimensões e doze componentes. A Dimensão 1, “Necessidades Humanas Básicas”, contém os seguintes componentes: Nutrição e cuidados médicos básicos, Água e saneamento, Moradia e Segurança pessoal. Por sua vez, a Dimensão 2, “Fundamentos para o Bem-estar”, tem os seguintes componentes: Acesso ao conhecimento básico, Acesso à informação e comunicação, Saúde e bem-estar e Sustentabilidade dos ecossistemas. E, por fim, a Dimensão 3, “Oportunidades”, inclui os componentes: Direitos individuais, Liberdade individual e de escolha, Tolerância e inclusão e Acesso à educação superior. O IPS Amazônia representa o diagnóstico mais detalhado do progresso social e ambiental dos nove estados e 772 municípios da região. No caso da Amazônia, utilizamos 43 indicadores sociais e ambientais na escala municipal para calcular o IPS. Além disso, neste relatório analisamos o progresso social dos municípios medido pelo IPS em relação ao desempenho econômico expresso pela renda per capita. Isso permite avaliar até que ponto o resultado do IPS tem relação com a economia regional. Por fim, apresentamos um ranking dos municípios da Amazônia mostrando sua performance, fortalezas e fraquezas em relação a outros municípios na mesma faixa de renda per capita (Apêndice 1). É importante ressaltar que este trabalho não teve como objetivo avaliar as causas ou propor soluções específicas para os graves e complexos problemas sociais da Amazônia. Este relatório também é complementado por dados desagregados na escala municipal, disponibilizados no website www.ipsamazonia.org.br. O site permite realizar análises comparativas da situação de cada município da região. Nossa expectativa é que este conjunto de indicadores – que permite uma visão mais acurada da realidade social – sirva como uma bússola para orientar e priorizar o processo de tomada de decisão dos governos locais e estaduais da região e, com isso, contribuir para melhorar a qualidade de vida da população amazônica.
Adotamos a escala municipal para as análises do IPS considerando 772 municípios amazônicos. No entanto, alguns municípios da região têm áreas territoriais imensas (por exemplo Altamira é maior que os territórios somados do Espírito Santo, Santa Catarina e Sergipe) e é muito provável que haja diferenças significativas quanto a sua performance social entre os distritos que compõem esses municípios. Porém, não é possível gerar o IPS por distrito ou por unidade censitária, pois não há indicadores disponíveis suficientes para uma análise nessa escala. Da mesma forma, sabe-se que há diferenças marcantes entre as zonas rurais e as urbanas para a maioria dos indicadores, mas não é possível, na maioria dos casos, desagregar a análise nesse recorte geográfico. De fato, alguns indicadores do IPS consideram essa disparidade (como no caso do saneamento ambiental), mas a grande maioria inclui toda a população municipal. Um grupo de trabalho da rede #Progresso Social Brasil está elaborando indicadores de progresso social na escala de comunidades. Um primeiro esforço está sendo realizado no município de Carauarí, no Amazonas. É importante ressaltar que os indicadores municipais não refletem necessariamente a situação dos povos indígenas e das populações tradicionais que vivem na região amazônica. De fato, o conceito de progresso social para esses povos é diferenciado devido ao seu modo de vida, e ainda não existem levantamentos de dados específicos e periódicos com essas populações (Lima, 2010)[1] Mesmo com essas limitações, foi possível utilizar dados referentes aos povos indígenas no cálculo do IPS no componente 8 “Sustentabilidade dos ecossistemas” (Áreas Protegidas) e no componente 11 “Tolerância e inclusão” (Violência contra indígena). Os mapas foram construídos com base nos resultados dos municípios, dessa forma, não refletem as variações intramunicipais (por exemplo, entre os distritos) nem capturam a densidade demográfica. Em geral, na Amazônia, os municípios com grande extensão territorial têm população relativamente pequena. Por exemplo, a densidade demográfica é muito baixa nos municípios mais extensos da Amazônia (maiores que 100 mil quilômetros quadrados) como Altamira (0,62 habitante/km²), Barcelos (0,21 habitante/km²), São Gabriel da Cachoeira (0,35 habitante/km²) e Oriximiná (0,58 habitante/km²). Por outro lado, a densidade demográfica é muito expressiva nas capitais Belém (1.315 habitantes/km²) e São Luís (1.215 habitantes/km²). A área geográfica adotada neste estudo é a Amazônia Legal. No entanto, parte dessa região é coberta pela vegetação de cerrado e tem uma dinâmica social e econômica distinta da Amazônia florestal. Essas áreas de cerrado ocupam inteiramente o Tocantins e aproximadamente metade de Mato Grosso. A performance de desenvolvimento com base em agricultura de grãos (especialmente soja) em parte dessas áreas não pode ser extrapolada para as áreas de floresta do Bioma Amazônia. Para avaliar isso, apresentamos uma análise do IPS comparando os municípios florestais e os não florestais, aqueles com menos de 50% de sua área com vegetação originalmente florestal (ver Quadro 2 nos resultados). Finalmente, ressaltamos que este estudo utiliza somente indicadores relativamente recentes: 2010 a 2013. É fato que as estatísticas na Amazônia apresentam problemas históricos devido à dificuldade de acesso e de coleta de dados. Além disso, o censo demográfico, no qual se levantam a maioria dos indicadores sociais do Brasil, é realizado apenas a cada 10 anos – o último foi realizado em 2010. Alguns indicadores utilizados no IPS Global que seriam relevantes para a região amazônica não puderam ser utilizados para o cálculo do IPS Amazônia devido à defasagem na informação ou por não existirem indicadores na escala municipal (por exemplo, poluição do ar, emissões de gases de efeito estufa, corrupção, liberdade de imprensa e tolerância à homossexualidade). Os indicadores utilizados neste estudo foram conferidos e atualizados em nossa base de dados de acordo com a fonte original da informação até o dia 09 de Julho de 2014, dessa forma, qualquer alteração após essa data não foi considerada nas análises.
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[1] Para pesquisas específicas sobre os povos indígenas e os indicadores disponíveis recomendamos as publicações do Instituto Socioambiental (http://www.socioambiental.org/) e do Conselho Indigenista Missionário (http://www.cimi.org.br).
O Índice de Progresso Social (IPS) é um índice que mede de forma holística e robusta a performance social e ambiental das nações, independente do desenvolvimento econômico (SPI, 2014a). Foi criado em 2013 pela Social Progress Imperative (SPI), num processo que contou com o apoio de diversos estudiosos e especialistas mundiais em políticas públicas (SPI, 2014a). O IPS foi idealizado a partir do entendimento que medidas de desenvolvimento baseadas apenas em variáveis econômicas são insuficientes, já que crescimento econômico sem progresso social resulta em exclusão, descontentamento social, conflitos sociais e degradação ambiental (SPI, 2014a). A iniciativa IPS Global inclui 54 indicadores sociais e ambientais. Quatro princípios fundamentam o IPS (SPI, 2014a): Princípios do IPS 1. Indicadores exclusivamente sociais e ambientais: seu objetivo é medir o progresso social diretamente e não por meio de variáveis econômicas. 2. Foco nos resultados: seu objetivo é medir os resultados que são importantes para a vida das pessoas (outputs), não os investimentos ou esforços realizados (inputs). 3. Factibilidade: o índice pretende ser uma ferramenta prática que possa ajudar dirigentes públicos, líderes empresariais e da sociedade civil a propor e apoiar a implementação de políticas públicas e programas que acelerem o progresso social. 4. Relevância: seu objetivo é medir o progresso social de forma holística e abrangente, englobando todas as regiões/territórios independente de seu nível de desenvolvimento econômico.
Progresso social é definido pela SPI como “a capacidade da sociedade em satisfazer as necessidades humanas básicas, estabelecer as estruturas que garantam qualidade de vida aos cidadãos e dar oportunidades para que todos os indivíduos possam atingir seu potencial máximo” (SPI, 2014a). A partir dessa definição, surgem três questões fundamentais para avaliar o progresso social de um determinado local, seja um país, estado ou um município: 1) As necessidades mais essenciais da população estão sendo atendidas? 2) Existem estruturas que garantam aos indivíduos e comunidades melhorar ou manter seu bem-estar? 3) Há oportunidades para que todos os indivíduos atinjam seu potencial pleno? A partir dessas questões derivam as três dimensões do IPS (Figura 1): 1) Necessidades Humanas Básicas, 2) Fundamentos para o Bem-estar e 3) Oportunidades. Cada uma dessas dimensões é composta por quatro componentes, e cada componente é constituído por três a seis indicadores.
Figura 1. Estrutura do Índice de Progresso Social (IPS).
O IPS foi originalmente proposto para a escala global. No entanto, desde sua criação em 2013, diversas iniciativas nacionais e subnacionais estão surgindo. Uma delas, o IPS Amazônia, promovida pela rede #Progresso Social Brasil, é liderada pelo Imazon em parceria com a Social Progress Imperative (SPI) na Amazônia Legal.
A Amazônia brasileira é superlativa em recursos naturais, pois abriga um terço das florestas tropicais do mundo e é banhada pela maior bacia hidrográfica do planeta. Sob as florestas exuberantes da região ocorrem ainda uma das mais ricas jazidas minerais da Terra, com destaque para o minério de ferro e a bauxita. Além disso, a floresta amazônica retém imensos estoques de carbono e, por isso, desempenha uma função estratégica na regulação do clima regional e global.
A região conta com sistemas de monitoramento do desmatamento através de imagens de satélite quase em tempo real que servem de referência para o mundo tropical. Porém, medir a situação social da região é mais complicado. Por um lado, a frequência de atualização dos dados é baixa e há limitações na abrangência geográfica de alguns indicadores. Por outro, a maioria dos levantamentos tem forte influência de indicadores econômicos que não necessariamente refletem as condições sociais da região. Por exemplo, estudos anteriores sobre o desenvolvimento humano na Amazônia por meio do IDH e dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) propostos pela Organização das Nações Unidas (ONU) revelam que essas abordagens são fortemente influenciadas pelos indicadores econômicos como o PIB e a renda per capita (Celentano & Veríssimo, 2007; Celentano et al., 2010). Alternativamente, o IPS, ao excluir indicadores econômicos no seu cálculo base, representa uma alternativa mais completa de avaliar a situação social da Amazônia.
A Amazônia pode ser definida de acordo com os limites biogeográficos (Bioma Amazônia), hidrográficos (Bacia Amazônica) e político (Amazônia Legal) (Figura 2).
O Bioma Amazônia é uma região principalmente coberta por floresta tropical densa, compartilhada por nove países da América do Sul (Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela), com 7,8 milhões de quilômetros quadrados de extensão, dos quais 65% estão em território brasileiro. Já a Bacia Amazônica, a maior bacia hidrográfica do mundo, refere-se à área de drenagem do rio Amazonas e seus tributários, com 7 milhões de quilômetros quadrados, dos quais quase 50% estão no Brasil. E a Amazônia Legal é uma divisão político-administrativa brasileira, criada em 1953 com cerca de 5 milhões de quilômetros quadrados[2]. Neste estudo, adotamos a área geográfica da Amazônia Legal, referida no relatório apenas como Amazônia.
Figura 2. A Amazônia brasileira segundo a divisão biogeográfica, hidrográfica e administrativa.
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[2] A Amazônia Legal abrange municípios que estão integralmente em áreas de Bioma Amazônia, bem como municípios cobertos total ou parcialmente pelo Bioma Cerrado e áreas de transição (cerca de 20% da região). A vegetação de cerrado tem influência na dinâmica de ocupação e de desenvolvimento desses municípios, o que os distingue em alguns aspectos socioeconômicos e legais do restante da Amazônia florestal.
A Amazônia cobre 59% do território brasileiro (5 milhões de quilômetros quadrados), é composta por nove estados (Acre, Amazonas, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins) e por 773 municípios (Tabela 1). Essa região possui cerca de 24 milhões de habitantes (13% da população nacional) e uma baixa densidade demográfica (4,8 habitantes por quilômetro quadrado) em relação à média brasileira (22,4). Embora a maioria da população amazônica se concentre em áreas urbanas (72%), a região resguarda uma das maiores diversidades étnicas e culturais do mundo: são mais de 170 povos indígenas com uma população estimada em cerca de 400 mil pessoas (IBGE, 2010).
A riqueza da Amazônia expressa pelo PIB atingiu cerca de R$ 347 bilhões (~ US$ 208 bilhões)[3] em 2011, os quais representam apenas 8% do PIB do Brasil. Em 2011, o PIB per capita anual da região foi R$ 14 mil (US$ 8 mil/ano), praticamente a metade do PIB per capita do País e comparável ao da África do Sul (FMI, 2013). Há variações importantes no PIB da região. Por exemplo, o PIB per capita de Mato Grosso é maior que a média nacional, enquanto o Maranhão apresenta o segundo pior PIB per capita do Brasil atrás apenas do Piauí. Embora o PIB per capita seja o indicador mais utilizado para ter uma medida relativa da economia, ele não reflete necessariamente a renda da população. De fato, a renda per capita[4] média na região é ainda mais baixa (R$ 6,6 mil em 2010) e 26% inferior à média nacional. Esses resultados revelam que a Amazônia tem uma economia incipiente quando comparada ao restante do Brasil; no entanto, a riqueza da região em recursos naturais e serviços ambientais é ainda inestimável.
Em virtude de sua importância ambiental, o desmatamento da Amazônia é uma preocupação global. Em 2013, o desmatamento atingiu cerca de 19% do território. Estimativa das emissões brasileiras de CO2 revela que o desmatamento contribuiu com cerca de um terço das emissões totais do Brasil em 2012 (SEEG, 2014). Apesar da queda do desmatamento nos últimos anos com a melhoria da fiscalização, criação de Áreas Protegidas e regras mais duras para concessão de crédito rural, entre outras medidas, a taxa continua muito acima do aceitável, tendo atingido cerca de 5,8 mil quilômetros em 2013 (Inpe, 2014a). Além de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil para reduzir o desmatamento em até 80% até 2020, existe uma pressão crescente da sociedade para o desmatamento zero da Amazônia (Veríssimo, 2013).
Tabela 1. Perfil dos estados da Amazônia*.
* Fonte dos dados: IBGE, 2010; IBGE, 2014; Pnud, 2014.
** Apenas os municípios maranhenses inseridos na Amazônia Legal.
O IPS Amazônia avaliou o progresso social e ambiental dos 9 estados e de 772 municípios da região[5]. Para isso utilizamos o mesmo método estatístico de construção do IPS Global para responder as mesmas questões contidas em seus componentes (SPI, 2014b). Porém, foi necessário adotar alguns indicadores diferentes daqueles usados no IPS Global para que refletissem a realidade social da região. Por exemplo, indicadores como a incidência de malária e o desmatamento são fundamentais para a Amazônia ainda que não tenham a mesma importância para outras regiões do mundo.
A escolha dos indicadores foi feita com base na relevância para a região amazônica, confiabilidade da fonte do dado, disponibilidade (dado público), abrangência (dado disponível para a grande maioria dos municípios da Amazônia) e atualização (dados mais recentes possíveis com no máximo 5 anos). Para isso, selecionamos 43 indicadores para a avaliação, que foram agrupados nos 12 componentes e nas três dimensões do IPS Global (Tabela 2).
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[3] Média da cotação do dólar em 2011: US$ 1 = R$ 1,67.
[4] Renda per capita média é a razão entre o somatório da renda de todos os indivíduos com renda e o número total desses indivíduos (Pnud, 2013).
[5] O IPS do município de Mojuí dos Campos (Pará) não foi calculado, pois esse município foi criado somente em 2013, desmembrado do município de Santarém.
O IPS varia de zero (pior) a 100 (melhor). O índice é a média simples dos valores de progresso social das três dimensões (Necessidades Humanas Básicas, Fundamentos para o Bem-estar e Oportunidades). Por sua vez, cada dimensão corresponde à média simples dos índices obtidos dos quatro componentes que a compõem. Estes foram obtidos a partir da Análise de Componentes Principais (ACP) entre os indicadores. A validade e confiabilidade da ACP para cada componente foram verificadas por meio das análises Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e alfa de Cronbach. Os mapas agrupam os municípios em cinco classes de IPS, definidos pelo método natural breaks. Os detalhes do método utilizados para calcular o IPS Amazônia estão apresentados no Apêndice 2.
Tabela 2. Indicadores utilizados para construir o IPS*.
*Maiores detalhes dos indicadores utilizados estão apresentados no Apêndice 3.
Nesta seção apresentamos os principais resultados do IPS Amazônia de forma geral. Para mais detalhes sobre os resultados dos municípios da região, consulte o Apêndice 1 e os scorecards municipais disponíveis no site
www.ipsamazonia.org.br. As análises com o IPS revelaram diferenças marcantes entre os municípios da Amazônia em seu desempenho social (Figura 4), destacando suas fraquezas e fortalezas (ver Quadro 1).
O Índice de Progresso Social (IPS) médio na região amazônica (57,31) é inferior à média nacional (67,73). Comparada com a média do Brasil, a Amazônia apresenta resultados inferiores para todas as dimensões e quase todos os componentes do IPS (Tabela 3). Embora neste relatório usemos a média dos municípios brasileiros para avaliar e comparar o desempenho da região amazônica, é importante ressaltar que o progresso social do Brasil medido pelo IPS tampouco é favorável. Segundo o ranking apresentado pela SPI (2014a), o País está na 46ª posição em um grupo de 132 países, sendo que aqueles com as melhores colocações (Nova Zelândia, Suíça e Islândia) apresentam IPS superior a 88.
O melhor resultado da região amazônica é na Dimensão 2 (Fundamentos para o Bem-estar), na qual é avaliado se os municípios têm a estrutura necessária para garantir o bem-estar social por meio do acesso ao conhecimento, à informação e aos meios de comunicação, à saúde e bem-estar e a aspectos relacionados com a sustentabilidade dos ecossistemas. Ainda que seja o melhor resultado da região, o índice médio (64,84) é 8% inferior ao índice brasileiro.
A Dimensão 1 (Necessidades Humanas Básicas) apresenta resultados intermediários (58,75) e uma disparidade de 18% com o restante do País. Esta dimensão avalia se a população tem suas necessidades básicas (Nutrição e cuidados médicos básicos, Água e saneamento, Moradia e Segurança pessoal) garantidas.
Finalmente, na Dimensão 3 (Oportunidades), a Amazônia tem o pior resultado, com um índice de apenas 48,33, e apresenta a maior disparidade entre a região e o restante do País (21%). Isso evidencia que, em média, os municípios da Amazônia oferecem poucas oportunidades, expressas nos Direitos individuais, Liberdade individual e de escolha, Tolerância e inclusão e Acesso à educação superior). Uma avaliação mais detalhada das dimensões e dos componentes do IPS é apresentada ao final da seção de resultados.
Tabela 3. Índice de Progresso Social da Amazônia.
Os estados da Amazônia apresentam uma disparidade importante entre si em relação ao IPS e suas três dimensões, mas todos têm resultados inferiores à média brasileira. Mato Grosso apresenta o melhor desempenho da região com IPS de 61,37, seguido por Tocantins (59,46) e Rondônia (59,21). Os demais estados apresentam um IPS inferior a 57. Há grande variação entre os municípios dos estados conforme indicam os valores máximos e mínimos do IPS Estadual (Figura 3).
Figura 3. Variação do IPS e suas dimensões (mínimo, média e máximo) nos estados da Amazônia.
Os municípios amazônicos foram agrupados em cinco “níveis de IPS” conforme sua pontuação (Figura 4, Tabela 4). O primeiro grupo inclui os 87 municípios com os melhores resultados (verde escuro no mapa), nos quais o IPS médio é 65,79. Esses municípios somam 390 mil quilômetros quadrados (cerca de 8% do território da região) e abrigam uma população de 9,4 milhões de habitantes (39% da população amazônica). Este grupo responde por mais da metade (53%) do PIB da região, que somou R$ 182,3 bilhões em 2011. Neste grupo estão incluídas todas as capitais, exceto Porto Velho (RO). Embora apresentem os melhores resultados da Amazônia, a maioria desses municípios apresenta resultados inferiores à média brasileira. Na Figura 4, observa-se que esses municípios estão principalmente concentrados em Mato Grosso, Rondônia e Tocantins; estados com os melhores resultados do IPS Amazônia.
Figura 4. IPS nos municípios da Amazônia.
Tabela 4. Descrição dos cinco níveis de IPS nos municípios da Amazônia.
O segundo grupo tem 200 municípios e apresenta um IPS médio de 61,13 (verde claro no mapa). Esses municípios somam uma área de 1 milhão de quilômetros quadrados (cerca de 21% do território) e abrigam uma população de 4,18 milhões de habitantes (20%). O PIB somado desses municípios atingiu R$ 79,8 bilhões em 2011 (cerca de 23% do PIB regional). Neste grupo está a capital de Rondônia, Porto Velho, e também o município com a maior renda domiciliar per capita da Amazônia: Campos de Júlio (MT).
O terceiro grupo possui 194 municípios, que apresentam um IPS médio de 57,21 (em amarelo no mapa). Este grupo diversificado inclui municípios com diferença acentuada no nível de desenvolvimento econômico, medida pela renda per capita, que varia de R$ 1,8 mil anuais em Barreirinha (AM) a R$ 9,7 mil em Ipiranga do Norte (MT). Isso demonstra que bom desempenho econômico não garante necessariamente o progresso social. Entre os municípios desse grupo destacam-se Marabá (PA), Ariquemes (RO), Paragominas (PA), Alta Floresta (MT) e Oiapoque (AP).
O quarto grupo (em laranja no mapa) compreende o maior número de municípios (204) e possui IPS médio de apenas 53,59. Esses municípios somam 29% do território e abrigam 20% da população total (4,9 milhões de habitantes). Eles respondem por apenas 9% da economia amazônica com um PIB de R$ 31,6 bilhões. No mapa, observa-se que grande parte dos municípios deste grupo está concentrada em uma mesma faixa de latitude que vai do leste (no Maranhão), passa pelo Pará, até o oeste do Amazonas e Acre. Os municípios de Coari (AM), Itaituba (PA) e Raposa (MA) são alguns dos municípios neste nível de IPS.
Finalmente, 87 municípios compõem o quinto grupo (em vermelho no mapa), que registra os níveis mais baixos de progresso social da Amazônia: IPS médio igual a 49,00. Eles abrigam 1,7 milhão de habitantes (7%), possuem um PIB total de apenas R$ 9,7 milhões (3% do PIB regional) e a renda domiciliar anual per capita média é de apenas R$ 2,7 mil por ano. Trinta e oito por cento desses municípios estão no Maranhão e 26% no Pará. Os municípios com piores resultados na região são Jordão (AC), Brejo de Areia (MA), Alto Alegre (RR) e Anapu (PA).
Quadro 1. Fraquezas e fortalezas dos municípios amazônicos (scorecards).
O progresso social medido pelo IPS, suas três dimensões, 12 componentes e 43 indicadores pode ser avaliado individualmente para os 772 municípios da região amazônica por meio dos scorecards que estão disponíveis no site www.ipsamazonia.org.br. Scorecard é um termo esportivo em inglês que significa cartão de pontuação. Nele estão apresentados todos os resultados municipais e a classificação de cada município no ranking regional. Os resultados recebem um cartão verde (bom resultado), amarelo (neutro) ou vermelho (fraco) em relação a outros 27 municípios na mesma faixa de renda per capita, segundo o exemplo abaixo.
Um dos objetivos do IPS é entender melhor a relação entre o progresso social e o desenvolvimento econômico (SPI, 2014a). O IPS permite analisar os aspectos do progresso social que são mais ou menos correlacionados com as medidas tradicionais de sucesso econômico. No geral, o IPS permite avaliar a eficácia com que o sucesso econômico de um município, estado ou país é convertido em progresso social e vice-versa.
Embora o IPS tenha uma correlação positiva alta com a renda per capita dos municípios da Amazônia (0,62), a distribuição dos dados mostra que a performance econômica sozinha não é suficiente para explicar integralmente o progresso social, dado que a relação entre IPS e renda per capita não é linear (Figura 5). De fato, há grande variação no IPS entre os municípios com a mesma faixa de renda per capita.
Alguns municípios com renda per capita muito baixa apresentam IPS relativamente alto em relação a outros municípios na mesma faixa de renda. Por exemplo, Magalhães Barata (PA), Porto Rico do Maranhão (MA) e Parintins (AM) têm um IPS no nível mais alto (verde escuro) mesmo apresentando uma renda per capita muito baixa em comparação com as capitais. Por outro lado, há diversos municípios com renda superior à média regional que apresentam um IPS nos níveis mais baixos, entre eles: Campo Novo (RO), Bom Jesus do Araguaia (MT), Cumaru do Norte (PA) e Pedra Branca do Amaparí (AP). Ou seja, progresso social é diferente de desenvolvimento econômico, embora sejam correlacionados.
Figura 5. Relação entre IPS e a renda per capita nos municípios da Amazônia.
Todas as dimensões do IPS têm uma correlação significativa com a renda per capita. No entanto, a correlação da renda é bem mais forte (0,72) com a Dimensão 3 (Oportunidades) do que com a Dimensão 1 (Necessidades Humanas Básicas – 0,38) e Dimensão 2 (Fundamentos para o Bem-estar – 0,33).
A correlação entre IPS e a renda per capita é significativa em todos os estados da Amazônia (Tabela 5), mas é mais forte em Roraima (0,83) e no Acre (0,76). Em todos os estados a renda está mais fortemente correlacionada com a Dimensão 3 (Oportunidades), exceto no Acre e em Rondônia, onde a renda tem correlação mais forte com a Dimensão 1 (Necessidades Humanas Básicas).
Tabela 5. Correlação entre o IPS e suas dimensões com a renda per capita nos estados da Amazônia.
Entre os estados, a distribuição do IPS de cada município segundo a renda per capita é bastante informativa, mostrando que às vezes é possível “obter maior progresso social mesmo com menor renda”. Por exemplo, no Pará, essa correlação mostra que municípios com a mesma faixa de renda per capita possuem diferenças significativas na pontuação, como Santa Cruz do Arari (64,67) e Afuá (51,09), dois municípios paraenses situados na ilha do Marajó que possuem rendas similares e IPS bastante distintos (Figura 6). O mesmo acontece em municípios de Mato Grosso que estão na mesma faixa de renda e apresentam diferença expressiva de IPS, como é o caso de Bom Jesus do Araguaia (48,97) e Pontal do Araguaia (66,91) (Figura 7). No Amazonas, há municípios com IPS diferentes ainda que tenham renda per capita similares, como é o caso de Humaitá (58,09) e Apuí (51,50) (Figura 8).
Figura 6. Relação entre IPS e a renda per capita nos municípios do Estado do Pará.
Figura 7. Relação entre IPS e a renda per capita nos municípios do Estado de Mato Grosso.
Figura 8. Relação entre IPS e a renda per capita nos municípios do Estado do Amazonas.
A Amazônia abriga a maior floresta tropical do mundo. No entanto, cerca de 19% da floresta amazônica (mais de 760 mil km²) já foi desmatada (Inpe, 2014a). O desmatamento da Amazônia foi impulsionado na década de 1960 e 1970 pelo governo militar por meio da construção de estradas, projetos de colonização e subsídios para a agricultura. Atualmente, grande parte desse desmatamento é resultado de investimentos privados em agropecuária (especialmente pecuária bovina), extração ilegal de madeira, além dos grande projetos de infraestrutura. Nos últimos anos houve avanços no combate ao desmatamento e a taxa caiu cerca de 75% entre 2004 e 2013. Mesmo assim, a perda continua muito alta (5,8 mil quilômetros quadrados em 2013). Estudos indicam que o desmatamento eleva indicadores econômicos em um primeiro momento (boom), mas que esse aumento é seguido por um colapso econômico, fenômeno chamado de boom-colapso (Celentano et al., 2012).
A correlação entre o IPS e o desmatamento é muito fraca (0,22). É interessante observar que existe uma grande variação do IPS em municípios na mesma faixa de desmatamento (Figura 9). Por exemplo, entre os melhores IPS encontram-se municípios muito desmatados, como Lucas do Rio Verde (MT), assim como municípios com grande cobertura florestal, como Guajará Mirim (RO) e Serra do Navio (AP). Por outro lado, entre os piores níveis de IPS também há municípios quase totalmente florestais, como Atalaia do Norte e Jutaí, no Amazonas, cujo desmatamento é inferior a 1%, até municípios largamente desmatados, como é o caso de Bom Jesus das Selvas, no Maranhão, e Eldorado do Carajás, no Pará (> 90% de áreas desmatadas). Entre as dimensões do IPS, Oportunidades tem a maior correlação com desmatamento (0,27), enquanto as demais dimensões têm correlações muito baixas: 0,15 (Necessidades Humanas Básicas) e 0,09 (Fundamentos para o Bem-estar).
Figura 9. Relação do IPS com o desmatamento acumulado até 2012 nos municípios da Amazônia.
Quadro 2. IPS nos municípios florestais e não florestais.
A Amazônia Legal abrange municípios que estão integralmente em áreas do Bioma Amazônia, bem como municípios cobertos total ou parcialmente por vegetação não florestal (cerrados e áreas de transição) (ver Figura 12). Há 362 municípios na região com essas características, cuja área somada é cerca de 1,2 milhão de quilômetros quadrados (24% da área total) e onde vivem 8,6 milhões de pessoas (35% da população amazônica). A vegetação de cerrado tem influência na dinâmica de ocupação e de desenvolvimento desses municípios, o que os distingue em alguns aspectos socioeconômicos do restante da Amazônia florestal. Em média, o IPS dos municípios não florestais (58,50) é estatisticamente superior aos municípios florestais (56,26). No entanto, a diferença é relativamente pequena (Tabela 6) e, tanto o grupo de municípios florestais como o de não florestais apresentam IPS insatisfatório em relação à média nacional. A Dimensão 2 (Fundamentos para o Bem-estar) não apresenta diferença significativa entre os municípios florestais e não florestais, enquanto as demais dimensões apresentam resultados ligeiramente superiores para os municípios não florestais.
Tabela 6. Análise da variância (Anova) do IPS nos municípios florestais e não florestais da Amazônia. Média seguida do desvio padrão (entre parênteses). Letras diferentes significam diferença estatística (p < 0,05).
* municípios que originalmente tinham 50% ou mais do seu território coberto por floresta.
** municípios que originalmente tinham menos de 50% do seu território coberto por floresta.
As dimensões que compõem o IPS, seus componentes e os indicadores que geram esses componentes desagregados oferecem um detalhamento do IPS importante para a tomada de decisões. Segundo a SPI (2014a), não existe uma medida única que capture todos os aspectos do progresso social. Dessa forma, cada dimensão é diferente e cada componente também é distinto. Os municípios têm pontos fracos e fortes em relação ao progresso social tanto no nível das dimensões quanto dos seus componentes. Estes pontos fortes e fracos podem contribuir na definição de uma agenda de prioridades para o progresso social de cada município.
A Dimensão 1 do IPS mostra se a população tem suas necessidades mais básicas garantidas por meio de quatro componentes: 1) Nutrição e cuidados médicos básicos, 2) Água e saneamento, 3) Moradia e 4) Segurança pessoal (Os mapas de todos os 12 componentes estão apresentados no Apêndice 4). As necessidades humanas básicas são comuns a qualquer ser humano, independente de sua localização geográfica. Contudo, esta dimensão é a que apresenta o segundo pior resultado na Amazônia (58,75), e todos os componentes e indicadores avaliados são preocupantes (Figura 10). A disparidade entre a Amazônia e o restante do Brasil nessa dimensão é de 18%.
O primeiro componente (Nutrição e cuidados médicos básicos) evidencia problemas graves que persistem na região, como a subnutrição, a mortalidade infantil, a mortalidade materna e a mortalidade por doenças infecciosas. Na Amazônia, cerca de 1,4 milhão de pessoas (5,8% da população) apresentam peso abaixo do adequado, e a subnutrição é ainda maior entre as crianças com até 5 anos (8,5%). A taxa de mortalidade por desnutrição (7,8 óbitos para cada 100 mil habitantes) é o dobro da taxa brasileira (3,3). Além disso, a mortalidade materna média dos municípios amazônicos (167,5 óbitos para cada 100 mil nascidos vivos) é quase três vezes maior que a taxa média brasileira (58,2). A mortalidade infantil apresentou queda relevante nos últimos anos, mas a taxa da região ainda é 27% superior à média nacional (25 óbitos de crianças até 5 anos para cada mil nascidos vivos)[6]. A mortalidade por doenças infecciosas (Aids, tuberculose, dengue, malária, entre outras doenças) chega a cerca de 20 óbitos por 100 mil habitantes, e os casos de malária persistem em taxas consideradas epidêmicas (10,2 casos para cada mil habitantes), afetando a qualidade de vida da população (ver Quadro 3).
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[6] Além disso, estima-se que 26% dos óbitos até 1 ano não sejam registrados (Ripsa, 2011).
Figura 10. Necessidade Humanas Básicas (Dimensão 1 do IPS) nos municípios da Amazônia.
Quadro 3. Malária afeta drasticamente o bem-estar na Amazônia.
A malária é uma doença infecciosa causada por protozoários do gênero Plasmodium e transmitida ao homem pela picada do mosquito Anopheles contaminado. A Amazônia responde por 99% dos casos de malária do Brasil. Em 2012 foram registrados mais de 235 mil novos casos na região, dos quais 83 mil foram no Amazonas e 80 mil no Pará. Naquele ano, em 21 municípios da Amazônia, mais de 10% da população esteve infectada pela malária. Anajás (PA), Atalaia do Norte (AM) e Mâncio Lima (AC) são os municípios com as maiores taxas de incidência da doença. Populações indígenas, de assentamentos rurais, de garimpos e de regiões próximas às fronteiras com outros países são as mais vulneráveis (Braz et al., 2013). Embora a mortalidade seja relativamente baixa (60 óbitos em 2012), a doença afeta drasticamente o bem-estar da população amazônica.
O segundo componente (Água e saneamento) é o que apresenta a maior disparidade entre a Amazônia e o restante do Brasil (53%) e o segundo pior resultado geral (35,35). Sabe-se que saneamento básico e qualidade de vida estão intrinsecamente associados. Em média, pouco mais da metade da população da região (54%) recebe água de um sistema adequado e apenas 15,6% conta com o destino adequado do esgoto (rede geral ou fossa séptica) independente desse esgoto receber ou não o tratamento apropriado. Em 360 municípios amazônicos, mais de 90% dos habitantes não têm acesso a esgotamento sanitário adequado, ou seja, o esgoto é jogado a céu aberto, diretamente em rios ou disposto de outras formas rudimentares, o que representa grandes riscos à saúde. A situação é ainda pior nas áreas rurais da região, onde apenas 8% da população tem acesso a um abastecimento adequado de água e apenas 3% têm um sistema adequado de esgoto.
O componente 3 (Moradia) também aponta disparidade importante entre a Amazônia e o restante do Brasil (21%). Segundo dados do IBGE (2011), 23% da população da região amazônica vive em aglomerados considerados “subnormais”[7]. Outro problema crônico são os resíduos sólidos. Pouco mais da metade da população amazônica tem seu lixo coletado, enquanto o restante da população queima, enterra ou joga seus resíduos domésticos em terrenos, rios, lagos ou no mar. Além disso, menos de 10% dos municípios amazônicos contam com um sistema de reciclagem de lixo, e a grande maioria dos resíduos continua indo para lixões a céu aberto.[8] Por outro lado, o acesso à energia elétrica vem aumentado consideravelmente na região e 90% da população já tem acesso a esse serviço. Ainda que a região tenha grandes usinas hidroelétricas em funcionamento e em construção, uma das principais fontes de energia da região continua sendo termoelétrica gerada a partir da queima de combustíveis fósseis. Segundo o MME (2013), a qualidade da energia elétrica na Amazônia, medida pelo total de horas de interrupção de fornecimento nos municípios (61 horas), era sofrível na comparação com a média brasileira (19 horas). E a situação era ainda mais crítica nos Estados de Roraima e Amazonas, onde a interrupção de energia elétrica atingiu mais de 100 horas em 2012.
O componente 4 (Segurança pessoal) da Amazônia (54,72) é crítico, ainda que seja melhor que a média nacional (39,49). Infelizmente, os indicadores desse componente (homicídios, assassinatos de jovens e mortes no trânsito) são graves em todo o Brasil. A violência no campo e nas cidades amazônicas é preocupante (ver Quadro 4). Além disso, a mortalidade de pessoas vítimas de acidentes de trânsito na região amazônica (31,9 mortes para cada 100 mil habitantes) é superior à média nacional (23,7). Em 2012, mais de 6 mil pessoas morreram no trânsito na região. Na Amazônia como no resto do Brasil, a maioria (70%) dos acidentes de trânsito tem relação com o consumo de bebida alcoólica (Denatran, 2012; Ipea, 2008).
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[7] Termo que designa um “conjunto constituído por no mínimo 51 unidades habitacionais (barracos, casas etc.) ocupando ou tendo ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular), dispostas, em geral, de forma desordenada e densa; carentes, em sua maioria, de serviços públicos e essenciais”.
[8] Em 2010, o Congresso Nacional aprovou a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010), que obriga as cidades brasileiras a acabarem com os lixões até agosto de 2014. Segundo o Ministério do Meio Ambiente (MMA, 2014), apenas 10% dos municípios brasileiros entregaram o planejamento de adequação às novas normas. Infelizmente, há iniciativas parlamentares no Congresso Nacional para adiar a obrigatoriedade das cidades em acabarem com os lixões.
Quadro 4. Violência no campo e nas cidades da Amazônia.
O Brasil está entre os dez países mais violentos do mundo. Na Amazônia não é diferente. A violência está presente nas cidades, nas áreas desmatadas e na floresta. Somente em 2012, morreram mais de 8,7 mil pessoas vítimas da violência na região (15% dos assassinatos nacionais), sendo 3 mil jovens entre 15 e 24 anos. De fato, a violência é a principal causa de morte de jovens na região (Waiselfisz, 2014). Além disso, o consumo crescente de drogas, como o crack, vem sendo apontado como uma das causas do agravo da criminalidade e da violência em todas as regiões no País (Brasil, 2009).
Manaus (AM), São Luís (MA), Belém (PA) e Ananindeua (PA) figuram entre as cidades mais violentas do Brasil. A taxa de homicídios média dos municípios da região é de 28,2 homicídios para cada 100 mil habitantes. Mas quando se considera apenas a população jovem, a taxa sobe para 45,6 mortes para cada 100 mil jovens. Em 100 municípios amazônicos a taxa de assassinatos de jovens é superior a 100.
No campo, a Amazônia é o principal palco dos conflitos pela terra e dos assassinatos rurais no Brasil. O avanço da fronteira de desmatamento é um processo violento. Povos indígenas, populações tradicionais e pequenos produtores têm sido as maiores vítimas. Há conflitos pela terra e pelos recursos naturais, grilagem de terras públicas e assassinatos rurais. Em 2012, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) registrou 459 conflitos na região (56% dos conflitos totais do País) envolvendo mais de 36 mil famílias. Entre 2009 e 2012, 44 indígenas (Cimi, 2014) e 83 não indígenas foram assassinados vítimas desses conflitos (CPT, 2013). Além disso, moram na Amazônia 211 das 262 pessoas ameaçadas de morte do País, ameaças geralmente associadas a questões fundiárias e ambientais.
A Dimensão 2 do IPS mostra se os municípios amazônicos têm a estrutura necessária para garantir o bem-estar social, definido a partir de quatro componentes essenciais: 5) Acesso ao conhecimento básico, 6) Acesso à informação e comunicação, 7) Saúde e bem-estar e 8) Sustentabilidade dos ecossistemas. Essa é a dimensão do IPS em que a Amazônia apresenta melhor resultado (64,84), mesmo assim, é 8% inferior à média do Brasil (Figura 11).
Figura 11. Fundamentos para o Bem-estar (Dimensão 2 do IPS) nos municípios da Amazônia.
O Acesso ao conhecimento básico (componente 5) revela uma disparidade de 10% entre a Amazônia e o restante do Brasil. O analfabetismo atinge 18,4% da população com mais de 15 anos na Amazônia, alcançando 26% no Maranhão. Além disso, outros 23% da população da região era analfabeta funcional em 2009[9]. O acesso de crianças de 7 a 14 anos ao ensino fundamental chega a 87% na Amazônia devido a diversas políticas nacionais de inclusão social e transferência de renda. No ent anto, o acesso dos jovens de 15 a 17 anos ao ensino médio ainda apresenta alguns desafios. Nos municípios amazônicos, a frequência média de jovens ao ensino médio é de 33%, valor inferior à média nacional (44,8%). No Acre, Amazonas, Pará e Roraima, esse valor é ainda menor: inferior a 30%. Embora o acesso à escola tenha aumentado nos últimos anos, a Amazônia enfrenta problemas sérios para garantir a estrutura e a qualidade na educação. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb)[10], criado pelo Ministério da Educação (MEC) para monitorar a qualidade da educação básica no Brasil, mostra que todos os estados da Amazônia têm baixa qualidade na educação (Ideb < 5), e o resultado médio dos municípios da região é de apenas 3,9.
O Acesso à informação e comunicação (componente 6) é essencial para o progresso social e o desenvolvimento sustentável da Amazônia. Porém, esse componente apresenta o pior resultado nessa dimensão (53,36), e alguns indicadores não estão disponíveis na escala municipal. Dados na escala estadual revelam que apenas 30% da população amazônica tem computador em casa e uma fração ainda menor tem o computador conectado à internet (23,4%; IBGE 2011). Por outro lado, 83% da população tem um telefone celular, e o número de linhas ultrapassa o número de habitantes (116 linhas para cada 100 habitantes). Estudo recente aponta que o celular é o principal meio de acesso à internet no Brasil (Datafolha, 2013). Ainda que dados da Anatel (2013) indiquem taxas altas de conexão de voz (97%) e de internet (95%) na região, menos de 40% dos municípios contam com o serviço de 3G. Em 2013, apenas 24% dos usuários de telefonia móvel estavam satisfeitos com o serviço (Teleco, 2014). Além disso, estudo da ONU (2013) mostra que as tarifas de comunicações do Brasil estão entre as mais caras do mundo.
A Saúde e bem-estar (componente 7) refletem as condições de vida da população e também seu acesso a um sistema de saúde universal de qualidade. A taxa de pessoas com sobrepeso e obesidade é alarmante (35% da população). O sobrepeso e a obesidade geralmente estão associados à alimentação de má qualidade e a um estilo de vida sedentário; fatores associados ao aumento de diversas doenças da “modernidade” como a diabetes, o câncer e as doenças cardiovasculares. Os óbitos atribuídos à essas doenças na Amazônia chegam a 15,9 para cada 100 mil habitantes, o que representou cerca de 8 mil mortes em 2012.[11] O sistema público de saúde da maioria dos municípios pequenos não tem estrutura para tratar doenças como câncer, o que sobrecarrega os hospitais e centros de tratamento das capitais. Além disso, muitas pessoas têm dificuldades logísticas para chegar aos centros de tratamento devido às grandes distâncias entre as cidades do interior e as capitais da região. Outra causa importante de mortes na região são as doenças respiratórias (ver Quadro 5).[12]
Quadro 5. Focos de calor e doenças respiratórias.
Em 2013, a Amazônia foi responsável pela maioria (68%) dos focos de calor[13] no Brasil (Inpe, 2014b). A fumaça presente no ar devido às queimadas, poluição e indústrias é a principal causa de doenças respiratórias. Na Amazônia, a mortalidade atribuída a doenças respiratórias chega anualmente a 35,2 óbitos para cada 100 mil habitantes, e em alguns municípios de Mato Grosso (Colider, Pontal do Araguaia e Nova Santa Helena) é alarmante, com mais de 70 óbitos por 100 mil habitantes. Outra fonte importante de doenças respiratórias na região está relacionada ao grande número de carvoarias que abastecem a indústria de ferro-gusa principalmente nos municípios de Marabá (PA) e Açailândia (MA).
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[9] Analfabeto funcional é uma pessoa que tem menos de 3 anos de estudo, geralmente sabe ler e escrever algo simples, mas tem habilidades limitadas e dificuldade de compreensão.
[10] O Ideb varia de 0 (péssimo) a 10 (ótimo) e é calculado a partir de dois conceitos fundamentais para a qualidade da educação: aprovação e média de desempenho dos estudantes em língua portuguesa e matemática (Inep, 2013).
[11] É importante ressaltar que cerca de 15% dos óbitos na região não são registrados (Ripsa, 2011), e que dos óbitos registrados mais de 10% não têm suas causas definidas (MS, 2014b).
[12] Outro indicador utilizado para construir esse componente do IPS municipal é a mortalidade por suicídio. Em 2012, a região apresentou uma taxa de suicídio (8,8 casos para cada 100 mil habitantes) superior à média nacional (5,3), mas essas taxas são consideradas baixas quando comparadas àquelas da Europa e Ásia, que podem chegar a mais de 30 casos. No entanto, o suicídio entre as populações indígenas é alarmante no Brasil, chegando a ser quatro vezes maior do que entre a população não indígena na região Norte (Souza e Orellana, 2012).
[13] Casos de queimadas e de incêndios florestais detectados por satélites.
A Sustentabilidade dos ecossistemas (componente 8) inclui indicadores relativos a água (desperdício), solo (degradação) e florestas (desmatamento e Áreas Protegidas). A Amazônia abriga a maior reserva de água doce do planeta. Porém, mais da metade da população não tem acesso a um sistema de abastecimento adequado e em vários municípios há racionamento de água potável. Nos municípios onde a população é servida por rede de abastecimento de água, o desperdício médio chega a 44%; valor superior à média nacional (37%). A perda de florestas na Amazônia é uma preocupação global. O desmatamento entre 2009 e 2013 somou mais de 31 mil quilômetros quadrados, e em 2013 atingiu cerca de 19% do Bioma
(Figura 12) (Inpe, 2014a). O desmatamento representa uma das maiores fontes de emissões brasileiras de gases de efeito estufa (ver Quadro 6). A boa notícia é que 42% da região está protegida por Unidades de Conservação e Terras Indígenas (Imazon e ISA, 2011), muito embora haja evidências de desmatamento ilegal dentro dessas Áreas Protegidas e uma pressão forte por parte de lideranças ruralistas e setores do governo para a diminuição e até mesmo desafetação de uma parte dessas áreas (Martins et al., 2012; Bernard et al., 2014).
Quadro 6. Desmatamento e as emissões de Gases de Efeito Estufa.
O desmatamento na Amazônia já foi um dos maiores responsáveis pelas emissões de Gases de Efeito Estufa (GEEs) do Brasil. Em 1995, quando as emissões de GEEs do País atingiram seu maior valor, com 2,615 GT CO2eq (Gigatons de CO2 equivalente), as mudanças de uso da terra, sobretudo desmatamento da Amazônia, responderam por 75% do total (MCTI, 2013). É importante registrar que naquele ano o desmatamento na Amazônia atingiu a sua maior marca histórica: 29 mil quilômetros quadrados de florestas destruídas. Em 2005, com o desmatamento um pouco menor, as emissões do Brasil caíram para 2,032 GT CO2eq, e a contribuição das mudanças de uso da terra (desmatamento incluído) diminuiu para 57% (MCTI, 2013). A queda expressiva no desmatamento, sobretudo a partir de 2008, teve reflexo positivo nas emissões de GEE do Brasil. De acordo com as estimativas do governo, as emissões de GEE em 2010 foram 1,246 GT CO2eq, sendo que a participação das mudanças de uso da terra foi apenas 22% (MCTI, 2013). Dessa vez, os vilões das emissões brasileiras foram a agropecuária (35%) e energia (32%) (MCTI, 2013). Estimativas ainda mais recentes divulgadas pelo Observatório do Clima, realizadas por meio do Sistema de Estimativa de Emissão de Gases de Efeito Estufa do Brasil (SEEG), também revelam redução nas emissões totais do País. De acordo com o SEEG, as emissões de GEE do Brasil em 2012 foram 1,488 GT CO2eq, das quais 32% foram provenientes das mudanças de uso da terra (http://seeg.observatoriodoclima.eco.br).
Figura 12. Desmatamento acumulado na Amazônia até 2012 (Inpe, 2014a).
A Dimensão 3 do IPS estima o nível de oportunidade existente nos municípios da Amazônia por meio de quatro componentes: 9) Direitos individuais, 10) Liberdade individual e de escolha, 11) Tolerância e inclusão e 12) Acesso à educação superior. Essa é a dimensão com os piores resultados na Amazônia, com um índice médio de apenas 48,33, enquanto no restante do Brasil é 61,18. Entre os municípios da Amazônia, a situação é melhor nas capitais, bem como nos municípios com população acima de 200 mil habitantes, com exceções em alguns municípios com menor população principalmente em Mato Grosso e Tocantins (Figura 13).
Figura 13. Oportunidades (Dimensão 3 do IPS) nos municípios da Amazônia.
O componente 9 (Direitos individuais) inclui indicadores de mobilidade urbana, representatividade partidária e pessoas ameaçadas (rever Quadro 4). A deficiência e a má qualidade no transporte público do Brasil são notórias. Se no Brasil a mobilidade urbana não está boa com 4,7 ônibus para cada mil habitantes, na Amazônia a situação é ainda mais crítica com apenas 2,0 ônibus para cada mil habitantes. Ainda que alguns municípios da região precisem mais de barcos do que de ônibus para o transporte público, a frota de ônibus nas grandes cidades amazônicas é insuficiente. Entre as capitais, Rio Branco (AC), Macapá (AP) e Belém (PA) apresentaram a menor frota, com respectivamente 2,5, 2,5 e 3,7 ônibus para cada mil habitantes. A precariedade do serviço de transporte público afeta a qualidade de vida da população e também a produtividade dos trabalhadores. Além disso, a falta de transporte público leva ao aumento do transporte individual e, consequentemente, a problemas de trânsito, de poluição e de violência associados. Em 2012 havia 44 carros para cada 100 mil habitantes, taxa 22 vezes superior à taxa de ônibus. Diferente do IPS Global, indicadores de corrupção não foram incluídos na análise desse componente por causa da falta de transparência sobre o tema na região (ver Quadro 7). [14]
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[14] Para o cálculo do componente 9 (Direitos individuais) utilizamos um indicador de representatividade partidária. Esse indicador mostra a porcentagem dos partidos eleitos em relação aos partidos que participaram da última eleição para vereador municipal, indicando em alguns municípios a hegemonia política de alguns partidos, que muitas vezes não favorece a democracia. Esse indicador, que variou de 20% a 100% entre os municípios da região, teve uma média de 50,2% para a Amazônia no geral.
Quadro 7. Falta transparência sobre a corrupção na Amazônia.
A corrupção na política é um dos indicadores empregados para calcular o IPS Global. Infelizmente, não foram encontrados dados que pudessem ser utilizados para indicar a corrupção na escala municipal da Amazônia. Alguns estados e municípios apresentam informações dispersas sobre contas públicas não aprovadas e cassações de mandatos, mas não existem disponíveis dados consolidados e organizados que ilustrem esse tema para todos os municípios da região. A falta de transparência sobre corrupção, financiamento de campanhas e uso do dinheiro público é um problema generalizado no Brasil. Sem transparência e combate à corrupção não é possível haver progresso social. Em 2013, o Índice de Percepção da Corrupção da ONG Transparência Internacional (www.transparency.org/) colocou o Brasil na 72ª posição entre os 177 países avaliados com 42 pontos, pontuação próxima a países africanos e árabes.
O componente 10, Liberdade individual e de escolha, evidencia a falta de oportunidades dos jovens na região amazônica, seja pela necessidade de trabalho, pela vulnerabilidade das famílias ou pelo acesso escasso à cultura, lazer e esporte. O trabalho infantil é um problema recorrente e mais de 11% das crianças entre 10 e 14 anos trabalham na região. Isso significa que mais de 500 mil crianças que deveriam estar se dedicando aos estudos e à vivência esportiva e cultural – essencial para seu desenvolvimento intelectual e emocional – estão trabalhando para ajudar na renda familiar. As taxas de gravidez entre adolescentes (13% das mulheres entre 15 e 17 anos já tinham filho) e das mães chefe de família sem cônjuge e sem instrução (25%) indicam alta vulnerabilidade familiar e carência nas políticas públicas de planejamento familiar. Outro problema é a falta de espaços públicos para a realização de esportes, atividades culturais e lazer. Na Amazônia, 80% dos municípios têm um ginásio esportivo, 26% têm um centro cultural, 12% têm um teatro ou sala de espetáculo e 94% têm uma biblioteca municipal[15]. Porém, menos de 7% dos municípios da região contam com todos esses espaços para sua população. Além disso, na maioria dos municípios esses espaços existem somente na sede municipal e não beneficiam bairros distantes ou as zonas rurais.
Tolerância e inclusão (componente 11) tem um resultado geral para a Amazônia (64,58) ligeiramente superior à média do Brasil (63,59). Mesmo assim, há problemas sérios na região com relação à violência contra a mulher e indígenas e à desigualdade racial. A violência afeta mulheres de diferentes classes sociais, escolaridade e etnias. No Brasil, uma em cada cinco mulheres declarou haver sofrido algum tipo de violência por parte de um homem (Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2010). Na Amazônia, mais de 11 mil casos de violência contra a mulher foram denunciados em 2012, o que representa uma taxa de 80,9 casos para cada 100 mil mulheres. Desse total, 30% ocorreram em 4 municípios: Manaus (AM), Belém (PA), Tefé (AM) e Codó (MA). Embora políticas tenham sido implementadas para prevenir, eliminar e condenar essa prática, como a Lei Maria da Penha (Brasil, Lei nº. 11.340/2006), há ainda um número expressivo de mulheres vítimas que não denunciam seus agressores. Outras vítimas de violência recorrente na região são os povos indígenas. Segundo o Cimi (2014), ocorreram pelo menos 137 casos de violência contra indígenas na Amazônia entre 2008 e 2012, dos quais 97 ocorrências constituíram agressões e atentados contra a vida (45 casos de agressão, 37 homicídios e 13 tentativas de homicídio). Em 2012, foram registrados 9,4 casos de violência para cada 100 mil indígenas. Além disso, persistem na região altas taxas de trabalho análogo a escravidão (ver Quadro 8) e forte desigualdade racial, em especial no acesso à educação. Apenas 36% da população negra e parda com mais de 15 anos tem o ensino fundamental completo.
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[15] A existência de pelo menos uma biblioteca pública em cada município brasileiro é uma disposição legal brasileira (Brasil, Lei nº. 12.244/2010), mas isto não garante a qualidade e quantidade do acervo, a modernização do espaço, infraestrutura e a existência de novas tecnologias digitais.
Quadro 8. Trabalho escravo persiste na Amazônia.
A escravidão moderna (ou trabalho em condição análoga a de escravo) refere-se ao trabalho degradante com privação de liberdade seja por meio da servidão por dívida, retenção de documentos, isolamento geográfico ou uso de guardas armados (OIT, 2005). Essa prática ilegal persiste elevada na Amazônia, infringindo os direitos humanos mais básicos. Entre 2009 e 2012, foram registrados 537 casos de trabalho em condições análogas a de escravidão na região (64% de todos os casos registrados no Brasil). Durante esses anos, mais de 4 mil pessoas foram libertadas da condição de trabalho forçado na Amazônia. Segundo a ONU (2010), os trabalhadores escravos no Brasil são, no geral, homens analfabetos entre 25 e 40 anos de idade, provenientes principalmente do Maranhão, Piauí e Tocantins. A maioria trabalha em fazendas de pecuária (38%), agricultura (25%), bem como na prática de desmatamento, extração de madeira e produção de carvão (ONU, 2010). Somente em 2014 o Senado aprovou a Proposta de Emenda à Constituição nº. 57A/1999 (conhecida como PEC do Trabalho Escravo) que determina expropriação de terra onde houver trabalho escravo e destinação da mesma para a reforma agrária. Porém, até junho de 2014 ainda não havia sido aprovada a regulamentação da lei, a qual definirá o que é trabalho escravo e como a lei deverá ser implementada.
Finalmente, o último componente (Acesso à educação superior) tem o pior resultado entre os componentes do IPS (19,1) e mostra uma disparidade de 43% entre a Amazônia e o restante do Brasil. Na Amazônia, apenas 4,6% da população com 25 anos ou mais concluiu um curso superior e 5,6% dos jovens entre 18 e 24 anos frequentam um curso superior. Formação de capital humano e investimentos em ensino superior, ciência e tecnologia têm sido apontados como os principais meios de desenvolver a Amazônia de maneira sustentável, reduzindo a pobreza e diminuindo as desigualdades regionais.
O Índice de Progresso Social (IPS) apresenta o diagnóstico mais completo da situação social em 772 municípios da Amazônia com base em 43 indicadores. Esse índice, desagregado em 3 dimensões (Necessidades Humanas Básicas, Fundamentos para o Bem-estar e Oportunidades) e 12 componentes mostra com detalhe a situação social dos municípios e estados da Amazônia.
O IPS médio da Amazônia é apenas 57,31 – bem inferior à média nacional (67,73). A Dimensão 3 do IPS (Oportunidades) é a que tem o pior resultado (48,33), mostrando os desafios que a região deve enfrentar para garantir oportunidades para sua população. Nessa dimensão, o pior resultado foi no componente “Acesso à educação superior” (19,10), evidenciando a insuficiência de investimentos na qualificação do capital humano na Amazônia.
A Dimensão 1 (Necessidades Humana Básicas) apresentou um índice de apenas 58,75 – abaixo da média nacional de 71,60. Entre os componentes dessa dimensão inclui-se “Água e saneamento”, que teve o pior resultado (35,35).
A segunda Dimensão (Fundamentos para o Bem-estar) obteve o melhor resultado (64,84), mesmo assim, o valor está abaixo da média nacional (70,42). Entre os componentes, o pior resultado foi no “Acesso à informação e comunicação” (53,36). Por outro lado, o melhor resultado foi alcançado pelo componente “Sustentabilidade dos ecossistemas” (74,85), devido principalmente à queda recente no desmatamento e também à maior proporção de Áreas Protegidas (Terras Indígenas e Unidades Conservação) existentes na região.
Os estados da Amazônia apresentam uma disparidade em relação ao IPS e suas três dimensões, mas nenhum deles tem resultados satisfatórios ou melhores que o restante do Brasil. Mato Grosso, Tocantins e Rondônia têm os melhores desempenhos. A variação do IPS nos municípios também é significativa.
Os municípios foram classificados em 5 categorias de IPS. Na melhor categoria estão 87 municípios que têm em média um IPS de 65,79. Esses municípios abrigam 9,4 milhões de habitantes (39% da população regional) e são responsáveis por mais da metade (53%) da economia regional, com um PIB de R$ 182,3 bilhões em 2011. Por outro lado, na pior categoria estão 87 municípios que somam uma população de 1,7 milhão de habitantes e que têm um IPS médio de apenas 49,00. A economia desses municípios representa apenas 3% do PIB regional (R$ 9,7 milhões). Mais detalhes dos resultados dos estados e municípios estão apresentados no site
www.ipsamazonia.org.br.
A relação do IPS com o desenvolvimento econômico (medido pela renda per capita) é alta (0,62), principalmente na dimensão Oportunidades (0,72). Todavia, a performance econômica sozinha não é suficiente para explicar integralmente o progresso social já que a relação entre IPS e renda per capita não é linear. Vários municípios na mesma faixa de renda apresentam resultados do IPS muito diferentes, evidenciando como a economia pode ou não influenciar o progresso social.
A relação entre o desmatamento e o IPS é relativamente fraca (0,22), mas significativa. Não há um padrão claro na distribuição dos dados. Diversos municípios com o mesmo nível de desmatamento acumulado apresentam uma variação ampla de IPS. Análises adicionais são necessárias para entender melhor o impacto do desmatamento sobre o progresso social medido pelo IPS. Porém, sabe-se que a relação entre o desmatamento e indicadores de bem-estar (principalmente aqueles que englobam aspectos econômicos) tendem a seguir um padrão boom-colapso (Celentano et al., 2012), ou seja, crescem nos primeiros anos após a abertura da fronteira e desmatamento e tendem a se equilibrar e apresentar queda nos anos subsequentes quando o recurso florestal se esgota.
A Amazônia é conhecida internacionalmente por seus recursos naturais superlativos e por proporcionar serviços ambientais ao Brasil e ao restante do planeta. Essa riqueza vem sendo utilizada de forma predatória com constantes conflitos na disputa pelos recursos naturais. Ao mesmo tempo persistem na região problemas sociais graves e faltam oportunidades de progresso social para a grande maioria da população. O progresso social da forma como é medido pelo IPS revela que a região está abaixo da média brasileira, o que é incompatível com a sua importância estratégica em termos de recursos naturais para o Brasil. As próximas eleições gerais (presidente, governadores e legislativo estaduais e federal), em outubro de 2014, oferecem um momento excepcional para debater as questões sociais e ambientais da região e propor soluções que melhorem o progresso social dos mais de 24 milhões de habitantes da Amazônia. Esperamos que este relatório seja utilizado como uma bússola para orientar a gestão e as políticas públicas na região.
Metodologia adaptada de SPI (2014b)
Visão geral do método
A metodologia utilizada para calcular o Índice de Progresso Social (IPS) incorpora três grandes elementos: dimensões, componentes e indicadores (ver seção O que é o IPS?, pág. 16). As dimensões representam os conceitos com que o progresso social é definido. Basicamente, o IPS é calculado através da média aritmética da pontuação de cada dimensão de um determinado território (no caso da Amazônia brasileira, os municípios).
Há três dimensões e 12 componentes (4 componentes para cada dimensão). A pontuação das dimensões é obtida pela média aritmética simples dos seus componentes. Já cada componente é calculado pela média ponderada dos seus indicadores. Os pesos de cada indicador são determinados por análises fatoriais (AF).
As dimensões e os componentes do IPS
As três dimensões são oriundas do significado de progresso social, determinado pela Social Progress Imperative. Desse conceito surgiram três questões fundamentais que procuram averiguar se as necessidades mais básicas, o bem-estar e a existência de oportunidades, de qualquer nível territorial, existem e/ou são usufruídas de modo pleno por uma população. Essas três questões, ao serem medidas, tornam-se as dimensões do IPS, a saber: Necessidades Humanas Básicas, Fundamentos para o
Bem-estar e Oportunidades.
Para cada uma das três dimensões há quatro componentes. Cada componente dentro de uma dimensão tem o objetivo de avaliar de forma específica a dimensão na qual está inserido, também através de perguntas norteadoras (Tabela 1). A escolha das dimensões e a elaboração dos componentes foram definidas pela Social Progress Imperative por meio de um processo amplo de consultas, debates e revisão de literatura (SPI, 2014b).
Tabela 1. Perguntas norteadoras das dimensões e componentes do IPS.
Os indicadores utilizados no IPS
O IPS é uma medida agregada derivada de diversos indicadores de muitas organizações, desde grandes instituições, como a ONU, até ONGs (SPI, 2014b). Para a Amazônia brasileira foram utilizados indicadores secundários provenientes de instituições e agências do governo federal, além de informações de organizações da sociedade civil. Eles foram selecionados a partir de alguns critérios determinados pela SPI: 1) estar disponíveis ao público e ser de fácil acesso via internet; 2) ser indicadores de caráter social e ambiental, isto é, não devem ser indicadores econômicos; 3) ser indicadores de resultado (output), não de investimentos e/ou contribuição (input); 4) ser de fontes seguras, disponíveis para consulta e relativamente recentes (pelo menos 5 anos em relação a 2014); e 5) ter boa abrangência geográfica, ou seja, existir na maioria dos municípios.
Desse modo, um conjunto de indicadores foi escolhido para o cálculo do IPS Amazônia (Apêndice 3). Todos eles são válidos, disponíveis e estão conceitualmente relacionados às perguntas norteadoras de cada componente. Os indicadores são dos anos 2010 e 2012 (48% dos indicadores para cada ano), 2011 e 2013 (2% cada). A análise de componentes principais (ACP) foi utilizada entre eles para extrair o peso de cada indicador nos componentes e cálculo da pontuação dos componentes, dimensões e IPS. No entanto, antes de realizar essa análise, alguns ajustes foram necessários, a saber:
• ajuste de alguns indicadores, transformando-os da unidade original para ordinal, para evitar que os valores discrepantes distorcessem os pesos na análise fatorial de alguns componentes (Tabela 2);
• estimativa dos valores de alguns indicadores municipais sem informação. Para isso, foi aplicada a técnica de regressão entre os indicadores de um mesmo componente.
• cálculo do coeficiente alfa de Cronbach entre os indicadores de cada componente (Tabela 3). Esse coeficiente fornece uma medida de consistência interna em todos os indicadores, onde uma relação perfeita se dá com o coeficiente igual a 0,7. Embora funcione como uma boa ferramenta de verificação de ajuste conceitual de cada componente, ele não é essencial para o cálculo e qualidade da análise fatorial.
Tabela 2. Indicadores transformados em categóricos.
Tabela 3. Alfa de Cronbach de cada componente.
Calculando o IPS
De acordo com SPI (2014b), a análise fatorial (AF) utiliza a covariância comum em todos os indicadores para calcular os pesos que permitem criar um valor agregado dentre muitos indicadores. A AF fornece pesos para os indicadores de cada componente utilizados no IPS. Com esses pesos é possível calcular a pontuação de cada componente e, consequentemente, as dimensões e o IPS para cada município.
Depois de realizar a AF entre os componentes, a qualidade de ajuste entre os indicadores é testada por meio da medida de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) (Tabela 4). Em geral, as pontuações KMO devem ficar acima de 0,5. Para o caso dos componentes para a Amazônia, a pontuação KMO média é igual ou superior a 0,5 para todos eles. Logo, os componentes do IPS Amazônia encontram-se adequados.
Tabela 4. Média do KMO de cada componente.
Em cada componente é calculado um valor de progresso social. Esses valores são calculados somando-se as pontuações ponderadas para chegar ao componente:
Fórmula:
onde os pesos (w na equação) são determinados por meio da AF. Na Tabela 7 há uma relação completa desses pesos e valores.
Pontuação dos componentes
Para calcular a pontuação de progresso social para cada componente, é utilizado o valor do componente obtido ajustado pelos melhores e piores valores dos indicadores. Essas pontuações de melhor e pior caso são definidas no nível dos indicadores de acordo com a definição delas. Isso permite que cada município obtenha uma pontuação em uma escala de 0 a 100, com 100 sendo o melhor caso estimado e 0 significando o pior caso estimado no nível do componente. A fórmula seguinte é utilizada para calcular uma pontuação de componente para cada município:
Fórmula:
onde x é o valor bruto do componente para cada município. As estatísticas resumidas depois dessa transformação final dos dados para a Amazônia estão na Tabela 5.
Tabela 5. Estatística descritiva de cada componente, por dimensão, da Amazônia.
Há diferenças entre os componentes em termos da variação da sua pontuação geral. Isso acontece porque alguns indicadores apresentam uma variação muito grande entre os municípios, enquanto outros têm pouca variação. Por exemplo, no caso da violência não há um número significativo de casos em algumas cidades, enquanto que em outras há incidência muito alta. Por outro lado, o Acesso à educação básica têm uma variação menor entre os municípios. Porém, há um espaço muito grande para melhorias em ambos os casos.
Pontuação das Dimensões
A pontuação de cada dimensão é obtida calculando-se a média aritmética simples dos quatro componentes de cada uma (ver fórmula abaixo). A Tabela 6 apresenta a estatística descritiva das dimensões do IPS Amazônia.
Fórmula:
Tabela 6. Estatística descritiva de cada dimensão do IPS Amazônia.
Com os valores das dimensões obtidos, o IPS geral é obtido calculando-se a média aritmética simples dessas dimensões conforme a fórmula abaixo:
Fórmula:
Desempenho relativo (fortalezas e fraquezas) do IPS
As pontuações nos componentes, nas dimensões e no IPS como um todo variam de 0 a 100, sendo 100 a pontuação mais alta possível em todos os indicadores e 0 a pontuação mais baixa possível em todos os indicadores. Com essa escala, é possível avaliar o desempenho de uma sociedade em qualquer nível territorial em relação a melhor e a pior pontuação possível.
Todavia, também é útil comparar o desempenho relativo de um município amazônico com outros com nível de desenvolvimento econômico semelhante. Essa abordagem serve para verificar como está o progresso social de um município frente a outros com renda per capita similar. Por exemplo, um município pode possuir boa renda per capita, mas mesmo assim apresentar um IPS baixo em comparação a outros municípios na mesma faixa de renda.
Para isso, é considerado o seguinte. Foram estabelecidos grupos com 27 municípios com renda per capita semelhante. Então, o desempenho de um município de cada grupo foi comparado com os demais por meio da mediana dos desempenhos no IPS geral, dimensões, componentes e indicadores. Utilizou-se a mediana e não a média para minimizar a influência de valores discrepantes. Se a pontuação de um município for maior do que o desvio absoluto médio da mediana do grupo de comparação, considera-se um ponto forte (sinal verde). De modo oposto, se essa pontuação for menor, o desempenho relativo do IPS é considerado fraco (sinal vermelho). Por fim, as pontuações que ficam em um desvio absoluto médio estão dentro da faixa de pontuações esperadas e não são consideradas pontos fortes nem fracos, e sim neutros (sinal amarelo).
Tabela 7. Pesos dos indicadores para o cálculo do IPS Amazônia.
Comparação do modelo global com o modelo amazônico
Como mencionado anteriormente, em razão das características específicas da região amazônica, o modelo IPS Amazônia se difere do modelo IPS Global na seleção de alguns indicadores. No entanto, ambos mantêm a mesma estrutura básica de construção do índice, formada por três dimensões e quatro componentes cada uma. Ainda assim, apesar de os modelos não serem comparáveis entre si, os resultados coincidem significativamente para o resultados do Brasil em ambos os modelos, com uma diferença de apenas 3,2% entre os dois IPS obtidos (Tabela 8). Entre os componentes, apenas Moradia, Sustentabilidade dos ecossistemas e Acesso à informação e comunicação têm diferenças que ultrapassam 25%, enquanto nos demais a diferença é inferior a 15%.
Tabela 8. Comparação entre os resultados brasileiros nos modelos IPS Global e IPS Amazônia.
Dimensão 1. Necessidades Humanas Básicas
Nutrição e cuidados médicos básicos
Água e saneamento
Moradia
Segurança pessoal
Dimensão 2. Fundamentos para o Bem-estar
Acesso ao conhecimento básico
Acesso à informação e comunicação
Saúde e Bem-estar
Sustentabilidade dos ecossistemas
Dimensão 3. Oportunidades
Direitos individuais
Liberdade individual e de escolha
Tolerância e inclusão
Acesso à educação superior
This post was published on 26 de janeiro de 2015
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